Nota: A Encíclica citada pelo autor é a Encíclica Casti connubii, do Papa Pio XI.
VERDADEIRO AMOR
"Vós, maridos, amai vossas esposas, como Cristo amou a Igreja"
(Efésios, 5.25)
Em conformidade com os intuitos do Criador deve ser também o amor conjugal amor verdadeiro em todo o vasto sentido dessa palavra. Quanto mais se assemelhar ao Amor Infinito de Deus, tanto maior felicidade representará para os cônjuges.
Neste amor de esposo à esposa acresce uma circunstância toda singular. Um e outro têm, de acordo com a mesma natureza, sua finalidade particular. Um e outro se completam mutuamente. Ambos possuem a mesma natureza e ambos a possuem de forma diferente. Num e outro há um vazio que, reciprocamente, pode ser preenchido. Manifestamente. Esse complemento mútuo, essa recíproca compensação de qualidades diversas entre duas pessoas de sexos diferentes constitui ao mesmo tempo, motivo justo e base sólida de profundo e verdadeiro afeto.
Como um depende do outro e a ambos associou o mesmo ideal, excluem-se, já por isso mesmo, baixas rivalidades e cálculos de concorrência. Numa atmosfera de benevolência, simpatia e dedicação há de um ajudar ao outro, hão de se mutuamente aconselhar em consideração e respeito recíprocos para o bem e a felicidade de ambos.
Segundo a Vontade de Deus constitui o marido a cabeça da família. É o que Deus declara a Eva em termos irretorquíveis: "Estarás às ordens do teu marido e ele te dominará". (Gen. 3.16) Nesta hierarquia natural nenhuma emancipação da mulher há de alterar um ceitil sequer. É ainda o que o Santo Padre (Papa Pio XI) encarece, quando diz:
"Consolidada, enfim, com o vínculo desta caridade a sociedade conjugal, florescerá nela, necessariamente, a quem vem chamada por Santo Agostinho a 'ordem do amor'. Essa ordem exige de uma parte a superioridade do marido sobre a mulher e os filhos e, de outra, a pronta submissão e obediência da mulher, não por força, mas tal qual é recomendada pelo Apóstolo com estas palavras 'As mulheres sejam submissas aos seus maridos, como ao Senhor, porque o homem é cabeça da mulher, como Cristo é cabeça da Igreja'"
"Tal submissão, pois, não nega, nem tira a liberdade, que compete, de pleno direito à mulher, quer pela nobreza da personalidade humana, quer pelo múnus nobilíssimo de esposa, de mãe e de companheira; nem a obriga a condescender a todos os caprichos do homem, mesmo àqueles que pouco conformes à razão ou dignidade da esposa; nem exige, afinal, que a esposa seja equiparada às pessoas que, em direito, se chamam menores, às quais, por falta de madureza de juízo ou, por inexperiência das coisas humanas não se costuma conceder o livre exercício de seus direitos, mas proíbe aquela exagerada licença que não faz cuidar do bem da família, proíbe, que no corpo desta família fique o coração separado da cabeça, com sumo prejuízo de todo o corpo e com perigo próximo de ruínas. Pois, se o homem é a cabeça, a mulher é o coração e, tendo um primado no governo, à outra pode e deve atribuir-se, como seu próprio, o primado do amor.
"Quanto ao grau e ao modo desta submissão da mulher ao marido, pode ela variar, conforme a variedade das pessoas, dos lugares e dos tempos. Pois, se o homem faltar seu dever compete à mulher suprir essa falta na direção da família. Mas em nenhum lugar e tempo será lícito subverter ou lesar a estrutura especial da mesma família e a sua lei por Deus firmemente estabelecida".
"É a mesma verdade que já Leão XIII fez lembrar aos fiéis em sua Encíclica de 10 de fevereiro de 1880, dirigindo-se ao mundo com estas palavras: 'O marido é o chefe da família e a cabeça da mulher. Nele, pois, que governa e nele que obedece, dando ambos, uma imagem de Cristo, outra o da Igreja, a divina caridade seja a moderadora de todos os seus deveres'".
"Com quanto rigor o próprio Deus observa os ditames dessa lei natural, depara-se-nos no fato eloquente de enviar Seu anjo não à Mãe de Deus, mas a São José, o pai adotivo do Seu Filho, para lhe aconselhar a fuga ao Egito. Por mais que Maria Santíssima excedesse em dignidade a José, impunha-se-lhe a obrigação moral de se sujeitar ao Seu marido."
Em outra parte de sua profunda Encíclica condena o Sumo Pontífice, em seguida, a errônea opinião de ser tal obediência indigna escravidão de um cônjuge para com outro, refutando ainda a exigência dessa tríplice emancipação da mulher que por aí se costuma apregoar. Pois se "querem que a mulher seja ou deva ser desobrigada, segundo sua livre vontade, dos pesos conjugais, quer de mulher, quer de mãe" chama isto o Papa, com todo o peso de sua Autoridade não de "emancipação" mas de "manifesta malvadez".
A emancipação econômica, por sua vez, deve garantir à mulher, segundo a mente dos que a defendem, a liberdade "de poder ter, tratar e administrar, sem o marido o saber e mesmo contra sua vontade, seus negócios particulares, descurando filhos, marido e família. A emancipação social, enfim, que quer, sejam afastados da mulher os cuidados domésticos, quer dos filhos, quer da família, para que possa, pondo estes de banda, seguir seus caprichos e dedicar-se aos negócios e aos ofícios públicos".
"Tal, porém, não é, segundo o Santo Padre, nem verdadeira emancipação da mulher, nem liberdade razoável e digna, mas corrupção da índole mulíebre e da dignidade materna e perversão de toda a família, visto como o marido fica privado da mulher, os filhos da mãe, a casa e toda a família de sua guarda, que deve ser sempre vigilante. A demais, torna-se esta falsa liberdade e não natural igualdade com o homem, a ruína da mesma mulher, pois que, se a mulher desce da sede verdadeiramente real, para que, entre as paredes domésticas, foi, pelo Evangelho, elevada, logo cairá na antiga escravidão - se não na aparência, certo na realidade - e tornará a ser, como no Paganismo, um mero instrumento de prazer nas mãos do homem".
Com efeito. Leis eternas não se transgridem impunemente. Toda tentativa de emenda sai, em tais terrenos, pior que o soneto.
O matrimônio pode ser a concentração mais maravilhosa de afetos, de propriedade inatas e de virtudes, a associação mais completa de atividades harmônicas, sinérgicas e convergentes que a inteligência humana pode conceber. Só o é, porém, quando assenta sobre o verdadeiro amor. O amor constitui o pendor mais íntimo da natureza humana. Satisfeito em todas as aspirações, representa, ao mesmo tempo, a harmônia e a felicidade do conjúgio.
O amor profundo e verdadeiro, o amor nobre e espiritualizado é o segredo da união conjugal. É ele que vai ideando e construindo o vínculo mais sagrado que a duas almas pode unir, o complemento mais perfeito que entre homens pode haver. É a aliança da delicadeza à autoridade, da dedicação à constância na disciplina, da afetividade do coração feminino à energia na admoestação, próprio ao caráter do homem. Será, porém, vil união de baixos interesses, desprezível aliança de egoísmo, quando o amor faltar.
É por isso que São Paulo exorta aos maridos, de cada vez que faz lembrar as esposas da obediência devida: "Amai as vossas mulheres"!
E onde a verdadeira mulher não vê no amor dedicado e respeitoso do seu marido, a realização dos seus mais lindos sonhos?
Tendência é esta, de mútuo aconchego, que o coração humano leve inato na própria natureza... "Não é bom que o homem esteja só".
É este o sonho da donzela, de se poder arrimar em homem corajoso e pujante, de se lhe poder acolher à sombra protetora e benfazeja, para lhe ser, por sua vez, a companheira que com ele partilhe as dores e as alegrias. É este o anelo, outrossim, do homem, de encontrar a mão amiga que, meiga, lhe acalme a fronte ardente pelas vicissitudes da vida, e se prontifique a lhe ser mão de companheira fiel, para que por ela trabalhar possa, nela encontre seu complemento e o encanto do seu lar...
Não há de realizar nunca os sonhos e as esperanças de quem ingressa no matrimônio, quando a mútua afeição descansa, na expressão de Pio XI "Apenas na inclinação dos sentidos, que dura pouco, ou só nas palavras carinhosas, e não no íntimo afeto d'alma".
Mero afeto e inclinação dos sentidos que "chamam de simpatia" não representa para o Sucessor e Vigário de Cristo fundamento sólido para o matrimônio, é antes areia movediça que cede para fazer ruína a casa, "ao contrário, porém, a casa que fora fundada sobre a pedra, i.é, sobre o amor mútuo entre os cônjuges e consolidada por uma consciente e constante união de almas, nunca será sacudida nem abatida por nenhuma adversidade".
Se dois jovens pretendem, pois, contrair matrimônio, não devem eles ter em mira tanto o que poderão esperar do futuro cônjuge, mas muito antes o que procuram oferecer a ele. Cada qual pergunta-se como aquele moço desinteressado, que após o casamento, foi ter com um sacerdote, seu amigo, para dirigir-lhe a pergunta: "Que poderei fazer para tornar feliz a minha esposa?" Se assim não procedem, assemelham-se os noivos, segundo a expressão de moderno escritor, a (duas pessoas) que procuram explorar-se mutuamente. Claro está que sobre sentimentos tão egoísticos não pode constituir-se o edifício de um lar feliz.
Forçoso é, pois, amigos meus, que se vos torne claro, claro como a água cristalina da rocha, aquilo tudo que o verdadeiro amor reclama de vós. Não é o matrimônio, com efeito, nenhum jogo, ao qual pode abalançar-se, irrefletidamente, quem o quiser tentar. Não. É, porém, tarefa árdua a cumprir que exige sólido estudo, profunda compenetração do assunto e acrisolado espírito de sacrifício.
(Excertos do livro: Às ordens do Criador, livro para noivos, pelo Pe. Hardy Schilgen S.J)
PS: Grifos meus.