Indigna escrava do Crucificado e da SS. Virgem,
Letícia de Paula
(Jesus Cristo falando ao coração do Sacerdote, ou meditações eclesiásticas para todos os dias do mês, escritas em italiano pelo Missionário e doutor Bartholomeu do Monte traduzidas pelo Pe. Francisco José Duarte de Macedo, ano de 1910)
I.
Filho, sabes que qual for a vida, tal há de ser a morte. Eu mesmo te disse nas
Escrituras, que a morte dos bons é preciosa.
Quantos sacerdotes no momento da morte
exclamaram, transbordando de alegria: Ah! Nunca julguei que fosse tão suave o
morrer! Ditoso morrer depois de muitos trabalhos sofridos pela salvação das
almas!
Pelo contrário te disse, que a morte dos
maus será péssima. Quantos sacerdotes, tendo vivido no pecado, na ociosidade,
ou tendo abusado dos talentos que tinham recebido, morreram, amaldiçoando a
hora em que nasceram, e o tempo em que aprenderam a ler e a escrever!
Desejas, filho, a morte dos justos. Mas
como terás morte de justo, se a vida é de pecador? Porque não dás crédito às Minhas
ameaças e protestos, à tua experiência, a teus mesmos olhos, que tem
presenciado as consolações dos justos e a consternação dos pecados naquela
hora?
Tu, filho, ensinas e pregas aos outros
estas mesmas verdades; haverá pois para ti outro Evangelho, outra Lei, outra
Escritura? Porque vives uma vida que conheces e confessas te não pode dar
conforto nem confiança na hora da morte?
II.
– Morre bem, filho, não quem começa bem, mas quem persevera até o fim. Para
morrer bem, é necessário o especial dom da Minha graça final.[1]
Tu esperas este dom; mas lembra-te que
Judas, chamado por Mim ao Apostolado, começou bem e acabou mal. Lembra-te que
são mui poucos os sacerdotes que vivem como devem, e por isso mesmo mui poucos
os que morrem como desejam; lembra-te também que muitos sacerdotes, ainda que
santos, naquela tremenda hora temeram e tremeram de morrer mal.
Eia pois, toma uma firme resolução; e,
com temor e tremor santo, opera tua salvação por meio de trabalhos, vigílias,
esmolas, orações, sacrifícios, jejuns e castidade.[2]
Sou eu mesmo que te aviso para teu bem.
Se viveres sem fervor e sem temor, e diferires tua emenda, de certo deverei
ver-te apesar do Meu amor, eternamente perdido.
Há já muito tempo que te espero: acaba
com esses desejos que nunca executas. Sê firme e constante no bem; por que a
morte, para colher-te, não esperará aquele ano ou aquele dia em que estejas em
graça e fervor: ela há de vir quando menos o pensares[3].
III.
– Hás de morrer, filho, uma só vez: e se dessa morreres mal, ai de ti! A tua
ruína é suma, é irreparável, é eterna.
Eu morri na cruz, para que tu pudesses
ter uma boa morte. Podia mandar-te morte improvisa, e colher-te em pecado, como
a outros muitos; mas não o fiz, esperando, como bom pai, que te voltasses para Mim.
Outra vez te admoesto: está preparado,
porque não sabes o dia nem a hora. És excessivamente cruel para contigo, e
ingrato para Comigo, se diferes um momento a tua conversão.
Considera bem, filho, que o perdão que
hoje te ofereço e prometo, está seguro, se hoje te arrependes e te convertes de
todo o coração; mas para o dia de amanhã nem Eu te prometo, nem tu podes contar
com ele.
Reconhece quanto Sou solícito pelo teu
bem, até em te deixar incerta a hora da morte; para que, ignorando-a, estejas
sempre preparado[4].
Fruto.
– Salda tuas contas com Deus e com o próximo.
Faze o teu testamento, diz Santo
Agostinho, enquanto tens saúde, enquanto és senhor das tuas faculdades. A alma à
Deus, o corpo à terra, e os bens da fortuna a quem pertencem.
Considera bem agora qual desejarias que
tivesse sido, na hora da tua morte, o teu procedimento para com Deus, para com
o próximo e para contigo mesmo; e faze já o que então desejarás ter feito. Não
morre de morte improvisa quem sempre está preparado, e sempre pensa que há de
morrer.
O Beato Gregório Barbarigo, tendo
recebido com extraordinária devoção os santos sacramentos, considerando nos
juízos de Deus, onde em breve havia de comparecer, se encheu de tal espanto e
horror, que levantava a miúdo as mãos e os olhos ao Céu, e com voz lamentosa
repetia: Que será? Que será? E assim sofreu por algum tempo esta forte
agitação, pelo temor do rigoroso juízo, até que à tempestade sucedeu a bonança.
E que será de ti...?
[1]
De
perseverantiae munere, de quo scriptum est: Qui perseveraverit usque in finem,
hic salvus erit: quod quidem haberi non potest, nisi ab eo, qui potens est, eum
qui stat, statuere, ut perseveranter stet; et eum qui cadit, restituere: nemo
sibi certi aliquid absoluta certitudine polliceatur: tamestsi in Dei auxilio
firmissimam spem reponere omnes debent. (Concil, Trid., IV, 13.)
[2] Veruntamen
qui se existimant stare, videant, ne cadant; et cum timore, et tremore salutem
suam operentur in laboribus, in vigiliis, in eleemosynis, in orationibus, et
oblationibus, in jejuniis, et castitate. Formidare enim debent, scientis quod
in spem gloriae, et nondum in gloriam renati sumus de pugna, quae superset, …
(Ibidem.)
[3] ...Qua
hora non putatis...veniet. (LUC., XII, 40.) Sicut in diebus Noe et in diebus
Loth, errant edentes et bibentes, emebant et vendebant, plantabant… et non
cognoverunt,… ita erit adventus Filii Hominis. (MATH., XXIV,
37-39.)
[4] Horam voro
ultimam Dominus noster ideirco voluit nobis esse incognitam, ut semper possit
esse suspecta ut dum illam pravidere non possumus, ad illam sine intermissione
praeparemur. (S.GREG., Hom, 13.)