(Jesus Cristo falando ao coração do Sacerdote, ou meditações eclesiásticas para todos os dias do mês, escritas em italiano pelo Missionário e doutor Bartholomeu do Monte traduzidas pelo Pe. Francisco José Duarte de Macedo, ano de 1910)
I. — Filho, vejo-te ocioso; e é assim que cumpres com teus deveres? Com o sacerdócio te destinei, não à ociosidade, mas ao estudo, a obras de zelo pela salvação das almas, ao serviço da Religião. Não te declarou o Bispo na ordenação que devias oferecer, abençoar, presidir, pregar, ministrar? que devias coadjuvá-lo, como os setenta e dois discípulos aos Apóstolos; e aplicar-te inteiramente a obras de misericórdia?
A isto mesmo te obrigaste ao receber
as vestes sacerdotais; e julgarás cumprir com tais deveres, vivendo na
ociosidade? Não sabes que virei quando menos pensares, e pedir-te-ei contas,
com todo o rigor, do tempo que te dei?
Tu mesmo, se tiveras um servo que,
ainda que te não roubasse nem injuriasse, não cumprisse com os deveres incumbidos,
não o poderias sofrer. Como pois julgas que, só porque não matas, não furtas,
não te embriagas, eu te hei de sofrer, ainda que nada faças daquilo a que é
obrigado um Sacerdote? Acaso a omissão dos deveres do
próprio estado não será criminosa? não merecerá uma condenação? [I]
II. — Considera, filho, que podes
enriquecer-te de merecimentos na Minha presença, ganhar a veneração e os
aplausos dos homens, ser de muito proveito à Igreja e à tua religião, se empregas o tempo como deves; pelo contrário, se vives ocioso,
distraído, descuidado, como fazes, vê a quantas tentações, a quantos pecados te
sujeitas! Quem, mais que os
ociosos, se entrega a conversações, a jogos, á intemperança? Quem mais
murmurador, mais mexeriqueiro, mais desonesto, mais escandaloso que os ociosos?
[II]
Estes desonram o sacerdócio, e dão
aos mundanos ocasião de dizerem todos os dias que há Sacerdotes de mais, que
são membros inúteis e até nocivos à sociedade!
Ócio cruel! Abrasa-se a casa de teu
Pai celeste; é espezinhada a Minha lei; são, devorados pelo lobo infernal tens
irmãos; e tu assistes a este espetáculo, e não te moves?! e dizes que não sabes
que fazer?!
Custam-Me todo o Meu sangue, e
precipitam-se no inferno; e tu não queres estender-lhes a mão, nem ainda mover
a língua para detê-los?! Ó danos imensos do ócio!...
III. — Dirás que te falta tempo? Mas
quão liberal fui em t’o conceder! Separei-te dos negócios do mundo e dos cuida
dos profanos, para que te não impedissem de ser todo Meu. Faltam-te acaso obras em que te
empregues? Mas, além da oração, do estudo, da leitura espiritual, do serviço na
Igreja, não há tantos pobres que socorrer, tantos enfermos e encarcerados que
visitar, tantos ignorantes que instruir, tantos pecadores que converter?
Dirás que te faltam meios e capacidade:
mas tu recebeste bens da tua casa e da Igreja; e tantos Sacerdotes mais pobres,
mais rudes e menos eruditos que tu, mas que me amam, trabalham e colhem, em
proporção do seu talento, muitíssimo fruto para si e para o próximo.
Acaso te desculparás dizendo que
outros fazem o mesmo; que dizem Missa, rezam o Breviário, e nada mais? Ah
infeliz! No momento da morte conhecerás quanto os Meus benefícios e o Meu
sacerdócio te obrigavam a procurar a salvação das almas!
Se souberas que estava próxima a
morte, esperá-la-ias sossegado com esta desculpa? Se, para seres julgado réu,
basta só o não teres negociado com o talento [III]; quanto mais,
se o tiveres dissipado? quanto mais se, ao peso de tantos pecados teus,
acresces o da ruína de tantas almas?
Confessarás então a necessidade, a
utilidade, a facilidade de fugir ao maldito ócio; mas já será tarde. Chegada a
noite da morte, já não podes trabalhar; e, já que não quiseste fatigar-te com
os homens, irás sofrer com os demônios horrorosas penas por toda a eternidade.
Fruto. — Além da Missa com a devida preparação
e ação de graças, e do Ofício divino, distribuído pelas horas do dia, determina
tempo próprio para a meditação, para a leitura espiritual, para o exame, para a
prática de obras de piedade e de caridade, para o estudo, para incumbências
pessoais; e faze que o demônio te ache sempre ocupado em coisas próprias de um
Sacerdote, nunca e coisas inúteis[IV]; e muito menos nas perigosas e proibidas.
Notas:
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[I] Ii enim in quos nulla cadit reprehensio quod aliquid mali habeant, aliquid autem boni praeter -miserunt, cum iis qui mala fecerunt abducentur in ignem gehennae. Nam bonum non fecisse hoc est fecisse malum. (Chrysost., Hom. 16.)
[II] Multam enim malitiam docuit otiositas. (Eccl., XXXIII, 29.) Haec fuit iniquitas Sodomae: saturitas et otium, et fecit abominationes. (Ezech., XVI, 49.) Otium est pars vitii, vel potius occasio, et prava radix, (Chrysol., loc. cit.)
[III] Vides quomodo non solum rapaces, nec soli malefactores, verum etiam et qui bona facere negligit, extremo cruciatur supplicio? Quæ cogitantes, quibuscumque possumus proximos adjuvemus.Talenta enim hic pro eo quod unusquisque facere potest accipimus, sive auctoritate protegere, sive pecuniis adjuvare, sive doctrina admonere, sive alia quapiam re proximis prodesse queas. (Chrysost.,Hom. 79.)
[IV] Quicumque non agit fideliter et feventer quodcumque agit, et non agit ut Deo serviatur, ille otiatur. Pro vitando antem otio, otiosa sectari ridiculum est. (Bern., De vita sol., c.8)