segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Sermão da Festa da Imaculada Conceição (8/XII/13) - Pe. René Trincado

Fonte: Grupo Dom Bosco


A partir de Adão e Eva, o pecado original abre em cada alma e em cada corpo humano, uma espantosa e sangrenta ferida. Ensina a Igreja que pelo pecado dos primeiros pais “foi mudado para pior o homem inteiro, ou seja, enquanto ao corpo e a alma” (Concílio II de Orange). As funestas chagas que foram deixadas em nós pelo pecado original são profundas e numerosíssimas, e todos as experimentamos cada dia de nossas enfermas vidas.

O primeiro efeito deste pecado é a privação da justiça original (...) Deste primeiro efeito se seguiu ficar o homem enfermo enquanto a todas as faculdades da alma e corpo; e em primeiro lugar enquanto ao entendimento e vontade. (...) A ignorância ainda das coisas necessárias à conservação da vida, a fatuidade e rudeza de entendimento, a dificuldade em adquirir os conhecimentos, a debilidade e instabilidade do ânimo, o continuo vagar da mente, o atender a coisas vãs (...) com preferência às úteis, importantes, e ainda necessárias, são outras tantas enfermidades de nossos entendimentos infectados do pecado original.

Não são menos (...) as dolências que por ele padece nossa vontade. O amor desordenado de nós mesmos [egoísmo], e do qual nascem preocupações inúteis; os temores, as invejas, os pleitos, rinhas, contendas, discórdias, artimanhas, guerras, e vãos temores: a dificuldade em abraçar o bom, e afastarmo-nos do mau: a inconstância com que nos fazemos a nós mesmos uma guerra interna, querendo uma coisa e logo querendo outra, a debilidade da livre vontade para o seguir o bem; são todos efeitos do pecado original, e enfermidades com a contrição de nossa vontade.

Também a parte sensitiva (...) recebeu feridas (...), sendo a principal aquela inclinação ao pecado, que nos ficou para o combate (...) e pela qual a parte inferior se rebela continuamente contra a superior, a carne contra o espírito, fazendo-nos sentir em cada momento aquela lei que dizia S. Paulo era repugnante à de sua mente, e que queria reduzi-lo ao cativeiro da lei do pecado.

Enquanto ao corpo são igualmente inumeráveis as desditas e misérias em que incorremos pelo pecado original. Por ele nos vemos sujeitos à fome, à nudez, às enfermidades, dores, tristezas e (...) à mais terrível entre as coisas terríveis, que é a morte, preço do pecado.(“Comp. Mor. Salmatic.” V. 3).

Explica Santo Tomás de Aquino que esta enfermidade terrível e múltipla que é o pecado original em nós, além do sofrimento e da sujeição à morte – as duas chagas que afetam o corpo- nos causou feridas na alma, opostas cada uma às quatro virtudes cardeais: 1- a ferida de ignorância, ou seja, a dificuldade para conhecer a verdade, contra a prudência; 2- a ferida da malícia, isto é, a debilidade de nossa vontade, oposta à justiça; 3- a ferida da debilidade, isto é, a covardia para fazer o bem e resistir ao mal, contraria à fortaleza; e 4- a ferida da concupiscência, isto é, o desejo desordenado de satisfazer aos sentidos contra os ditados da razão, oposta à temperança (Suma Teol. I-II c. 85 a. 3).

Como aquele infeliz da parábola do bom samaritano, todos os filhos de homem e mulher viemos ao mundo meio-mortos, cheios de chagas e enfermos por causa do pecado original. Todos, desde Adão e Eva e até o fim do mundo. Todos com uma só exceção: a Santíssima Virgem Maria. Nenhuma destas feridas, nenhuma destas misérias do corpo e da alma padeceu a Santíssima Virgem, porque Ela nunca contraiu o pecado original.

No Evangelho da grande festa que hoje celebramos, lemos que o Arcanjo Gabriel disse à Santíssima Virgem Maria certas palavras que vamos explicar brevemente:

Ave, cheia de graça, começa dizendo o Anjo. Cheia de graça: se a graça se dá aos demais com certa medida, à escolhida desde todos os séculos para ser Mãe de Deus se lhe deu em toda sua plenitude. Está cheia de graça santificante, dos dons do Espírito Santo, de todas as virtudes. Tudo nela agrada a Deus. Sua conceição foi imaculada. Este é o dogma que festejamos. Isto significa que ela foi preservada imune de toda mancha (mácula) de culpa no primeiro instante de Sua conceição, por singular graça e privilégio de Deus onipotente, em atenção aos méritos de Cristo. Cheia de graça desde sempre e para sempre, Ela foi, é e será toda formosa, toda pura, adornada de todas as virtudes e de todos os dons divinos.

O Senhor é convosco. Deus está nela desde o primeiro momento, desde a concepção e para toda a eternidade; não como em nosso caso, pois nascemos separados de Deus e inimigos seus por causa do pecado original, e desde que chegamos ao uso da razão, muitas vezes, pelo pecado mortal, nos fazemos escravos do demônio e expulsamos Deus de nossas almas.

Bendita sois vós entre as mulheres. Porque assim como a mulher foi causa do primeiro pecado, e por ele, de todos os pecados e suas maldições até o fim do mundo; a Virgem Maria é causa de todas as graças e bênçãos que recaem sobre os homens pelos merecimentos de Seu divino Filho. Nova Eva, Maria vence ao demônio que venceu a Eva. O que Eva perdeu por desobedecer, Maria o recuperou mediante a perfeita obediência de sua respostas: Eis aqui a Escrava do Senhor; faça-se em mim segundo sua Palavra (Lc. I, 38).

Estimados fiéis: todos nós nascemos manchados com o pecado original, por isso somos inclinados ao mal e –de fato- pecadores, erramos e padecemos muitas debilidades e misérias. Esta terrível e inexorável realidade deve ser sempre um motivo de humildade para nós. Por pura misericórdia, com preferência aos milhões de pessoas, fomos arrancados da escravidão do demônio mediante o santo Batismo. Por ele, de filhos de ira fomos transformados em filhos de Deus. Mas, cabe perguntarmo-nos se temos sido fiéis à graça e às promessas de nosso Batismo, à vestidura de inocência que com ele se nos deu.

A Santíssima Virgem Maria, sendo preservada de todo pecado e propensão ao mal, gozava de uma perfeita paz; sendo impecável, ainda assim vigiava e orava sem cessar. Nós, que somos pecadores, que estamos fortemente inclinados a muitos males, que vivemos rodeados de inimigos no mundo que se esqueceu de Deus e que cada dia demonstra maior ódio ao seu Criador e Salvador, vigiamos (estamos atentos) à nossa alma, aos inimigos desta e a Deus? Porque para conservar ou recobrar a pureza batismal é necessário combater sem descanso, fugindo das ocasiões de pecado, da sensualidade, da vaidade, da superficialidade, da curiosidade, das paixões descontroladas, da ignorância, etc.

Ela vigiava a orava sem cessar. Levamos diariamente o combate por nossas almas mediante a oração? Neste dia santo, tomemos a resolução irrevogável de empunhar a arma invencível do Rosário, para que pela intercessão incessante da Virgem Maria, Deus tire de nossas almas todas essas manchas ou máculas, essas imundícias que as fazem indignas da condição de templos do Espírito Santo.

E nunca esqueçamos que Maria Imaculada, apesar da distância imensa que há entre sua santidade e nossa indigência, além de ser a Mãe de Deus, é nossa Mãe. Peçamos-Lhe que nos acolha sob seu manto maternal e que nos conduza ao Céu, para o qual fomos criados e donde queremos viver eternamente com Ela na presença de Deus.
Tradução: Grupo Dom Bosco