domingo, 29 de dezembro de 2013

O Combate Espiritual por Dom Lorenzo Scúpoli – Capítulo II

Por um indigno escravo de Nosso Senhor

“Vigiai e orai, para que não entreis em tentação;
na verdade, o espírito está pronto, mas a carne é fraca.”
(Mt 26:41)
 A DESCONFIANÇA DE NÓS MESMOS

A desconfiança de nós mesmos, nos é necessária neste combate de tal maneira, que sem ela devemos ter por certo que não só não poderíamos conseguir a desejada vitória, como não venceríamos a menor das paixões. (Mt 26:41)
Importa que desta verdade fiquemos bem persuadidos, porque nossa natureza corrompida nos empurra a ter uma vã e errada estimação de nós mesmos. Apesar de sermos um nada verdadeiramente, nem por isso deixamos de nos persuadir de que prestamos para alguma coisa, e que sem fundamento algum presumimos poder alcançar por nossas forças. (cf. Lc 17:10 ; Ro 6:16-23)
Este defeito se conhece dificultosamente, e desagrada muito aos olhos de Deus, que deseja e quer em nós um fiel conhecimento desta certíssima verdade na qual toda graça e toda virtude vem Dele, que é fonte de todo o bem, e que nós mesmos somos absolutamente incapazes de ter ao menos um pensamento bom, que lhe seja agradável. (cf. 1Co 2:12 ; 2Co 4:7 ; Ef 2:8)
E sendo também esta tão importante desconfiança uma obra do seu poder divino, um dom que ele dá aos Seus amados servos, às vezes através de santas inspirações, outras vezes  com amargas provações, por tentações violentas e quase insuperáveis, ou com outros meios, que não podemos chegar a entender; apesar disto, querendo Ele que juntamente façamos de nossa parte o que convém, eu vos proponho quatro meios, que com a graça de Deus, podereis conseguir esta desconfiança. (1Pe 1:6 ; At 14:22 ; Ro 5:2-5 ; 1Co 2:5)
Porque Deus é o que opera em vós tanto o querer como o efetuar,
segundo a sua boa vontade
.”
(Filipenses 2:13)
O primeiro é que vos considereis e conheçais a vossa vileza, e limitado ser, e que não sois capazes de obrar bem algum por vós mesmos, por onde mereçais entrar no Reino dos Céus. (Lc 17:10 ; 2Co 9:8 ; Mc 8:34)
O segundo, é que com fervorosas e humildes orações peçais esta importante virtude ao Senhor, aquele que é o único que nos a pode dar. Confessemos primeiro que, não somente não a temos, mas que por nós mesmos estamos numa plena impotência de obtê-la. Desta maneira nós nos apresentamos aos pés do Senhor com uma confiança firme em Sua bondade, e perseveremos na oração, até quando sua Divina Providência julgue conveniente conceder nosso pedido. (Ef 3:20 ; Ro 15:13)
O terceiro meio é que nos acostumemos pouco a pouco a recear de nós mesmos e de nosso próprio julgamento, temendo a violenta inclinação de nossa natureza ao pecado, os inúmeros inimigos e a incomparável superioridade de suas forças, sua longa experiência de combate, suas astúcias e suas ilusões que os transformam a nossos olhos em anjos de luz, as armadilhas que eles nos pregam por todas as partes do caminho da virtude. (cf  Ef 6:10-18 ;  2Co 11:14)
O quarto meio é de entrarmos em nós mesmos  sempre que acontecer de cairmos em alguma falta, e então considerarmos vivamente até onde vai nossa fraqueza. Se Deus permite que tenhamos algumas quedas, é afim de que pela claridade desta luz, possamos nos conhecer melhor, desprezam-nos a nós mesmos como criaturas vis, e a desejar ser desprezado pelos outros (cf Lc 17:3). Sem esta vontade não pode haver desconfiança virtuosa, a qual tem todo o seu fundamento na verdadeira humildade e no conhecimento, que traz consigo a experiência (cf Ro 5:2-5). Porque bem claro se pode ver que quem deseja unir-se com a Luz Suprema e com a Verdade incriada, necessita do conhecimento de si mesmo, o qual a divina Piedade dá frequentemente aos soberbos e aos presunçosos através da experiência, deixando-os justamente cair em alguma falta da qual imaginam que poderão se livrar; assim desta forma acabam por se conhecer e por aprender a desconfiar em tudo de si mesmos. (2Co 11:30)
Mas não costuma valer-se o Senhor deste meio tão miserável, se não quando os outros meios mais piedosos  não obtiveram o efeito que esperava Sua misericórdia.  Esta permite que caia o homem com mais ou menos frequência, se ele tem mais ou menos orgulho e própria estimação, de modo que  onde não se acha sombra de presunção, como foi na Bem-aventurada Virgem Maria, da mesma maneira não haverá sinal algum de queda.
Assim, quando cairmos, corramos imediatamente com o pensamento ao humilde conhecimento de nós mesmos, e com oração pedir ao Senhor que nos dê a verdadeira luz para nos conhecermos e desconfiarmos inteiramente de nós mesmos, se não queiramos cair de novo nas mesmas faltas ou em faltas ainda mais prejudiciais à salvação de nossa alma.