sábado, 25 de maio de 2013

Amor da Pátria - Final

Nota do blogue: Acompanhar esse Especial AQUI.
Cônego Júlio Antônio dos Santos
O Crucifixo, meu livro de estudos - 1950

1. — Respeito
           
             Numa sociedade tudo vai bem ou mal conforme o poder é ou não respeitado.
            Quando o poder não é respeitado, a Pátria cai na anarquia, isto é, na insolência contra a autoridade decaída e sem prestígio, em desordens e vinganças de uns contra os outros.
            Quando, ao contrário, o poder é respeitado, tudo vai bem.
            O respeito pelo poder é, pois, uma das condições essenciais da paz e prosperidade da Pátria.
            Os cidadãos devem respeitar o poder porque todo o poder vem de Deus.
           Deus é o supremo Senhor de todas as coisas e por isso é quem tem direito a mandar em nós. Ora Deus exerce o seu domínio sobre nós por meio dos Seus representantes.

            Com que direito um homem pode mandar noutro homem senão como representante de Deus? O barro, diz Bossuet, não tem direito a mandar no barro. Todos os homens são iguais por natureza. Fora das relações de autoridade e subordinação, resultantes da fraternidade e filiação, nenhum homem possui, em virtude da sua natureza, o direito de mandar nos outros, ainda que fosse o mais sábio, o mais hábil e virtuoso dos homens.
            Os cidadãos devem respeitar o poder porque todo o poder vem de Deus. Se, na sociedade, os cidadãos escolhessem um homem a quem confiassem, com uma parte da sua autoridade os seus interesses, o poder exercido por esse homem seria a soma total das concessões, seria uma delegação da multidão e, por isso, Deus não teria nada com isto. Então eu, por exemplo, veria à minha frente, um encarregado de negócios e não um chefe, um superior com direito a mandar em mim.
            Se os nossos chefes fossem apenas nossos empregados, com muita dificuldade conquistariam o nosso respeito.
          O poder separado de Deus, laicizado não infunde respeito. Avilta-se e degrada-se então a autoridade.
              Todo o poder vem de Deus e reside em Deus.
            Os cidadãos devem respeitar o poder, quaisquer que sejam os seus representantes. Qualquer que seja o homem, novo ou velho, sábio ou ignorante, virtuoso ou mau, ou que empunhe o cetro por hereditariedade, eleição ou conquista, pouco importa. É meu superior legítimo? Deus entregou-lhe o direito de mandar em mim? Se ele tem este direito, eu inclino-me, com toda a submissão e reverência, diante desta criação divina, que se chama o poder, como se fosse diante de Deus.
            Os cidadãos devem respeitar o poder, quaisquer que sejam as suas faltas. A indignidade do superior não suprime a santidade do poder e o direito que ele tem ao respeito. Há o dever de respeitar a autoridade legitimamente constituída.
            Respeitando o poder podemos discutir as suas ordens e os seus atos. O poder não está isento de erros e de faltas; e os cidadãos, que lhe devem respeito, têm o direito de adverti-lo, ajudá-lo na prosperidade crescente da Pátria. Os cidadãos, de concerto com o poder, são a salvação nacional.
            Lembrem-se, porém, os católicos de que se a lei é opressiva dos seus direitos e da sua pessoa, espoliadora dos seus bens, podem tolerá-la, sem esquecer que têm duas coisas a fazer: Combatê-la tanto quanto possível até ser revogada, ou protestar contra ela, se não se puder fazer mais nada. E se a lei não é somente injusta e opressiva, mas imoral e irreligiosa, se manda o que é mal ou impede um bem a que a consciência obriga, então a resistência não é somente um direito, mas um dever, visto que a lei humana é contrária à lei divina; «está primeiro obedecer a Deus do que aos homens».
            Os cidadãos devem respeitar o poder, qualquer que seja a sua forma. Todo o homem designado ou pelo direito de herança, ou pelo direito de eleição, ou pelo direito de conquista, possui, em virtude desta designação a investidura divina que lhe dá o direito de governar, dirigir e conduzir o barco da governação pública. Nada importa a forma regular do poder, porque a sua forma, que é humana, não altera a sua essência que é divina.

2. — Serviço

            Há quatro espécies de serviços que devemos à nossa Pátria: o serviço tributário, o serviço militar, o serviço cívico e o serviço cristão.

            1.— O serviço tributário

            O serviço da Pátria exige em primeiro lugar o tributo ou imposto do dinheiro. — Bossuet define admiravelmente este imposto dizendo que «não é outra coisa senão uma pequena parcela dos seus bens que se paga ao chefe do Estado para lhe dar meios de salvar o resto».
            Necessidade deste imposto. — Um povo tem necessidades públicas que se devem remediar sob pena de arruinar e perder os particulares. Uma Pátria precisa que a segurança nacional seja protegida pelas armas, que a justiça seja administrada por funcionários e magistrados, que a agricultura, o comércio e a indústria sejam desenvolvidos, que as letras, ciências, artes, moral e religião sejam favorecidas. Para isto é preciso dinheiro. Precisa que a ordem reine no interior, que a bandeira flutue respeitada, na fronteira, que a prosperidade do país irradie no estrangeiro. Ora isto não se pode fazer sem dinheiro.
            Sem dinheiro não se podem manter o exér­cito e a armada, exigir tribunais, construir templos, escolas e universidades, civilizar as colônias para engrandecerem e enriquecerem a metrópole. Onde é que a Pátria pode ir buscar o dinheiro senão à bolsa daqueles que compõem a coletividade social? A Pátria tem direito a exigir o imposto de dinheiro e os cidadãos o dever de o pagar.
            Jesus Cristo, pela Sua palavra e pelo Seu exemplo, ensina-nos que devemos cumprir esse dever.
          Os fariseus estavam convencidos de que não devia pagar o tributo a César, sob pretexto de que o povo de Deus não devia pagar o tributo a um príncipe infiel. Consultam Jesus Cristo. E este disse-lhes: Deixai-me cá ver essa moeda de quem é a imagem e a inscrição gravada nela? De César, responderam eles. «Pois bem dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus». Não vos deveis servir do pretexto da religião para não pagar o tributo. Deus tem Seus direitos separados dos do príncipe. Obedecei a César. A moeda de que vos servis comércio é de César, e ele é soberano; deve reconhecer a sua soberania pagando o tributo que ele impõe. Jesus dá o exemplo no cumprimento deste dever.
            Todo o Judeu, rico ou pobre, devia pagar o imposto dois dracmas. Um dia um dos coletores de impostos perguntou a São Pedro «O vosso Mestre não paga o nosso imposto?» paga, respondeu friamente São Pedro. Jesus tinha ouvido tudo. Então se aproximando de São Pedro pergunta-lhe: — Que te parece Simão; de quem é que os reis da terra recebem o tributo ou o censo? Dos filhos ou dos estranhos? Dos estranhos, respondeu Pedro. Assim, observa Jesus, os filhos estão isentos disso. Todavia, para não escandalizar esta gente que dirá que eu quero pôr-me acima das leis ou ter privilégios, e, também, para que o meu exemplo não seja invocado pelos meus para se desembaraçarem das obrigações religiosas ou sociais, desce para o lago e lança o anzol, e ao primeiro peixe, que tu tirares, abre-lhe a boca e encontrarás lá uma moeda, toma-a e dá a por mim e por ti. (Mat. XV11, 24, 27). São Paulo fala como o seu Mestre. «Dai aos príncipes o que deveis; o imposto a quem é devido o imposto».

            2. — Serviço militar

            O serviço da Pátria exige um segundo imposto, o imposto do sangue ou da dedicação.

          1.º Imposto do sangue. — «Quando uma nação é lesada nos seus direitos, diz Mgr. Gibier, e não pode obter por meios pacíficos as reparações que lhe são devidas, é obrigada a recorrer à força. Sim, quando vê ultrajar o seu representante, insultar a sua bandeira, violar as suas fronteiras, ela obriga a pegar em armas para sua defesa e a ir para os campos de batalha, e aí derramar o sangue até à última gota, se necessário for. Aprendamos a lição de heroísmo dada pelo divino Mestre: «Não temais aqueles que podem tirar a vida do corpo, temei antes aqueles que podem matar a alma e lançá-la no inferno».
            Para nosso brio nacional convém notar que não há nunca necessidade de exortar o soldado português a dar a vida pela sua Pátria. Ele não é avarento da sua vida, dá-a generosa e heroicamente e daria mesmo mil vidas pela sua Pátria. E esta, reconhecida, eterniza a sua gratidão para com

Aqueles que por obras valorosas
Se vão da lei da morte libertando.
           
            A avareza que é preciso combater, é a avareza daqueles que recusam dar o mais precioso dos bens: a vida. Muitos não querem filho: ou não querem senão um pequeno número de filhos. Esses têm a maldição de Deus e da Pátria; são os seus coveiros. As sepultura; da Pátria não estão nos campos de batalha nem nos cemitérios, estão nos berços. Uma nação arruína-se e perde-se não por aqueles que morrem, mas por aqueles que não nascem.
            Uma nação só pode viver e desenvolver-se desde que as famílias se proponham a dar-lhe cidadãos. Cada uma das famílias assim constituída é um baluarte da Pátria. Eis o cântico do lar verdadeiramente cristão e patriótico:

— Filhinhos?... É Deus que faz
A conta de cada lar...
Criá-los?... Quem faz a conta
Também nos há-de ajudar.

         A Pátria não tem recompensa condigna para os pais e mães que não contam os filhos, só Deus os pode recompensar devidamente.
          2.º Imposto de dedicação. — O imposto do sangue pode ser substituído por sacrifícios equivalentes, por serviços permanentes prestados à nação em certas profissões e carreiras importantes e necessárias.
        Atrás do soldado que faz face ao inimigo, diz ainda Mgr. Gibier, é útil e necessário que haja o operário que lhe assegure munições; o agricultor nos campos que lhe prepare o pão; o professor e o sacerdote que velem pelos seus filhos, instruindo-os e educando-os.
         Aqui convém notar que o imposto do sangue o clero o paga, à sua maneira, mais larga­mente que qualquer outra corporação social.
          Quando os flagelos devastam as cidades e as aldeias de Portugal, os sacerdotes não são os primeiros a comparecer para prestar socorros espirituais e corporais? No tempo de guerra, o sacerdote não aparece nos campos de batalha, como capelão, servita, enfermeiro, curando chagas, enxugando lágrimas, ajudando na grande batalha da conquista da pátria do Céu e recebendo a última vontade daqueles que expiram? De que valeria pôr-lhe uma arma na mão? Como o médico e farmacêutico, tem outras coisas a fazer.
          De que valeria arrancar o seu sangue de um só golpe se ele mesmo o derrama gota a gota, quer pelas necessidades do exército no horror do combate, quer pelas necessidades das almas, no trabalho constante da paróquia, no interior do país, ou das missões nas colônias — dilatando a Fé e o Império.
         A fé serve de alavanca a todas as conquistas, a todas as descobertas e a todas as glórias portuguesas.
        A sua vida é urdida de sacrifícios. E se, vendo-o extenuado, lhe dissermos com ar de compaixão: Ai! o senhor padre esgota-se; ele responde destemidamente: O padre que não se esgota para que serve?!
        Bendita organização! «Por toda a parte se rasteia o talento dos seus doutores, o esforço dos seus apóstolos, o fervor dos seus heróis, o zelo dos seus santos e o sangue dos seus mártires».

            3. — Serviço cívico

            Depois do serviço militar todo o cidadão deve à sua Pátria o serviço cívico. Este é o concurso ativo que o cidadão é obrigado a prestar ao governo do seu país para a manutenção da paz, para a expansão da influência nacional, para a salvaguarda das liberdades. Não é um dever facultativo que se pode omitir sem grande dano; é uma obrigação rigorosa cujo abandono conduz, mais cedo ou mais tarde, a agitações profundas.
            O eleitor. — O cidadão tem o dever de sufrágio ou do voto. É uma obrigação moral votar e votar bem.
            O cidadão, como eleitor, deve conhecer os seus deveres. Vejamos algumas regras gerais a seguir:
            1. ° Pôr o bem comum acima do interesse próprio ou de um partido;
            2. ° Pôr o interesse moral acima do interesse material;
            3. ° Pôr a lei de Deus acima da lei dos homens.
            Enfim, acima de tudo está a recomendação do Divino Mestre: «Procurai primeiro o reino de Deus e a sua justiça e tudo o mais vos será dado por acréscimo». A abstenção do cumprimento deste dever, por indiferença, negligência, pusilanimidade, é uma falta grave diante de Deus e diante dos homens. Muitos raciocinam deste modo: Eu não sou senão uma pequena gota de água; em que é que o Oceano tem necessidade de mim? O Oceano responder-vos-á que não é composto senão de gotas. É necessário o sufrágio individual de cada um para formar o sufrágio coletivo.
            Assim a nossa palavra tem peso nos negócios públicos, a nossa influência é real e benéfica.
            Convém notar que tanto o bem como o mal não se faz senão pela associação de forças.
          O eleitor. — O dever que obriga a dar o voto como eleitor, obriga a não recusar o mandato, qualquer que ele seja, que é oferecido como elegível e conferido como eleito. Aceitá-lo, é contribuir para o triunfo da verdade e da justiça, e recusá-lo é dar livre curso à mentira e iniquidade. O eleito deve cumprir as funções inerentes ao seu cargo, com «dedicação, zelo e acendrado patriotismo».

            4. — Serviço cristão

            Devemos servir a Pátria pela prática pessoal do dever cristão.

          1.º Bom exemplo. — Um dos melhores meios de servir a Pátria e de fazer com que os outros a sirvam, é servir a Deus cumprindo a sua Lei.
            Mercê de uma revolução estamos num Estado Novo. O Estado é Novo mas os homens, em grande maioria, continuam a ser velhos. Merecem a exortação do Apóstolo das gentes: «despojai-vos do homem velho e revesti-vos do homem novo». Há ainda uma revolução a fazer: a conversão e perfeição de cada um de nós.
            É um absurdo que o todo seja bom, sendo más as suas partes componentes. E um erro fundamental do espírito moderno, dizia um ilustre professor, fundar a cidade de Deus sobre os sete pecados capitais. Tenhamos uma vida honesta, virtuosa, como convém a homens e a cristãos, a bem da nação.
            2.º Oração. — Não basta dar à Pátria o nosso dinheiro, o nosso sangue, a nossa dedicação e bom exemplo; é preciso oferecer-lhe as nossas orações para lhe assegurar a assistência divina. Deus é o Autor, Senhor e Conservador das Nações. É Ele, diz Mgr. Gibier, que fere e que cura, que perde e ressuscita, que conduz as nações às portas da morte ou às alturas da vida e da prosperidade. Sem Deus não construímos senão sobre ruínas; os direitos não têm base, os deveres não têm sansão, os sacrifícios não têm proveito, as revoluções não têm freio e as catástrofes não têm remédio. Só Deus é que pode fazer com que um povo subsista, de pé, no meio das causas de des­truição que o ameaçam de dentro e de fora.
            Como no mar de Tiberíades, Jesus está no meio de nós, como amigo e protetor.
        Ao grito da nossa fé, Ele despertará e haverá sempre grande calma: «Calma da verdade reconquistada, da virtude restaurada, da ordem pública assegurada, do reino de Deus estabelecido nas almas, da vitória, enfim, sobre os inimigos de Deus e da Pátria».
            Portugal, como nação, tem orado sempre a pedir todas as bênçãos de ordem temporal e espiritual.
            E Portugal tem sido bafejado, acalentado e abençoado por Deus, como canta o poeta:

Esta grande nação que n'Ele cria
Em todos os perigos protegia

            Cultivemos a virtude do patriotismo. Não do patriotismo pagão que tem ensanguentado o mundo, mas do patriotismo cristão, que enche de bênçãos a vida e a história dos povos, amando-nos uns aos outros.
            — Jesus, Rei Divino, reinai em Portugal que em Vós confia.
            — Jesus, Rei do Amor, por Maria Imaculada, salvai Portugal que em Vós confia.