A Igreja e seus mandamentos
por
Monsenhor Henrique Magalhães
Editora Vozes, 1946
ESSÊNCIA DO MATRIMÔNIO
12 de Agosto de 1940
Veremos hoje a essência do
Sacramento do Matrimônio.
O Matrimônio legitimamente celebrado
entre cristãos é um Sacramento propriamente dito. — Eis uma verdade de Fé, como
definiu o Concílio Tridentino.[1]
Assistindo àquelas núpcias em Caná
da Galiléia e operando então o seu primeiro milagre, Jesus Cristo elevou o
casamento à sua primitiva dignidade.
Quando, mais tarde, se discutia a
respeito da possibilidade do divórcio e os fariseus alegavam a lei mosaica que
permitia a separação, Jesus se reporta ao começo dos tempos, e declara: “No começo
não foi assim”. E, com aquela expressão: “não queira o homem separar o que Deus
uniu”, mostra não só a origem divina do Matrimônio, mas a continuidade da
Bênção que vem do alto e santifica os esposos, que se unem com reta intenção.
A doutrina que o apóstolo São Paulo
bebeu na fonte puríssima do ensino recentemente dado pelo próprio Messias e que
começava a ser transmitida pelos discípulos, evangelizadores da Boa Nova, — a
doutrina pregada por São Paulo, convence-nos da dignidade do Matrimônio e do
seu legítimo caráter Sacramental. Diz ele aos Efésios: “As mulheres estejam
sujeitas aos seus maridos, como ao Senhor. Porque o homem é cabeça da mulher,
como Cristo é cabeça da Igreja. Ele mesmo é o Salvador do seu corpo. Mas assim
como a Igreja está sujeita a Cristo, assim as mulheres hão de estar sujeitas a
seu marido”. Tal submissão, entretanto, tem como base o amor e dele recebe sua
força e perenidade. O apóstolo chega a dizer: “Uma vez que o esposo e a esposa
já não são mais dois, porém um só, o marido, amando sua mulher, ama-se a si
mesmo”. E remata dizendo: “Este Sacramento é grande, porém em Cristo e na
Igreja”.[2]
O Matrimônio é realmente um sinal
sensível e sagrado. Representa a união de Jesus com sua Igreja, como acabamos
de ver.
Confere a graça que há de fomentar
na família a vida conjugal, o desempenho das missões paterna e materna, a
harmonia tão desejável entre os irmãos.
Desde a aurora do Cristianismo, o
Matrimônio é considerado um Sacramento. É o que lemos na epístola 167 de S.
Leão Magno ad Rusticum, na de Inocêncio
I, ad Probum. Santo Agostinho chama
ao Matrimônio — “Sacramento das Núpcias”.[3] Santo Ambrósio
dizia: “O Matrimônio se santifica pela bênção sacerdotal”.[4]
E o grande Tertuliano, em sua carta “ad
uxores”, diz deste Sacramento: “Uma bênção o assinala, os anjos o anunciam
e o Pai o ratifica”.[5]
Entre cristãos, o contrato e o
Sacramento do Matrimônio de tal modo estão ligados, que não pode dar-se o
contrato do Matrimônio, sem que seja igualmente Sacramento.
Leão XIII, na encíclica “Arcanum” que já vos citei, ensina:
“Ninguém dê importância à distinção tantas vezes proclamada pelos Regalistas,
pela qual separam o contrato nupcial do Sacramento. É ponto averiguado no
matrimônio cristão, contrato e Sacramento são inseparáveis”.
Notas
_____________________
[1] Sessão XXIV, c. I.
[2] Para identificar as citações, ver citações anteriores.
[3] Comentário ao Evang. de S. João, cap. IX, n.° 2.
[4] Epístola a Vigilâncio.
[5] Livro II, c. 7.