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A Mãe segundo a vontade de Deus ou Deveres da Mãe Cristã para com os seus filhos,
do célebre Padre J. Berthier, M.S
Edição de 1927
XIX- Da vanglória
A
sede das honras é também um dos defeitos dominantes do nosso século. Uma mãe
segundo a vontade de Deus fará notar a seus filhos o nada das glórias deste
mundo, cujo brilho enganador fascina tantas almas; ensinar-lhes-á a amar um gênero
de vida simples e modesto, e a contentar-se com a condição de seus pais, sem
procurar elevar-se à força de intrigas. «A senhora Acarie nada desprezava,
para inspirar a humildade a seus filhos, porque ela considerava essa virtude,
como o fundamento da vida cristã. Posto que pertencessem a uma família nobre,
nunca os tratava, nem deixava que os outros os tratassem, senão pelo nome do batismo.»
Por
maior que fosse a vontade que os seus criados tivessem de lhe servir os filhos,
ela queria muitas vezes, que estes se servissem a si próprios.
«Eu
era muito orgulhosa, diz a sua filha mais velha; mas minha mãe obrigava-me aos
serviços mais humilhantes da casa, para me corrigir, sabendo quanta era a
repugnância, que para isso sentia, como era varrer uma escada, por onde todos
subiam e desciam. E, tendo observado que eu procurava as horas, em que julgava
que ninguém me poderia ver, e que até fechava a porta, para não poder ser
vista, obrigou-me, para mortificar o meu orgulho, a varrer a escada diante de
toda a gente.»
De
todas as culpadas filhas do orgulho, a vaidade é a que atualmente está mais
espalhada em todas as classes da sociedade.
«Nada
há pior entre as crianças, e nada mais as estraga e mais depressa, diz Mgr.
Dupanloup, do que a vaidade. É preciso ensinar-lhes a desprezá-la. Pela minha
parte, nunca permitiria, por exemplo, a ostentação dos relógios e das correntes
de ouro; quanto aos perfumes e às pessoas que se perfumam, desprezava-as
completamente. Alguém achará isto severo, mas é a severidade da experiência.» O
ilustre prelado fala das crianças, em geral, mas é principalmente nas meninas
que se deve combater a vaidade. «Elas nascem, diz Fénelon, com um desejo
violento de agradar; daí provém a sua conversação meiga e insinuante, daí
provém o fato de tanto aspirarem à beleza, e a todas as graças exteriores; um
enfeite de cabeça, um laço de fita, a escolha de uma cor, o cabelo levantado ou
caído, são para elas assuntos importantes. Aplicai-vos, pois, em fazer
compreender às meninas, quanta honra provém de um bom comportamento, e de uma
verdadeira capacidade, e que tudo isso é mais estimável que o que se tira dos
cabelos e do vestido. Basta um pequeno número de anos, para transformar em
feia, uma mulher que era formosa. A beleza é um bem frágil; diminui à medida
que aumenta o número dos anos. Os lírios nem sempre estão floridos; e quando
murcha a rosa, apenas resta a haste eriçada de espinhos. — «As pessoas,
acrescenta Fénelon, que fazem derivar da beleza toda a sua glória, em breve se
tornam ridículas; e o mais curioso é que, chegando, sem darem por isso, a uma
certa idade em que a beleza lhes desaparece, ainda estão encantadas de si
próprias, quando toda a gente as acha feias. A verdadeira graça não depende de
um adorno vão e afetado.» Nada agrada mais que o desprezo que se faz dos
ornamentos, e é um belo adorno, não saber uma pessoa adornar-se. É verdadeiramente
bela e amável, segundo afirma S. Jerônimo, a senhora que ignora e despreza a
sua beleza, e que, aparecendo em público, longe de descobrir o colo, vela pelo
contrário, o rosto.
«Quererias,
pode-se perguntar a uma menina, arriscar a tua alma, e a do teu próximo, para
satisfazeres a tua vaidade? Tem horror às nudezas do pescoço, e a todas as
imodéstias; ainda mesmo que se cometessem estas faltas, sem ter em vista alguma
paixão má, é pelo menos uma vaidade; é um desejo desenfreado de agradar. E
convirá este cego desejo a uma alma cristã, que deve considerar como uma
idolatria tudo o que desvia do amor do Criador e do respeito das criaturas? Mas
que pretende a pessoa que procura agradar? Não é excitar as paixões? Preparas,
então, um veneno sútil e mortal, derramá-lo sobre todos os espetadores, e
julgas-te inocente!
«Não
é verdade que uma menina arrisca tudo, tratando-se do sossego de sua vida, se
desposa um homem vão, leviano e de mau comportamento? Logo é necessário
esforçar-se por desposar um homem honrado, sério, de espírito sólido... mas
para encontrar um homem desses, é necessário ser modesta e nada deixar mostrar
de frívolo e de desarrazoado. Qual é o homem ilustrado e honesto que quereria
uma mulher vaidosa, e cuja virtude parece duvidosa a avaliar pelas exterioridades?»
(Fénelon) Eis alguns exemplos que podeis adicionar aos que já conheceis. Santa
Coleta, na sua infância, usava os vestidos, conforme a mãe lhos fazia, e se
algum ornato tendia para a vaidade, envergonhava-se, e era um tormento, ir
assim para o meio das suas companheiras. Quando lhe davam a liberdade de escolher,
preferia tudo quanto havia de mais simples, e gostava das cores menos vivas,
para não dar tanto na vista (Vida de Santa Coleta).
M.
de Goudren, que foi mais tarde superior do Oratório, apenas tinha cinco anos,
quando o pai mandou tirar-lhe o retrato. Todos admiravam a obra; só o pobre
pequeno não estava satisfeito. Não podia ver, sem dor, que se admirasse outra
coisa, que não fosse a bondade divina. Chegou a tanto a sua dor, que resolveu
despedaçar o retrato. Pegou num pau, para o deitar abaixo, mas como estava
muito alto, não lhe pôde chegar. Então, sem dizer nada a ninguém, pegou em
flechas, fechou-se na sala em que o retrato estava exposto, e furou-o, até o
tornar irreconhecível. «Custava-me, dizia ele mais tarde, que elogiassem a
minha beleza, quando Deus imprimia na minha alma um grande horror por tudo
quanto fosse vaidade» (Em sua vida pelo Abade Pin).
«Nunca
consintais, no exterior das meninas, coisa alguma que exceda a sua condição,
diz o imortal arcebispo de Cambrai; repreendei severamente todas as suas
fantasias; mostrai-lhes a que perigos se expõem, e quanto se fazem desprezar
das pessoas sensatas, esquecendo aquilo que são. Todavia, se conservardes
vossa filha em muito inferior estado ao das outras meninas da sua idade e
condição, correreis o risco de a afastardes de vós. Poderia apaixonar-se pelo
que não poderia ter, e que admiraria nas outras. Em breve se faria senhora sua,
para dar asas à sua vaidade. Melhor a contentareis procurando um meio termo,
que será sempre aprovado das pessoas sensatas e estimáveis. O que é essencial
é que não procurareis nenhuma das imodéstias que são indignas do Cristianismo»
(Fénelon).
A
senhora de Chantal não se cansava de elogiar aos filhos a simplicidade e a
modéstia, essas belas companheiras da beleza; ensinava-os a serem sérios, a
estimarem as pessoas, segundo as suas qualidades, e não segundo a roupa que
vestiam; a zombarem das modas absurdas que variam incessantemente e que são a
causa de tantas despesas, e a ocasião de tantos pecados. E era tanto mais fácil
essa tarefa à santa baronesa de Chantal, que nunca fora escrava da moda, o que
não impedira que obtivesse os mais brilhantes triunfos no mundo (O abade Bougaud).
Muitas
vezes a precoce inteligência das crianças e as suas qualidades morais fazem-nas
cair na vaidade. Ó mães, sede vigilantes, diz Mgr. Dupanloup, porque quanto
mais pródiga foi a natureza, na criança que educais, tanto mais deveis recear
que o orgulho a não deprave. Os primeiros ditos espirituosos de uma criança têm
tão sincera graça, que todos a querem ouvir falar muito, mesmo até, diz
Fénelon, das coisas de que não têem conhecimentos distintos; fica-lhes para
sempre o costume de falarem com precipitação, (e sem reserva), e de dizerem
coisas, de que não têm idéia suficientemente clara. Vendo-se objeto da
admiração de todos, acabam por acreditar, que tudo nelas é maravilhoso e
extraordinário. É preciso, pois, que fiquem cientes, de que são mais apreciadas
quando mostram dúvidas, do que quando elas próprias decidem alguma questão.
A
segunda filha da senhora Acarie, que sempre teve um grande bom senso, dizia
coisas muito razoáveis, desde a sua primeira infância. Para destruir toda a
semente do amor próprio, que teria podido germinar no coração desta criança,
fingia a mãe umas vezes que não a ouvia, outras vezes mandava-a calar. Uma
sabedoria precoce, dizia ela, desaparece de ordinário tão depressa, como vem.
«Quando
mesmo pudésseis adiantar muito o espírito duma criança, sem o oprimir, diz
Fénelon, deveríeis recear fazê-lo, porque o perigo da vaidade e da presunção é
sempre maior que o fruto destas educações prematuras que tanto barulho fazem».
Recomenda
o mesmo ilustre prelado que não se felicitem muito as crianças a quem nada há
que repreender, porque «engrandecendo o seu amor próprio, fazeis com que ele
se fortifique, e à primeira contradição, pode explodir. Não hesitamos até em
dizer, que falta alguma coisa a uma educação, quando nada há a censurar às
crianças».
Virgínia
Bruni punha tudo em movimento, para reprimir nos filhos os primeiros movimentos
de orgulho. Mal notava que um deles preferia, por vaidade, um trajo a outro,
repreendia-o severamente, e nunca lhe fazia a vontade. As roupas, dizia ela,
novas ou velhas, não são mais do que andrajos que cobrem um cadáver. O único
traje verdadeiramente belo e precioso, de que se deve ter a santa vaidade de
estar revestido diante do Senhor, é o da inocência e da virtude. E nunca
deixava de ligar, aos próprios objetos, que lhes dava para trazer como
ornamentos, uma idéia religiosa, para lhe afastar todo o vão deleite.
Eis
um exemplo: Tendo um dia colocado ao pescoço da sua filha mais nova uma cruz
de valor, disse-lhe:— «Esta cruz é uma recordação de Jesus Cristo, que
consente pertencer-te, para que te recordes sem cessar, que deves ser Sua
esposa.» Se as filhas proferiam palavras, que mesmo longinquamente parecessem
produzidas pela presunção ou pelo orgulho, dizia-lhes energicamente, para as
humilhar: «Vede estes grandes mendigos que julgam serem mais que os outros! Não
vos acabareis de capacitar que nada mais sois que os pobres cobertos de farrapos,
que nada possuís, e que o vestuário e a alimentação os deveis à Providência de
Deus e à caridade de vossos avós! É preciso pois que vos humilheis, diante de
toda a gente.» E nos seus últimos momentos, não cessava de dar instruções
particulares a sua irmã, sobre o modo de corrigir seus filhos do defeito da
vaidade.
Se
alguém os acariciava ou louvava, na sua presença, Virgínia testemunhava a mais
viva contrariedade, e tanto pelo gesto como pelo olhar, convidava essa pessoa
a abster-se disso. E depois, para atenuar o mau efeito do louvor, acrescentava:
— «Não liguem importância ao que estão ouvindo dizer. Se lhes falam assim, é
por mero cumprimento, é porque toda essa gente ignora que os meninos não são
suportados na casa de seu avô, senão por efeito da vontade e da misericórdia de
Deus.»
Possam
os conselhos e os exemplos, que acabamos de dar às nossas leitoras, ser mais
úteis para algumas mães, aliás cristãs, que, cegas pela sua ternura, não se
cansam de admirar as graças e as qualidades que descobrem em seus filhos,
através do prisma da sua ilusão. Para elas, não é suficiente dizer a seus
filhos que são belos, perfeitos, encantadores; querem que todos lhes digam a
mesma coisa, e ai de quem lhes notar algum defeito, ou lhes dirigir alguma
censura!... Protegidos pela mãe, como lhes não há de crescer o orgulho e a
vaidade? E eis a razão, por que se tornam presunçosos, altivos, egoístas e
talvez viciosos; porque, segundo afirma o Espírito Santo, todas as desordens têm
a sua origem no orgulho.