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Fr. Manuel Sancho,
Exercícios Espirituais para Crianças
1955
PARTE PRIMEIRA
A conversão da vida do pecado à vida da graça
(Vida Purgativa. — 1.ª semana)
A
CONFISSÃO (Meio para tirar o pecado)
1.
A Confissão: explica-se por uma parábola.— 2. Partes da confissão. — 3. Exame.
—4. Dor. — 5. Propósito. — 6. Confissão e satisfação. — 7. Confissão geral.
1.
— Havia um mancebo muito mau, tão mau que havia tratado seu pai da maneira mais
vil; e isso sendo seu pai um nobre cavalheiro, com seu castelo e seus soldados
e seu pessoal de serviço... todo um fidalgo! Esse filho ele só o tinha para seu
tormento. E este tanto ofendeu seu pai, tantas injúrias lhe fez, até o ponto de
atentar contra a vida do autor de seus dias, que este o encerrou num calabouço
do castelo e o pôs a pão e água, a fim de que ele se arrependesse. O calabouço
era lôbrego e mal cheiroso. O bendito sol dos céus jamais filtrava até ali os
seus raios. Ratos, escorpiões e outros bichos pululavam pelo calabouço,
guinchavam, perseguiam-se uns aos outros, e às vezes mordiam o coitado do
prisioneiro.
O
qual pensou em seu pai, nas injúrias que a este havia feito, em como ele era
bom, na abundância da sua mesa, na sua antiga felicidade correndo pelos jardins
do castelo.
O
jovem suspirou, começou a doer-se do seu feíssimo comportamento, chorou
amargamente...
Nisto
ouviu passos de alguém que se aproximava para visitá-lo. Era o mordomo de seu
pai, o homem que dispunha de todas as riquezas deste para reparti-las entre
quem convinha, ou para pô-las a bom resguardo. Era, enfim, quem administrava os
vultosos bens do castelo. Não é preciso dizer que ele era amigo muito querido
do castelão.
E
— Como estás? — perguntou ele, em chegando, ao prisioneiro — Muito mal —
respondeu este.
—
Que tens?
—
Ai! sou muito infeliz!
—
Teu pai me manda para te consolar.
—
Quero abrir ao sr. o meu coração, e quero que o sr. me sirva de medianeiro para
me reconciliar com meu pai, tão ofendido por mim. — E o jovem conta ao mordomo
todas as infâmias, todas as injúrias que fez a seu pai, e promete mudar de
conduta.
—
Pois fica sabendo — responde-lhe o mordomo — que, em nome de teu pai, eu te
perdoo, e ele te perdoa comigo. Agora sai daqui e vem gozar a antiga vida que
gozavas, e continuar feliz com teu bom pai.
E
o moço sai da prisão e lança-se nos braços do seu bom pai, e desde então
começa a ter uma conduta exemplar.
Isto
que eu vos ontem é o que ocorre no sacramento da penitência. Vamos examiná-lo
por partes.
Que
é confissão ou penitência?
É
(responde catecismo) “um sacramento instituído por Jesus Cristo para perdoar os
pecados cometidos depois do batismo”. O pobre pecador, com seus pecados nas
costas, é como o moço prisioneiro. Está metido na prisão, longe de Deus, num
lugar escuro, em companhia dos bichos dos pecados. Às vezes, quando cometeis uma
maldade, não pensais que vos encontrais num estado semelhante? Não vos tem
passado pela mente que, se então olhardes para Jesus Cristo pregado na cruz, ou
para o Coração de Jesus, parece que Ele vos faz má cara, e então tendes
vergonha de olhar para Ele? Ah! é que ofendestes e perdestes a sua amizade,
como o moço prisioneiro perdera a amizade de seu pai.
Mas
reparai no que faz o prisioneiro: chora o seu pecado. Eis aqui o princípio da
reabilitação, as lágrimas, a dor. Depois ele recorda, examina as suas faltas.
Assim, antes de vos confessardes, vós examinais os vossos pecados e vos doeis
deles. Depois o mordomo, o administrador dos bens do Pai, vem visitar o delinquente.
Aqui sucede ao revés: vós é que ides ao confessor para lhe explicar as vossas
misérias, como o outro explica ao mordomo as suas. E, assim como o mordomo o
ouve em nome do seu senhor e administra os bens deste, assim também o confessor
vos ouve em nome de Cristo, e, como administrador dos bens do céu, que ele
comunica pelos sacramentos, vos dá graça por meio da absolvição, de modo que,
uma vez confessados, de prisioneiros sujos e horríveis pelos pecados, vos
converteis em livres e filhos de Deus pela graça, vos restituís à sua amizade,
ficais limpos e alvos como a neve.
Que
efeitos maravilhosos os da confissão! E não penseis que o confessor vos tratará
com maus modos: Ele representa Cristo, e, assim como Cristo recebia com
mansidão os pecadores, assim o confessor vos receberá em nome de Cristo.
2.
— Pela parábola anterior notastes as partes da confissão. Primeiro, há que se
examinar dos pecados para poder dizê-los; depois há que se arrepender deles, do
contrário a confissão seria sacrílega; segue-se a confissão, o dizer os pecados
ao confessor, sem deixar de citar nenhum mortal, pois só os mortais há
obrigação de confessar todos; e, por fim, o propósito de não pecar mais, e o
cumprimento da penitência que o confessor impõe. São, pois, estas as cinco
coisas necessárias para a confissão, como diz o catecismo.
3.
— A primeira coisa que há a fazer para se confessar é o exame dos pecados.
Alguns dizem: “Não sei examinar-me”. Mas é que não entendem o que é exame.
Propor-vos-ei um meio para vos examinardes.
Tendes
uma zorra novinha e a perdestes. Onde estará ela? E vos poreis a vos lembrar
para saber onde podeis tê-la perdido. A primeira coisa que vos perguntareis é:
“Quantos dias faz que eu a tive em mão?” E vos lembrais de que faz oito dias.
Já sabeis o tempo: já é alguma coisa. Depois vos perguntais: “Onde estive estes
dias?” E vos lembrais de que estivestes no colégio; mas no colégio não a
perdestes, porque ao colégio nunca a levais. E vos perguntais de novo: “Onde
mais estive eu? Em casa de meus amiguinhos. Para ali, sim, é que eu levo sempre
a zorra”. Começareis a desconfiar de que a perdestes ali, mas ainda não estais
bem certos disso. Que fazeis então? Perguntais-vos interiormente: “Com quem
estive brincando em casa de meus amiguinhos?”. E vos lembrareis de que foi com
Joãozinho, que, para brincar com a zorra, é uma especialidade. De repente jorra
um raio de luz, dais uma palmada na testa: lembrastes-vos de que, a última vez
que brincastes com Joãozinho em casa dele, deixastes lá a zorra. Correis à casa
dele e, efetivamente, debaixo de um móvel, lá está a vossa zorra.
Apliquemos
agora o conto ao exame de consciência. A primeira coisa que haveis de fazer é
pensar em quanto tempo faz que vos não confessais, como o menino que perdeu a
zorra pensou nos dias que já fazia que ele não a tinha em mão. Depois, como o
menino do conto, pensais nos lugares que frequentastes, e no que ali fizestes.
Sem dúvida vos virão à memória muitas faltas que tereis cometido. Se ainda
duvidardes, recordareis, como o dono da zorra, as pessoas com quem brincastes,
com quem estivestes nesse tempo, e brotará a luz, e vos lembrareis dos vossos
pecados, como o outro se lembrou da zorra perdida. Lembrai-vos bem de que, para
vos examinardes: 1.°, começareis pedindo luzes ao Altíssimo por intercessão da
Virgem; 2.º, recordareis há quanto tempo não vos examinais; 3.°, pensareis nos
lugares que frequentastes; 4.º, recordareis com quem tratastes. Tende presentes
estas quatro coisas.
Também
podeis examinar-vos pelos mandamentos, e para isso poderá servir-vos qualquer
devocionário ou catecismo explicado[1].
Que
diligência se deve pôr no exame? A que se põe num negócio sério. Se ao
encarregado de uma grande fazenda o amo pedisse contas de como ele a
administrava, não poria o administrador muito cuidado em apresentar a seu amo
as contas claras e exatas? Assim haveis vós outros de examinar a vossa
consciência, para apresentardes clara e distinta, aos pés do confessor, a conta
dos vossos pecados. Já vos disse que só é necessário confessar os pecados
mortais, embora se aconselhe que se digam também os veniais. Bastará empregar
neste exame de consciência um quarto de hora, e, se vos confessais a miúdo,
ainda menos tempo; mas fazendo-o com seriedade, pois o negócio da salvação é o
único negócio sério da vida.
[1] Se lhe parecer oportuno, diga-lhes o P. Diretor os pecados mais comuns das crianças em cada mandamento, procurando não ser demasiado explícito no sexto; de maneira que os que conheçam esta matéria o entendam, e os inocentes não percam a sua inocência.