A Igreja e seus mandamentos
por
Monsenhor Henrique Magalhães
Editora Vozes, 1946
CENSURA E PROIBIÇÃO DE LIVROS
6 de Dezembro de 1940
Vamos
estudar hoje um assunto interessante: a proibição da leitura de certos livros.
Duas coisas temos a considerar: a censura dos livros e a proibição dos mesmos.[1]
A
Igreja tem o direito de exigir que seus fiéis, antes de publicarem certos
livros, apresentem-nos à legítima autoridade, para o devido exame, sendo
aprovados se nada contiverem contra o ensino da Igreja, e reprovados no caso
contrário. A razão é que a Igreja tem o dever de afastar seus filhos de todos
os perigos relativos à fé e aos costumes.
O
divino Mestre disse a Pedro: “apascenta as minhas ovelhas, apascenta os meus
cordeiros” (Jo 21, 16-17). Ora, quem não vê nestas palavras, implicitamente, a
ordem de velar pelo bem desse rebanho, pelo qual o Bom Pastor deu a própria vida?...
— Livros maus são erva daninha, venenosa, que produz toda sorte de males morais
e até a morte da alma. Nada mais próprio para corromper a fé moral do que as
más leituras.
Devem
ser apresentados à censura eclesiástica, antes de se imprimirem, os livros que
versam sobre a Sagrada Escritura, Teologia, História Eclesiástica, Direito Canônico,
Teologia Natural, e todas as disciplinas morais e religiosas. E ainda os que
tratam de piedade, ascética e mística. Em suma todos os escritos que
especialmente tratem de religião ou da honestidade dos costumes. Os clérigos
seculares ou regulares não podem publicar livro algum, nem colaborar em jornais
ou revistas, sem licença de seu legítimo Superior. Estão sujeitas à censura
também as imagens que se deverem imprimir, com ou sem orações, listas ou
catálogos de indulgências e livros litúrgicos.
Os
católicos têm um meio seguro de conhecer o que devem aceitar ou repelir, nesta
matéria: examinem a oração, o livro, o impresso; tem o “imprimatur” da
autoridade eclesiástica? — Serve. Não tem? — Não serve. Nada mais simples.
O
mal, porém, é que cada católico, ou católica, quer ser bispo ou papa... e vai
dando a sua sentença, às vezes até contra a sentença expressa da própria
Igreja! Isto é indisciplina, é legítima e detestável anarquia. Podemos concluir
desde já do nenhum valor de certos impressos que andam por aí, prometendo
coisas ou fazendo ameaças, cadeias de orações, orações a determinado Santo, com
a obrigação, para quem recebe pelo correio tais impressos ou folhas
datilografadas, de passar adiante a um grupo de pessoas. Quem se prestar a essa
ridícula manobra de gente supersticiosa ou desocupada, receberá uma graça; e
quem resistir à intimação terá em troca de sua rebeldia um severo castigo; e
vem o exemplo do que aconteceu em Jerusalém e nem sei mais onde...— A nossa
gente é uma das mais supersticiosas do mundo; a mais cheia de crendices, de
infantilidades, de preconceitos, de abusões. O maior fator dessas fraquezas
espirituais é a profunda ignorância religiosa que lavra em todas as camadas
sociais.
Quanto
à Bíblia Sagrada, as edições católicas têm invariavelmente a aprovação
eclesiástica, logo nas primeiras páginas. Corre mundo uma edição protestante da
Bíblia, em cuja primeira página se lê: tradução do Padre Antônio Maria Pereira
de Figueiredo, publicada sob os auspícios do Cardeal Patriarca de Lisboa. —
Procurai a aprovação... não a encontrareis. Mais: Na Bíblia verdadeira
traduzida pelo Padre Antônio Pereira de Figueiredo, depois do livro de
Malaquias, seguem-se os dois livros dos Macabeus. Nessa tal edição sem
aprovação, os dois livros dos Macabeus são suprimidos! Uma de duas: ou a
tradução de Pereira é autêntica e então os protestantes devem publicá-la na
íntegra, ou é uma tradução adulterada, e então não deve figurar na primeira
página: tradução do Padre Antônio Pereira de Figueiredo. Pois tal expressão não
corresponde à verdade.
Passemos
à proibição dos livros pela autoridade da Igreja. — O fiel não pode ler, nem
conservar consigo, nem comprar, nem vender livros proibidos, havendo um só
caminho a seguir por quem possui tais livros: inutilizá-los, queimando-os, por
exemplo...
A
Santa Sé e o Concílio Ecumênico proibem livros para o mundo inteiro. O Bispo e
o Concílio particular proíbem o livro para a própria região.
São
proibidos, independentemente de qualquer declaração especial, todos os livros
que atacam a Religião católica, todos os livros que desenvolvem ou expõem
doutrinas heréticas, condenadas pela Igreja, pois são poderosos meios de
divulgação do erro. Livros protestantes, espíritas, teosofistas, ocultistas,
maçons, etc. — Também são por si mesmos condenados esses livros imorais,
obscenos, literatura depravada, ou, melhor, lixo de literatura, que corrompe os
costumes, excita ao vício, dá origem a toda sorte de indignidades. — É uma das graves
obrigações da polícia de costumes expurgar livrarias e bibliotecas públicas de
toda essa imundície que envenena as massas e desvia do bom caminho a mocidade.
O índex
é o catálogo dos livros proibidos por serem considerados, pela Santa Sé, maus
ou perigosos à fé e aos costumes e que os fiéis não podem ler, sem a devida
autorização. Esse catálogo foi primeiramente confeccionado por ordem do Santo Padre
Paulo IV, em 1558. No Concílio de Trento, em 1564 o Sumo Pontífice Pio IV
reeditou e melhorou o índex. Sucessivamente os Papas Clemente VIII, Alexandre
VII e Benedito XIV fizeram a revisão desse famoso e indispensável catálogo.
Leão XIII modernizou e refundiu o índex, publicando-o muito mais perfeito em
1900. A lista negra da literatura universal vai sendo aumentada
ininterruptamente com novos exemplares...
Com
o seu poder e o seu dever indeclinável de precaver os fiéis contra as más
leituras, a Igreja pode proibir a leitura de determinados jornais, revistas, ou
quaisquer publicações danosas à fé e aos costumes. É o que tínhamos a examinar
a respeito da censura e proibição dos livros, que se costuma mencionar como o
sexto preceito da Igreja.
1) Ver o Código de Direito Canônico, Título XXVIII —
“De praevia censura librorum eorunque prohibitione”.