segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Amor de Deus - 2.ª Parte (Qualidades do amor de Deus)

Nota do blogue: Acompanhar esse Especial AQUI.

 Cônego Júlio Antônio dos Santos
O Crucifixo, meu livro de estudos - 1950

1 - Qualidade do amor de Deus

O amor para com Deus deve ter as seguintes qualidades:

Þ    Amor afetivo
Isto é, deve manifestar-se por sentimentos afetuosos e por atos de amor de complacência regozijando-nos de Deus ser Deus; amor de benevolência, desejando que seja conhecido, amado e servido; amor de reconhecimento pelos Seus benefícios, sobretudo quando nos aproximamos dos sacramentos da Penitência e da Eucaristia.

1.º Deus exige os afetos do nosso coração. - “Amarás o Senhor teu Deus, de todo o teu coração”. Quando Deus resolveu criar o homem convidou os anjos a tomar parte nesta grande obra, como ministros encarregados de Lhe preparar e apresentar a matéria; mas, quando chegou ao coração, despediu os anjos e quisera só Ele trabalhar para que ele, o homem, fosse unicamente obra das Suas mãos. E porquê? Para que não fossemos obrigados a repartir o afeto do nosso coração com outras criaturas ainda mesmo com os anjos, como sucederia se tivessem tomado parte na nossa formação. Não é, pois, para admirar que Ele e só Ele o exija; Ele mesmo diz: meu filho, dá-me o teu coração.

2.° Jesus Cristo exige os afetos do nosso coração. - Podemos ter esta convicção de que, mais do que nunca, na nossa época, Jesus exige de nós o concurso do coração. Às revelações recentes do Sagrado Coração de Jesus não têm outro sentido nem outro fim. "Mostra o Seu coração expelindo chamas e, entretanto, diz: Eis o coração que tanto tem amado os homens e que, em troca, não tem recebido senão indiferença, ingratidão e desprezo; ao menos tu ama-Me." Estas palavras são um convite a sairmos da indiferença, insensibilidade que, já nos tempos da Sua vida mortal, tanto amargurou o Seu coração. Censurou os Apóstolos, diz o Evangelho pelas "suas hesitações na fé e dureza de Coração".
Devemos pois, corresponder ao amor misericordioso com amor de reconhecimento.

3.° O Cristianismo exige os afetos do nosso coração porque é uma religião cheia de encantos e uma religião de amor - O Cristianismo apresenta-se com encantos variadíssimos. - Seus dogmas, sua moral, seu culto, suas promessas e suas ameaças provocam a ação do coração. É, sobretudo, nos exercícios de piedade, onde o coração se deve manifestar; porque, por eles, há entre Deus e as almas um verdadeiro contato com todas as emoções do coração e efusões de amor. Assim toda a oração exprime afetos. Ela não seria senão uma mentira se estes afetos não estivessem no coração. Todo o sacramento exige disposições que não seriam sinceras, se o coração não fosse delas impregnado; enfim, todo o contato com Deus é, de sua natureza, próprio para causar regozijo e, por isso, deve, logicamente, corresponder-lhe uma ternura do coração humano. Não se compreenderiam os exercícios de religião e de piedade, em que tudo é ordenado para dilatar o coração, se este ficasse fechado e recusasse abrir-se.
O Cristianismo é essencialmente uma religião de amor.- O Cristianismo é mais uma religião do coração do que uma religião da inteligência.
Nos dois testamentos o primeiro e o segundo preceito da Lei são preceitos de amor. "Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu espírito e todo o teu coração e com todas as tuas forças. Este é o maior e o primeiro mandamento. E o segundo é semelhante a este: Amarás o teu próximo como a ti mesmo." (Mat. XXII,17-19).
O Discípulo Amado, que melhor penetrou nos sentimentos do coração de Jesus, resume toda a crença cristã no amor de Deus por nós. "E nós conhecemos e cremos na caridade que Deus tem por nós. Deus é a caridade e quem permanece na caridade permanece com Deus e Deus nele." (Jo. IV, 16).
Lemos a vida dos santos; apesar da diferença de caráter e mesmo de espiritualidade que os distingue, há um traço pelo qual se assemelham: - O amor de Deus de que estão cheios os seus corações. Todos têm posto o seu coração ao serviço da sua piedade.

4. ° A vida cristã exige os afetos do coração. - A vida cristã exige os afetos do coração humano porque este tem um grande poder de integrar os fiéis nas práticas religiosas. A experiência atesta-o. O coração tem uma grande preponderância no governo dos homens: obedecem-lhe mais habitual e docilmente do que à razão e à consciência. Podemos ter quase a certeza de que as idéias, as resoluções e as promessas são postas em prática quando recebem a adesão do coração.
Quando, pois, alguém é tentado a abandonar a religião, facilmente o faz se nunca experimentou gosto pelas práticas religiosas, se o coração nunca tomou parte nelas.
As pulsações do nosso coração seriam uma coisa vã e estéril, se não juntassem uns instantes de vida à nossa existência. Acontecerá o mesmo com os afetos, se eles não ajudarem a nossa alma a subir mais alto, a aproximar-se de Deus. 
Pelo contrário, quando os nossos exercícios de piedade são acompanhados do concurso do coração, possuem um poder de ação considerável. Potência de ação sobre Deus, porque nada comove tanto o Seu coração como os filiais e sinceros afetos do nosso; potência de ação sobre as almas, porque se é sempre bem sucedido em todas as empresas em que o coração toma parte.
Façamos uma boa oração com o nosso coração. - Assistamos devotamente à missa com o coração; comunguemos fervorosamente com o coração; pratiquemos a caridade com o coração nas mãos, e assim daremos muita glória a Deus e lucrarão muito as almas.
O nosso amor para com Deus deve ser toda e sem reserva. Não pode haver partilhas. Nosso Senhor observa àqueles que têm apego aos ídolos: "Olha que o leito é muito estreito, se dois vão a deitar-se nele necessariamente um deles cai no chão; a coberta é muito estreita não pode abrigar nem defender do frio duas pessoas. (Jo., XXVIII, 20). O nosso coração é este leito esta coberta. Não se podem ter dois amores porque não se podem ter dois senhores. Ouçamos bem o preâmbulo da grande lei e a razão principal em que se funda: - "Escuta, Israel, o Senhor teu Deus, o Senhor é um só. E tu o amarás de todo o teu coração".
O amor para com Deus deve ser sem reserva. Não devemos guardar nada para nós. Deus dá sem medida, e, infelizmente, aquele que deve tudo, mede o que dá.

Þ    Amor efetivo
Isto é, deve manifestar-se exteriormente: - Pelo cumprimento de todos os deveres de cristão: Jesus Cristo diz em Seu próprio nome e em nome de Seu Pai celeste: "Aquele que me ama é amado por meu Pai e por mim (Jo., XIV, 21). - Pelas palavras de zelo: o zelo é efeito do amor: "Quem não zela, diz Santo Agostinho, não ama". Pela afirmação da nossa crença contra o respeito humano. - Pelo bom exemplo. Algumas vezes até por atos heroicos.

Þ    Amor soberano
Devemos amar a Deus sobre todas as coisas. Deus deve ocupar o primeiro lugar no nosso coração. "Quem como Deus!".

Þ    Amor contínuo
O amor de Deus deve existir continuamente em nós. É um fogo sagrado que nunca se deve apagar, a fim de que se possa manifestar na primeira ocasião.

Þ    Amor generoso
Para ser generoso são necessárias três coisas: - 1.º Pensar muito em Deus. Pensa em Mim, dizia Nosso Senhor a Santa Catarina de Sena que Eu pensarei em ti. Pensemos, pois, em Deus quando nos levantamos, comemos, trabalhamos e descansamos. 2.º Ser pródigo. O amor não vive senão do que ele dá. Devemos dar-nos sem cálculo: porque quando se trata do amor, nada é suficiente. Ainda que tenhamos suportado todas as doenças de Santa Liduina, sofrido, como São Francisco de Assis, as dores da crucifixão, fundado, como Santa Teresa, trinta e dois mosteiros, procurado a paz da Igreja, como Santa Catarina de Sena, convertido nações, como São Francisco Xavier, passado coisas incríveis, como São Paulo, amado como São João, pensemos e confessemos que não temos feito nada. Coloquemo-nos humildemente de joelhos e, de mãos postas, diante de Deus, peçamos-Lhe a graça de nos não deixar morrer sem termos feito, enfim alguma coisa para lhe testemunhar o nosso amor. 3.º Imolar-se. É a generosidade suprema e última palavra do amor. O amor é um fogo que precisa de combustível. Jesus é sacerdote, precisa de uma vítima. Sejamos o combustível do fogo do amor de Deus, a vítima de Jesus. As perfeições divinas têm, relativamente a nós, direitos e necessidades. A justiça tem também as suas. Têm necessidade, fome de nós: fome de nos purificar, de nos santificar, de nos tornar imensamente felizes. Deixemos, pois, que Nosso Senhor tome posse de todo o nosso ser para o consumir com o Seu amor. "Dignai-vos, nós Vós pedimos, Senhor, santificar estes dons, e, aceitando a oferta desta hóstia espiritual, acabai de fazer de nós uma digna vítima Vossa." (Secreta da missa de segunda feira de Pentecostes).