A
paz! Eis ai a primeira e a última palavra do Evangelho! Os
anjos a cantam em redor do berço de Belém: “Paz aos homens de boa vontade!” E o
próprio Cristo, ao deixar a terra para subir ao céu, diz aos Apóstolos: Que a
paz seja convosco: “Pax vobis!” Assim a paz é o dom evangélico que abre e
encerra a serie de graças proporcionadas ao homem. É o doce fruto da santidade,
mas é também a condição de seu amadurecimento.
Todo
o progresso da alma não é mais do que uma dilatação gradual na paz de Deus. Consideremos,
todavia, que ela pressupõe lutas e vitórias. É por isso que Jesus Cristo, o
“Príncipe da Paz”, nos declara que ele veio trazer a espada ao mundo. Enquanto
há inimigos a combater, o repouso completo não é possível.
“A paz – diz a Escritura Sagrada – não é concedida senão aos vencedores”; isto
é, àqueles que superam o mal, triunfam de si mesmos e removem os obstáculos que
se opõe ao reino de Deus. “Não há paz para os ímpios”, acrescenta o Livro
Santo.
Como
de fato, poderiam gozar as delícias da harmonia e da paz os que violam a lei
divina e se põem em contradição com a Vontade soberana que dirige o universo? A
paz, este sopro do céu que sai das páginas do Evangelho, se oferece com
liberalidade às almas retas; mas deve mui particularmente ser procurada pelas
mães cristãs. Se o coração da mãe não é um foco de paz, tudo que a
rodeia é mal estar e confusão. Os membros da família necessitam achar juntos ao
coração materno a calma, a tranqüilidade de espírito e a serenidade que as
ocupações da vida comumente perturbam nos homens do mundo. E é um triste e
desgraçado obstáculo ao desenvolvimento do espírito de família e à perfeita
educação dos filhos, achar-se uma mãe perpetuamente inquieta, preocupada e
aflita. Contudo, isto é infelizmente, muito comum nos tempos que correm.
Múltiplas
causas atuam no seio das famílias para destruir o desejado sossego doméstico. A
mãe que intimamente não possui a paz, como a poderá dar aos outro? Demais,
a alma não é susceptível de nenhuma consolação religiosa, se não conservar
disposições verdadeiramente pacíficas. A ausência destas
disposições é a principal causa das distrações durante a oração, da indiferença
nas leituras religiosas e da ineficácia da Santa Missa. Deus não se manifesta
no meio das agitações: “non in commotione”, diz a Escritura. A sua voz não se
faz ouvir senão no regaço da paz, porque ele não fala senão aos que o
escutam e não verte a sua graça senão na alma recolhida para receber e
corresponder a esse dom.
Por vezes dizeis que Deus não vos fala nunca. É um erro. Deus vos fala sim; vós
é que o não ouvis porque, em vossas orações, só vós quereis falar, julgando
perdido o tempo em que o não fazeis e não vos concentrais seriamente para
receber do alto as inspirações que vos enchem de coragem, de confiança,
paciência e bondade. A linguagem de Deus é diferente da nossa.
Deus
toca delicadamente as fibras da alma, inunda o espírito de luz, excita a nossa
vontade, inclina para o bem o nosso coração e interiormente nos instrui com uma
suave unção. Para discernir a voz divina é indispensável a calma, o silêncio,
um brando recolhimento e certa disposição moral que muitas vezes nos falta. As
Santas inspirações, tão desejáveis ao ministério maternal, não são jamais
recusadas à prece, mas nós é que poucas vezes estamos em estado de distinguir o
doce clarão que luz nas trevas. Isto é prejudicial não menos à
própria mãe do que à família e à casa que se acham sob a sua responsabilidade. Carregada
de apreensões e no desassossego do seu espírito, ela muitas vezes confunde o
capricho com o dever; cai alternadamente em excesso de severidade ou de
indulgência; as repreensões e as admoestações se multiplicam a esmo e fatigam
os filhos; toleram-se grandes abusos, enquanto pequenas faltas não encontram
desculpas e tantas palavras e esforços desordenados ficam sem efeito. Às vezes
nem se atende à idade e à condição particular de cada filho, e continua-se a
tratar um filho já crescido como se ainda estivesse em tenra infância.
As
impaciências mal contidas, enfim, destroem os bons frutos, que com os recursos
moderados de um espírito calmo e pacífico se poderiam colher.
Estes
defeitos provêm de uma solicitude impetuosa e contraria aos preceitos divinos. Se
a mãe de família está sempre fora da sua esfera, o fogo do seu lar se apaga.
Ao
verem-na constantemente entregue às preocupações extravagantes que a
atormentam, os seus, ao princípio, a lastimam e depois a fogem. O esposo não se
resolve facilmente a suportar para sempre tal suplício e vai procurar em outra
parte, se não a paz, ao menos diversões que o façam esquecer a sua desgraça; e
os filhos, por sua vez, apressam-se em seguir o exemplo do pai, sem embargo do
amor que à sua mãe consagrem.
Como,
ao contrário, descansariam todos sob o olhar tranqüilo de uma mãe feliz! O só
aspecto de uma alma simples e cândida e, em geral, a vista de tudo que está em
paz, basta para apaziguar o coração do homem, mesmo o mais violento.
Mães
cristãs, pedi a paz, “pedi o que vos pode trazer a paz”! É dom de Deus por
excelência. A vossa missão, como a dos anjos, é serdes mensageiras da paz. Vós
sereis o conforto dos que se acham preocupados com os negócios do mundo, se, ao
voltarem dos seus labores, os receberdes com um ar satisfeito e tranqüilo; e
eles assim se fixarão no lar onde encontram ao mesmo tempo a doçura e a força
da paz evangélica.
Ninguém
seguramente põe em dúvida estas vantagens; mas pergunta-se como se pode
adquirir ou conservar a paz. A resposta está no Evangelho: “Pax hominibus bonae
voluntatis!” A paz é dada “aos homens de boa vontade”.
Ora,
boa vontade pressupõe uma boa consciência, sem o que não há senão confusão e
trevas. Se, pois, tendes sofrido alguns choques na consciência, recorrei à
misericórdia de Jesus Cristo na Santa confissão, que veio a terra, não para vos
condenar, mas para vos perdoar, purificar e absolver. “Ide em paz – diz-vos Ele
pela boca de seus ministros – e não pequeis mais de ora avante”; palavra de
vida esta, que o vosso Salvador vos repete todas as vezes que vos dispondes a
ouvi-lo. Um sacramento vos restitui a paz; um outro sacramento a
alimenta e a faz crescer em vós. Acalma-vos a penitencia e a comunhão vos
fortifica.
Então, com todas as suas forças, a
alma cristã se levanta e firme se encaminha para a perfeição; as suas relações
com Deus, como com o próximo, se tornam fáceis e agradáveis; a confiança se
desenvolve; e ela, aprendendo a unir-se a Deus, gozará nesta concórdia intima e
santa uma paz imperturbável, que sobrepuja vitoriosamente qualquer outro
sentimento em contrário.