Por Pe. Peter R. Scott
Traduzido por Andrea Patrícia
O uso de tatuagens não é algo novo na história da humanidade. A destruição de um corpo é vista em muitas sociedades primitivas como um sinal de bravura e conquista, um verdadeiro sinal de honra.
A prática moderna de tatuagens é comparável a isso? Tatuagens estão sob a categoria de automutilação. A automutilação é certamente permissível quando realizada para o bem de todo o corpo, de acordo com o princípio da totalidade, que a parte é para o todo. Isso serve de base para a compreensão do sentido comum destas palavras do Senhor:
“Se teu olho direito é uma ocasião de pecado para ti, arranca-o e lança-o de ti, porque é melhor para ti que um dos teus membros se perca do que todo o teu corpo seja lançado no inferno”. (Mt. 5,29)
Consequentemente ninguém contesta a excisão de órgãos ou mutilação da aparência externa, que vem do tratamento de doenças graves e potencialmente fatais, como o câncer. Mas as tatuagens são uma desfiguração do corpo que não é dirigida a qualquer bem, seja do corpo ou da alma. É permitido realizar tal deformidade estética, sem qualquer finalidade objetiva, simplesmente porque se quer?
A moralidade depende da autoridade que um homem tem sobre o seu corpo. De acordo com a maneira moderna de pensar, um homem tem autoridade absoluta sobre seu corpo, para fazer com ele o que quiser. No entanto, tal não é o ensinamento da Igreja. Somos apenas administradores de nossos corpos, pois nós pertencemos a Deus Todo-Poderoso. O nosso domínio sobre o nosso corpo está limitado a usá-lo para o fim para o qual foi criado. Isto foi claramente ensinado pelo Papa Pio XI em sua encíclica sobre o casamento cristão, condenando a automutilação da esterilização:
“A doutrina cristã estabeleceu, e é de todo evidente pela luz da razão humana, que o homem não tem o direito de destruir ou mutilar seus membros ou torná-los de qualquer forma incapazes de alcançar sua finalidade natural”.
À objeção de que tatuagens não fazem mal para o funcionamento do corpo deve ser respondido que toda ação humana tem que ter um propósito, sobre o qual sua moralidade se baseia. Não existe ação indiferente na prática. Uma ação que não é boa é necessariamente má. Se não há propósito para uma tatuagem, então é no mínimo vaidade ou respeito humano, o desejo de chamar a atenção para si ou chocar os outros. Mas todos estes são motivos desordenados. Se tatuagem não é algo virtuoso e razoável, então é errado, ofensivo e pecaminoso. Este pecado pode ser venial se a tatuagem não é um ataque a Deus ou a religião, nem imoral em seu simbolismo, e se é feita por vaidade, por si só uma desordem venial. No entanto, pode ser mortal, se a tatuagem é uma blasfêmia ou irreligiosa, ou aplicada como um ataque direto ao domínio de Deus sobre o corpo.
Às vezes, é objetado que alguns católicos fervorosos têm se tatuado com cruzes e símbolos sagrados. Em tal caso, uma tatuagem pode ter como objetivo professar a fé e demonstrar exteriormente a sacralidade do corpo, consagrado a Deus Todo-Poderoso por meio do batismo. Assim, lemos na vida de Santa Joana Francisca Fremiot de Chantal que ela esculpiu o santíssimo nome de Jesus Cristo em seu peito com um ferro em brasa. No entanto, esta é a inspiração excepcional de uma santa. Em nosso tempo, muitas vezes esses símbolos são aplicados zombeteiramente, e são mais um sinal da profanação do templo de Deus que somos (I Coríntios 3,16-17) do que o contrário. Eles se referem a uma subcultura que é ateia e por vezes pagã. Eles são uma degradação do homem ao nível dos animais, que são marcados para que seus corpos tenham uma finalidade puramente utilitária.
Aqui reside a real moralidade das tatuagens. Elas são aplicadas em um espírito de rebelião e, geralmente, representam um aspecto ou outro dessa rebelião, muitas vezes impuro, bruto, violento, feio, assustador, repulsivo, se não francamente blasfemo e diabólico. É precisamente essa rebelião contra a ordem natural, essa rejeição da submissão do homem ao seu Criador, que é simbolizada pelas tatuagens, pelas quais o homem finge ter poder total sobre seu corpo, desfigurando o corpo que Deus, em sua bondade, deu a ele. É uma rebelião contra o protocolo, contra a decência, uma rebelião contra todas as expectativas sociais, contra o caráter social do homem. É por conta dessa oposição à ordem natural que as tatuagens foram proibidas nos preceitos judiciais da lei antiga:
“Você não devem fazer cortes em sua carne, para os mortos, nem devem fazer em vocês mesmos quaisquer números ou marcas: Eu sou o Senhor”. (Levítico 19,28).
Embora esses preceitos, certamente em si não obriguem em consciência, no entanto, eles não eram, em geral, totalmente arbitrários, e o mandamento de não cortar a própria carne é listado juntamente com aqueles que proíbem a consulta a bruxos e adivinhos, a adivinhação de sonhos e o de fazer da filha de alguém “uma prostituta”.
É também uma rebelião contra a ordem sobrenatural, pois a tatuagem simboliza um homem insistindo em seu direito de fazer o que quiser, sem prestar contas ao seu Redentor, mesmo até a automutilação e a autoprofanação. Ela simboliza a rejeição da sacralidade do corpo humano. É um sinal do desespero final que é tão característico da sociedade moderna: a nossa vida corpórea é um fim em si e não há nada além disso.
Original aqui.