I. — Filho, só a Mim deves temer; só
deves esperar em Mim, que Sou teu Deus, por ti solenemente escolhido para tua
porção e tua herança.
De que te servirá pores tua
confiança nas riquezas, na força, nos protetores; lisonjeares-te de virtude ou
capacidade propriamente tua, se é maldito quem confia no homem, e será sempre
humilhado quem se glória da própria virtude?[1]
Se não despes a humana presunção,
jamais serás assistido da Minha virtude divina. Espera em Mim, e queixa-te
depois se, buscando-Me de todo o coração, te faltar alguma coisa[2].
II. — Não esmoreças, amado filho,
não desanimes; Eu não quero que esperes sem temer por ti; mas não quero também
que temas sem esperares em Mim [3].
Tens sobeja razão do temor,
atendendo aos teus pecados, até porque são mais graves que os dos seculares;
mas não te prometi eu o perdão de todos eles? Não dei à Minha Igreja poder para
te absolver de tudo? Não cheguei eu a jurar que não quero a morte do pecador,
mas sim que se converta e viva?
Tu ensinas ao Meu povo estas
verdades, e como te esqueces tu mesmo delas? Não só te perdoarei, mas estou
pronto a fazer-te um santo. Olha um Pedro e um Paulo; eram pecadores; não
obstante os fiz grandes santos, e os primeiros príncipes da Igreja, para que
conheças qual é o Meu coração para com os pecadores.
Eia, filho, não te desanimem as tribulações,
nem as tentações, nem a tua fragilidade, nem o peso de tuas obrigações; acaso
negar-te-ei o meu auxílio, se for sincera tua vontade? Olha para estas chagas,
e vê a grandeza do amor que te tenho.
Se, na hóstia que todos os dias
ofereces, nos Sacramentos que administras, nos ministérios que exerces, te dei
as Minhas graças, o Meu sangue, a Mim todo, para bem dos mais miseráveis; serás
tu excluído destes benefícios? Se
te escolhi para o Sacerdócio, e te impus graves deveres; negar-te-ei os
auxílios necessários para fielmente os cumprires? Se comecei a Minha obra,
porque a não hei de concluir, se tu cooperares? Confia em Mim, e serei contigo.
III. — Lembra-te que és Meu filho, e
filho herdeiro da Minha glória; se quiseres padecer comigo, todas as penas
desta vida são nada em comparação do prêmio da outra: e tu julgarás que é
demasiado o pouco ou nada que fazes?
Quanto não padeceram para ganhar o
Céu tantos Sacerdotes, ainda, talvez, mais fracos que tu? Mas, fortalecidos com
a esperança daquele prêmio imenso e eterno, julgaram ligeiríssimos e
momentâneos todos os seus trabalhos e padecimentos[4].
Quanto não tive de padecer eu mesmo,
para entrar na Minha glória? Padecerás tu tanto como Eu padeci?
Que não sofrem os mundanos, e que
não terás tu mesmo sofrido por bens mentirosos e caducos? só pelas coisas do
Céu serás negligente e insofrido?
Preparei-te no Céu uma coroa mais
rica, dei-te, para a conseguires, meios mais copiosos que aos seculares, e
serás menos solicito que eles?
O tempo é breve: empenha-te em
acumular merecimentos: próxima está a Minha vinda, e será pronta a Minha
recompensa, que distribuirei a cada um, segundo as suas obras.
Fruto. — S. Bernardo dizia: Que
deviam ser admitidos ao sacerdócio somente aqueles que tivessem estudo e
prática da oração, e que em qualquer empresa confiassem mais na oração, que na
própria ciência e trabalho. Foge das ocasiões que te lisonjeiam,
do mundo e dos divertimentos profanos. Deus mandou a Seus Anjos que te assistam
em teus caminhos; mas não em teus precipícios.
Talvez a disciplina eclesiástica te
pareça pesada e austera; mas sabes por quê? porque tens muito apego ao mundo, e
amas o viver licencioso dos seculares. Lembra-te que és Sacerdote, e que não
és deste mundo. Pensa a miúdo nos grandes bens do Céu; e desprezarás, como vil
lodo, todas as coisas da terra.
Notas:
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[1] Non derelinquis... Domine... præsumentes de te ; et præsumentes de se, et de sua virtute gloriantes, humilias. (Judith., VI, 15.)
[2] Respicite,
filii, nationes hominum, et scitote quia nullus speravit in Domino, et confusus
est. Quis enim speravit in mandatis ejus, derelictus est? aut quis invocavit
eum, et despexit illum? (Eccl., II, 11-12.)
[3] Metuendum est, ne te occidat spes, et cum multum speras de misericórdia, incidas in judicium; metuendum est rursus, ne te occidat desperatio, et cum putas jam tibi non ignosci quæ gravia commisisti, non agas pœnitentiam, etc. (August., In. Joan. Tr. 33.)
[4] Ludibria; et verbera experti, insuper et vincula, et carceres: lapidati suut;
secti sunt, tentati sunt, in occisione gladii mortui sunt; circumierunt
egentes, angustiati, afflicti,... non suscipientes redemptionem, ut meliorem
invenirent resurrectionem. Aspiciebant
enim in remunerationem. (Hoebr., XI, 35-37.)