domingo, 5 de dezembro de 2010

A boa educação

A BOA EDUCAÇÃO


Educar filhos! missão sublime, mas, ai, como é mal compreendida e, sobretudo, mal estudada! Educar (do latim educere) significa elevar, fazer subir a uma altura que fica pouco abaixo dos anjos, aqueles pequeninos entes que Deus confiou aos pais como um depósito sagrado. Ora, isso representa um trabalho de todos os dias, de todos os momentos, um trabalho por vezes aborrecido, enfadonho, extenuante; requer mais: um tino muito especial, sacrifícios e abnegações bem difíceis e uma vigilância de todos os dias, de todas as horas.

Nosso Senhor tem ameaças terríveis para qualquer que dê escândalo; que se há de dizer dos pais que dão maus exemplos aos filhos? Desgraçados deles! Não esqueçam nunca que aqueles pequeninos olhos e ouvidos estão sempre se atalaia. Evitem, portanto, qualquer palavra ou conversação, qualquer coisa enfim que lhes venha empanar a candura da alma inocente.

Quem poderá avaliar, diz um autor, a influência que podem ter, na perdição de uma moça de vinte e cinco anos, as conversações que ela surpreendeu quando pequenina, de vestidinho curto! Costuma-se dizer que as conversações entram por um ouvido e saem pelo outro, mas não se repara que, entre um e outro ouvido, está o coração alerta. É lei da natureza, escreve um pagão: os maus exemplos domésticos corrompem mais depressa e são mais eficazes que quaisquer outros, pela grande autoridade de que se revestem. Grave-se bem na memória e nunca se perca de vista, que aos filhos se lhes deve um grande respeito. Pai de família se cavilais alguma desonestidade, lembrai-vos dos vossos filhos, tão pequeninos ainda e, na tentação, detende-vos ante a lembrança desses anjinhos. Miserável, receais que o amigo que vos vem visitar encontre a casa desasseada e em desordem e esqueceis que vossos filhos não devem respirar senão um ambiente puro, em um lar sem mancha nem vícios!

Admiravelmente dito por certo; a graça, porém, fala ainda mais alto e melhor que a sabedoria humana aos corações dos pais cristãos que se respeitem; para eles o filho é muito mais do que um simples herdeiro das qualidades e do sangue que lhes transmitiram; é, antes de tudo, o herdeiro do céu, onde não entra nada manchado, e co-herdeiro dos anjos que vêm a Deus face a face e denunciam à justiça divina os corruptores da inocência; é um ser por tal forma sagrado que nenhum mal se pode praticar em sua presença, sem incorrer na maldição divina. "Ai de vós, exclama Jesus Cristo, o eterno amigo das crianças, ai, dos que escandalizam um destes pequeninos; melhor lhes fora atarem uma pedra ao pescoço e precipitarem-se no fundo do mar."

Alguém já disse, com muito acerto, referindo-se a educação das crianças: "Vigiai-lhes o despontar da vida porque aqui tudo depende do começo; será um mau dia, se for sombria a aurora e amargo o fruto da flor contaminada; turva-se a água de um arroio em lhe remexendo a fonte; enfim, toda a vida do homem se ressentirá do berço".

É verdade que a Igreja elevou à criança a sublime altura de filho de Deus pelo batismo; mas, a chaga purulenta da concupiscência não cicatriza nunca, e lá fica no fundo dessa alminha, apesar de purificada pelo sacramento. A concupsciência desenvolver-se-á nela com a idade, procurando sempre subtraí-la ao benefício influxo da graça, tentando arrastá-la para o lodo. As conseqüências do pecado original lá estão e lá ficam como germe de decomposição e de morte, sempre em luta com aquele outro princípio de divina beleza e vigor; sempre a advogar a usurpação do corpo e da matéria contra os direitos sagrados da razão iluminada pela fé; sempre em brecha na defesa de um moral independente, a provocar a revolta contra qualquer autoridade, por legítima e sagrada que seja. A concupiscência revolta-se contra tudo quanto lhe venha contrariar as aspirações criminosas e não descansará nem será vencida definitivamente, senão com a morte dos que ela atormenta. Enquanto isso, preciso será educar e elevar continuamente a alma e libertá-la, quanto possível da tirania da carne.

Trata-se, portanto, de combater as más inclinações que se manifestam na criança, de empregar meios eficazes de armar estas pequeninas almas para a luta renhida e prolongada que vai começar; é questão que os pais devem tomar muito a peito se tiverem em alguma conta a felicidade temporal e eterna dos filhos. Quer eles abracem mais tarde a vida religiosa ou o sacerdócio, quer se destinem ao matrimônio, se não estiverem suficientemente adestrados para vencer as dificuldades e tropeços que o demônio e a carne lhes preparam, serão sempre infelizes e não corresponderão ao que Deus espera deles.

Na vida conjugal, sobretudo, para viverem felizes ou, quando menos, resignados, são indispensáveis caracteres temperados nos sofrimentos e contrariedade de toda espécie, caracteres capazes de enfrentar todos os trabalhos, todos os contratempos, todos os infortúnios que possam aparecer; é necessário que disponham de uma energia a toda prova, no cumprimento do dever.

Ora, uma educação em que os caprichos se vêm sempre satisfeitos em lugar de reprimidos, uma educação em que predomina sempre a vontade da criança, a quem não se nega nenhum prazer e se transige sempre com as pequenas paixões em revolta, nunca dará homens de boa têmpera, de caráter firme, austeros, nunca dará mais que homens sem vontade para coisa alguma, incapazes de qualquer sacrifício nobre, vítimas desgraçadas do amor próprio.

É as mães que cabe, em primeira linha, este importante papel da educação religiosa e moral dos filhos, pois estes serão que fatalmente o que elas quiserem, mas quiserem verdadeiramente; e se algum dia vierem a se extraviar, a lembrança daquela mãe piedosa que os guiou com tanto amor, fá-los-á voltar ao bom caminho.

Como se hão de haver, pois, para premunir os filhos contra as más inclinações que se manifestam desde a primeira idade e se desenvolvem com o andar dos anos? Que fazer para educar essas alminhas e elevá-las de modo a fazê-las pairar sempre bem acima do lodaçal deste mundo, de seus encantos frívolos e passageiros?

Dar-lhe uma boa educação.

"Ah! como a educação cristã é grande e sublime, exclama Lamennais, e a que altura sabe elevar uma criança! É ela quem depõe naquela pequenina inteligência as verdades que fecundaram o gênio de Bossuet, a alma de Fenelon e produziram - oh! não o esqueçais, por favor! - as virtudes de um São Vicente de Paulo. Mas, que digo? Foi ela quem comunicou a estes homens admiráveis, espírito e força, é ela quem há de preparar uma sociedade mais perfeita para o dia de amanhã".

(As desavenças no lar, causas e remédios, J. Nysten, Centro da boa imprensa, 1927, com imprimatur)

PS: Grifos meus.