terça-feira, 9 de novembro de 2010

O desejo de passar a novas núpcias

O DESEJO DE PASSAR A NOVAS NÚPCIAS


Uma das principais causas do divórcio, embora se não ouse confessá-la, é o desejo de passar a novas núpcias e dali provém toda aquela retórica dos seus propagadores, nos comícios, na imprensa, como nas câmaras governamentais.

É um absurdo, um contra-senso, pois não há, nem pode haver novas núpcias, enquanto sobreviverem os cônjuges; contra a lei de Deus, não há apelação.

Por novas núpcias entende-se, no caso, o simples cumprimento de uma formalidade civil, sem valor algum, porquanto os homens, ainda que sejam governos, não têm competência para declarar casados aqueles que Deus declara simplesmente adúlteros.

A autoridade civil, como o seu pretendido divórcio, apenas coopera para que os contraentes se coloquem e permaneçam em estado de pecado mortal, ou, o que vem a dar no mesmo, de condenação eterna; favorece o escândalo público e concorre poderosamente para a destruição e desmoralização da família. É um dever que assiste a todos, o de combater sem tréguas qualquer disposição favorável ao divórcio, venha ela donde vier.

Ouçamos a palavra autorizada de Leão XIII aos italianos, quando, nas câmaras se discutia o projeto do divórcio:

"Qualquer lei que venha implantar o divórcio é ilegítima, injusta e gravemente injuriosa a Deus, Criador e Soberano Legislador; dará origem a um adultério; a um casamento, nunca. O que agrava ainda mais a falta, é que, pretender circunscrever o divórcio nos limites de antemão previstos, é uma empresa mais difícil que extinguir, em pleno incêndio, as chamas das mais violentas paixões. A Igreja absolutamente não dorme, não fechará os olhos, não descansará, não suportará resignada a injúria arrogada a Deus e a ela mesma. Com efeito, esse ultraje será a origem de males incalculáveis de toda espécie e por isso mesmo, aqueles próprios que não admitem a Religião Católica em todos os pontos e quiçá em nenhum, em grande parte, ao menos, lutam com zelo e pleno conhecimento de causa por assegurar ao matrimônio indissolubilidade do vínculo conjugal e, com isso, nada mais fazem que zelar pelos interesses públicos. Na verdade, uma vez sancionada a lei que permite romper o vínculo conjugal, o matrimônio perde toda a sua estabilidade e firmeza e, em forte declive, leva a todos aqueles males que nós mesmos, em outro lugar, lamentávamos: o amor aferrece de parte em parte, nascem as mais funestas instigações à infidelidade, periga a salvação e a educação dos filhos, germinam as discórdias no lar, convulsiona-se a família toda e avilta-se a condição da mulher".

Aqueles mesmo que requerem o divórcio, ou os que, na falta de motivos suficientes para chegar ao mesmo resultado desonesto e antisocial, inventam mil pretextos ridículos para alcançá-lo, não ignoram quanto tem de baixo e perverso o seu procedimento,

Na América do Norte, divorciam-se os casais com a mesma finalidade com que se muda de camisa.

Existem em S. Francisco a "Sociedade dos Divorciados", onde, como o nome indica, só se admitem como sócios, os homens que foram mal sucedidos no matrimônio. Lá foi um jornalista americano colher dados e, dirigindo-se ao secretário, obteve as seguintes informações:

"O senhor bem sabe quanto o casamento é coisa aleatória em toda parte, mas, na América do Norte, o abuso do divórcio tornou-o excepcionalmente difícil. As americanas não têm nenhuma paciência, desde que se lhes colocou o divórcio ao alcance de qualquer pretexto. Temos aqui um homem excelente, repudiado por sua mulher, porque fumava; o fundador da nossa sociedade caiu no desagrado da esposa, porque sonhava alto; o nosso administrador, um perfeito "gentleman", passou pelo desgosto de ver a mulher pedir o divórcio, porque lhe havia feito algumas observações acerca dos exagerados gastos em "toilettes". Sócios há que se viram abandonados só porque se negavam a levar as esposas ao teatro, porque não quiseram ir jantar em casa dos sogros mais que uma vez por semana, ou porque não suportavam cachorros em casa. Outros ainda, viram seu lar destruído, em consequência uma discussão política, literária ou artística, ou por uma simples divergência sobre o modo de preparar um prato".

Claro está, tudo isso não passa de meros pretextos, para novas núpcias. Não ousam confessar publicamente seus miseráveis e criminosos intuitos, mas empenhados em consegui-los a todo transe, usam da mais refinada hipocrisia; verdadeiros sepulcros caiados, exteriormente polidos, mas, na realidade vasos de corrupção moral. Divorciam-se, porém, com jeito, de modo a não perderem o prestígio e continuarem  fazer parte da melhor sociedade!

Os partidários do divórcio, para poderem continuar com o bom nome de que fazem alarde, levantam ou inventam um escândalo, que lhes venha encobrir os criminosos desígnios. O Bispo de Rochester, no Parlamento inglês, afirmava que, em noventa e nove por cento dos crimes de sedução, o sedutor nada mais faz do que fornecer ao marido as provas da infidelidade da esposa, com o fim único de obter o divórcio.

Durante o mês de fevereiro de 1904, o tribunal de Louvain condenou um indivíduo que preparara um encontro entre a própria esposa e um desconhecido, à cata de um pretexto para obter o divórcio. A pobre mulher e o desconhecido limitaram-se a um simples cumprimento de cortesia, admirados, um e outro, de se encontrarem naquele lugar, tão inesperadamente. O marido, que queria a todo transe o divórcio, colocara-se de emboscada e, no momento oportuno, atirou-se sobre os inocentes, armando um escândalo e intentando, em seguida, uma ação de divórcio!

Os apologistas do divórcio, facilmente concordam em receber um "sacramento leigo" e não se lhes dá de viverem em permanente adultério, à sombra da lei; mas, nem por isso deixam de conhecer quanto o seu procedimento é abominável e criminoso perante a mulher e os filhos e, daí, esse empenho, que pagariam a bom preço, à procura de motivos mais ou menos plausíveis que lhes justifiquem o crime, ao menos na aparência.

É preciso, portanto, proclamar bem alto que, os que requerem o divórcio ou habilmente forgicam pretextos nesse intuito, não passam de reles farsistas, pelos ardis imoralíssimos a que recorrem.

Casaram sem nenhuma consideração para com aquela que teve a suprema desgraça de confiar-lhes o seu destino e são em tal grau egoístas, que não buscam no casamento mais que o próprio prazer, ainda que seja à custa da desgraça da mulher e dos filhos. Pedem o divórcio, às mais das vezes, por motivos inconfessáveis: as paixões, as esperanças de maiores vantagens friamente calculadas ou a sensualidade infrene, são as causas de um divórcio que virá arruinar e destruir a família, aliás distinta.

Muitos "moralistas" modernos, desses que se arrogam o encargo de defenderem a liberdade humana, nos comícios, inimigos de qualquer sujeição, não passam de egoístas refinados, sem compaixão nem piedade. Elevam às nuvens os defensores da lei iníqua do divórcio que condena suas vítimas à imoralidade, à opressão e à mais triste e vergonhosa miséria.

Diante desse procedimento, eu me pergunto: que confiança poderão depositar as esposas em semelhantes maridos? Claro está que hão de fazer eles mesmos aquilo que aprovam nos demais e, si se casarem, mais tarde, com os compromissos assumidos. E sabe Deus se já não estão procedendo como se esse compromisso não existissem!

Oh! desconfiai dos apologistas do divórcio e de falsos princípios sobre que baseiam um utilitarismo e uma moral sem vergonha. Desconfiai e desconfia muito deles. Infeliz da mulher de um apologista do divórcio; em seu lar não viverão muito tempo o afeto e a fidelidade e não vem longe o naufrágio, em que ela e os filhos se hão de ver, de um momento para outro, sem marido e sem pai.

Raça infame e demolidora da ordem social, escandalosa, algozes da mulher e dos filhos, hipócritas refinados e fariseus da pior espécie, vossa campanha é mais que satânica. Refocilai na lama e afogai-vos no lodo. Um egoísmo disfarçado e um sensualismo grosseiro extinguiram em vós o que havia de humano, para vos deixar apenas o que há de animal. Repelis a vossa legítima esposa e abandonai-la sem recursos; não vos comove a triste sorte dos filhos e só uma coisa vos prende a atenção: uma mulher infame como vós, sem coração, sem entranhas, sem honra e sem vergonha.

Uma mulher, por pouco que se respeite e saiba avaliar um amor sincero, nunca aceitará a mão de um divorciado. Nenhuma sociedade medianamente honesta, quererá admitir tais pessoas em seu grêmio; devem ser tratados como verdadeiros leprosos, cujo contato é perigoso e merecem a repulsão de todos. Nenhuma diferença existe entre um divorciado de mãos calejadas e outro de mãos lisas e fidalgas com luvas de peliça. Tanto vale um como o outro e ambos não valem nada.

Que direi do triste estado de alma de qualquer infeliz que haja, com seu voto ou de qualquer modo auxiliado os infames defensores do amor livre e do divórcio?

Fala-se muitas vezes no bom senso político e, graças a Deus, esse bom senso ainda não está de todo extinto; ainda vive. Mas, quando contemplamos o arengar em público, nas câmaras, ou em particular, de certos indivíduos partidários impudentes do amor livre, é o caso de perguntar se o bom senso não está prestes a desaparecer. Quando verificamos que, em alguns países, certos homens sem moral, recolhem mais votos a favor do divórcio, do que os defensores da família e da honra, vemo-nos forçados a confessar que ainda há muita lama neste mundo e que, os que nela se chafurdam, não pensam em sair tão cedo da degradação por onde enveredaram.

Melhor as condições materiais da sociedade, bem está; muito mais urgente, porém, seria restituir às massas o bom senso cristão, indispensável a quem possui uma alma imortal. Sem esse trabalho, a que devem associar-se todos os homens de bem, ver-nos-emos afundar cada vez mais.

(As desavenças no lar, causas e remédios, J. Nysten, edição de 1927)

PS: Grifos meus.