Monsenhor Francisco Pascucci, 1935, Doutrina Cristã,
tradução por Padre Armando Guerrazzi, 2.ª Edição, biblioteca Anchieta.
I. - DAS VIRTUDES EM GERAL
Definição
e divisões
58. - A virtude é uma disposição constante da alma para se fazer o bem.
Em si a palavra significa força, energia,
e indica assim qualidade do ato, que se requer da vontade para se conseguir
fazer o bem, vencendo-se os obstáculos interpostos pelas paixões. Quando esse ato
da vontade se repete com firme perseverança e constitui um hábito, assume então
o nome de virtude.
As virtudes se dividem:
1.º- Em naturais ou humanas,
praticadas segundo o lume da razão, com as únicas forças naturais e em vista de
um bem natural; sobrenaturais ou cristãs, praticadas com o auxílio da
graça, por motivos de fé em vista de um bem sobrenatural;
2.º- em adquiridas, se conseguidas por nós com repetição de atos bons; infusas, se postas em nós por Deus,
quando infundiu a graça em nossa alma;
3.º - em teologais ou divinas, que
têm a Deus por objeto e motivo imediato; morais,
que regulam o nosso procedimento em relação a nós e ao próximo e se referem a
Deus indiretamente.
As teologais são sempre
sobrenaturais e infusas; as morais podem ser naturais e adquiridas ou também
infusas e sobrenaturais.
As
virtudes próprias do cristão
59 - As virtudes próprias do cristão,
isto é, que somente se encontram no cristão, são as virtudes sobrenaturais e
especialmente as teologais ou divinas, a saber: fé, esperança e caridade.
Têm estas a Deus por objeto imediato, pois crê em Deus,
espera em Deus, ama a Deus; têm, além disso, a Deus por motivo imediato, pois crê-se em Deus, porque é veraz, - espera-se
em Deus, porque é misericordioso, - ama-se a Deus, porque é bom.
As virtudes teologais, recebemo-las
de Deus juntamente com a graça santificante; são-nos infusas pelo santo Batismo
ou pela Penitência, ou pelo ato perfeito de caridade; e aumentam, com a graça,
recebendo-se os sacramentos dos vivos. Devemos, porém, exercitá-las
repetindo-lhes os atos, com auxílio da graça.
Das três virtudes teologais, a mais
excelente é a caridade:
1.º- porque inseparável da graça santificante,
enquanto a fé e a esperança se encontram também num pecador;
2.º - porque nos une inteiramente a
Deus e ao próximo;
3.º- porque nos move a observar a
lei e a fazer o bem;
4.º- porque não cessam, por
sucederam à fé a visão e à esperança a posse.
II-
DAS VIRTUDES EM PARTICULAR
1.º
- A FÉ
Definição
60. - A fé é a virtude sobrenatural
por meio da qual cremos na autoridade infalível de Deus, o que Ele revelou e
nos propõe a crer por intermédio da Igreja.
A fé, portanto, é uma virtude
sobrenatural, infusa por Deus em nossa alma. Leva-nos a ter por verdadeiras as
verdades reveladas, não porque as compreendamos com a nossa mente, mas porque
Deus, verdade infalível, as revelou à Santa Igreja e por meio dela as revela a
nós.
Necessidade
61. - A Fé é necessária de necessidade de meio para nos salvar.
"Sem a fé é impossível agradar a Deus". (Hebr. XI, 6.) Aquele que
crer e for batizado será salvo; o que, porém, não crer será condenado".
(Marc. XVI, 16.)
Aos que têm o uso da razão não lhes
basta crerem em geral em todas as verdades, falando: Eu creio em tudo quanto a
Igreja me propõe a crer.
Há algumas verdades que devem ser
cridas com ato explícito e particular, para nos salvarmos; e são precisamente
os dois mistérios principais da fé: - que Deus existe e que é remunerador dos
bons e justo punidor dos maus.
Pecados
contra a Fé
62. - Peca-se contra a fé:
a) com a heresia, quando obstinadamente se nega qualquer verdade;
b) com a apostasia, com o renunciar à fé já professada;
c) com a dúvida voluntária;
d) com a superstição, o indiferentismo,
o respeito humano, etc.
2.°
- ESPERANÇA
Definição
63. - A Esperança é a virtude
sobrenatural, por meio da qual confiamos em Deus e d’Ele aguardamos a vida
eterna e as graças necessárias para merecê-las, cá na terra, com as boas obras.
De Deus esperamos a vida eterna, que
devemos merecê-las com as boas obras. Não podem estas ser praticadas sem o dom
da graça.
Nossa esperança funda-se na bondade de Deus, que nos quer salvar; na
fidelidade de Deus, que no-lo
prometeu e manterá Sua promessa; na onipotência
de Deus, que pode cabalmente mantê-la.
Quem desconfia ou duvida e quem
desespera, isto é, absolutamente crê que Deus não o ajuda, ofende sumamente a
Deus.
Nossa esperança deve ser viva, ativa
e prudente, sem pretender tudo por parte de Deus; mas fazer o que podemos,
recordando que Deus não manda coisas impossíveis, e, ao dar-nos ordens, nos
adverte a fazer o que podemos, a pedir-Lhe o que não podemos, e nos auxilia
para que o possamos fazer.
Pecados
contra a Esperança
64. - Peca-se contra a esperança:
a) com a presunção, isto é, com a temerária confiança de obter a vida eterna
sem as boas obras;
b) com o desespero, isto é, desconfiando de obter o céu, porque julga não
conseguir o perdão dos pecados e estar, de Deus, abandonado.
3.°
- CARIDADE
Definição
65. - A caridade é a virtude
sobrenatural, pela qual amamos a Deus, em Si mesmo, sobre todas as coisas, e ao
próximo, como a nós mesmos, por amor de Deus.
Devemos amar a Deus em Si mesmo, sobre
todas as coisas, como sumo Bem, fonte de todo bem nosso: - é a caridade perfeita; amá-lO pelos
benefícios que reparte: - é a caridade
imperfeita.
O amor, que devemos ao próximo, deve
ser sobrenatural, isto é, por amor de
Deus, e não por motivos naturais; pelo que importa ser universal, amando-se a
todos os homens, até aos nossos inimigos, como no-lo ensinou Jesus Cristo com
as Suas palavras e exemplos; deve ser interno,
isto é, sincero, - justo, ajudando-o
no bem, e efetivo, com fatos e não
com palavras apenas.
A virtude da caridade perde-se com
qualquer pecado mortal: readquire-se com a confissão e com a dor perfeita.