A Igreja e seus mandamentos
por
Monsenhor Henrique Magalhães
Editora Vozes, 1946
MINISTRO
DO SACRAMENTO DA PENITÊNCIA
10
de Julho de 1940
Meditando
seriamente sobre as palavras de Jesus aos Seus apóstolos, relatadas no
Evangelho de São João, concluímos sem o menor esforço que há realmente o poder
de perdoar pecados e o poder de não absolvê-los. Isso depende da disposição do
penitente. Um
caso serve de exemplo, pois é muito comum em nossos dias. Às pessoas casadas
que se confessam de fugir ao dever primordial do matrimônio, a prole — e
declaram não estar dispostas a se emendarem, o confessor é obrigado a negar a
absolvição, não podendo perdoar os pecados de que se acusa o penitente, sem
arrependimento, nem propósito de conversão.
Se
alguém diz: furtei certa quantia, o confessor imediatamente sentenciará:
restitua o que furtou a quem foi lesado — ou parceladamente, ou duma só vez. No
caso de impossibilidade de restituição ao próprio dono, permanece o dever de
restituir de qualquer outra maneira: aos pobres, aos asilos de beneficência. Se
o que lesou se recusa a restituir, o confessor lhe negará o perdão do pecado.
Tudo
isto será impossível sem a prática do Sacramento da Penitência.
Há
os que aceitam a confissão dos pecados, mas repelem a confissão auricular, em
que, secretamente, se faz a própria acusação. Para esses deveria ser adotada a
Confissão pública. E... quem se submeteria a tal processo?!
Eis
aí uma solução a ser considerada ingênua, se não envolvesse a malícia e a
astúcia dos inimigos do 4.° Sacramento.
Quanto
ao Ministro da Penitência, só os sacerdotes, isto é — os bispos e os
presbíteros — podem validamente absolver os fiéis dos seus pecados. É de fé,
segundo o Concílio Tridentino.[1]
Jesus
Cristo não deu esse privilégio a todos quantos O ouviam, mas expressamente o
outorgou aos apóstolos.
Santo
Inácio Mártir prometia a remissão dos pecados aos cristãos, que, para isso, se
dirigissem aos Bispos.[2] — Tertuliano já
se refere ao perdão conferido pelos presbíteros.[3] Seu discípulo
Cipriano escreve: “a satisfação e a remissão feita pelos sacerdotes é agradável
a Deus.”[4]
E
Santo Ambrósio diz explicitamente: “compete aos apóstolos e aos sacerdotes
absolver dos pecados”.[5]
O
notável teólogo Tanquerey ensina: “Nos quatro primeiros séculos da Igreja, o
poder das chaves era exercido exclusivamente pelos Bispos. No quarto século era
concedida a alguns presbíteros, especialmente aos penitenciários, a autoridade
de ouvir confissões e absolver pecados. Do quinto ao oitavo século, esse poder
foi comunicado com mais amplitude. Do século 8.° em diante era dado a todos os
sacerdotes”.[6]
Note-se,
porém, que, para absolver validamente, não basta o poder da ordem; requer-se o
poder da jurisdição, concedido pela autoridade eclesiástica competente.
Por
exemplo: um jovem recebe a ordenação sacerdotal. É padre. Não pode, entretanto,
ouvir um fiel em confissão, não pode validamente absolvê-lo. Para isso é
necessário que seu Superior Eclesiástico, seu Bispo, lhe dê a jurisdição de
confessor.
A
razão é que a Penitência é um sacramento pelo qual, em virtude da absolvição
judicial, são perdoados os pecados. Só se pode exercer uma função judicial
sobre súbditos — daí a necessidade da jurisdição que submete o fiel à
autoridade de determinados sacerdotes.
Vede
o carinho maternal da Igreja, facilitando aos pecadores o meio de se libertarem
dos vínculos que os escravizam aos seus delitos. Compreendam os homens a
grandeza, a beleza desta consoladora doutrina e pratiquem a miúdo a Confissão.