sábado, 25 de maio de 2013

Amor da Pátria - Primeira parte


Nota do blogue: Acompanhar esse Especial AQUI.
Cônego Júlio Antônio dos Santos
O Crucifixo, meu livro de estudos - 1950

            1. — Um quadro célebre. O Crucifixo de Wertz. Jesus pregado na Cruz e aos pés de Jesus Crucificado está estendido um soldado agonizante segurando com mão firme a sua querida bandeira.
            2. Jesus, cantando o Seu consumatum est, inclina a cabeça e diz a esse soldado que o amor ali prendia, canta tu também o teu consumatum est, porque também tu venceste e morres pelos teus irmãos.

I. — Pátria de Jesus

            O Filho de Deus fazendo-Se homem, tirou à descendência de Abraão o sangue das Suas veias, pediu à família dos Reis de Judá a mãe que o devia conceber, e o pai que o devia proteger na infância; pediu ao solo da Judeia o Seu berço; às leis e às tradições de Moisés a direção da Sua vida; ao Templo, o santuário da Sua oração, aos filhos de Galiléia os Seus Apóstolos, e ao mundo inteiro os seus ouvintes. Realizou-se o que havia sido predito: O Senhor, vosso Deus, fará nascer no meio de vós um profeta, da vossa roça, vosso irmão e vosso concidadão». (Deut.).

II. — Amor de Jesus pela sua Pátria

            Jesus, vindo ao mundo, passa a Sua vida fazendo bem. Escolhe sobretudo para campo da Sua ação benéfica a Sua Pátria. Ele mesmo anuncia que «não vem senão para as ovelhas perdidas do reino de Israel».
            Efetivamente, consagra todo o tempo da Sua vida terrena a distribuir, à custa de todos os sacrifícios, todos os bens de ordem espiritual e material aos Seus compatriotas.
            Por fim é necessário que «um homem morra para que a nação não pereça.» E Jesus derrama o Seu sangue até à última gota, em primeiro lugar pela Pátria.
            Não se pode dar maior prova de amor do que dar a vida por aquele que se ama. Não há a negá-lo. O amor da Pátria tinha um lugar espaçoso no Coração de Jesus. 
           
Amor da Pátria

            Que é a Pátria?
            A Pátria é a terra que nossos pais nos legaram; é esta gleba riscada à ponta de lança e firmada à força de fé por ínclitos avós que a legaram inteira e sagrada ao gozo de seus netos; é um patrimônio de virtudes morais, de tesouros literários e científicos que recebemos de nossos maiores e que devemos transmitir, enriquecido, às gerações futuras. A Pátria é o passado, o presente e o futuro do mesmo povo. É uma fonte de riquezas e de alegrias.
            O amor da Pátria é exigido sobretudo pelo seu solo, pela sua história, pelos seus monumentos e pelos seus benefícios.

            1 — A terra portuguesa
            A terra portuguesa é bela, é fértil e santa.

            1.º É bela. — O que constitui a sua beleza são as suas montanhas com os seus cumes, aquém e além, coroados de diademas de neve; são os seus campos, verdadeiros paraísos de verdura; os rios que correm e os ribeiros que cantam; é o Atlântico com as suas praias brancas e as suas ondas espumantes. « Portugal é um jardim à beira-mar plantado.»
          2.º É fértil. — Há no solo de Portugal os vastíssimos figueirais do Algarve, as amplas herdades do Alentejo, as verdejantes campinas da Estremadura, as melancólicas colinas da Beira, os preciosos vinhos do Douro, as altas terras de Trás-os-Montes, as pitorescas e ubérrimas veigas do Minho. Que imenso reservatório de riquezas é a terra-pátria!
         3.º É santa. — A sua santidade firma-se em três pedras angulares, e abraça a vida, a morte e a imortalidade. Vai desde a pedra quente e vivificante do lar até à pedra ungida e santificante do altar; desde a pedra do altar até à pedra fria e orvalhada de lágrimas do túmulo, até tocar definitivamente nas regiões serenas da imortalidade, na pátria do Céu.
            A causa do amor da Pátria — está na paternidade — pertencemos à Pátria pelas raízes paternas. Amamos a Pátria, diz alguém, porque vimos aí um sorriso nunca mais visto, e bebemos aí um afeto nunca olvidado — o afeto e o sorriso de nossas mães.
            — «A fé viva dos nossos pais reverentes aos mesmos altares e genuflexos ao mesmo Deus», é o que prezamos de mais precioso e mais belo.
            — Se a terra-pátria, por mais modesta que seja, vale para nós o universo é porque «encerra uns ossos a que nos prende a alma, e entesoura umas cinzas que nos cristalizam a memória, os ossos e as cinzas de nossos pais».
            — «O túmulo assemelha-se a um altar, as lágrimas que aí se vertem, as preces que aí ciciam, as flores que aí rescendem não se dirigem a uma vulgaríssima poeira, dirigem-se e elevam-se à Pátria celeste, até ao trono de Deus Clementíssimo que dá às almas o descanso eterno e a luz do perpétuo esplendor».

            2. — A História de Portugal
            A História arquiva a condensação de todos os esplendores. Esplendores militares, glórias intelectuais e artísticas e glórias sociais. «Fomos videntes como os Egípcios, mareantes como os Fenícios, inspirados como os Gregos, e conquistadores como os Romanos».
            «O povo português nasceu do seio da crença, embalou-se nos braços da crença, cresceu, lidou e triunfou pelas mãos da crença. Fez-se guerreiro e cruzado, navegante e missionário, desdobrou uma envergadura imensa e, em um vôo audacioso e rápido, foi levar a ciência do Evangelho aos términos do mundo! do mundo cujos
            campos ara;
            E, se mais mundos houvera, lá chegara.

            «A nossa história! tão grande é ela que nenhum povo a tem maior, nenhum; tal, que ninguém a tem melhor, ninguém. Foi burilada com o ferro das lanças, brasonada com o emblema da cruz e asselada com o sangue dos mártires.» «E tudo isto se orquestra, e tudo isto se afina, e tudo isto se entoa num poema cíclico, num órgão altissonante, num saltério imortal — os Lusíadas.»

            3. — Monumentos nacionais
            Portugal é um museu ao ar livre. Basta mencionar a sua trilogia monumental. Batalha, Alcobaça e Jerônimos, cada uma destas Basí­licas eterniza uma vitória da Pátria, uma vitória da fé e uma vitória da arte.
            Portugal é a terra dos três amores que encantam e cativam o coração humano: beleza, riqueza e glória. Por isso é esta

Ditosa Pátria, minha amada.

            4. — Benefícios da Pátria
            Como não amar a Pátria? Nós devemos lhe serviços e benefícios sem os quais não podemos passar.
         1. ° Coloca ao nosso serviço uma organização militar, que guarda e defende a integridade do território, o patrimônio de cada um de nós; uma organização militar que nos livra das invasões e revoluções, dos inimigos de fora e de dentro, — por consequência, devemos-lhe o benefício da paz no exterior e no interior.
              2. ° Coloca ao nosso serviço uma organização judiciária que nos protege contra as nossas próprias fraquezas, contra as nossas próprias tentações e, ao mesmo tempo, contra as fraquezas e tentações dos nossos concidadãos; que nos retém a nós e ao nosso próximo no caminho da justiça, da honestidade, do pudor, do respeito de nós mesmos e dos outros.
            Os magistrados não são menos úteis que os soldados. É a Pátria que confia a uns a manutenção da lei e a outros o uso da força.
            A Pátria bem organizada tem necessidade da magistratura para que as leis sejam aplicadas a todos igualmente, e para que os excessos de todos sejam reprimidos equitativamente.
            O direito civil moderno proclama o grande princípio da igualdade de todos perante a lei, tanto a lei que protege como a lei que pune. Este princípio vem diretamente do Evangelho, não existia no direito pagão nem no direito bárbaro. Todos os homens são irmãos, iguais perante Deus, diante de Jesus Cristo, Juiz dos vivos e dos mortos que dará a cada um segundo as suas obras.
          A aplicação e a prática deste princípio cristão é obra da magistratura. Armados com as leis, os magistrados previnem o mal quanto podem. E, se o não puderem prevenir, os magistrados reprimem e punem o mal desde que apareça no seio da vida nacional. Por mal entende-se tudo o que fere exteriormente a santidade da religião, a honestidade dos costumes, a justiça e a ordem pública,
            Inspirada e guiada pela razão, consciência e fé, a magistratura exerce a sua ação com os olhos fixos no Crucifixo; porque este é certamente a maior potência do mundo para a manter independente, imparcial e inacessível à corrupção.
            O Crucifixo no tribunal é a base do juramento, o apoio da inocência e do arrependimento, a garantia da justiça, porque, depois dos homens fazerem justiça, é Deus que julgará ainda as justiças dos homens.
            Por ele a voz humana tem mais eco, a púrpura mais esplendor e as audiências revestem a majestade do templo.
            A Cruz tem sido e será sempre o símbolo imortal da verdade, do direito e da justiça.
          Eis protegida, sem fraqueza como sem injus­tiça, a fortuna, a honra, a liberdade e a vida dos cidadãos.
            3. ° Põe ao nosso serviço uma organização intelectual que promove a vulgarização da instrução e o desenvolvimento das Ciências, Letras e Artes.
            4. ° Põe ao nosso serviço uma organização econômica que nos permite tirar dos nossos campos, das nossas minas, dos nossos rios, dos nossos mares, maior proveito e riqueza; faz frutificar os nossos esforços e os nossos trabalhos;—uma organização econômica que estimula e dirige a nossa agricultura, comércio e indústria, que põe, ao nosso serviço, os correios, telégrafos, caminhos de ferro, estradas, portos, marinha mercante,
            5. ° Põe ao nosso serviço uma organização eclesiástica que tem «o maior de todos os poderes — o poder da consciência; e o melhor de todos os impérios — o império das almas».
            «Assim como existe a falange dos soldados para servir e defender a Pátria, a falange dos lavradores para amanhar e cultivar a ferra, a falange dos industriais para domar e transformar a matéria, igualmente arde haver a falange dos sacerdotes para polir os espíritos, para cultivar e fecundar as virtudes, para exterminar os males e assegurar todos os bens, de maneira que o homem seja feliz tanto quanto se pode ser feliz na Pátria da terra e sobretudo na Pátria do Céu. Exército glorioso! que maneja uma arma sempre invencível — a arma do Evangelho, e que arvora uma bandeira sempre triunfante — a bandeira da Cruz, para dignificar a vida do homem, da família e da sociedade. Porque, diga-se peremptoriamente: O homem sem crença é a sombra de um homem, e um povo sem crença é o cadáver de um povo. Toda a civilização que anula a idéia de Deus é falsa; toda a civilização que não atinge a idéia de Deus é baixa; e toda a civilização que não se repassa da idéia de Deus é fria e vã. O valor máximo de uma civilização perfeita é Deus melhor conhecido, amado e adorado dos homens.»
            O clero português, instruído e culto, bondoso e afável, irrepreensível e santo, ativo e dedicado, cumpre fielmente a missão sublime de dar Deus às almas e as almas a Deus.
            Há duas maneiras práticas de amar a pátria: respeitá-la e servi-la.

(continuará...)