sexta-feira, 30 de abril de 2010

Trechos do sermão 13 (São Cesário de Arles)

Trechos do sermão 13
(São Cesário de Arles)


Eu vos rogo, irmãos caríssimos, que reflitamos sobre o significado de sermos cristãos e sobre o sinal da cruz de Cristo que trazemos na fronte. Não nos basta - bem devemos saber - termos recebido o nome de cristãos se não agimos como cristãos, conforme disse o próprio Senhor no Evangelho: “De que adianta dizer: ‘Senhor, Senhor’, se não fazeis o que eu digo?” (Lc 6,46). Se mil vezes te proclamas cristão e fazes o sinal da cruz, mas não dás esmola de acordo com tuas possibilidades e não queres ter amor, justiça e pureza, de nada te aproveitará o nome “cristão”.

Sim, é uma grande coisa o sinal de Cristo e a Cruz de Cristo, mas, precisamente por isso, grande e preciosa deve ser também a realidade assinalada por tão precioso sinal. De que adianta fazer um selo de ouro, se o que está por dentro é palha podre? De que adianta andar com o sinal de Cristo na fronte e na boca se o que ele encerra são nossos pecados e delitos? Pois, quem pensa mal, fala mal e age mal e, se não quiser corrigir-se, a cada sinal da cruz seu pecado não só não diminuirá como aumentará.

É o caso de muitos que, ao furtar, adulterar ou agredir a pontapés, fazem o sinal da cruz e nem por isso deixam de fazer o mal. Ignoram esses infelizes que, com isso, atraem mais demônios para dentro de si em vez de expulsá-los.

Já quem, com a ajuda de Deus, afasta de si os vícios e os pecados, lutando por pensar o bem e realizar o bem, este imprime de verdade o sinal da cruz sobre seus lábios: pois esse agir, sim, é digno de receber o sinal de Cristo. E já que está escrito: “O reino de Deus não consiste em palavras mas em virtudes” (I Cor. 4,20) e também: “A fé sem obras é morta” (Tg 2,26), não usemos, pois, o nome de cristãos para nossa condenação, mas para nossa cura e dediquemo-nos às boas obras enquanto ainda podemos lançar mão dos remédios.

***

Memorizai o Símbolo e o Pai-Nosso, e ensinai-os a vossos filhos, pois não sei como pode alguém dizer-se cristão e não se empenhar sequer em saber os poucos artigos do Símbolo e o Pai-Nosso.

Sabei que sois responsáveis diante de Deus pelos filhos, que trouxestes ao Batismo: deveis ensinar e corrigir tanto os vossos próprios filhos como os afilhados para que vivam uma vida pura, justa e sóbria. E vós mesmos agi de tal maneira que, querendo vossos filhos imitar-vos, não acabem ardendo convosco no fogo eterno mas, a vosso lado, atinjam o prêmio da vida eterna...

***

Aos domingos, reuni-vos na igreja. Se os infelizes judeus celebram o sábado com tamanha devoção que nesse dia não realizam nenhum trabalho, quanto mais não deve o cristão dedicar o domingo somente a Deus e vir à igreja em benefício de sua alma? Quando vierdes às reuniões da igreja, orai por vossos pecados e não entreis em discussões nem provoqueis discórdias ou escândalos. Quem vem à igreja para tais coisas agrava a ferida de sua alma, precisamente onde, pela oração, poderia curá-la.

Na igreja, não fiqueis tagarelando, mas ouvi pacientemente as leituras da palavra de Deus. Quem fica conversando na igreja deverá prestar contas, não só do mal que causa a si mesmo, mas também do que causa aos outros: pois nem ele ouve a palavra de Deus nem deixa que os outros a ouçam.

Dai o dízimo de vossos proventos à Igreja. Aquele que foi soberbo seja humilde; o que era adúltero seja casto; o que costumava furtar ou apropriar-se das coisas alheias que comece a dar de seu próprio patrimônio aos pobres. Quem foi invejoso seja benevolente; seja paciente o iracundo, quem ofendeu apresse-se a pedir perdão e o ofendido apresse-se em ser misericordioso.

Toda vez que sobrevier uma doença, o que a sofre receba o corpo e o sangue de Cristo; peça humildemente e com fé ao sacerdote a unção com o óleo bento a fim de que se cumpra nele o que está escrito: “Algum de vós está doente? Chame os presbíteros para que orem sobre ele, ungindo-o com óleo, e a oração da fé salvará o enfermo, elevando-o ao Senhor. Se tiver cometido pecados, ser-lhe-ão remitidos” (Tg 5,14-15).

Vede, irmãos, como quem recorre à Igreja em sua doença obtém a saúde do corpo e a remissão dos pecados. Se é possível, pois, encontrar este duplo benefício na Igreja, por que há infelizes que se empenham em causar mal a si mesmos, procurando os mais variados sortilégios: recorrendo a encantadores, a feitiçarias em fontes e árvores, amuletos, charlatães, videntes e adivinhos?

***


Como disse há pouco, exortai vossos filhos e parentes a viver uma vida pura, justa e sóbria. Não só com palavras mas também com a força do bom exemplo.

Antes de mais nada, onde quer que estejais, em casa, em viagem, comendo ou em reuniões, não profira vossa boca palavras torpes e obscenas, e exortai os vizinhos e vossos próximos a que falem sempre o que é bom e belo, e não palavras más ou maledicência. Evitai as danças organizadas nas festas religiosas, com suas canções torpes e obscenas: a língua, com a qual o homem deveria louvar a Deus, é então usada para ferir a si mesmo.

Esses infelizes e miseráveis que, sem vergonha e sem temor, promovem seus bailes e danças bem diante das próprias basílicas dos santos, tendo vindo à igreja como cristãos, dela saem como pagãos: pois tais bailes são restos de paganismo. E dizei-me que tipo de cristão é esse que veio à igreja para orar, mas se esquece da oração e não se envergonha de entoar cânticos sacrílegos pagãos. Considerai ainda, irmãos, se é justo que a boca cristã, que recebe o próprio corpo de Cristo, entoe cânticos obscenos, um veneno do diabo.

E, principalmente, fazei aos outros tudo o que quiserdes que os outros vos façam, e não façais aos outros o que não quiserdes que vos façam. Se cumprirdes isto, podereis preservar vossas almas de todo o pecado. E todos, mesmo aqueles que são analfabetos, devem guardar estas duas sentenças na memória e, com a ajuda de Deus, podem e devem pô-las em prática.

Nós, caríssimos irmãos, conscientes de nossa responsabilidade, advertimo-vos com solicitude paterna: se de bom grado nos ouvirdes, dar-nos-eis uma grande alegria e chegareis felizmente ao reino de Cristo. Que Ele se digne vo-lo conceder, Ele que, com o Pai e o Espírito Santo, vive e reina pelos séculos dos séculos. Amém.

(Grifos meus)

Todos os dias...

Todos os dias...


Há certas realidades de todos os dias. São realidades inegáveis, tangiveis, tremendas. Com elas tens de contar. Viver no esquecimento delas é indigno de uma cristã, máxime quando é jovem ainda.

"Todos os dias Deus é ultrajado, esquecido, desprezado, blasfemado, odiado... Todos os dias Jesus Cristo renova seu amoroso sacrifício do Gólgota sobre o altar, sempre que numa matriz ou capela se celebra a santa Missa. Seus inimigos procuram crucificá-lO novamente, maldizendo-Lhe o Evangelho. "Como é evidente que nosso Senhor, se voltasse ao mundo, seria crucificando de novo e mais depressa do que a primeira vez"! (Gay)

Todos os dias a Santa Igreja é atacada, criam-se leis que a perseguem...

Todos os dias oculto no tabernáculo, o Divino Mestre pergunta-te: É pouco o que tenho feito por ti? Nada me custou o amar-te?

Todos os dias milhares de vidas desaparecem... Uma hora! Que é isso? É um desfile de sessenta minutos breves? Um minuto? Significa a morte de cem pessoas e o nascimento de cem crianças. Uma centena de agonizantes e outra centena de recem-nascidos. Numa hora: seis mil cadáveres e seis mil berços! E para quantos correu talvez em vão o sangue de nosso Senhor!... Até ao fim do mundo, disse alguém, nosso Senhor estará em agonia.

Todos os dias milhares de almas deixam-se talvez arrastar e seduzir pelo pecado e ofendem a Deus, expõem-se ao inferno, ou, quem sabe, nele caem.

E eu, entretanto, em que vivo pensando? Penso em divertir-me, em distrair-me, em ofender a Deus também? Preocupa-me tão somente a frivolidade, a futilidade, o prazer, o nada?

"Pobre coração, que passa insensível ao lado de tanto amor, de tanta dor, de tanto risco, de tanto ódio, sem sensibilizar-se. Pobre cabeça que um nada distrai e que tanta coisa não pode enchê-la." (Pe. Plus).

(Excertos do livro: Audi Filia!, do Pe. Geraldo Pires de Souza)

PS: Grifos meus.

ESPECIAL: Textos do livro: A formação da donzela, do Pe. J. Baeteman

Nota: Reuniremos em um único post os textos do livro: A formação da donzela, do Pe. J. Baeteman.
Este post receberá atualizações.


ESPECIAL
 Textos do livro: A formação da donzela, do Pe. J. Baeteman
 
 

Da fidelidade aos pais

Da fidelidade aos pais


Conforme a vontade de Deus, deves antes de tudo dedicar aos teus pais amor e fidelidade. São Jerônimo refere-se um belo exemplo desta fidelidade na vida da Santa Eustáquia, filha de Santa Paula, notável dama romana.

Segundo conta, ela portou-se em tudo, como boa filha, ternamente amorosa para com a sua mãe. Amava a mãe de todo o coração e se empenhava por imita-la em todo o bem.

Assinalavam-se, constantemente, por uma voluntária e pontual obediência, e cumpria-lhe prazerosa os menores desejos. Sempre ficava satisfeita, quando podia proporcionar-lhe alguma alegria. Seu maior gosto era permanecer em sua presença e assisti-la, com incansável dedicação e ilimitada diligência, tanto nos dias de saúde, como nos de doença, até o derradeiro momento de sua existência.

Tais foram às disposições e o procedimento de uma filha verdadeiramente boa, que tu, donzela cristã, deverás ternamente imitar.

Sim, cumpre com absoluta fidelidade, os teus deveres para com teus pais que, segundo a determinação de Deus são os teus maiores benfeitores. Lembra-te, por um instante que tudo deves agradecer a teus pais. Vê quanto por ti se afadigou teu pai, no decorrer de muitos anos. Todos os dias, pela manhã, erguia-se do leito e, depois de curta oração, encaminhava-se para os duros trabalhos de sua profissão. Quantas pesadas gotas de suor derramou para satisfazer às suas obrigações!

Quantas vezes sentia que as forças ameaçavam abandoná-lo, e as mãos denunciavam cansaço! Sem embargo, o pensamento em ti, o amor por ti, estimulava-o sempre a continuar o trabalho, não obstante toda a fadiga.

Enumera, se puderes, os penosos passos que deu por ti, as muitas alegrias e prazeres de que se privou para que nada te faltasse, os gastos incalculáveis que fez para que tivesses o necessário e te instruísses convenientemente. Contempla os duros calos de suas mãos, os sulcos de sua fronte, a gravidade que lhe transparece na face e em todo o ser – tudo isso te fará lembrar uma infinidade de incômodos e cuidados que teu pai suportou por tua causa.

Interpela, depois tua mãe, sobre o que tem feito. Responder-te-á: Minha filha, não te posso narrar, é impossível.

Horas e dias consecutivos trouxe-te em meus braços, acalentei-te ao meu coração e velei-te no berço; cumulei-te de carícias, antes que tu as pudesses compreender. Tu me fatigaste, muitas vezes; longas horas me roubaste ao repouso noturno pelo qual suspirava e do sono de que eu tanto necessitava. Sustentei a tua fraca vida, alimentei-te e tanta coisa suportei, até que pudesses falar, andar e de algum modo agir por ti mesma.

E, que de cuidados eu não sentia por tua vida, quando ela de qualquer modo corria perigo! Como eu oscilava entre a angústia e a esperança, esquecendo o comer e o beber, quando alguma doença te retinha no pequeno leito.

Fui eu a primeira que te iniciei no conhecimento de Deus, a primeira que acendi em teu coração a chama do seu divino amor, a primeira que juntei tuas mãozinhas e te ensinei a rezar: “Pai nosso que estais no céu”. Inúmeras vezes, ao divino Salvador e a sua Mãe Santíssima, com fervorosas orações e lágrimas, pedi o teu verdadeiro bem no tempo e na eternidade.

Estas e muitas outras coisas poderá narrar-te a tua boa mãe, se a interrogares sobre quanto fez por ti.

Os alemães têm um belo provérbio que diz com razão:

A mãe fiel será diariamente nova”
- Mutter treu vird taglich neu”.

Não seria, portanto, donzela cristã, sobretudo ignóbil, não seria uma negra injustiça, se não fosses boa e fiel para com teus pais, a quem tanto tens que agradecer, e não cumprisses conscienciosamente os teus deveres?

Se alguém visita um enfermo que, enfraquecido e desditoso jaz no seu leito de dores, e leva-lhe uma pequena dádiva, o doente comovido agradece com lágrimas nos olhos essa prova de carinho e amizade. Mais ainda: se alguém nos faz uma pequena fineza um favor insignificante, imediatamente proferimos o nosso “muito obrigado”, ou “Deus lhe pague”.

Tem-se, geralmente por falta de atenção e de nobreza de sentimento, o não reconhecer e agradecer tais favores e gentilezas. No entanto, são de todo insignificantes esses pequenos favores ao lado dos inumeráveis benefícios com que os pais cumularam aos filhos; mesquinha gota de água, em confronto com o mar incomensurável.

Cumpre, com toda a fidelidade e consciência os teus deveres para com teus pais, porque são eles aqui na terra os primeiros representantes de Deus junto de ti.
Nas suas ações externas, por via de regra, Deus não age imediatamente, mas com intervenção das causas segundas.

Ao trabalho do diligente, lavrador e do perito jardineiro, alia a sua atividade criadora e faz as sementes germinarem, nos campos cheios de esperança e orna os jardins com magníficas flores.

Foi assim também que, por meio de teus pais, te deu a vida; por meio de teus pais te alimenta e veste; por meio de teus pais te protege e guarda de muitos perigos; por meio de teus pais quer educar-te para a vida futura, conduzir-te para o bem e finalmente para o céu.

Os pais ocupam junto de ti o lugar de Deus; são para ti os primeiros dons de Majestade de Deus.

Deus tomou por assim dizer, uma pedra cintilante da sua coroa divina e a engastou na coroa da autoridade dos teus pais. Este pensamento a honrá-los, em alto grau, e a cumprir, com perfeição, os teus deveres para com eles?

Quando o Faraó do Egito nomeou seu representante, na qualidade de vice-rei, o patriarca José pôs-lhe um anel no dedo, vestiu-o com um manto real e lançou-lhe ao pescoço um colar de ouro.

Fê-lo depois percorrer toda a cidade no seu segundo coche, a que precedia um arauto para anunciar a todos que se ajoelhassem diante dele e soubessem que esse era o superintendente de todo o país do Egito.

Ora, os reis e príncipes da terra querem que seus representantes sejam honrados, que se lhes tribute uma parte da veneração e do respeito devidos ao rei. Porventura, donzela cristã, o Rei dos reis, perante quem o mais poderoso monarca na terra não passa afinal de um mesquinho grão de poeira, não exigirá que os homens respeitem seus representantes – os pais, - e lhes manifestem grande fidelidade?

Cumpre, fiel e conscienciosamente, os teus deveres para com teus pais; isto atrairá sobre ti as bênçãos de Deus para o teu futuro e graças abundantes para uma vida cristã virtuosa. Assegura-te o próprio Deus eternamente veraz e que sustenta o que prometeu.
Quero citar alguns dos mais belos trechos da Sagrada Escritura, que diz respeito a este assunto.

Lê-os com a atenção e devagar. Toma-os na devida consideração e propõe, por tua atenta observância, merecer as bênçãos divinas:

Honra teu pai e tua mãe, para que tudo te corra bem e tenhas uma vida longa sobre a terra”. Assim reza o quarto mandamento da Lei de Deus, que tu aprendestes quando criança.
Como quem acumula tesouros, assim é aquele que honra sua mãe (Ecli., 3,5).

Filho, ampara a velhice de teu pai e não o entristeças durante a sua vida. Se a inteligência lhe for faltando, suporta-o e não o desprezes por teres mais vigor do que ele; porquanto a caridade exercida com teu pai não ficará no esquecimento. Serás recompensado por teres suportado os defeitos de tua mãe... No dia da tribulação Deus se lembrará de ti, e os teus pecados se desfarão com o gelo num dia sereno”. (Ibid., 14,17).

Assim, como Deus prometeu as suas bênçãos aos bons filhos que fielmente cumprem os seus deveres para com os pais, assim também, ameaça com sua maldição àqueles que transgridem muitas vezes e de modo grave esses deveres.

Severas, com efeito, são as suas palavras. Lê, também, estas e sirvam-te de aviso salutar, a fim de conscienciosamente, pores em prática, a resolução de ser, em todo o tempo, boa filha.

Maldito o que não honra seu pai e sua mãe; e todo o povo dirá: Assim seja (Deut., 27,16).

O olho do que escarnece de seu pai e do que despreza a mãe que o deu à luz, arranquem-no os corvos... e comam-no os filhos da água (Prov., 30,17).
Como é infame aquele que desampara seu pai! E como é amaldiçoado de Deus o que exaspera sua mãe!” (Ecli., 3,18).

Quantas vezes não se encontra na história o cumprimento destas ameaçadoras palavras de Deus! Lembra-te de Absalão, que se sublevou contra o pai; ficou suspenso pelos longos cabelos ao galho de uma árvore e ali foi atravessado por três lanças.

Lembra-te de Cam que, com maliciosa satisfação, viu o pai em estado de embriaguez e foi referir o caso aos irmãos com certo desprezo. Em castigo, tornou-se escravo dos seus irmãos com certo desprezo. Em castigo, tornou-se escravo dos seus irmãos, e toda a sua descendência deverá sofrer a pena daquele delito.

Ainda hoje, cada cidade, cada aldeia, nos oferece exemplos de filhos que, muitas vezes menosprezaram gravemente os seus deveres para com os pais, e foram depois, a cada passo perseguidos pela maldição de Deus, de modo que, nas empresas comuns não logram nenhum êxito, nenhuma benção, e são de ordinário molestados e maltratados de igual maneira pelos próprios filhos, exatamente como antes haviam feito a seus pais.

Em lugar de maldição, donzela cristã, procura merecer as bênçãos abundantes de teus pais.
Portanto, presta sempre a teus pais, que ocupam junto de ti o lugar de Deus, temor reverencial; não te esqueças as belas palavras que São Cirilo Alexandrino dirige a cada filho: Honra e venera muito teu pai e tua mãe, porquanto os pais trazem em si de certo modo a imagem de Deus”.

Tomás Moro, homem de brilhantes dons de espírito e coração, foi nomeado arquichanceler da Inglaterra, portanto um dos primeiros e mais notáveis dignatários de todo o Reino. Todavia, com ser homem de estado, nunca deixou sua residência por muito tempo, sem se despedir do velho pai e sem lhe pedir, de joelhos, a benção.

Se participava duma reunião dos Grandes da Inglaterra, onde o pai estivesse presente, ele se dirigia logo ao pai, beijava-o com todo o respeito, oferecia-lhe o primeiro lugar, e só depois de recusado este, ocupava Tomás o lugar de honra que requeria a sua posição de arquichanceler.

Honra também teus pais em qualquer ocorrência. Seja onde e quando for, refere-te a eles com toda a atenção e respeito; guarda-te de te alegrar com suas faltas eventuais e suas imperfeições e de as ocultar a outrem. Jamais te envergonhes deles, ainda que sejam pobres ou defeituosos ou pouco educados.
Como é triste e intolerável aos olhos de Deus, o filho desprezar a seus pais, dirigir-lhes palavras ásperas e encara-los de rosto sombrio!

Diz com grande severidade São Jerônimo: Merece ficar cego, aquele que encara com mau humor o semblante de seus pais e ofende com olhos arrogantes, o amor filial!”.

E verdadeiras são as belas palavras de São Pedro Crisólogo: Tirai os raios ao sol e não mais alumiará; separai o regato da fonte, e não mais correrá; despojai a árvore de seus ramos, e secará; arrancai os membros, ao corpo, e morrerá; tirai ao filho a reverência aos pais e já não será nem filho, nem filha”.

Se, pelo contrário, estimares e honrares teus pais, a ti mesma te honrarás; o respeito que demonstra a teus pais, é a maior honra para tua pessoa e granjeia-te as suas bênçãos.
Honra teu pai por ações, por palavras e com toda a paciência, para que venha sobre ti a sua bênção e esta permaneça contigo até o fim”. (Ecli.,3,9-10).

Sê, além disso, pontual e obedece com alegria a teus pais. Receberam de Deus o sério encargo de te educar como boa cidadã e diligente cristã, pra que logres o destino eterno.

A esta grave incumbência não poderão satisfazer sem a espontânea obediência de tua parte. Com efeito: assim como sem a luz do sol não há dia claro, muito menos ainda pode existir verdadeira educação sem a obediência. Eis porque tens o dever rigoroso, perante Deus. De prestar de bom grado obediência a teus pais.

Não os deixes nunca chamar-te ou interrogar-te sem lhes responder alegremente; encaminha-te depressa e com prazer para o trabalho que eles te destinarem. Não te atrevas jamais a tomar atitudes arrogantes quando, com razão, eles te negarem visitar um clube. Nunca exijas deles coisa algumas contra a sua vontade, por ex., dar um passeio, ou isto ou aquilo; não procures depois extorquir ou captar a sua licença e permissão.

Não consinta que te chegue aos lábios uma palavra de descontentamento pela tua desobediência, nem jamais se veja, em ti, um sinal de enfado ou mau humor.

Executa com prazer sempre que puderes, os desejos que te não manifestam, mas que podes adivinhar. Assim, proporcionanas a teus pais grande alegria e edifica a teus irmãos, profundamente.

Por último, jovem cristã, ama teus pais, de todo coração. O grande, o heróico amor que te votam reclama o teu amor recíproco em alto grau: os inumeráveis benefícios de que te cumularam, desde os mais verdes anos de tua vida, impõe-te a doce obrigação de lhos retribuir com grato amor, o qual há de ser verdadeiro e puro, e não aparente ou hipócrita, e deve consistir numa afeição cordial, que te induza a tomar parte, de modo mais íntimo, em tudo quanto se relaciona com eles: alegrias e tristezas, saúde e doenças, felicidade e infelicidade.

O teu amor a teus pais deve ser constante e permanente: não só na tua mocidade, mas ainda em toda a tua vida subseqüente; não só enquanto eles têm saúde e aptidão para o trabalho, senão também, quando estiverem doentes e quebrantados e exigirem muitos cuidados, cumpre lhes sejas dedicada com amor íntimo e fiel.

Poupa-os sempre da menor aflição; proporciona-lhes com o teu procedimento, constante alegria. Não deixes tampouco de rezar por eles todos os dias, principalmente, quando assistirem ao santo Sacrifício da Missa ou quando receberes a sagrada Comunhão, o que fazes com bastante freqüência, como é de se esperar.

Teu amor para com teus pais deve, enfim, ser ativo e pronto. "O amor é paciente", diz o Apóstolo São Paulo aos gentios. Suporta com grande peciência as imperfeições e pobreza de teus pais. Se possuem defeitos realmente notáveis, que te fazem recear pela sua salvação, então reza por eles com maior solicitude e procura, de maneira prudente e afável, influir cristãmente sobre eles; entretanto, guarda de te queixares deles na presença de outrem e de aludir sem necessidade, a seus defeitos; antes sofre tranqüila e resignada, o que apesar de tua boa vontade, não podes modificar.

Se teus pais forem velhos e doentes, assiste-os com terno respeito, atenção e amor. Terás por grande favor e graça do céu o porporcionar-te Deus a ocasião de cuidares de teus pais velhos alquebrados. Em caso de necessidade deves preferir impor-te uma restrição ou privação, e até mesmo abster-te do próprio sustento, a permitir que eles de qualquer modo vivam na indigência.

Há muitos filhos e muitas filhas que não têm verdadeiro amor aos pais. Pode chamar-se amor, o tratar os pais com dureza e desprezo, não lhes dirigir uma palavra de afeto, falar com eles de maneira áspera e mortificante?

Pode chamar-se amor, o de filhos que por seu comportamento leviano, sua indiferença religiosa, sua vida dissoluta, afligem profundamente os pais e lhes preparam opróbrio e vergonha?

Pode, finalmente, chamar-se amor, a atitude de filhos que, por ocasião de uma doença mais prolongada dos pais, ou nos achaques próprios da velhice, se mostram insensíveis ou pouco cuidadosos; e cada trabalho, cada sacrifício, cada despesa, lhes parece demasiado, manifestando assim falta de amizade e de paciência?

Chegará tempo, talvez mais depressa do que supões, em que a morte te roube os pais. Então, o coração paterno que agora pulsa com tanto calor por ti, se quebrará no doloroso combate da morte; os olhos que tantas vezes agora se fixam com sincero amor e alegria se hão de cerrar para nunca mais baixar sobre ti; as mãos que tão frequentemente acariciam, tu as verás tolhidas, frias e hirtas.

Que de exprobações farás, então, a ti mesma, ao pé do leito funéreo de tua terna mãe, ou do teu bom pai, quando sentires os clamores da consciência assim bradando: eu causei à minha mãe, a meu pai, tantas aflições e dissabores, ultrajei-os tantas vezes e gravemente; agora estão no tribunal de Deus, para serem os meus acusadores!

Por outro lado, que doce consolação te será naquele tão grave momento poderes dizer com toda a verdade: sempre me esforcei em proporcionar a meus pais alegrias e prazeres; fui em todo o tempo filha sincera e fiel, cumpri as suas ordens e executei os seus desejos com a maior prontidão e boa vontade! Reflete, donzela cristã, sobre esta consolação que te poderá propiciar.

(Excertos do livro: A donzela cristã, do Pe. Matias de Bremscheid)

PS: Grifos meus

quinta-feira, 29 de abril de 2010

VII- OS FLAGELOS

VII- OS FLAGELOS


Do começo da vida até ao momento da morte, Jesus teve sempre diante dos olhos a Sua Paixão sangrenta.
Qual um artista que traz incessantemente consigo, numa gestação dolorosa, o ideal de que fará a sua obra prima.

Para Jesus, este grande drama da Paixão tem cinco atos principais: Ele os enumera, pormenoriza-os e sobre eles frequentemente comenta na intimidade da sua conversação com os Apóstolos.

O Filho do Homem, diz mais de uma vez aflitivamente, será traído (e ai daquele que O trair!): em conseqüência dessa traição será entregue aos príncipes dos sacerdotes e aos anciãos, que por sua vez O entregarão aos gentios”. E aí está o primeiro ato.

Depois será escarnecido, posto a ridículo. Et illudent ei. Ludibria-lO-ão, divertir-se-ão à Sua custa cinicamente. E nesta palavra, como num espelho profundo onde se refletissem cenas distantes, Jesus vê se desenrolarem todos os ultrajes do corpo da guarda, do Pretório, do palácio de Herodes, até a sinistra irrisão da coroa e do título real afixado à cruz: é o segundo ato.

O terceiro cifra-se numa palavra: Et conspuent eum: cuspir-Lhe-ão em cima. É um traço que O atormenta antecipadamente, frisa-O Ele com dolorosa precisão.

Et flagellabunt: será flagelado, açoitado como um escravo ou um animal malfazejo: é o quarto ato.

Após todas essas cenas, todas essas orgias de sangue, o quinto ato termina no Calvário.
Assim, como em cruel escorço, eis toda a Paixão do Cristo, tal qual O preocupa e O angustia de antemão.
A traição. As zombarias. Os escarros. Os flagelos. A cruz.

Tais são os cimos que Ele tem de galgar em menos de dezoito horas. Que profundezas de humilhações ser-Lhe-á forçoso atravessar para atingi-los!

Flagellabunt eum!

A flagelação parece ser, à luz da reflexão, uma cruel inutilidade: porque essa tortura suplementar a quem vai padecer a morte? A flagelação pode quando muito compreender-se como um castigo destinado a punir e a escarmentar.

Mas, para um condenado, não passa isso de um ato de selvageria. Aturou-o Jesus.

Tão bem o haviam compreendido os Judeus que, na conformidade da sua lei, ratificada por Deus, tinham que limitar no número dos golpes, trinta e nove, e o lugar onde se deviam aplicar esses golpes estava designado: as espáduas e o peito do réu.

Jesus não teve o benefício da Sua lei nacional.

Estava entregue aos gentios: ora, os gentios, mais bárbaros, mais cínicos, mais próximos dos baixos instintos, a despeito da sua civilização, não entendiam essas reservas no modo do castigo.
Ó Jesus! Fostes pois inteiramente despido e atado assim a uma coluna, com as mãos presas pela frente a uma argola, e o Vosso corpo se dobrava dolorosamente em dois!

Quanto tempo durou esse horrível suplício? Qual foi o número dos golpes?

Sabemos que eram gentios que batiam, que nenhuma lei limitava os golpes; – que eles eram estimulados pelos judeus; – que o homem entregue perdera toda reputação; – que já lhes era entregue em estado deplorável, coberto de poeira e de escarros, como um louco indigno de compaixão, um sedutor, um mágico; – que Pilatos, na sua cruel política, pedira um castigo de preferência severo; – que eles, os gentios, não queriam ficar atrás relativamente ao que fôra feito na noite precedente pela guarda de Caifás; – que, finalmente, eram soldados grosseiros, ávidos de espetáculos sangrentos.

Sabemos também que não se utilizavam varas para os estrangeiros e os escravos, mas sim flagelos engrossados de nós ou eriçados de pontas.

É provável portanto que aqueles verdugos não se tenham contentado com bater só no lado de trás do corpo, porém que, quando a sua Vítima ficou ensangüentada desse lado, a tenham cruelmente virado e sulcado de golpes, da cabeça aos pés o Divino Cordeiro a sangrar e a gemer sob os flagelos.

Supra dorsum meum fabricaverunt peccatores. Lavraram-me as costas todas. Prolongaverunt iniquitatem suam. E prolongaram a sua cruel prática (cf. Sl 128, 3).

Aí estão o lugar e a duração já indicados.

A planta pedia usque ad verticem, non est in eo sanitas, nem um só lugar sem laceração, da base ao vértice.

Vulnus et livor et plaga tumens. São só feridas, rasgos lívidos, chaga túmida (cf. Is 1, 6).

Como designar melhor os efeitos de uma longa e cruel flagelação? Nenhum dos suplícios suportados pelo Filho do Homem na Sua Paixão podia produzir efeitos semelhantes. E sob o dedo do profeta se remata a sinistra pintura:

Já não tinha forma, nenhuma beleza, o rosto está como suprimido, encolhido, aniquilado por aquela horrível dor; flagelado, açoitado como o último dos homens, assemelha-se o Seu corpo ao de um leproso; exangue, parece um galho mirrado que sai de uma terra seca. Podem-se-Lhe contar os ossos, postos a nu. Faz mal à vista, a gente desvia a cabeça, é um homem açoitado por Deus: açoitado, que digo? Ele está é triturado” (Isaías 53).

Estes pormenores não convêm senão à flagelação. Por que a quis Deus tão longa, tão cruel, tão especialmente horrível? Por que essa pintura do Profeta tão pungente, tão realista? Por que de per si constitui ela um ato do drama lúgubre? Por que acrescentou Ele que de antemão ela faz experimentar ao Filho do Homem um arrepio involuntário?

Os que conhecem o terrível mistério da depravação humana e as perversões de uma carne de que Deus queria fazer um invólucro radioso da alma pura, talvez compreendam os horrores da expiação divina.
Em duas circunstâncias memoráveis Deus alçou-se contra a carne culpada: no dilúvio, que cobriu o mundo corrompido, e em Sodoma e Gomorra, que inflamaram-se numa noite, quais sinistros archotes.

A mesma corrupção existe hoje em dia: se não tivéssemos a onda de Sangue Divino que correu na coluna, o mundo subsistiria ainda?

(“A subida do Calvário”, do Pe. Louis Perroy, SJ)

(Texto recebido por e-mail)

PS: Mantenho os grifos.

VI- A VESTE BRANCA

VI- A VESTE BRANCA


Jesus é arrastado, pela manhã, de Pilatos a Herodes: em que estado! A última parte da noite foi tão dolorosa! Aquela sala baixa de onde saímos, aquela coluna, venerada ainda hoje em Jerusalém, onde Ele se assentara, aquela oliveira do pátio de Caifás a que teria estado preso enquanto os soldados cobravam alento para a obra bebendo, outras tantas testemunhas daquela espantosa agonia!

Passa Ele pois pelas ruas, com as vestes sujas, o rosto inchado de bofetadas, a barba esquálida, embaraçada e cheia de escarros, sempre atado. Quando O vêem passar, desviam a cabeça... ousaremos dizê-lo? Depois do que disse o profeta, sim: é uma Face nojenta. Não está bastante ensangüentada para excitar a compaixão; está suja demais, por demais desfeita, para não suscitar o nojo.

Ó meu Deus, perdão por este termo repugnante, mas é o verdadeiro, nada se deve mudar ao que disse o Espírito Santo.

Tem Ele os braços amarrados, o rubor da confusão cobre-Lhe os pontos do rosto que não sujam os escarros e a poeira: não pode nem enxugar a Face nem esconder o pranto que corre.

Jesus deve ter chorado muitas vezes na Sua Paixão.

Ei-lO em presença de Herodes, de pé, pálido e desfeito; um arrepio de nojo percorre a elegante assembléia. Não podiam tê-lO modificado? Quando menos lavá-lO?

Atormentam-nO com perguntas; lisonjeiam-nO, gabam-nO; Ele se cala; desatam-Lhe as mãos para que execute passes. Jesus se cala, pendem-Lhe imóveis os braços. Instam então com Ele, a impaciência reponta:

“O quê?! Eu antecipei o meu levantar, atrapalhei o meu dia, convoquei a minha corte, pra Te ver, pra Te ouvir!”

E Jesus se cala. – “Que doido estúpido é este, ignorante das conveniências e usanças do mundo, que Pilatos me despachou?”

“É vosso rival, Herodes, intitula-se Rei dos judeus”.

“Belo Rei na verdade! Vamos vesti-lO de Rei, preciso tirar o meu proveito; prometi um divertimento à minha corte: já que Ele não nos quer divertir, divertir-nos-emos nós a custa dEle”.
Trazem a veste branca, passam-Lha, menosprezam-nO. E Jesus mantêm-se firme, face a Herodes, e despreza nEle o mundo.
Eis porque se cala.

Se houvesse diante dEle um simples pecador, oh!, por certo o Coração se Lhe fundiria, as mãos se Lhe atirariam no pó para retirá-lO. Mas há um zombador. Então Jesus se cala... aguardando a hora da justiça final. In eteritu vestro ridebo et subsanabo. Eu, a Sabedoria que tratais de loucura, a meu turno Eu me rirei de vós e brincarei convosco (Prov 1, 26).

Ó brinquedo terrível!

Há ainda vestes brancas que passam pelo mundo, justamente porque há sempre um mundo.

Todo o que quer amar a Deus acima de alguma coisa reveste um pouco dessa veste branca: se quiser amar a Deus acima de tudo, revesti-la-á toda. Eu posso, aos olhos de Deus, cobrir-me ainda com outra veste de humilhação: envolve-me a lembrança dos meus pecados, as tentações me assediam, os meus sentidos se revoltam.

Que veste humilhante! E eu só tenho esta para apresentar a Deus, pois perdi a outra, a primeira, a da minha inocência.

Ó Deus, ó Pai, afferte stolam primam, mandai que me tragam outra vez a minha veste, e com ela o anel, as sandálias e o vosso amor novo. Assim seja.

(“A subida do Calvário”, do Pe. Louis Perroy, SJ)

(Texto recebido por e-mail)

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Trecho da Carta Encíclica DIVINI ILLIUS MAGISTRI, Papa Pio XI

Trecho da Carta Encíclica
DIVINI ILLIUS MAGISTRI
de sua Santidade Papa Pio XI
acerca da educação cristã da juventude.


SUJEITO DA EDUCAÇÃO

c) Educação sexual

Mormente perigoso é portanto aquele naturalismo que, em nossos tempos, invade o campo da educação em matéria delicadíssima como é a honestidade dos costumes. Assaz difuso é o erro dos que, com pretensões perigosas e más palavras, promovem a pretendida educação sexual, julgando erradamente poderem precaver os jovens contra os perigos da sensualidade, com meios puramente naturais, tais como uma temerária iniciação e instrução preventiva, indistintamente para todos, e até publicamente, e pior ainda, expondo-os por algum tempo às ocasiões para os acostumar, como dizem, e quase fortalecer-lhes o espírito contra aqueles perigos.

Estes erram gravemente, não querendo reconhecer a natural fragilidade humana e a lei de que fala o Apóstolo: contrária à lei do espírito, (43) e desprezando até a própria experiência dos factos, da qual consta que, nomeadamente nos jovens, as culpas contra os bons costumes são efeito, não tanto da ignorância intelectual, quanto e principalmente da fraqueza da vontade, exposta às ocasiões e não sustentada pelos meios da Graça.

Se consideradas todas as circunstâncias se torna necessária, em tempo oportuno, alguma instrução individual, acerca deste delicadíssimo assunto, deve, quem recebeu de Deus a missão educadora e a graça própria desse estado, tomar todas as precauções, conhecidíssimas da educação cristã tradicional, e suficientemente descritas pelo já citado Antoniano, quando diz:

« Tal e tão grande é a nossa miséria e a inclinação para o mal, que muitas vezes até as coisas que se dizem para remédio dos pecados são ocasião e incitamento para o mesmo pecado. Por isso importa sumamente que um bom pai quando discorre com o filho em matéria tão lúbrica, esteja bem atento, e não desça a particularidades e aos vários modos pelos quais esta hidra infernal envenena uma tão grande parte do mundo; não seja o caso que, em vez de extinguir este fogo, o sopre ou acenda imprudentemente no coração simples e tenro da criança. Geralmente falando, enquanto perdura a infância, bastará usar daqueles remédios que juntamente com o próprio efeito, inoculam a virtude da castidade e fecham a entrada ao vício » (44).

(43) Rom., VII, 23.
(44) Silvio Antoniano, Dell'educazione cristiana dei figliuoli, lib. II, c. 88.

28 de abril - São Paulo da Cruz

Viva São Paulo da Cruz!



PUREZA ANGÉLICA

Em todo o curso desta vida, temos respirado, como num jardim, o doce perfume desta alma virginal, branca e pura como o lírio. Desde os mais tenros anos, tomara por divisa a sentença POTIUS MORI QUAM FOEDARI, Antes morrer do que pecar.

Conservou a inocência batismal até o último alento de vida. Discorreu de sua juventude, acusava-se de ter sido demasiado vivo, e acrescentava que Deus o preservara dos escolhos em que tantos jovens se perdem.

Quando enfermo em Orbetello, julgando-se sozinho, assim se desabafava com, Nosso Senhor:

Bem sabeis, ó Senhor, que, com o auxílio de vossa graça, o vosso Paulo jamais maculou a alma com falta deliberada”.

Não pensemos que nele a virtude fosse fruto espontâneo de temperamento gélido ou de insensibilidade. Muito ao contrário, possuía rara ternura de coração, natural ardente, imaginação vívida. Alcançara a pureza angelical a preço de lutas e combates cruentos. Sua juventude foi dotada de riquíssimos dons naturais e do atrativo da virtude. Nem por isso foi isenta de perigos. Apesar das mais séries precauções, encontrou rudes assaltos, que quebrantariam virtude menos sólida.

Numa palavra, nele brilhou o lírio da virgindade, porque soube cercá-lo com os espinhos da mortificação, da modéstia, da fuga das ocasiões e da desconfiança das próprias forças. Sua modéstia era realmente angélica. Chegou a dizer certa vez que preferia lhe arrancassem os olhos, antes que fitar o rosto de uma mulher.

Conhecia apenas pela voz uma senhora espanhola de Orbetello, de rara formosura, a quem dirigira por muitos anos. A castidade, qual tímida pomba, vê perigo por toda parte. Em conversa com pessoas de outro sexo, suas palavras respiravam gravidade religiosa e celestial unção. Exigia que a porta do locutório estivesse aberta.

O companheiro recebia ordem de não afastar-se muito. Costumava dizer que o companheiro é como o Anjo da guarda. Não admitia exceção com quem quer que fosse. Estando em conferência espiritual com uma princesa, fecharam por inadvertência a porta do quarto. Bradou Paulo imediatamente:

Abram, abram a porta, pois estarmos de porta fechada é contra as regras de nossa Congregação”.

Disse certa vez: Não confio absolutamente em mim; nesta matéria fui sempre escrupuloso, tornando-me por vezes até descortês”.

Santas DESCORTESIAS, que levam o religioso a cumprir sua primordial obrigação: a observância das Regras! Velava o coração a fim de que se não afeiçoasse às almas por ele guiadas à santidade. NADA DE LATROCÍNIO EM RELAÇÃO A DEUS! essa a sua divisa.

Uma senhora, recomendando-se-lhe às orações, acrescentou com certa afetação:

Lembre-se sempre de mim em suas orações; jamais me esqueça”.
Isto não, replicou o Santo; depois de ter atendido às senhoras que a mim recorrem e de tê- las ajudado o melhor possível, recomendo-as a Nosso Senhor e procuro esquecer-me delas”.

Talvez pareça pouco satisfatória a resposta, mas era a máxima do servo de Deus que a familiaridade com essas pessoas é espinho capaz de ferir o formoso lírio da pureza. Deviam seus filhos ser Anjos em carne humana. Exortava-os calorosamente a imitarem a modéstia do Salvador. Recomendava-lhes não somente a modéstia da vista e o combate à concupiscência, mas também modelassem o seu agir às normas da modéstia, que a tudo empresta medida, compostura, dignidade.

Subira tão alto na região do amor celeste que, embora revestido de carne humana, já o constituira Deus poderoso protetor da castidade. Na missão de Valentano, dissera a uma jovem “Minha filha, Deus me fêz conhecer que sua inocência será submetida a terrível provação. Muito cuidado, minha filha”.

Estimulou-a a confiar em Deus, garantindo-lhe a vitória. Quatro anos decorridos, em quatro ocasiões diversas, sofreu a jovem violentos assaltos. Para repelir o brutal inimigo, invocava o nome do Pe. Paulo e sempre saiu vitoriosa.

Espargia o nosso santo em derredor de si o perfume da pureza. Bastava conversar com ele ou mesmo dele se aproximar, para experimentar os atrativos dessa virtude. Odor caraterístico exalava-se-lhe do corpo, dos objetos de uso e até da cela em que habitava. E esse celestial perfume perdurava por meses e anos.

Por vezes suas carnes virginais como que tomavam as propriedades do corpo glorioso: impassibilidade, claridade, agilidade e sutileza. No êxtase, tornava-se insensível à dor, desprendia de si luz vivíssima, elevava-se aos ares, voava como os Anjos, ausentava-se de casa com portas fechadas, como Jesus no Cenáculo, encontrava-se presente em vários lugares simultaneamente. Freqüentes eram esses prodígios na vida do servo de Deus.

Para retratar com perfeição a Paulo da Cruz, fora mister um raio de luz puríssima, mãos de Anjos, as cores que matizam a celeste Jerusalém.

(Excertos do livro: Caçador de almas, do Pe. Luís Teresa de Jesus Agonizante)

PS: Grifos meus

segunda-feira, 26 de abril de 2010

O interior de Maria

O interior de Maria


"Maria conservava todas estas palavras no Seu coração.”
(S. Lucas, cap. II)

Para bem julgar o interior de Maria, vejamos o que Deus fez por Ela e o que Ela fez por Deus. O Senhor, tendo-A predestinado para Mãe de Jesus Cristo;

1º) preservou-A do pecado original;
2º) enriqueceu-A com as maiores graças desde o momento da Sua Conceição;
3º) conferiu-Lhe muito cedo, e talvez desde o seio materno, o uso da razão;
4º) elevou-A á maternidade divina, deu-Lhe parte especial e única na Cruz e depois na glória do Seu Filho.

Maria correspondeu a essas graças de Deus:

1º) Vivendo com tão grande resguardo e tão contínua vigilância como se tivesse algo a recear da concupiscência e de suas conseqüências. Que atenção e cautela não devemos ter, nós que tantas vezes experimentamos os efeitos funestos da concupiscência!

2º) Aplicando-Se a seguir todos os impulsos e ditames da graça com tanta fidelidade, que jamais cometeu o mais leve pecado; mereceu em todos os instantes da Sua vida novo aumento de graça; nunca fez um só ato interior, uma única ação exterior cujo fim não fosse a mais estreita união com Deus.

Que modelo para a alma completamente entregue a Deus!

3º) Fazendo constantemente o mais perfeito uso da razão. E em que consistiu tal uso? Em constantemente submeter Maria a Sua razão ás luzes da fé; em trazê-la sempre sacrificada á razão suprema que é Deus; em nunca haver consentido num só raciocínio sobre os desígnios de Deus e o procedimento d'Este a Seu respeito, conquanto esse procedimento fosse cheio de mistérios e aparentes contradições.

Jamais avançaremos na vida interior, se não fizermos igual uso da nossa razão. Deus conduz as almas por caminhos opostos a todas as vistas humanas; compraz-se em destruir todos os nossos juízos, transtornar todas as nossas previsões, frustrar as nossas espectativas....

4º) Dispondo-se, sem o saber, á maternidade divina, pelo que devia humanamente privá-la para sempre dessa honra. Todas as filhas de Judá anhelavam o matrimônio, afim de contar o Messias em sua posteridade. Para elas era opróbrio a esterilidade; Maria julga-se indigna de pretender á qualidade de Mãe de Deus.

Desde a mais tenra idade, apresenta-Se ao templo para consagrar a Deus a Sua virgindade e, segundo as idéias de Sua nação, renuncia para sempre á mais alta pretensão das pessoas do Seu sexo e da Sua tribo.

Não é aspirando a grandes coisas, concebendo projetos grandiosos, tomando resoluções sublimes que alcançamos a santidade e nos dispomos aos desígnios de Deus, bem diferentes dos nossos; é humilhando-nos, abismando-nos na nossa baixeza e no nosso nada, reconhecendo-nos indignos de toda graça, temendo todo desejo de elevação e rejeitando-o como sugestão do espírito do orgulho.

Na Cruz de Jesus Cristo Maria teve tão grande parte que desde o nascimento até a morte do Seu Filho, n'Ela repercurtiu-se tudo quanto sofreu Ele, não só da parte dos homens, como da parte de Deus. Para termos idéia disso, basta considerarmos que Maria tinha por Seu Filho o maior amor de que seja capaz uma criatura: amava-O incomparavelmente mais do que a Si mesma...

Não vivia em Si mesma, mas no Seu Filho; todos os sentimentos de Jesus comunicavam-se ao coração de Sua Mãe com toda a força e na extensão ao alcance de uma simples criatura.

Elevemos-nos á meditação do que se passava na alma de Jesus Cristo, relativamente á glória do Seu Pai, ultrajada pelos homens, á santidade desonrada pelo pecado, á Sua justiça de que Ele era a vítima e a tantos milhões de almas, para as quais o Seu sangue seria inútil e até funesto em razão do abuso que dele fariam. E digamos afoitamente que a alma de Maria, guardadas as proporções experimentou as mesmas impressões.

Jesus Cristo sacrificou-Se na Cruz entregando-Se a todo o rigor da justiça divina. Maria sacrificou-Se também e mais do que a Si mesma, sacrificando Jesus Cristo e consentindo na realização dos desígnios de Deus, sobre a Redenção do gênero humano: os maiores sacrifícios da vida interior são incomparavelmente inferiores ao Seu, tanto pela extensão, como pela intensidade e pela incompreensível dor do Seu coração.

Quando tivermos passado pelas últimas provações, se Deus nos conceder tal graça, teremos pálida idéia do que sofreu Maria. Mas a maior parte dos cristãos só vê na Paixão de Jesus Cristo os tormentos do corpo e em Maria a Sua compaixão pelos sofrimentos do Filho.

O interior de Maria foi a cópia, mas a cópia mais fiél do interior de Jesus Cristo. Como Jesus Se imolou constantemente ao Pai, durante todo o curso da Sua vida, também Maria imolou continuamente a Jesus o Seu coração e imolou-Se com Ele ao Pai Celestial...

Como Jesus amou os homens, até lhes dar não só a vida do corpo, mas até a vida da alma. Maria amou os homens até lhes dar em Jesus Cristo o que lhe era mais caro do que a Sua própria vida e a Sua alma.

Que direi agora da oração de Maria?
Quem poderá dignamente descrevê-la?

Jesus foi o único objeto do Seu amor: desde a Ressurreição, só corporalmente permaneceu Ela sobre a Terra; Sua alma seguiu Jesus por assim dizer, até ao Céu. Não fez senão consumir-Se de amores pelo Filho e suspirar por Ele com inexprimível veemência, inefável enlevo. A sua única distração, se assim póde chamar-se, foi interessar-se pelo progresso da Igreja nascente e orar em prol da mesma.

Com sentimentos tão elevados quem era, quanto ao exterior, como pessoa, a SS. Virgem?

Uma mulher do povo, paupérrima, que vivia do Seu trabalho manual, durante trinta anos dedicada ao governo de uma pequena casa em Nazareth, mais tarde confiada a São João que com Ela repartia as espórtulas dos fiéis.

Que nome grangeou no mundo? Por que grandes feitos salientou-se aos olhos dos homens? Por ventura pôs-Se em evidência e contribuiu exteriormente, visivelmente, para a propagação do Evangelho? Era, entretanto, a Mãe de Deus, a mais santa e a mais pura das criaturas; foi quem teve a parte mais importante na Redenção da humanidade, e no estabelecimento da Religião cristã.

Quão diversas das nossas são as idéias de Deus!
Quão diferentes dos nossos os caminhos por Ele tomados para alcançar os Seus fins!

Como a obscuridade, o retraimento, o retiro, a solidão, a prece em silêncio Lhe agradam e mil vezes maiores são aos Seus olhos do que toda sorte de ações brilhantes!

Ah! como é ser tudo diante do Senhor - ser nada, nada pretender, aspirar apenas a viver ignorado, esquecido, desprezado, reputado o que há de mais vil e abjeto!

Se a vida da Santíssima Virgem não nos ensina esta verdade, se não provoca o nosso amor, abafando em nós todo desejo de sermos alguma coisa, se não convence da necessidade de perdermo-nos por completo, em nós mesmos, afim de nos encontrarmos de novo em Deus, que exemplo mais sensível, que lição mais poderosa será capaz de persuadir-nos?

Jesus e Maria demonstram a todo cristão que Deus só tira verdadeira glória neste mundo do nosso aniquilamento; provam ainda que quanto maior houver sido o nosso aniquilamento na Terra, tanto mais felizes, enaltecidos, poderosos seremos no Céu.

Qual é, pois a sólida devoção á SS. Virgem?

Tomarmos o Seu interior para modelo do nosso: procurarmos imitá-lA no baixo conceito que de Si mesma fazia; no amor á obscuridade, ao silêncio, ao retraimento; na atração que sentia pelas pequenas coisas; na fidelidade á graça; na simplicidade do recolhimento e da oração, cujo único objeto foi Deus e a Sua vontade, Jesus Cristo e o Seu amor; no sacrifício contínuo de si mesma e do que amava e devia amar mais do que a Si mesma.

Peçamos-Lhe quotidianamente que nos sirva de guia e modelo na vida interior, que nos obtenha as graças necessárias para correspondermos aos desígnios de Deus sobre nós. Esses desígnios são indubitavelmente desígnios de morte e destruição.

(Excertos do livro: Manual das almas interiores, do Pe. Grou)

PS: Grifos meus.

O meio da educação moral (Terceira parte)

O meio da educação moral
(Terceira parte)


3º - A dignidade no porte.

Que importância se deve ligar às boas maneiras?
As boas maneiras são o complemento obrigado da educação; dão-lhe não sei que graça, que atrai e provoca a simpatia.

Em que devem os pais praticá-las?
Em tudo aquilo que possam exigir de seus filhos. Pensam e dizem que não é bonito cruzar as pernas, bocejar ruidosamente, encostar-se, assobiar, olhar fixamente as pessoas presentes, etc. Muito bem. Mas é preciso que eles próprios comecem por evitar essas incorreções, contra as quais é muito justo prevenir a criança.

4º - A fidelidade às práticas religiosas.

Os vossos filhos farão aquilo que vós fizerdes; serão aquilo que vós fordes
(Mgr. Gibier, A desorganização da família, p. 442).

Qual é a importância do bom exemplo nas práticas religiosas?
A importância é capital.

Se, com efeito, o terceiro mandamento é uma tolice, como dizia um desgraçado pai a seu filho, no dia seguinte ao da sua primeira Comunhão, o quarto mandamento e os outros tornarão bem depressa o mesmo caráter aos olhos da criança, lógica e dócil. Se a criança “abrindo os olhos e perscrutando a vida paterna, pode dizer: Meu pai não é cristão; porque o deverei ser eu? a sua apostasia é naturalmente certa”.
(Mgr. Gibier, Ibid, p.296)

Quais são os hábitos dos quais convém dar o exemplo?
- Far-se-á, ao menos à noite, a oração em família.
-Aos domingos, assistir à missa, e, sendo possível, aos exercícios da tarde na igreja, com um livrinho na não.

"Faço como o papá", dizia a criança P. Nempon, quando a queriam obrigar a ter um livro nas mãos, em vez dos braços cruzados.

- Dar-se-á às crianças o exemplo dum grande afeto à Igreja e duma profunda veneração pelos ministros de Jesus Cristo.
-Tomar-se-á a defesa da religião e da Igreja, quando são atacadas, e habituem-se as crianças à luta do bem contra o mal.
- O mais freqüentemente possível, os pais ajoelharão à Mesa Santa ao lado de seus filhos, que já tenham uso da razão.

Os pais que compreendem a importância do bom exemplo não deverão comungar frequentemente, e mesmo todos os dias?
Sim; e, para nos convencermos, basta recordar duas verdade indiscutíveis.

A primeira é que, em nossos dias, um jovem ou uma menina, sem a comunhão frequente ou cotidiana, não pode de modo algum ter uma virtude completa. A segunda é que as crianças não seguem geralmente os pais no caminho do bem, senão a uma certa distância muito respeitosa.

E, se os pais comungam, não assistirão jamais a este espetáculo, profundamente contristador e inquietante, de jovens e de donzelas que, todos os dias, iam ajoelhar-se diante da Mesa Sagrada, quando estavam no colégio ou durante os estudos e, uma vez de regresso ao lar, no tempo das férias ou terminados os estudos, abandonam a regularidade desse ato piedoso e caem na negligência, com risco de se perderem.

É preciso que os pais possam dizer dos seus hábitos cristãos aquilo que o bom rei Henrique dizia do seu penacho branco: “Segui-o, encontrá-lo-eis sempre no caminho da honra e da vitória”.
Os hábitos religiosos entravam no regime da sua casa, como a comida e a bebida”, dizia Mgr. Parisis, a respeito de seus pais.

Seção II
A vigilância

Como se divide esta seção da vigilância?
Em quatro capítulos:

Capítulo I: A natureza da vigilância.
Capítulo II: A necessidade da vigilância.
Capítulo III: As condições da vigilância.
Capítulo IV: O objeto da vigilância.

Capítulo I - A natureza da vigilância

O que é a vigilância?
A vigilância é uma virtude que abre o espírito, os olhos e os ouvidos dos pais (e, em geral, de todas as pessoas responsáveis pela educação), e que as torna capazes:
- De prever, de distinguir e de afastar os perigos que podem correr a vida, a saúde e, sobretudo, a fé e a virtude das criancinhas;

- De prestar um auxílio oportuno à consciência e à vontade, previamente excitadas, das crianças que crescem e que, ao mesmo tempo, fazem a aprendizagem progressiva da sua liberdade.
Seguindo esta definição há, portanto, dois atos no papel da vigilância?
Sim.

- Quando a criança é pequena:

a) A vigilância é estrita; evita o mal;
b) Se o mal aparece, arreda-o à primeira manifestação;
c) Se o mal tomou já algum desenvolvimento, descobre-o, indaga a causa dele, e dá o remédio.

- Quando a criança cresce:

a) A vigilância diminui progressivamente na medida do desenvolvimento da inteligência, da consciência e da vontade da criança;
b) Presta um auxílio oportuno a quem vacila ou pede socorro;
c) Se há uma queda, levanta o espírito e faz tirar da mesma queda uma lição prática, útil e edificante.

Capítulo II – A necessidade da vigilância

A vigilância é necessária?
Sim, por muitas razões:

- A criança que não sabe é naturalmente imprudente e temerária.
- A criança traz em si as conseqüências do pecado original.
- Está cercada de inimigos exteriores.
- Sofre na ocasião do seu desenvolvimento uma crise interior muito para temer.

Artigo I – A criança é naturalmente imprudente.

A que atribui a imprudência natural da criança?
Ao seguinte: o animal tem o instinto para se guiar; e pelo instinto evita as coisas nocivas, protege-se contra os perigos, distingue as plantas venenosas, encontra as gramíneas que o devem aliviar.

O homem tem também uma faculdade, que os filósofos chamam estimativa ou instinto; mas é pouco desenvolvida e quase não tem necessidade de o ser. O verdadeiro guia do homem, com efeito, é a razão, o entendimento e a experiência.

Mas a criança?
A sua razão apenas começa a exercer-se; o seu entendimento não está formado: a sua experiência é nula.
É-lhe preciso, pois, um guia, um protetor, um defensor, um esteio.

Quem desempenhará junto dela estas funções necessárias?
Os pais, e somente os pais; são eles, por sua mesma natureza, a segunda providência, a providência visível de seus filhos.

A vigilância impõe-se.
É para os pais um dever grave.

Que conclusão se deve tirar destas comprovações?
É que será uma imprudência deixar muito cedo a criança dirigir-se só e a seu talante. Seria, além disso, supor que a sua razão e a sua vontade estão já formadas, quando, nesta hipótese, se trata precisamente da sua formação; seria supor a educação já feita, enquanto ela está por fazer.

Artigo II – A criança traz em si as conseqüências do pecado original.

Como é que o pecado original prova a necessidade da vigilância?
Porque o pecado original deixou as suas conseqüências na criança e rompeu o equilíbrio das suas faculdades; predispõe-a, por conseguinte, para uma infinidade de maus hábitos.
Só a vigilância pode evitar os desvios, salvaguardar a dignidade, preservar a inocência.

Artigo III – A criança está cercada de perigos exteriores.

Quais são os perigos exteriores que ameaçam a criança?
São as mil variantes do fruto proibido, os atrativos sedutores que o mal oferece; as solicitações das pessoas; as tentações das coisas, etc., todos os perigos aos quais seria muito difícil a criança resistir só com as suas forças.

Uma menina de quatro anos, obrigada a confessar que se tinha apoderado dum cacho de uvas destinado a sua mãe doente, fez esta reflexão: - E também porque me deixam sozinha!
Respeitamos a forma para conservar a este ligeiro episódio o caráter de autenticidade de que merece ser revestido.

E não parece que esta palavra seja como que o grito instintivo duma fraqueza que queria praticar o bem, mas que foi vencida por falta dum auxílio oportuno?

Artigo IV- A criança sofre, na ocasião do seu desenvolvimento, uma crise interior muito para temer.

Qual é o último e, talvez, o maior perigo que corre a criança?
A criança sofre, na época crítica do seu desenvolvimento, físico e moral, violentos assaltos, aos quais, sem um socorro poderoso, vindo de fora, estaria em grande perigo de sucumbir.

Se esta vigilância é necessária, os pais não devem considerar o seu exercício como um dever?
A criança tem necessidade dela.
Tem, pois, um direito a ela.

E, por uma correlação necessária, os pais têm o dever de lhes proporcionar essas vantagens. Houvera no céu que todas as crianças pudessem dizer a seu pai e a sua mãe o que Britânnicus dizia ao seu tio:

Teus olhos, sobre mim incessantemente abertos, salvaram-me de mil perigos encobertos
(Racine, Britânnicus, I, 4)

(Excertos do livro: Catecismo da Educação, do Abade René Betheléem)

PS: Grifos meus.

domingo, 25 de abril de 2010

Uma vela historiada

Uma vela historiada


Eis a história de uma vela, nas mãos de certa mãe. Branca e alva saiu de sua gaveta. Colocaram-na nas mãos da parturiente, quando lhe nasceu o sexto filho. Digo, uma menina. A mãe teceu uma coroa de flores com que ornou a vela. Determinou ardesse à hora do batismo da filhinha Lioba. E o mesmo acontecesse no dia de sua primeira comunhão.

Alegrou-se em vê-la acesa quando Lioba foi crismada. Teve a alma em alvoroço vendo-a moça e esbelta como a vela que levava, quando se apresentou de noiva no altar. Ia receber um sacramento com alma branca. Veste, véu, vela, alma. - tudo branco.

Depois a vela passou a posse de Lioba. Não teve ela a alegria de acendê-la no nascimento de um filho, porque Deus a provou com a esterilidade. Mas certo dia veio a doença abrindo-lhe chagas nos pés e nas mãos, no corpo todo. Ficou Lioba presa ao leito de doente longos anos, numa santa paciência de predestinada.

O esposo, cristão exemplar, contemplava aquela esposa consumindo-se como uma vela. Anos passados retirou esta, já bem gasta, para a colocar nas mãos da esposa agonizante. Viu então como as duas velas - a de cera e a de carne humana - se consumiam lentamente. Ambas iam apagando-se, por entre orações da cristã sofredora.

Que belo símbolo de fé representa essa vela! Não faço questão de uma cera em forma de vela, família (leitora). Falo questão de seu símbolo, já que representa a luz de uma fé perseverante.

Essa luz tem de ser acesa na alma dos filhos, para arder em todas as horas da vida. Sobretudo à hora dos sofrimentos. Estes não podem faltar numa família e nem devem ser mal recebidos, profanados, convertendo-se em mau exemplo deixado nos lares.

Tão abençoada luz precisa ser acesa na alma dos pais, como numa lareira se acende uma vela. Lastimável é portanto a ausência dessa luz na vida de pais e educadores cristãos. Como conseguirão enfrentar e ensinar coragem, à hora das cruzes?

Cristo mencionou um programa para todos sem exceção: tomar a cruz e ir atrás d'Ele. Logo, importa contar com a realidade, a presença de sofrimentos. Vendo-os santificados pelos pais, mais fácil será aos filhos recordar um passado edificante.

A cruz é também capital com juros para quem herda o nome e as virtudes dos pais. Por isso, família (leitora), vamos acertar nossa visão a respeito da realidade. Errado seria contar com improvisações amanhã. A virtude é treino, é conquista. Vive ensaiada ao longo de ano para a sua hora.

(Excertos do livro: Mundo entre berços, do Pe. Geraldo Pires de Souza)

PS: Grifos meus.