As mais belas qualidades naturais, flores de um dia que podem aformosear uma mulher, não produzirão no homem mais do que uma impressão passageira: dominar seu coração, até assenhorear-se dele, é privilegio da esposa dotada de sólidas virtudes. Já vimos quão difícil era abrandar Fernando e mais ainda conquistar seu afeto; mas afinal, a esposa virtuosa, depois de vários anos de constante paciência, conseguiu que se fossem acalmando as ondas daquele coração tempestuoso e que reinasse a paz no lar doméstico, serenando-se por completo o seu caráter turbulento. (verificar: Modelo de esposa cristã)
A consolidar esta mudança de caráter e costumes do esposo de Rita veio o nascimento sucessivo de dois filhos, com que o Senhor favoreceu aquele casal, no qual agora reinava a paz; dando-se o caso de Fernando, fugir de casa, sempre que sentia renascer seu mau gênio, e, para não ofender a esposa, somente aí regressava depois de ter recuperado a tranqüilidade de espirito.
Não sabia Rita como agradecer ao Senhor a conversão do esposo e o fruto de benção concedido naqueles seus dois filhinhos. Dava graças a Deus por aqueles benefícios; sendo seu primeiro cuidado oferecê-los ao Senhor e fazer com que fossem logo regenerados pelo batismo. Velava constantemente a jovem mãe sobre o berço, e com os olhos marejados da lagrimas do mais profundo agradecimento rogava ao Pai das misericórdias continuasse favorecendo-a com seus dons, laminando-a na direção daqueles seres queridos de seu coração. Quantos cuidados, temores e ansiedades sofreu aquela boa mãe, pensando no futuro de seus filhos !
Com essa intuição que o Senhor tem dado à mulher, chegou Rita a descobrir nas impaciências, raivas e cumes de seus filhos, que o caráter deles havia de assemelhar-se ao do pai. Isto lhe inspirava sérias inquietações, que, por fim, chegaram a oprimir de angústia seu coração. Vendo que de dia para dia, conforme iam crescendo, se revelava neles o temperamento irascível de Fernando.
Para corrigir, quanto possível, o caráter que começava a revelar-se por estas prematuras manifestações nas duas crianças, Rita, na oração, encomendava a Deus a sorte futura dos filhinhos com palavras repassadas de piedade cristã. Incutia em seus tenros corações o amor a Jesus e a Maria, o respeito e veneração devidos ao santo nome de Deus, a tantas outras coisas que somente é capaz de sentir e expressar o coração de mãe inflamado no amor divino.
Cumpria, pois, Rita com perfeição os deveres duma santa mãe no cuidado e vigilância para com os filhos. Entre afagos e beijos procurava incutir-lhes o amor de Deus e a prática da virtude, para que esta facilitasse à natureza o caminho do bem e a aversão do mal. Servia-se de santas indústrias para mover o coração dos filhos à prática do bem, sendo ela a primeira a lhes dar o exemplo.
Sempre carinhosa, falava-lhes com meiguice, corrigia-os e castigava com brandura para os manter na obediência e santo temor de Deus, que é o fundamento solido para a fiel observância da lei divina. Exortava-os com o exemplo; de modo que, quando chegaram a compreender as coisas, vendo os filhos o exemplo de uma mãe tão devotada à oração, tão mortificada e tão moderada nas palavras; tão caritativa como os pobres e compassiva com os necessitados; tão entretida freqüentemente em santos e devotos exercícios, procuravam não desgostá-la e imitá-la no que lhes era possível.
Assim ia cumprindo Rita os deveres da maternidade, e deste modo também devem procurar cumpri-los todas as mães.
Mas Rita não olhava só o presente fites os olhos no futuro dos filhos e também no do esposo, com que fé, e com que amor, manifestava ante Jesus crucificado suas mágoas e seus receios. Com o coração atribulado pela incerteza, quantas vezes diria, qual outra Ester ante o Rei Assuero :
...A mudança esperada não chegava: temendo perder os filhos para sempre, pelo caráter briguento e belicoso deles, com o coração penetrado da mais dilacerante dor e os olhos marejados de lágrimas, de joelhos diante de Jesus crucificado e com a abnegação mais sublime que se pôde imaginar na mãe, suplica-lhe que, ou mude a condição de seus filhos, fazendo-lhes esquecer os sentimentos de vingança, ou os leve deste mundo, antes de permitir que o ofendam.
Nesta oração Rita chegou ao cume do heroísmo, pois sendo mãe tão amorosa, o temor de perdê-los para sempre se sobrepôs a qualquer outro sentimento humano.
Tal sacrifício, desconhecido para a maioria das mães cristãs, só tem precedentes naquelas heroinas do Cristianismo que entregavam seus filhos ao martírio, para, em troco de breves sofrimentos e momentânea separação, melhor assegurar-lhes a vida do céu e gozar depois com eles da glória eterna.
Oh proeza do amor materno e da caridade de Deus! Só o Cristianismo pôde contar tão estupendos milagres da graça.
O Senhor misericordioso escutou as preces de Rita, e em menos de um ano morreram-lhe os dois filhos, antes que a malícia pervertesse seu entendimento, e os desejos de vingança se arraigassem no seu coração. Apesar de ter sido a súplica de Rita feita com uma abnegação sublimelugar inspirada pelo grande amor ao soberano Senhor de todo o criado, não pôde subtrair-se à dor dilacerante que em todas as mães produz a separação pela morte dos filhos, embora breve e com a esperança de juntar-se com eles depois de algum tempo.
Coração delicado e amante como o de Rita não podia deixar de sentir toda a mágoa produzida pela perda dos dois filhos, mas ao mesmo tempo considerava como um grande favor do céu ter livrado os filhos da morte da alma.
Por outro lado, a esperança de vê-los um dia na glória e gozar de suas companhias, consolava-a e dava-lhe forças para resistir a tão grande aflição rogando ao Senhor que aceitasse aquele sacrifício, que tanta admiração e assombro havia de causar às gerações futuras, e que fora unicamente feito por seu amor.
(P. José R. Cabezas da Ordem de S. Agostinho- Vida de Santa Rita de Cássia)
PS: Grifos meus