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Fr. Manuel Sancho,
Exercícios Espirituais para Crianças
1955
PARTE PRIMEIRA
A conversão da vida do pecado à vida da graça
(Vida Purgativa. — 1.ª semana)
3.
— Considerai, meus filhos, outra coisa mui lastimável e muito para ser
recogitada com angústia de nosso coração. Jesus, Deus e homem, infinito,
santíssimo, sem culpa, morre numa cruz entre horríveis tormentos. Por que
morre? Acaso porque o mundo desaba? Acaso porque o obrigam a isso? Não, ninguém
o obriga: Ele morre voluntariamente. Mas então por que morre? Oh! meus filhos,
eu quisera neste momento apoderar-me dos vossos coraçãozinhos para lhes fazer
sentir intensamente esta verdade: Jesus morre por causa do pecado, só por causa
do pecado!
Meu Deus, que mal espantoso é este, quando Vós, o Imortal, o
eternamente feliz, padeces e morres como um facinoroso por nossos pecados!
Chegai-vos ao Calvário, mirai aquele corpo pendente na cruz, de membros
dilacerados, coberto de sangue, de olhar vidrado, de cabelos pegajosos numa
pasta com o sangue, rasgadas as Suas fontes com espinhos...; dolorido todo Ele
e oprimido de mortais angústias...; e, nos estertores da agonia, olhai como Ele
diz com voz trêmula de amor para com os pecadores: “Meu Pai, perdoai-lhes,
porque eles não sabem o que fazem”. Aos pés de Jesus Sua Mãe, a Virgem Maria,
nossa Mãe desde então, sofre a dor mais tremenda que jamais sofreu criatura humana,
porque a morte dolorosíssima de Seu Filho lhe repercute no coração. Meus
filhos, o vosso coração não estremece e não palpita mais depressa em vendo
morrer assim Jesus, em vendo assim penar a Virgem? Ficai sabendo que os vossos
pecados causaram a morte do Filho e as dores da Mãe.
Um
pintor moderno fez um quadro que representa Jesus na cruz. Não estão ao redor
os soldados romanos que O guardam, nem Sua Mãe, nem as outras santas mulheres
com São João em volta da cruz; rodeia Jesus moribundo uma turba de gente atual:
cavalheiros de sobrecasaca, operários de blusão, mulheres do povo e até
crianças. Todos O insultam e mofam d’Ele; fazem-Lhe gestos iracundos... Há até
um menino que apanha no chão uma pedra para Lhe atirar!... São os pecadores de
agora; os insultos são atirar-Lhe pedras; crucificá-lO, são os pecados. Em vez
de Lhe darem água com que aplacar a Sua sede, insultam-nO.
É
horrível este quadro, mas é a verdade: com os vossos pecados crucificais de
novo Jesus. E haveis de crucificá-lo outra vez? Nunca, nunca jamais; acabou-se
o pecar.
Agora
recolhei-vos dentro de vós mesmos, e dizei: “Então eu, com aquele pecado fui
causa da morte de Jesus e das dores de Sua Mãe e minha Mãe? Então, aquele
palavrão, aquele insulto a Deus, aquela raiva, aquele não ouvir missa, aquele
pecado de que me envergonho, foram causa da morte de meu Deus? Sim, meus filhos,
esses pecados foram causa da morte do nosso bom Jesus. Quanto me agradariam
agora umas lágrimas nos vossos olhos! Com que prazer eu vos veria agora,
comovidos, chorar os vossos pecados! Porque não há nada, nem inferno, nem
morte, nem outros males que assim façam ver a malícia do pecado como a morte de
Jesus Cristo. Pensai um pouco nesta passagem do Calvário, e pedi ao bom Jesus,
por intercessão de sua Mãe Dolorosa, que faça nascer em vós a compunção do
coração e o aborrecimento dos vossos pecados.
4. — Agora considerai a malícia dos pecados
pessoais. Muito maus devem eles ser, já que, para castigá-los, Deus prepara o
inferno; já que, para satisfazer por eles, Deus morre na cruz. Considerai a
razão por que haveis pecado. Se pecásseis por um bem extraordinário, por
exemplo pela posse de um reino, ou de toda a ciência dos homens, ainda nesse
caso não deveríeis pecar; contudo, poderíeis invocar uma má desculpa. Mas,
quando pecais, por que é que pecais? Por uma tolice, por uma ninharia, por uma
miséria. E por isso perdeis a Deus? Que loucura!
Vede
aquele menino que, sério, vai pela rua rumo à igreja. Vai cumprir a sua obrigação
de ouvir a missa, porque é domingo. Ao chegar a uma pracinha, topa com um grupo
de amiguinhos que estão jogando, e ele põe os olhos no jogo. Entrementes, o
sino que toca para a missa parece dizer-lhe: “Vem vem, vem vem”. E, na verdade
o diz, pois é isso o que significa o toque do sino quando chama os fiéis à
igreja. O pequeno vacila. A consciência lhe diz: “Não te entretenhas. Olha que
é o último toque”. Ele se resolve a ir à igreja; mas um garoto, um tentador que
naquela ocasião faz de demônio, lhe diz: “Vem, homem, que está faltando um para
completar o jogo”. E, apesar dos gritos da consciência, o menino entrega-se ao
jogo, perde a missa e comete um pecado mortal. Se naquela ocasião ele morresse
sem se arrepender, condenar-se-ia para sempre. Que insigne loucura! Por um
simples jogo ofender a Deus e fazer-se réu de um castigo eterno!
Talvez
algum de vós haja cometido um pecado desse gênero, ou tenha pecado gravemente
contra outro mandamento. Oh, meus filhos! Se cometestes falta grave e ainda não
a confessastes, preparai-vos para fazê-lo, pois é este o primeiro e principal
fim dos Exercícios: livrar-vos do pecado se acaso o haveis cometido, e
precaver-vos dele para o futuro.
Continuará...