Monsenhor Francisco Pascucci, 1935, Doutrina Cristã,
tradução por Padre Armando Guerrazzi, 2.ª Edição, biblioteca Anchieta.
Art.
III. - O qual foi concebido do Espírito Santo, nasceu de Maria Virgem.
A
Encarnação
26. - O Filho de Deus, para Se fazer
homem assumiu um corpo e uma alma, como temos nós no seio puríssimo de Maria Virgem,
por obra do Espírito Santo: corpo perfeito, mas sujeito às misérias humanas
(fome, sede, cansaço, etc.), para se assemelhar em tudo aos irmãos, na frase de
São Paulo; e alma dotada de todas as faculdades humanas em grau sublime, isto
é, inteligência e vontade livre e impecável.
Duas naturezas há, pois, em Jesus Cristo:
a humana e a divina, numa só divina pessoa: a pessoa do Verbo;
duas vontades, uma divina e outra
humana, como fora confirmado pelas palavras pronunciadas no horto: "Padre,
se é do teu agrado, aparta de mim este cálice: contudo, não se faça a minha
vontade, e sim a tua", (Luc., XXVII, 42); onde, enquanto se fala numa
vontade minha, isto é, humana de Jesus Cristo, fala-se depois numa tua vontade,
isto é, divina do Padre, a qual deve ser também a de Jesus Cristo, Filho de
Deus, e uma coisa só com o Padre.
As operações de Jesus, mesmo humanas,
como procedem da única pessoa do Verbo, têm todas valor infinito.
Maria
Virgem: - prerrogativas. - S. José
27. - O Filho de Jesus foi concebido por
obra do Espírito Santo no seio puríssimo da Virgem Maria, escolhida para a missão
de Mãe de Deus, e, consequentemente, enriquecida de especiais privilégios ou prerrogativas,
que são:
1.º- Imaculada
Conceição, que importa numa redenção preventiva, enquanto Ela, pelos méritos
do Seu divino Filho, foi à única entre os filhos de Adão, preservada do pecado
original! É dogma de fé, definido por Pio, em 1854.
2.º - A Maternidade divina. Maria é verdadeira Mãe de Deus, porque Mãe de
Jesus Cristo, que, assumindo a carne no seio da Virgem, d’Ela nasceu, verdadeiro
homem e verdadeiro Deus, na unidade da pessoa divina; do mesmo modo como nós
dizemos mãe da nossa pessoa à que nos deu à luz, embora a alma nos seja criada
por Deus. Dogma de fé também este, definido contra Nestório no Concilio de Éfeso
em 431.
3.º - A Virgindade perpétua, porque uniu as glórias da virgindade aos júbilos
da maternidade divina. Dogma de fé, definido pelo V Concilio geral, em 533.
4.º - Cheia de graça, como Lhe foi anunciado pelo Anjo.
5.º - Assunção ao céu em alma e corpo. Não é ainda dogma de fé, mas
universalmente professado pela Igreja.[1]
Como homem, Jesus não tem pai: São José,
esposo castíssimo de Maria, foi-Lhe o pai nutrício, putativo, isto é, criado
pelos homens como verdadeiro pai, enquanto era só um guarda, escolhido por Deus
para tal ofício, que fielmente executou, salvando a Jesus das mãos de Herodes,
criando-o e procurando-lhe o necessário à vida, à educação, etc.
Anunciação.
- Nascimento. - Infância
28. - Pelo Arcanjo Gabriel, enviado por
Deus a Nazaré, soube Maria, esposa de José, da estirpe de David, que devia ser
a Mãe de Deus. Como Ela a isto dera o Seu assentimento, cumpria-se desse modo o
mistério da Encarnação.
Indo com José a Belém, para o censo
ordenado pelo Imperador Augusto a todo o mundo romano - num presépio, aonde se
acolheram por falta de estalagens, Maria deu á luz o Salvador do orbe, envolvendo-O
em pobres panos, e reclinou-O a uma rude manjedoura de animais. O nascimento fora
primeiro anunciado pelos Anjos aos pastores; depois, com a aparição de uma
estreita, aos Magos, que vieram do Oriente, para adorá-lO. Em obediência à lei,
oito dias depois do nascimento, o menino Jesus foi circuncidado, e, no quadragésimo
dia, apresentado no templo, onde se cumpriu o rito da purificação de Maria Santíssima.
Perseguido pelo rei Herodes, que O queria matar, teve de fugir para o Egito com
Maria Santíssima e São José, donde voltou depois da morte de Herodes, monarca.
Encerrou-se destarte o período da infância de Jesus e principia Sua vida
privada até à idade de trinta anos.
Vida
privada
29. - Transcorreu Jesus Sua vida privada
na pequena cidade de Nazaré, da Galiléia, no silêncio e no recolhimento. Filho
de Deus, vindo ao mundo para ensinar aos homens, quis primeiro dar o exemplo de
toda virtude.
O santo Evangelho nos refere da vida de
Jesus em Nazaré:
1.º- que Jesus era obediente a José e a
Maria, Sua Mãe;
2.º- que era de todos reputado o filho
do carpinteiro, porque teria ajudado a Seu pai putativo no exercício dos seus misteres,
com que sustentava a si e à sua família;
3.º- que Ele crescia em idade, sabedoria
e graça diante de Deus e dos homens, isto é, enquanto efetivamente crescia em idade;
manifestava gradualmente no exterior Sua sabedoria e suas obras eram cada vez
mais aceitáveis e gratas ao Senhor;
4.º - que indo, aos doze anos de idade,
com Seus parentes ao templo de Jerusalém para a festa de Páscoa, ali ficou pelo
espaço de três dias, sem que os parentes soubessem onde estava, - e conseguiu
maravilhar os doutores pela sabedoria de Suas perguntas e respostas.
Vida
pública
30. - Aos trinta anos de idade, mais ou
menos, Jesus começou a vida pública, que Lhe durou três anos.
Deixando o tranquilo remanso de Nazaré, veio
às margens do Jordão, e ao precursor João Batista pediu o batismo de penitência.
Retirou-Se daí para o deserto, onde permaneceu quarenta dias, para Se preparar
com o jejum e com a oração ao grande ministério que ia empreender. No fim de
quarenta dias, permitiu ao demônio se Lhe aproximasse e quis sofrer, para instrução
nossa, uma tríplice tentação. Mal saiu do deserto, iniciou a pregação evangélica.
A doutrina que ensinava era alta e sublime,
exposta as mais das vezes de modo mui simples, por meio de semelhanças e
parábolas, colhendo argumento de tudo quanto caía sob os olhos dos ouvintes, de
maneira que pudessem mais facilmente compreendê-lO. Acompanhava depois e
confirmava a Sua doutrina com milagres.
[1] Nota
do blogue: Na época em que o livro foi escrito o dogma da Assunção de Nossa
Senhora ao céu de corpo e alma ainda não havia se dado. O Papa Pio XII, na Constituição
Apostólica Munificentissimus Deus definiu tal
dogma no ano de 1950.