Nota do blogue: Agradeço a generosidade do amigo Fabrício pelo envio do texto. Deus lhe pague.
(A Suma Teológica em forma de Catecismo,
Santo Tomás de Aquino, Páginas 257 à 265)
XLIX
DO FIM DO MUNDO E DO QUE A ELE SE SEGUIRÁ
-
Dissestes que, no momento em que o último predestinado chegue ao grau de
preparação e merecimento a que Deus o destina, sobrevirá o fim do mundo; em que
consistirá tal fim e que ordem de coisas se seguirá? Consistirá, exclusivamente
em trasladar para o céu o último eleito, e em determinar o estado e lugar
definitivo que hão de ocupar os condenados no inferno e as crianças no limbo?
-
Não, Senhor; ao fim do mundo se seguirão os dois atos mais transcendentais e
importantes da obra e plano divino; a ressurreição e o juízo final.
-
Como acabará este mundo?
- O
Apóstolo São Pedro nos ensina que no momento em que Jesus Cristo descer,
envolto em nuvens de glória para julgar os vivos e os mortos, o mundo terá
acabado por meio do fogo.
-
Logo, a conflagração universal, será o ato preparatório do Juízo?
-
Sim, Senhor; pois que servirá para purificar todos os elementos e dispô-los
para serem úteis no novo estado de coisas.
-
O fogo da conflagração final queimará e destruirá somente com a sua energia
natural, ou possuirá qualidades superiores, como instrumento de Deus?
-
Atuará como instrumento da divina justiça para que nele possam expiar as suas
faltas, as almas que deveriam estar mais ou menos tempo no purgatório.
-
Logo, o tempo de purificação dos que então morrerem, durará um só instante?
-
Sim, Senhor; porque Deus graduará a intensidade e energia dos tormentos
conforme ao que cada um deve, em Justiça, padecer.
-
Sabemos quando se dará o fim do mundo?
-
Não, Senhor; porém estamos certos de que a vinda do Juiz Supremo precederão
certos sinais e formidáveis avisos.
-
Quais serão?
-
Extraordinários transtornos e comoções em toda a natureza, a cuja vista, na
expressão do Evangelho, andarão os homens desfalecidos de terror.
-
Podemos determinar, em concreto, quais serão?
-
Não, Senhor; porém, serão tais que, à sua vista, os justos ou os homens simples
e sinceros e não obstinados em cegueira voluntária, reconhecerão a próxima
vinda do Juiz.
L
DA RESSURREIÇÃO
-
Que sucederá depois ou ao mesmo tempo em que o mundo esteja sendo reduzido a
cinzas?
-
Ouvir-se-á em todos os âmbitos da terra o som da trombeta de que fala o
Apóstolo São Paulo na sua primeira epístola aos Tessalonicenses; à sua voz se
levantarão os mortos das suas sepulturas e, por ela chamados, comparecerão na
presença do Juiz Supremo que para julgá-los, descerá do céu sobre nuvens de
glória e revestido de soberana majestade.
-
Quais são os que ressuscitarão?
Imediatamente,
os que morreram no transcurso do tempo desde o princípio do mundo, e além
disso, todos os que se acharem vivos, no momento de Jesus Cristo descer e de
soer a trombeta do Juízo final.
-
Ressuscitarão estes últimos no sentido de passar da morte para a vida?
-
Sim, Senhor; porque, ainda que todos estes acontecimentos sejam instantâneos,
como parece indicar São Paulo na primeira epístola aos Coríntios (Cap. XV –
15), sucederá que os homens vivos um momento antes, passarão por uma morte
instantânea e imediatamente irão ocupar o lugar que por suas obras lhes
corresponda.
-
Logo ressuscitarão em estado glorioso os corpos de todos os santos, vindos do
céu, saídos do purgatório, ou surpreendidos na vida mortal pelos últimos
acontecimentos?
-
Sim, Senhor; e todos juntos comparecerão diante da humanidade gloriosa de Jesus
Cristo, cuja vinda será a causa da ressurreição.
-
Ressuscitarão os justos com os mesmos corpos que neste mundo tiveram?
-
Sim, Senhor; com a diferença de que então não terão deformidade, nem imperfeição,
nem estarão sujeitos a debilidade alguma, mas que, pelo contrário, possuirão
qualidades e dotes que os converterão, de certo modo, em espirituais.
-
Quem será capaz de efetuar tão nobre transformação?
- A
onipotência divina que, assim como tirou do nada todos os seres, pode
transformá-los à sua vontade.
-
Quais serão os dotes dos corpos gloriosos?
- Os
de impassibilidade, sutileza, agilidade e claridade.
-
Em que consiste a impassibilidade?
- No
domínio e senhorio absolutos da alma sobre o corpo, em virtude dos quais este,
sob a tutela daquela, estará isento e livre de toda debilidade e padecimento.
-
Alcança este dote o mesmo grau de perfeição nos corpos de todos os bem
aventurados?
- No
sentido de que nenhum alcançará a dor por falta de submissão da alma, sim,
Senhor; porém, as faculdades e atribuições senhoriais da alma guardarão
proporção com a glória de que desfruta, que, por sua vez, depende do grau de
intensidade, na visão beatífica.
-
Se os corpos gloriosos são impassíveis, serão, também insensíveis?
-
Não, Senhor; pois tem uma sensibilidade rara e delicadíssima. Assim os olhos
possuirão uma agudeza visual penetradíssima, o ouvido finíssima audição e assim
os demais sentidos perceberão os objetos próprios e os comuns com uma
intensidade e perfeição impossível de compreender nem imaginar, sem que o
objeto produza jamais doenças nem ofenda à sensibilidade, limitando-se a
cumprir a sua missão que é prover de matéria as percepções mais delicadas.
-
Em que consiste a sutileza dos corpos gloriosos?
- No
dote mais peregrino que possuir podem, pois, mercê da união e sujeição à alma
glorificada, sem perder a sua qualidade de verdadeiros corpos, sem
transformar-se em corpos aéreos ou fantásticos, se tornarão puros e etéreos,
sem coisa alguma das que agora os fazem toscos e espessos.
-
Logo, perdem a propriedade física da impenetrabilidade, e podem, por
consequência, dois ocupar o mesmo lugar ou subtrair às condições do espaço e
não o ocupar nenhum?
-
Não, Senhor; conservarão todas as dimensões e ocupará cada um o seu próprio
lugar.
-
Foi em virtude da sutileza que o corpo glorioso de Cristo penetrou no cenáculo
com as portas fechadas?
-
Não, Senhor; mas por virtude divina de Jesus Cristo, e da mesma maneira como
nasceu das puríssimas entranhas da Santíssima Virgem, sem destruir a Sua
virgindade.
-
Que entendeis por agilidade dos corpos gloriosos?
- Um
dote que consiste em sujeitá-los tão plena e absolutamente aos impulsos motores
da alma, que os obedecerão com uma prontidão e rapidez maravilhosas.
-
Utilizarão os Santos esta qualidade?
-
Desde logo se servirão dela para ir ao encontro de Jesus Cristo quando venha a
julgar o mundo, e para subir ao céu com Ele. É possível que desde logo
empreendam voluntárias e agradáveis excursões, já para exercício de uma
qualidade em que tão maravilhosamente resplandece a sabedoria divina, já também
para recrear-se, contemplando as belezas e encantos do universo, pregoeiros da
glória de Deus.
-
É instantâneo o movimento dos corpos gloriosos?
-
Não, Senhor; pois ainda que imperceptível (tal será a sua rapidez), necessita
de algum tempo para efetuar-se.
-
Que entendeis ao dizer que os corpos gloriosos possuem o dote da claridade?
-
Que resplendor das almas glorificadas comunicará e infiltrará nos corpos uma
claridade que os tornará luminosos e radiantes como o sol, e transparentes como
o mais puro cristal; apesar disso, a luminosidade não apagará as cores
naturais; pelo contrário, se amoldará às suas distintas tonalidades para
realçá-los, embelezá-los e comunicar-lhes uma formosura mais divina de que
humana.
-
Possuirão todos os corpos o mesmo grau de claridade?
-
Não, Senhor; porque a claridade dos corpos é o reflexo da alma, e, portanto,
proporcional ao grau de glória de que esta desfruta. Por isso, querendo São
Paulo dar-nos a entender algo destas verdades sublimes, nos disse que serão os
corpos gloriosos como os astros no firmamento, entre os quais um é o brilho do
sol, outro o da lua e outro o das estrelas, e ainda umas estrelas diferem das
outras em brilho e claridade (I Coríntios Cap. XV-41).
-
Logo, o conjunto dos corpos gloriosos, formará um quadro vistosíssimo e de
incomparável formosura?
-
Tão grandioso, sugestivo e embelezador que os mais belos panoramas do céu e da
terra não poderão dar-nos dele uma idéia sequer aproximada.
-
Poderão ver com os olhos carnais a claridade dos corpos gloriosos, aqueles que
não possuem a glória?
-
Sim, Senhor; e assim a verão os próprios condenados.
-
Será facultativo à alma glorificada deixar ver ou ocultar a claridade do seu
corpo?
-
Sim, Senhor; porque provém dela e aos seus mandatos se sujeita.
-
De que idade ressuscitarão os corpos dos justos?
- Da
que corresponde à plenitude do desenvolvimento e energia vital.
-
Ressuscitarão no mesmo estado os corpos dos condenados?
-
Sim, Senhor; porém desprovidos em absoluto das qualidades dos gloriosos.
-
Logo, serão corruptíveis?
-
Não, Senhor; porque então terá terminado o reinado da morte e da corrupção.
-
Logo serão ao mesmo tempo passíveis e imortais?
-
Sim, Senhor, pois Deus, justiceiro e onipotente, dispôs as coisas de maneira
que nenhum agente exterior possa alterá-los e muito menos destruí-los, e que,
apesar disso, todos, e particularmente o fogo do inferno, lhes inflijam
formidável tormento e dor.
- Em que estado ressuscitarão as crianças
mortas sem batismo?
- No
de inteira perfeição natural, diferenciando-se dos justos, em que não possuirão
os dotes do corpo glorioso, e dos condenados, em que jamais experimentarão
enfermidades nem dor.
LI
DO JUÍZO FINAL
-
Depois da ressurreição, comparecerão todos os homens na presença do Juiz
Supremo?
-
Sim, Senhor.
-
De que forma se apresentará o Juiz?
-
Aparecerá a sua humanidade sacratíssima revestida da glória e majestade a que
lhe dá direito a sua união pessoal com o Verbo, e o triunfo alcançado sobre os
poderes do mal.
-
Verão todos os homens a glória do Redentor quando apareça para julgá-los?
-
Sim, Senhor.
-
Verão também todos a sua glória como Deus?
-
Somente a verão os eleitos.
-
Serão julgados quantos comparecerem na presença do Juiz?
-
Não, Senhor; somente serão submetidos a Juízo os que neste mundo tiveram uso da
razão.
-
E os que não o tiveram?
-
Não serão julgados, e se, como os demais, são conduzidos ao tribunal divino,
vão ali para ver e admirar a glória de Cristo, e a tremenda justiça e absoluta
imparcialidade dos juízos de Deus.
-
Logo, serão julgados, absolutamente, todos os homens que neste mundo foram
senhores dos seus atos?
- Se
por juízo entendemos a separação entre os bons e os maus e a colocação dos
primeiros à direita do Juiz, para ouvirem como os convida a tomar posse do
reino dos céus, e dos segundos à esquerda para escutarem a sentença de eterna
condenação, sim, Senhor; porém, se por juízo entendemos o processo, e pública e
convincente demonstração do mal obrar, somente os réprobos serão julgados.
-
Produzirá nos réprobos grande confusão e vergonha o ver como se descobrem e
publicam à face dos céus e da terra os seus crimes e pecados?
-
Isso lhes causará confusão suprema e tortura horrível porque, no fundo de todo
pecado, principalmente se é grave, aninha-se o mais inconfessável orgulho, e
naquele tremendo dia passarão pela vergonha de presenciar como o Juiz Supremo,
a cujo olhar nada se oculta, põe a descoberto os seus atos, projetos e
maquinações, e os segredos mais ocultos do seu orgulho e soberba, pai de todos
os vícios e pecados.
-
Logo, no dia do juízo, se publicarão à face do mundo inteiro quantos atos
reprováveis fizeram durante a sua vida?
-
Sim, Senhor; ali se publicarão os pecados da vida privada, os cometidos como
membros da família e da sociedade, conjuntamente com as consequências mais ou
menos lamentáveis que de sua intervenção nos negócios públicos se tivessem
seguido, quer seja no exercício do poder ou por meio da palavra falada ou
escrita; e quanto mais neste mundo tivessem colhido louros, alcançado mais
favor público e obtido maiores triunfos, mercê das intrigas dos inimigos de
Deus, de Cristo e da sua Igreja, mais esmagados se sentirão, sob o peso da
reprovação universal.
-
De que mais se servirá Deus para por as suas vidas no conhecimento do mundo
inteiro?
- Da
própria ilustração e iluminação do Juízo particular, com a diferença de que
nesta assembléia, única em que se acharão presentes quantos homens existiram
desde o princípio até ao fim do mundo, não somente verá cada um à sua própria
consciência, mas também a de todos os outros.
-
Logo, também estará patente aos olhos de todos a consciência dos justos?
-
Sim, Senhor; e isso constituirá a mais consoladora e sublime compensação da sua
humildade e voluntário obscurecimento na terra, porque só então se realizará
plenamente a promessa de Jesus Cristo no Evangelho:
O que se exalta será humilhado, o
que se humilha será exaltado.
-
Podemos dizer que não se discutirão as ações dos justos, e neste sentido, que
não serão julgados?
-
Tratando-se daqueles cuja vida é inteiramente santa e sem mistura notável do
mal, como a dos que, olhando as vaidades do mundo, põem todo o seu afã em
servir à Deus, sim, Senhor; porém, quanto aos outros, isto é, aqueles que, sem
amarem as criaturas mais do que a Deus até ao extremo de perdê-lo, viveram
afeiçoados às coisas do mundo e com elas mais ou menos transigiram, verão
expostas diante dos olhos dos demais as duas facetas de sua vida com o fim de
que todos contemplem a preeminência do bem sobre o mal, pois assim o requer a
escrupulosidade do Juízo divino.
-
Logo, publicar-se-ão todas as suas faltas, apesar do arrependimento e da
penitência?
-
Sim, Senhor, pela razão referida; porém esta manifestação, em vez de ser para
eles vergonhosa, será motivo de glória, pois conjuntamente com a culpa se
publicará a penitência, e tanto maior será a satisfação, quanto mais a
penitência tenha sido fervorosa e generosa.
-
Haverá justos que, em lugar de réus, serão juízes, e como tais tomarão assento
com o Juiz supremo?
-
Sim, Senhor; os que, a exemplo dos Apóstolos, abandonaram tudo para seguir a
Cristo, e cuja vida foi, poderemos dizer, a perfeição evangélica encarnada e
viva.
-
Naquele dia serão juízes também os anjos do Senhor?
-
Não, Senhor; porque os adjuntos daquele tribunal devem ser semelhantes ao Juiz,
e este será o Verbo divino enquanto homem. Logo só os homens podem ser seus
assistentes.
-
Se não são Juízes serão réus?
-
Propriamente também não, porque o juízo da sua causa se celebrou no princípio
do mundo, quando os que permaneceram fiéis entravam na glória, e os rebeldes
foram precipitados no inferno. Sem embargo disso, atenta a parte que os anjos
bons tomam na santificação dos justos e considerados os obstáculos e tropeços
que lhes põem os maus, encontram-se indiretamente envoltos no Juízo, os
primeiros para receberem um prêmio acidental, e os segundos, um aumento de pena
e suplícios.
-
Como terminará o Juízo final?
-
Pronunciando o Juiz a sentença definitiva.
-
Sabeis qual será?
-
Sim, Senhor; pois Ele mesmo a revelou.
-
Quais serão os termos?
-
Ei-los aqui como se leem no Evangelho: “Então
dirá o Rei aos que estão à sua direita: Vinde benditos de meu Pai, possuí o
reino que vos está preparado desde a formação do mundo – E dirá aos que se acham a sua
esquerda: Ide, malditos, ao
fogo eterno preparado para o diabo e para os seus anjos.
-
Qual será o efeito desta sentença?
-
Que “irão estes para o suplício eterno e os justos para a vida eterna.”