Nota do blogue: Acompanhe esse especial AQUI.
A Mãe segundo a vontade de Deus ou Deveres da Mãe Cristã para com os seus filhos,
do célebre Padre J. Berthier, M.S
Edição de 1927
V- Uma palavra acerca da
agricultura
Seria
agora ocasião de falar das diversas profissões e carreiras que podem abraçar os
jovens. Se excetuarmos algumas que são marcadas de infâmia, e que, por
conseguinte não podem ser escolhidas por uma mãe cristã, todas são úteis para
bem da sociedade, todas têm dado eleitos ao Céu. Abster-nos-emos de tratar das
vantagens e dos perigos, que cada uma delas pode oferecer. Falaremos dum estado
muito desprezado, e todavia estimável, sob tantas relações. Falo da
agricultura, dessa arte que se pode chamar a base da formação dos povos, a
agricultura, de que todos os poetas cantaram os encantos, e que tão honrada foi
por todos os povos, a ponto de ser considerada a honra da virtude. Segundo a
expressão dos nossos livros santos, a agricultura foi criada pelo Altíssimo, e
o próprio Deus nos proíbe de desprezá-la. É porque ela produz a saúde, a
virtude, e a fé, três dos mais preciosos bens.
«A
loja, o armazém, o escritório, o gabinete, são lugares bem tristes,
nauseabundos e doentios!exclama um escritor contemporâneo, e quanto sofrem aí
dentro encerrados esses pobres forçados que a indústria, o comércio, o estudo,
e os negócios aí retêm de manhã até à noite, em que o corpo se tortura e a alma
se aniquila! Mas a oficina do aldeão é a imensidade dos campos! Aí, sob a
benéfica influência dum ar puro e abundante, desenvolvem-se as forças físicas
do lavrador, que é sustentado por alimentos sãos, e fortificado por violentos,
mas salutares labores. Por isso é que, quem quiser encontrar membros vigorosos,
corpos robustos e velhos ainda ágeis e valentes, embora em avançada idade, nada
mais tem do que dar um passeio pelas aldeias, e travar conhecimento com os seus
habitantes.
Com
a saúde, floresce muitas vezes a virtude, no seio da vida campestre. Os penosos
trabalhos da agricultura, fatigando o corpo, reprimem-lhes as revoltas. A
alimentação simples e frugal do lavrador deixa adormentado o fogo das paixões,
que os exemplos perversos do mundo não são capazes de despertar. É também entre
os lavradores que se encontra ainda viva essa fé dos nossos pais, que parece
hoje prestes a extinguir-se. «Se há um fato que não sofre contestação, escreve
Mgr. Plantier, é que as povoações
agrícolas são por toda a parte as mais religiosas. «Noutros estados, não sendo
o homem testemunha, senão das obras do homem, esquece mais facilmente o seu
Criador, cuja ação não lhe é perceptível; e, sentindo-se autor de tudo o que o
rodeia, conta consigo próprio, e julga poder passar sem Deus. Mas o lavrador
está sempre em face das obras maravilhosas do Criador. Todos os dias o Senhor
patenteia a seus olhos os tesouros do Seu poder e da Sua misericórdia, e muitas
vezes também faz estalar a Sua cólera. As flores e os frutos; as neves do
inverno e os fortes calores do estio; o orvalho benfazejo e a saraiva
destruidora, o sol que fecunda e a nuvem negra onde se amontoam as trovoadas,
tudo isto fala de Deus ao lavrador, e lhe faz sentir a sua dependência d’Aquele
de cuja misericórdia ele espera o pão de cada dia, e cuja cólera, caso se
desencadeie, o deixaria sem recursos.
Além
disso o lavrador, na sua aldeia, está muito mais ao abrigo da impiedade, que o
habitante das cidades, porque as publicações antirreligiosas poucas vezes ali
chegam. Por isso venera o sacerdote, respeita a autoridade da Igreja, cujas
leis se presa de cumprir, acata a religião e os seus dogmas.
Que
mais poderemos dizer acerca das consolações da vida dos campos, das doçuras da
família, que só o lavrador sabe gozar? O que dissemos é mais que suficiente
para mostrarmos quanto a agricultura é útil e digna de respeito, pelas grandes
vantagens que prodigaliza — «Ó lavradores! — disse há muitos séculos um poeta,
que felizes seríeis, se soubésseis apreciar todos os bens que a agricultura vos
proporciona!» E, dirigindo-nos às mulheres do campo, diremos: — Nada mais
podeis desejar para vossos filhos que a saúde, a virtude, e a religião, com as doçuras
duma vida simples e pacífica, que a agricultura abundantemente lhes fornece.
Longe, pois, de os desencaminhar, de os desviar duma profissão tão nobre e tão
salutar, fazei-a amar e estimar, mostrando-lhes a sua utilidade e os seus
encantos. Insuflai-lhes gosto para os trabalhos campestres, e para essa vida
laboriosa e rude, que é a guarda da sua inocência. Ensinai-lhes a amarem esse
campo, regado pelo suor dos seus pais, e essa choupana, onde morreram os seus
avós. Inspirai-lhes aversão por essa mania, hoje tão espalhada, de fugirem para
as cidades, embora haja quem lhes aconselhe erradamente a fazerem-no.
Mas
hoje segue-se infelizmente outro caminho. Apenas um rapaz atinge os quinze
anos, mandam-no procurar emprego para a cidade. As raparigas abandonam o seu
tugúrio, para se transformarem em aprendizas de costureira, ou em criadas de
sala de qualquer casa. Ou então amontoam-nas em oficinas, sem se preocuparem do
que elas aí poderão aprender, ou dos exemplos que terão diante dos olhos. Mas—
dizem os pais — aí ganham mais, e com menos trabalho. Pais insensatos, que
assim raciocinais! Não pensais em procurar para vossos filhos senão o bem estar
material, os vestuários à moda, e uma comida mais delicada? A inocência não
vale nada? E a sua salvação eterna? Pois quê! Atirais as vossas filhas para
longe, para um mar tempestuoso, onde provavelmente naufragarão, e, perdida a
virtude, e talvez a fé, consolais-vos com o pensamento da abundância em que
vivem! São esses os vossos sentimentos cristãos?
Mas
essas grandezas, esses sonhos de felicidade dificilmente se realizam, porque,
se na cidade se podem encontrar empregos mais lucrativos, gasta-se também muito
mais, e a saúde altera-se com muito mais facilidade.— «A vida no campo, diz um
escritor, é menos brilhante, mas é mais segura e mais sólida; o dinheiro
colocado na terra, está sempre na mesma; mas na indústria, passa uma borrasca e
leva tudo. Há seis meses um homem era rico, hoje está crivado de dívidas. No
campo, são menores as soldadas, mas podeis trabalhar todos os dias. Além disso,
vem uma perturbação nos negócios, uma exuberância de produtos, e eis milhares
de operários postos na rua. Hoje, nas grandes cidades, está tudo cheio de
desgraçados, de pais de família que vêem agonizar os seus queridos filhos, e
que nos vêem dizer: — «Salvai-me, tende piedade de meus filhos; trabalharei muito
barato; mas antes quero ganhar alguns soldos do que mendigar.» — Eis o que nós
vemos todos os dias, o que nos aflige. Para terminar: Onde se encontra a grande
massa dos pobres? É no campo ou na cidade?»