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Fr. Manuel Sancho,
Exercícios Espirituais para Crianças
1955
PARTE PRIMEIRA
A conversão da vida do pecado à vida da graça
(Vida Purgativa. — 1.ª semana)
b)
Mas Deus não só os criou, como também os conserva atualmente. Vós que me ouvis
e eu que vos falo dependemos de tal maneira de Deus, que, se Ele nos largasse
da Sua mão, nós morreríamos, ou, melhor dizendo, voltaríamos ao nada de onde
saímos. Algum de vós já terá segurado na mão um passarinho: sentíeis que o
coraçãozinho dele palpitava agitado; na vossa mão estava a vida dele, pois só
com apertardes um pouco os dedos o teríeis matado. Pois bem: Deus pode
tirar-nos a vida do mesmo modo. Se o pássaro se voltasse contra aquele que o
segura na mão, que deveria este fazer com ele? Matá-lo, como aos pintos que
abandonaram a galinha. Deus, em cujas mãos está a nossa vida, em vez de
matar-nos quando O ofendemos, espera que nos convertamos, e nos chama como a
galinha chama os seus pintinhos. Como Deus é bom!
Mas
esperai, ainda não se esgotaram as Suas bondades. Se a providência de Deus se
reduzisse somente a não nos tirar a vida, isso já seria um favor muito grande;
mas Ele não só não no-la tira, mas no-la conserva, contribuindo para isso todas
as criaturas, de modo maravilhoso. O ar que nos dá fôlego é criatura de Deus:
sem ar, nós morreríamos asfixiados. E, mesmo se Deus não nos tirasse o ar, mas
nos tirasse o sol, esse grande incubador da vida, nós morreríamos de frio.
Tão
grande e absoluta é a nossa dependência de Deus, que nem um só fôlego do nosso alento
é absolutamente nosso, pois Deus no-lo pode negar, morrendo nós imediatamente.
A nossa saúde, a nossa ciência, o nosso corpo e a nossa alma, tudo quanto somos
e temos é de Deus. Vede se não devemos ser-lhe agradecidos; vede se não devemos
entregar-lhe o nosso coração, o nosso ser, como ao nosso único fim. E, todavia,
há tantos ingratos para com Deus nosso bom pai!
Como
é bonita uma horta cheia de frutas e de hortaliças! Quantas vezes não vos
tereis regalado de gosto contemplando os frutos maduros pendentes das árvores!
Pois tudo isso é dom de Deus, para que vivamos. O que comeis, o que vestis, o
sol, a aura vivificante, a água, as forças todas da natureza, são criaturas que
Deus nos dá para conservarmos a nossa existência. Tudo, tudo é d’EIe. Mas os homens
são tão irracionais, que, vivendo neste mundo que Deus sustenta com a Sua mão,
não se lembram d’Ele, nem mais nem menos como se Ele não passasse de um bom
Senhor que habita lá longe, num rincão da glória... Que ingratos!
Já
não levantastes alguma vez os olhos ao céu numa noite serena? Que belo é ver
essa abóbada azul marchetada de milhões de ponto luminosos! Quanta estrela! Que
esteira de luz tamisada parece a Via Láctea! Tudo aquilo qual poeira luminosa
são milhões de mundos!... Pois tudo isso foi Deus quem fez, como rodinhas e
engrenagens desta grande máquina do Universo, e tudo isso para bem do homem.
Não é verdade que, se há um homem, se há uma criança que não se lembra de
elevar seu coração a Deus, merece andar de quatro patas?
Porquanto
deveis saber que, nos países onde se criam os porcos no mato, vai com eles o
porqueiro ou pastor de porcos, o qual, para saciar a gulodice desses simpáticos
animaizinhos, sobe aos carvalhos e, com uma vara, sacode os ramos, e as bolotas
caem em abundância. Os porcos que estão debaixo comem e grunhem, grunhem e
comem; rangem os dentes ocupados, engolem, arredonda-se-lhes a pança, e nunca
lhes ocorre erguer os olhos para dirigirem um olhar de gratidão a quem lhes
atira as bolotas. Assim são os homens, assim são as crianças que neste mundo
comem e grunhem, grunhem e comem, sem nunca se lembrarem de levantar os olhos
ao céu, sem nunca se lembrarem de dizer: “Graças, meu Deus!”
Pois
bem, meus filhos, por este outro benefício da conservação estais obrigados a
seguir o vosso fim último, e este deve ser outro dos motivos que inclinem o
vosso coração a entregar-se a Deus por completo. Vede que Ele vos criou, vede
que Ele vos conserva com amorosa Providência, vede que Ele vos chama para que O
sirvais.
Se
acaso as vossas más inclinações, exaltadas por tentações diabólicas, vos
incitarem a fazerdes obras más, deveis dizer: “Não, não quero pecar contra
Deus, meu fim último; não quero ser-Lhe ingrato, à semelhança daqueles animais
imundos; não quero andar de quatro patas, não quero ser um porquinho que,
grunhindo e comendo e brincando, me esqueça do meu fim último, que é Deus. Sou
uma criança que Deus pôs neste mundo para servi-lO, e que Ele agora traz a
estes Exercícios para que eu aprenda os meus deveres da boca do Padre Diretor,
que é ministro de Deus”. Oh! meus filhos, que alegria a minha se conseguir isto
de vós!
Continuará...