terça-feira, 19 de março de 2013

Amor do Próximo (Primeira parte)

Nota do blogue: Acompanhar esse Especial AQUI.

Cônego Júlio Antônio dos Santos
O Crucifixo, meu livro de estudos - 1950

3. - Amor do Próximo

            Quem é o meu próximo?
            - À luz da razão, diz Longhaye, o meu próximo são homens, homens iguais a mim, inferiores a mim, desiguais entre si.
            1.°- O meu próximo são homens com quem tenho de viver. - Tenho atenções com eles para que eles as tenham comigo, respeito-os para que eles me respeitem, suporto as suas faltas para que eles suportem as minhas, ajudo-os para que eles me ajudem. Há aqui uma solidariedade, uma harmonia puramente natural e habilmente mantida.
            2.°- O meu próximo são homens iguais a mim. - Perante eles é justo que eu me mantenha no meu lugar, que defenda os meus direitos e exija o que me é devido; por mim, também lhes não regateio o que lhes pertence.
            Há aqui uma vida de equilíbrio sustentada pelo egoísmo e por interesses mútuos.
           3.°- O meu próximo são homens inferiores a mim. - Aprecio-os relativamente à minha pessoa e às minhas funções. Considero-os inferiores a mim, portanto, devo sacrificá-los a mim em vez de me sacrificar por eles. Há aqui amor próprio, puro egoísmo - razão de todas as ofensas para com o próximo.
           4.°- O meu próximo são homens desiguais entre si. - São homens desiguais no espírito, no caráter, naturezas simpáticas ou antipáticas à minha. Em virtude disto tenho preferências: escolho, atraio, repito; tenho, pois, amigos, indiferentes e adversários, e, talvez possa dizer, inimigos.    
            À luz da fé, de uma fé viva, atual, presente, diz ainda Longhaye, eu vejo o meu próximo de uma maneira muito diferente.
            O meu próximo são todos os homens:
            1.°- Meus irmãos em Jesus Cristo. Foi este irmão mais velho que nos adquiriu o título e a qualidade real de filhos de Deus para conosco, diz São João, somos chamados e somos realmente filhos de Deus.
            2.°- Jesus Cristo em pessoa. Sim, todos os cristãos, sem distinção, são realmente e praticamente Jesus Cristo em pessoa. Isto não é uma piedosa crença, é uma verdade pura, escrita pela mão divina. Tudo o que fizestes a um dos meus irmãos mais humilde a mim o fizestes. O que não fizestes a um dos mais pequenos, foi o mesmo que recusá-lo a mim.(Mat. XXV, 40, 45).

I - Natureza do amor do próximo


            1 - Essência do amor do próximo
            Esta identidade moral - meus irmãos e Jesus Cristo - constitui a essência da minha caridade. A caridade para com o próximo é uma virtude sobrenatural e teologal, porque o homem pode e deve ser objeto de um amor teologal isto é, divino. O amor com que nós amamos o próximo, diz Santo Tomás, é da mesma espécie daquele com que amamos a Deus, porque o homem é uma realidade divina, isto é, pela graça, é membro do corpo místico de Cristo, é um outro Jesus Cristo.
            2 - Princípio do amor do próximo
            O princípio teologal da caridade para com próximo é o Espírito Santo. - Para amar como convém uma realidade divina é preciso uma potência divina. É Cristo, a realidade que a caridade ama no próximo. E qual é a potência divina para amar? É o Espírito Santo. Deus, diz São Paulo, derrama o Seu Espírito nos nossos corações afim de que nós amemos sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos. (Rom. V, 5).
            A caridade em nós é uma coisa criada, ama qualidade divina na nossa alma, mas, na sua origem, é a Caridade incriada. Entre o Espírito Santo e a alma justa não há qualquer substância intermediária. A caridade é um dom, o Espírito Santo é o doador. Mas aqui o doador e dom nem estão separados nem são separáveis. “Da mesma maneira que o corpo não tem outro principio de vida que o espírito que o anima; do mesmo modo o coração humano não tira a sua vida, isto é, o seu amor senão do Espírito que está nele.”
            3 - Fim do amor do próximo
            O fim da caridade é Deus Pai, fim supremo de todas as coisas e mesmo de Jesus Cristo. Se me tendes amor, diz Jesus Cristo, deveis alegrar-vos quando vos digo que vou morrer, porque vou para meu Pai e meu Pai é mais do que eu. (Jo. XIV, 28), “Tudo é para vós, diz São Paulo e vós sois para Cristo e Cristo para Deus.” (Cor. III, 23).
            4 - Mérito do amor para com o próximo
            Esta identidade moral - meus irmãos e Jesus Cristo - dá o mérito à minha caridade.  “Mihi fecistis, a mim o fízestes.”
            Como a essência da caridade consiste nisto, também daqui vem todo o mérito. Se eu amo o meu irmão por si mesmo, então que ele me recompense! Jesus Cristo não me deve nada.
            5 - Excelência do amor do próximo
            Que coisa mais excelente e encantadora pode haver do que ver, saudar, amar e servir a Jesus Cristo, a Deus, em cada um dos meus irmãos? É um paraíso antecipado!

II - Motivos do amor do próximo

            Porque devemos amar o nosso próximo? Ouçamos a voz da natureza, a voz de Jesus Cristo, a voz da graça,
            1 - A voz da natureza a respeito da nossa origem
            Somos todos irmãos. Temos o mesmo Pai celeste que é Deus. Somos formados dos mesmos elementos: De um corpo tirado da terra e de uma alma criada à imagem e semelhança de Deus. O mesmo ar nos vivifica, o mesmo sol nos dá luz e calor, a mesma terra nos sustenta e nos alimenta.
            Somos filhos do primeiro par Adão e Eva. Formamos, pois, uma grande família, e, por isso, o nosso amor deve ser fraternal, devemos amar-nos como irmãos.
            2 - A voz da natureza a respeito do nosso destino
            Todos somos destinados a uma felicidade perfeita e eterna, no Céu.
            Todos os homens devem habitar junto no mais magnífico dos Pais. São João Evangelista diz: “Eu vi uma grande multidão, que ninguém podia contar, de todas as nações, tribos, povos e línguas que estavam em pé diante do trono, à vista do Cordeiro.” Aí se realiza esta palavra do Salmista : - Ecce quam bonum et quam jucundum habitare fratres in unum! Que felicidade e alegria viverem todos os irmãos juntos! Porque não havemos de imitar na terra a vida dos bem-aventurados no Céu? Quem não quer viver em união com o seu próximo neste mundo, não pode ir viver com ele na Bem-aventurança eterna.
            3 - A voz de Jesus Cristo
            Um dia um doutor da Lei perguntou ao divino Mestre qual era o maior preceito da Lei. E foi-lhe respondido: - Amarás ao Senhor, teu Deus, de todo o teu coração; eis o primeiro e maior dos mandamentos. Mas há um segundo mandamento semelhante ao primeiro: - Amarás o teu próximo como a ti mesmo.
            Convém notar que Jesus Cristo faz do amor do próximo: - 1.º- O preceito por excelência: Dou-vos um mandamento novo: “Amai-vos uns aos outros assim como eu vos amei.” – 2.º- O preceito mais importante: Declara pela boca do Apóstolo São Paulo: - Acima de tudo haja entre vós a Caridade. (Col. III, 14). - 3.º- O sinal essencial para reconhecer os seus discípulos: reconhecerão que sois meus discípulos se vos amardes uns aos outros. (Jo. XIII, 35).
            4- A voz da graça
            Pela graça somos todos membros do mesmo corpo de que Jesus Cristo é a cabeça. Unum corpus sumus in Christo - Formamos um só corpo com Jesus Cristo. Ora vejamos na ordem natural, o amor terno compassivo que os membros do mesmo corpo têm uns pelos outros.
            Se um dos membros sofre todos os outros se ressentem e procuram socorrê-lo. Mete-se um espinho num pé. O dorso curva-se, os olhos procuram-no e a mão trata de arrancá-lo.