“Sêde perfeitos como vosso Pai celeste é perfeito”. Este preceito divino
não foi formulado somente para as almas seletas que, seguindo os conselhos do
Evangelho, deixam as vias ordinárias do mundo para se consagrarem
exclusivamente ao serviço de Deus. Este preceito é obrigatório para todos,
porque nada de imperfeito entrará no céu. Para ascender ao esplendor das
regiões angélicas e viver na imortal companhia dos bem aventurados, é preciso
que a aureola da santidade brilhe na fronte do cristão. Por isso o trabalho da
santificação é sem dúvida o grande e nobre fim da vida cristã sobre a terra.
O Evangelho no-lo ensina, e a própria natureza, nos seus símbolos vivos,
nos revela a lei do aperfeiçoamento. Tudo que nasce na terra se desenvolve,
cresce e se aperfeiçoa. Da semente sai o caule; do caule irrompe a flor; a flor
desabrocha e dá lugar ao fruto; e o fruto por sua vez atravessa diferentes
fases até chegar à sua maturidade. O movimento da vida é um progresso pausado,
mas incessante, que não pára senão quando atinge o seu termo. Assim deve
proceder a alma cristã. Ela passa do mal ao bem, das trevas à claridade. Se já
é boa, é preciso que aspire a tornar-se melhor; e os progressos realizados,
elevando-se de grau a grau, não se contentariam com outros limites senão com os
de uma perfeição toda celeste. Aquele que não sobe, desce; aquele que não
avança, recua – eis o que diz São Bernardo. Não há ponto nenhum de parada na
viagem ascendente para a perfeição evangélica.
O Filho de Deus, que abriu a seus discípulos a verdadeira estrada,
conferiu-lhes também a graça de a saber percorrer. Ele se humanou: nasceu para
nos servir de modelo, foi menino e “cresceu em sabedoria e em idade diante de
Deus e diante dos homens – crescimento misterioso que se reproduz em cada um de
seus discípulos. A alma cristã deve elevar-se no amor e dilatar-se na caridade;
deve progredir na luz e amadurecer na virtude, ao mesmo tempo que avança na
vida. É assim que ela atinge o fim de sua missão na terra.
A mãe, principalmente, deve marchar nesta estrada com o passo firme e
infatigável, lembrando-se de que é cristã; foi regenerada pelo sangue de Jesus
Cristo e, incluída entre os filhos de Deus, aspira também ao Paraíso.
Cumpre-lhe, na qualidade de filho da Igreja, desviar-se das vaidades do século,
às quais tem já implicitamente renunciado por ocasião do batismo, e sobretudo
pela graça a natureza, liga-se intimamente a Jesus Cristo para viver em
conformidade com o espírito do Evangelho. Que estranho desvario é este que nos
leva a preferir o tempo atual à eternidade, a terra ao céu, as coisas do corpo
aos bens incorruptíveis da alma? Escravizar a rainha e fazer reinar a escrava,
diz São Bernardo, é uma monstruosidade. O mundo, com todos os tesouros que
encerra, não poderia pagar o preço de nenhuma alma, pois que, pela nossa, Jesus
Cristo deu a sua. O Filho de Deus, baixando de seu régio assento, veio arrancar
a nossa alma do poder do demônio, quando ela já se achava agrilhoada e
condenada à morte eterna; chorou sobre ela que não sabia chorar; deixou-se
prender para que ela fosse salva; e morreu enfim para lhe dar a vida.
“Reconhece, portanto, ó cristão, a alta dignidade da tua alma (exclama São
Leão) e considera quão profundas foram as suas feridas, pois que, para as
curar, o teu Salvador ficou coberto de chagas! Submete-te, não mais às tiranias
da lei do corpo, mas às prescrições da lei de Deus. Então, gloriosa será a tua
vida quando, purificada do pecado, limpa das suas manchas e liberta de todas as
peias, tua alma se eleva resplandecente até ao trono de Deus.
Essa linguagem é muito mal compreendida por essa espécie de meio-cristianismo
que se introduziu nas sociedades modernas e que paralisa todo o impulso para o
céu. Daí a fraqueza e o acobardamento de tantas almas que não vivem senão à
superfície da Igreja. Estas não progridem nem se aperfeiçoam; conservem-se, até
ao ultimo dia, imóveis no seu ponto de partida. Elas dormem o sono da incúria,
e no dizer da Escritura, “se acharão de mão vazias no grande dia em que
acordarem”.
Evitai o contagio destes exemplos, não somente porque sois cristão, mas também
porque sois mães. Quando Deus vos formou o coração, diz o eloqüente bispo de
Meaux, ai pôs primeiramente a bondade como próprio caráter da natureza divina e
como a marca da mão benfazeja de que saímos. A mãe está identificada com a sua
família; cada um de seus atos, cada um dos seus movimentos, para o bem ou para
o mal, reflete nos seres que vivem em união com ela. Quando ela se eleva,
aproxima a todos de Deus, e quando se abaixa, tudo em torno dela se degrada. À mãe
é que Deus confiou a tutela e a primeira instrução da criança, e o seu olhar é
como o sacramento da primeira graça.
Ela é quem abre nos lábios infantis o primeiro sorriso, no tenro cérebro
o primeiro amor. Duas qualidades, sobretudo lhe são necessárias; e, quando as
possui, ela é capaz de levá-las até ao heroísmo. Estas qualidades são a ternura
e a paciência. O homem excede à mulher pela sua força e pelo seu gênio, mas não
poderia igualar-se a uma mãe nos prodígios daquelas duas virtudes. A mãe cristã
sofre, mas não perde a coragem; chora, mas não se lastima. Acaricia o filho das
suas dores e o cobre de beijos, ainda quando ele é a causa do seu martírio.
Quem imagina que tudo lhe são prazeres na companhia dos filhos, não conhece a
vida de sacrifícios de uma mãe.
As crianças realmente não se parecem em nada com os pequenos heróis de Berquin.
As solicitudes que reclamam, dia e noite, exigem uma paciência maravilhosa
junto a uma ternura inesgotável. Uma mãe no meio dos filhinhos não tem folga
nem descanso: ela escuta com atenção palavras sem nexo, responde sem se enfadar
a perguntas importunas, previne os perigos, exorta com meiguice, repreende com
indulgencia e banha enfim estas débeis plantas de doçura e carinhos, fazendo-as
desabrochar como botões de rosa ao sol da primavera. Seria preciso que a mãe
cristã fosse buscar meios de santidade fora da esfera de sua atividade? Ela tem
diante dos olhos, nas suas mãos e em seu coração, objetos e instrumentos
capazes de a aperfeiçoarem. Vossos filhos são santuários que se destinam a ser
os templos vivos de Deus. Sois vós, ó mães, que haveis de responder pela
integridade e pelo augusto destino desses templos, confiados à vossa guarda e
vigilância e onde deveis fazer reinar a santidade.
Assim como Moisés teve de construir o tabernáculo conforme ao modelo que Deus
lhe havia mostrado sobre a montanha, assim também os vossos filhos, objetos de
tão piedosas solicitudes, se devem formar à imagem de vossas mães. De tudo isto
resulta que mãe cristã é obrigada a se tornar perfeita para poder aperfeiçoar
os filhos que Deus lhe deu; e é obrigada a se tornar santa para os poder
santificar. Só assim resplandece ela no seio da sua família como o arco-íris
entre as nuvens luminosas.