quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

A Mãe segundo a vontade de Deus/ XII- Do espírito do mundo

Nota do blogue: Acompanhe esse especial AQUI

A Mãe segundo a vontade de Deus ou Deveres da Mãe Cristã para com os seus filhos, 
do célebre Padre J. Berthier, M.S
Edição de 1927


XII- Do espírito do mundo

O amor de Deus e o espírito de Nosso Senhor não podem estabelecer a sua morada num coração onde reinam o espírito e o amor do mundo; ora tudo o que cerca as crianças junta-se às suas próprias inclinações, para as levar para o amor deste mundo perverso, que é o inimigo jurado de Jesus Cristo «Em volta da crianças, diz o judicioso Rollin, não há senão louvores aos que amontoam grandes rique­zas, que têem grandes equipagens, que vivera princi­pescamente, que têm ricos palacetes... Carecem, pois, estas crianças dum monitor fiel e assíduo, dum advogado que defenda, junto delas, a causa da ver­dade, da honra e da razão, que lhes faça notar a falsidade que reina em quase todos os discursos, e conversações dos homens.» Carecem dum guia in­teligente, que as arranque a esses jardins íloridos que o mundo lhes apresenta, e que só servem para a sua perdição, afim de que possam entrar no cami­nho espinhoso das virtudes cristãs, que conduz à eterna felicidade. Quem será esse monitor fiel, esse benfazejo guia, senão uma atenta mãe, que faça notar a seus filhos a vaidade de tudo o que passa, repetin­do-lhes muitas vezes: — «Não ameis o mundo, meus filhos, porque o mundo só vive de falsidades. Não há no mundo senão concupiscência da carne, concu­piscência dos olhos e orgulho.» Três fontes enve­nenadas de todos os nossos males e de todas as nossas iniquidades, que é preciso extirpar do cora­ção das crianças. «Quem não sabe que, na grande obra da educação, temos a lutar contra a tríplice concupiscência, nada sabe, e nada pode, diz o ilus­tre bispo d’Orleans.»


É pois a sensualidade o primeiro inimigo que temos a combater, isto é o amor do que lisonjeia o corpo, a moleza, a ociosidade com o vício que a se­gue de perto. Já neste livro nos insurgimos contra certas mães que concedem e procuram a seus filhos tudo o que pode lisonjear os seus gostos; inútil será tornar a falar sobre este ponto. Mas por quan­tas outras facilidades se não intertêem estas fraque­zas nas crianças! Satisfazem-se todos os seus capri­chos, para que nada tenham a sofrer; até lhes chegam a tirar o ar, com medo que tenham muito calor no verão, e muito frio no inverno. Mal se acusam da mais pequena dor, logo lhes tiram o estudo, e à menor indisposição, pai, mãe e criados andam numa roda viva, prodigalizando-lhes mil atenções e cuidados. Deixam-nas dormir até tarde na cama; talvez até as deixam estar na cama, sem dor­mir, e lamentam-nas, pelo que sofrem no colégio.

Parecem fúteis estes pormenores, mas têm um grande alcance, pelas fantasias que se sofrem aos meninos e que tão legítimas se julgam. No entre­tanto o conjunto de todas as estas sensualidades tira-lhes toda a energia, e toda a força física e moral, não lhes deixando ardor senão para o pecado.

«As crianças que passam os primeiros anos no meio das delícias, escreve Mgr. Dupanloup, repelem com repugnância todas as verdades que lhes incu­tem, apoderando-se com deplorável instinto de tudo o que é falso, ou as lisonjeia. Nada pode dar uma idéia do que pode suceder, na vida, a essas crian­ças que são amimadas no seio de todas as vontades. Porque as acariciam, porque lhes testemunham ter­nura muito sensível, porque lhes concedem quanto lisonjeia o seu apetite, o seu olhar, a sua preguiça... parecem-nos de ordinário uns lindos meninos, gra­ciosos, prazenteiros, gracejadores; se os virdes de relance parecer-vos-ão encantadores; mas se repen­tinamente descobrirdes a sua fraqueza e malícia, se experimentardes uma resistência, se lhes exigirdes o menor trabalho, a mais ligeira aplicação, logo o mau humor, o seu silêncio pesaroso e ruim vos revelarão que essas crianças tão amáveis são apenas engana­doras ... É certo que não gosto das crianças secas, duras e altivas, mas as que são ternas, insinuantes, meigas, para serem amáveis à primeira vista, não são menos ingratas a meus olhos... E o que aumenta o perigo, é que são fáceis os enganos; os mais hábeis são completamente iludidos... É neces­sário observar, diz Fénelon, que há naturezas de crianças que fazem enganar; parecem-nos ao prin­cípio bonitos, porque as primeiras graças da infância são formadas dum verniz que ilude. E que acontece depois divertem-se, deixam-se lisongear por toda a gente, por mulheres servis, que... seguem todas as suas fantasias, satisfazem todas as vontades, e animam as suas pequenas paixões depravadas. Dentro em pouco desaparecem as graças enganadoras da in­fância... perde-se a ternura aparente do seu coração, e mostram, com espanto, uma desoladora secura da alma, e por fim de contas, estas lindas crianças tornam-se verdadeiramente horríveis; só tarde é que se conhece, que não há ente mais duro, mais mau, mais altivo, mais violento, mais egoísta, mais ingrato, mais injusto e mais odioso do que uma criança acostumada a fazer todas as suas vontades.» As atenções que se têem com as crianças doentes, as vontades que, por essa ocasião, se lhes fazem, prejudicam-nas duma forma deplorável. Nada há que seja mais funesto a uma criança, do que ser, durante muitos anos o objeto constante de todos os cuidados, de todas as preocupações dum pai, duma mãe e de todos os criados duma casa... É um mal quase inevitável, mas é certo que é um mal. É preciso, pelo menos, evitar tudo quanto puder evitar-se. Deve-se procurar não servir este querido doente inutilmente, e nada lhe fazer, senão quando realmente careça dos seus serviços. Creio que, mesmo na mais tenra idade, se devem evitar com as crianças essas ternuras apaixonadas, que não servem senão para fazer as crianças mal educadas. Sem dúvida que é preciso ter com elas uma profunda e terna bondade, para que conheçam que são amadas, mas nem, por esse fato, devem os pais mostrar-se fracos e pusilânimes. É preciso que se recordem de que os filhos devem respeitar a dignidade materna, que é necessário que se respeite, para poder ser respeitada.

Os próprios pagãos tinham compreendido que uma educação efeminada era incapaz de fazer ho­mens de dedicação e de sacrifício, e cidadãos gene­rosos. Por isso habituavam os filhos, desde a mais tenra infância, a suportar o frio e o calor, a endu­recer-se no trabalho e nas canceiras. Poderíamos dar interessantes pormenores acerca dos exercícios laboriosos e da vida pesada que levavam os jovens de Sparta e de Athenas, nos belos dias destas duas repúblicas; mas preferimos falar dos exemplos dos santos. M.me Acarie educava os filhos nesse espírito de mortificação que caracteriza o verdadeiro cristão. Se o serviço dum criado lhes agradava mais do que o de qualquer outro, colocava junto deles o criado com que menos simpatizavam. Nas suas doenças, obrigava-os a tomar, sem mostrarem repugnância, as bebidas amargas, que o médico lhes receitava. Para lhes fazer odiar a sensualidade, fazia-lhes ser­vir à mesa comidas vulgares, e quase sempre um único prato.


Lemos na vida de S. Francisco de Sales que sua mãe se aplicou a educar o filho dessa maneira se­vera e varonil, que dá energia ao corpo e à alma, ensinando-o a contentar-se com pouco, a livrar-se das exigências do bem estar, e a sofrer de boa von­tade o sacrifício, a privação e a dor. Quis que tudo fosse simples, sem luxo, sem moleza, no vestir, no comer, no dormir, e em tudo. Imitai estes nobres exemplos, piedosas mães, desde o berço, diz Rollin; acostumai vossos filhos a reprimir os desejos e as fantasias. Se lhes não dessem nunca o que eles pedem gritando e chorando, acostumar-se-iam a passar sem esses brinquedos... não se tornariam odiosos e incomodativos a eles e aos outros... Nunca se deve satisfazer ao que pedem, gritando; e se redobram de importunidades, para receberem o que desejam, é preciso fazer-lhes compreender que nada se lhes dá por esse mesmo fato. Em algumas casas vêem-se crianças à mesa, que não pedem nada... noutras há-as, que pedem tudo quanto vêem, e que querem ser servidas antes de todos. Donde provém uma diferença tão notável? da diferente educação que receberam de seus pais.