Monsenhor Francisco Pascucci, 1935, Doutrina Cristã,
tradução por Padre Armando Guerrazzi, 2.ª Edição, biblioteca Anchieta.
4.º
- EXERCÍCIO DAS VIRTUDES
TEOLOGAIS
Obrigação
e modo de exercer as virtudes teologais
66.
- Devemos fazer atos de fé, esperança e caridade, logo chegados ao uso da
razão, muitas vezes na vida, implicitamente nas obras de piedade e de religião,
nas tentações a vencer, quando houver importantes deveres cristãos a cumprir, e
nos perigos de morte.
É
bom fazer muitas vezes atos de fé, esperança e caridade, para conservarmos, aumentarmos
e fortalecermos essas virtudes. São verdadeiras partes vitais, isto é, órgãos necessários
à vida do homem espiritual, que vive segundo a razão e os ditames do Evangelho.
Devemos
fazer atos de fé, esperança e caridade com
o coração, isto é, com o afeto, - com
a boca, mediante as fórmulas propostas no catecismo ou em jaculatórias, - com as obras, dando prova dessas virtudes
em nosso procedimento.
Daremos
prova de fé, confessando-a e defendendo-a,
onde for mister, sem temor e sem respeito humano, e vivendo segundo as suas máximas.
Daremos
prova de esperança, não nos conturbando
ante as misérias e contrariedades da vida, nem sequer ante as perseguições, mas
vivendo resignados, seguros das promessas de Deus.
Daremos
prova de caridade para com Deus e para
com o próximo, observando os mandamentos
e praticando as obras de misericórdia
espiritual e corporal. E, se no-lo
reclamar o Senhor, daremos prova de maior amor a Ele, seguindo os conselhos evangélicos, isto é, as exportações que Jesus Cristo fez para a
consecução de uma vida mais perfeita, mediante a prática de virtudes não
mandadas, como a pobreza voluntária, a castidade perpétua e a perfeita obediência.
5.
- VIRTUDES MORAIS
Definição
67.
- Virtude moral é o hábito de se
fazer o bem adquirido pela repetição de atos bons.
As
virtudes morais têm por objeto imediato os nossos bons costumes e não se
referem a Deus, senão indiretamente.
Foram
conhecidas e praticadas, como naturais, também pelos filósofos pagãos; nos cristãos,
elas se tornaram sobrenaturais, porque fortificadas pela graça.
As
virtudes morais são numerosas, mas podem reduzir-se a quatro principais, que
são um como sustentáculo ou gonzo (cardo)
sobre que giram as outras.
Daí
lhes vem o nome de cardeais. São a prudência,
a justiça, a fortaleza e a temperança.
As duas primeiras nos indicam o bem a realizar; as outras duas nos ensinam a
vencer as dificuldades e a resistir ao que nos seduz ao mal.
A
prudência é a virtude que dirige
todas as nossas ações, fazendo-nos conhecer se realmente são boas ou
convenientes e que meios bons, convenientes e suficientes, devemos escolher
para exercê-la.
A
justiça é a virtude que nos faz
render a cada um o que lhe é devido; em primeiro lugar, o que é devido a Deus
pela virtude da religião, e depois o
que é devido a nós e ao próximo.
A
fortaleza é a virtude que nos faz afrontar
sem temeridade e sem timidez qualquer dificuldade ou perigo, até a própria
morte, pelo serviço de Deus e pelo bem do próximo.
A
temperança é a virtude que refreia as
paixões e os desejos, especialmente sensuais, e modera o uso dos bens sensíveis.
Jesus Cristo nos recomendou em particular algumas virtudes morais, chamando,
nas oito bem-aventuranças evangélicas,
bem-aventurado aquele que as exercita (Mat. V, 1-12.)
II.
- DO VÍCIO
Paixões
e Vícios
68.
- Paixões são comoções ou movimentos violentos
da alma. De per si, não são nem más nem boas; mas tornam-se boas ou más
conforme o uso que faz, delas, a vontade ou conforme o fim a que são dirigidas.
Donde,
se a vontade livre dirige essas paixões e inclinações segundo a lei de Deus,
opera o bem; se contra a lei de Deus, comete pecado, isto é, faz um ato mal. Quando os atos maus se repetem, de
modo a adquirir-se o hábito de praticar o mal, tem-se o vício. O vício é, pois, o
hábito de se fazer o mal, adquirido pela repetição de atos maus.
Vícios
capitais
69
- Os vícios principais são sete e se chamam capitais por serem cabeça e origem
dos demais vícios.
1.º-
Soberba, estima e amor desordenado da
própria excelência. Dela nascem a ambição, a vanglória a desobediência, a obstinação,
etc.
A
ela se opõe a humildade.
2.º-
Avareza, amor desordenado dos bens
terrenos. Dela nascem a dureza do coração, a fraude, a violência, etc.
A
ela se opõe a liberalidade.
3.º-
Luxúria, amor desordenado dos
prazeres dos sentidos. É causa da cegueira da inteligência, da perda da fé, da
ruína da saúde e da família, etc.
Opõe-se-lhe
a castidade.
4.º-
Ira, desordenado movimento da alma em
rejeitar o que quer que nos fira, com desejo de vingança. Provoca os litígios, as
contumelias, as. rixas e conduz a graves delitos.
É-lhe
oposta a paciência.
5.º-
Gula, desordenado amor dos alimentos
e bebidas. Gera a embriaguez, a impureza, etc.
É sua contrária a sobriedade.
6.º-
Inveja, tristeza do bem alheio ou
alegria pelo mal de outrem. Produz a rivalidade, maledicências, etc.
Opõe-se-lhe
o amor fraterno.
7.º-
Acídia ou preguiça, desordenado amor ao descanso e consequente negligência em
cumprir os seus deveres, especialmente os espirituais.
A
ela se opõe a diligência no serviço
de Deus.
PARTE
III
A
GRAÇA
Definição
1.º-
Deus, na Sua infinita bondade, deu ao homem um fim sobrenatural a conseguir, destinando-o
a ver e a gozar eternamente de Deus, infinito Bem.
Para
obter esse fim, não eram suficientes as forças naturais do homem: por isso, deu
também aos homens uma energia proporcionada, com que pudessem realizar obras de
bondade mais elevada, que a bondade natural, e obras tais de serem dignas do prêmio
eterno. Essa energia sobrenatural chama-se a graça.
Por
"graça", pois, entendemos,
em geral, qualquer dom de Deus em ordem à
vida eterna. Dom, não prêmio, para excluir assim qualquer
direito por parte nossa.
Graça
atual e habitual ou santificante
2.
- Há duas espécies de graça: atual e habitual. Diz-se graça atual qualquer auxílio que Deus nos
concede para praticar uma ação meritória do prêmio eterno: assim por ex. a
graça de rezar bem, a graça de suportar pacientemente uma enfermidade, uma
desgraça, etc. A graça atual é sempre necessária a todos e a cada um dos atos, ordenados
de qualquer forma à vida eterna; e é necessária de tal modo, que, sem ela, é impossível
um só ato salutar, ainda que seja o pensamento, o desejo e o começo do mesmo, segundo
no-lo ensinou Jesus Cristo: "sem mim nada podeis fazer". (Jo. XV, 5.)
Todavia,
a graça não ofende nem diminui a nossa liberdade, como o definiu o Concílio de
Trento.
Deus,
que a todos quer salvos, concede-nos a cada um a graça suficiente. A graça, que se une ao livre consentimento e
consegue o fim para o qual Deus a concedeu, diz-se graça eficaz.
A
graça atual chama-se preveniente, se
vem antes de qualquer desejo nosso, esforço ou ato; cooperante ou concomitante,
se acompanha ou sustem o ato bom que despertou em nós; perficiente, se acompanha o ato até à sua realização.
A
graça habitual, chamada também santificante, é aquele dom sobrenatural
de Deus, inerente á nossa alma, e por isso habitual, que nos torna santos, isto
é, justos, filhos adotivos de Deus, irmãos de Jesus Cristo e herdeiros do Céu.
Diz-se habitual, porque destinada, por si, a ficar na alma, enquanto não nos
alongarmos dela, como em nós fica um vestido, enquanto não o tiramos. Ela é,
pois, a vida sobrenatural da alma.
A
graça santificante recebe-se no santo Batismo; perde-se com qualquer pecado
mortal; readquire-se com a Penitência ou com um ato de dor perfeita, unido ao propósito
de confessar-se: aumenta com os demais sacramentos.
Mérito
3.
- As nossas boas obras feitas com o auxílio da graça são meritórias. O mérito não pode derivar senão da promessa de Deus, que, fidelíssimo, sabe
manter o que prometeu.
Por
mérito entende-se a consequência do ato
virtuoso, realizado com o socorro da graça, em virtude do fim sobrenatural, que
torna o próprio ato digno de recompensa eterna. Há mérito de justiça, quando, por força de promessa
de Deus, o prêmio é devido por estrita justiça; e mérito de conveniência, quando é devido, não por
justiça, mas somente por uma certa conveniência.
No
mérito de justiça, requer-se, por parte de Deus, a promessa e o socorro da
graça; por parte do homem, o estado de graça e o oferecimento da obra a Deus,
com reta intenção. É de fé que o justo pode merecer de justiça o aumento da graça santificante e o aumento de glória.
No
mérito de conveniência, requer-se que a boa obra seja feita para agradar a Deus
e conseguir-se a própria salvação. O justo pode merecer de conveniência a graça
eficaz para conservar e acrescer a graça santificante, assim como para vencer
as tentações; pode ainda merecer de conveniência a perseverança final, as
graças para os outros e os próprios bens temporais. O pecador pode merecer de conveniência
a conversão.
A
grandeza do mérito deriva da dignidade e santidade da pessoa, da excelência e dificuldade
da obra e da perfeição com que se opera. Os atos mais indiferentes podem
tornar-se meritórios.
Meios
da graça
4.
- Os meios com que podemos ter de Deus o dom preciosíssimo da graça são os Sacramentos, que a produzem, e a Oração, que no-la impetra do Senhor.