CONSELHOS SOBRE A VOCAÇÃO
CAPÍTULO II
ESTUDO DA VOCAÇÃO
Padre J. Guibert
(Superior do Seminário do Instituto Católico de Paris)
edição de 1937
Escolha
de uma vocação particular
62.
— Suponhamos que vosso diretor vos diga: «Meu menino, creio ver claramente que
Deus vos chama a Seu serviço; deveis renunciar ao mundo e entrar em religião.»
Estará acabado o estudo da questão? Fica ainda uma parte secundária a decidir,
que tem bastante importância: Que lugar ocuparei na religião? Para
os moços, a questão é a seguinte: «Hei de entrar no sacerdócio ou consagrar
minha vida à educação da juventude em um Instituto de Irmãos?» No sacerdócio
pode-se escolher o clero secular, que administra as paróquias, ou o clero
regular, que vive em comunidade e se consagra ao serviço da educação e das
missões. Se quiserdes entrar numa congregação, será ainda preciso ver que
sociedade religiosa deveis preferir.
Para
as moças a questão se divide também. Que deverá preferir essa moça, as obras de
caridade ou as obras de educação? As missões longínquas, os hospitais, os
asilos de pobres, os doentes a domicílio, as escolas e os colégios solicitam,
com efeito, o zelo de todos e reclamam numerosíssimas vocações. Depois de
escolher entre a caridade e a educação, resta ainda determinar a sociedade religiosa
na qual se deve entrar.
Todas
estas questões se resolvem muito mais facilmente que a questão capital da
vocação. Uma vez que alguém resolveu deixar o mundo, uma vez que a família
consentiu ao sacrifício, a escolha do caminho particular que se deve seguir,
pode fazer-se depressa.
63.
— Com efeito, as diferentes comunidades não se distinguem senão por diferenças
pouco importantes: por toda a parte a profissão religiosa impõe os mesmos
votos, a regra estabelece os mesmos exercícios de piedade, os superiores exercem
a mesma autoridade, os religiosos vivem longe do mundo e de seus prazeres
insensatos. Todos os modos de vida religiosa se assemelham: discutir muito
tempo aquele que tomaremos, seria desperdiçar os dias e expor-nos a perder a
vocação. Tenhamos confiança que Deus estará conosco, seja qual for a comunidade
que nos der asilo.
Contudo
é justo que cada menino escolha a sociedade que prefere. No meio escolhido por
livre vontade, sentir-se-á mais feliz e poderá ser mais virtuoso. Quantos
aborrecimentos, quantos desânimos, quantas faltas haveria um dia para o
religioso que pudesse dizer: « Se estou nesta sociedade onde sofro, é que
alguém fez violência a meus atrativos.» Muito mais forte contra a tentação é o
religioso que vive no lugar que amou e escolheu por espontânea vontade.
Mas
esta escolha deve ser esclarecida. Para fazê-la com todo o conhecimento de
causa, o adolescente deve considerar dois pontos: 1.° O modo de vida que se
leva, as boas obras que se praticam na comunidade que tem suas simpatias; — 2.°
se os atrativos e as aptidões que o distinguem terão plena satisfação nesta
congregação.
Não
se deve, portanto, ir de vistas fechadas para qualquer noviciado: antes de
tudo, tomai conhecimento das provas que vos esperam, dos trabalhos que vos
serão impostos. As surpresas são perigosas: são a causa mais ordinária das
numerosas defecções que entristecem os superiores de comunidades. Para que
serve esconder aos meninos as dificuldades reais da vida religiosa? Tanto mais
que as próprias dificuldades e as austeridades são antes um estímulo para seu
ardor juvenil.
Uma
vez a par da vida e dos trabalhos de uma comunidade, o menino se considera a si
mesmo para saber:
1.° Se terá forças morais suficientes para suportar o peso
dos deveres 2.° Se suas aptidões e gostos pessoais serão satisfeitos.
A
maior parte dos meninos têm disposições para toda a espécie de trabalhos:
mediante uma formação particular, podem adaptar-se a qualquer gênero de
ocupações, obras de caridade ou de ensino. Todavia alguns meninos têm inclinações
particulares muito pronunciadas, uns para o ensino, outros para a caridade: é
uma indicação providencial que seria perigoso contrariar.
64.
— Em geral, a Providência mesma se encarrega de mostrar ao menino o caminho que
deve seguir. — Eis um menino que quer absolutamente ser religioso; em religião,
aprenderá a desempenhar todos os empregos que seus superiores poderão
confiar-lhe. Mas conhece apenas uma comunidade religiosa, a que o educou. Não
será justo que entre nesta família que já ama e da qual ele é filho? — Tal
outro menino possui maravilhosas disposições para os estudos: quer ser
professor. Porque não havia de entrar na falange dos educadores que lhe
formaram a alma? — Outro menino anela para dedicar-se às missões longínquas:
uma vez adquirido este ponto, entre ele na sociedade que ele tem a felicidade
de conhecer: para que serve hesitar muito tempo entre as várias sociedades de
missionários?
Na
realidade, é deste modo que se passam as coisas: os meninos sequiosos do
devotamento religioso, entram na comunidade que os formou. Nada é mais justo:
as sociedades religiosas vivem então dos frutos do campo onde trabalham.
Mesmo
para esta escolha particular, o diretor espiritual deve ser consultado. Só ele
pode preservar um menino contra a ilusão, contra um movimento passageiro,
contra entusiasmos pueris. A respeito de vocação pode-se dar aos meninos, como
regra áurea, o aviso seguinte: «Não dar nenhum passo, sobretudo não tomar
nenhuma decisão sem o consentimento prévio do confessor.»