quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Glória a Deus

«Glória a Deus no mais alto dos céus! ... »


Para a véspera. - Não encontrarei ocasião mais favorável para avivar em mim o desejo da glória de Deus. Tal deve ser a aspiração de toda a alma, até da alma vulgar, sob pena de infidelidade ao dever essencial; e, quanto mais puro, ardente e ativo ele é numa alma piedosa, mais a eleva e engrandece. A glória de Deus, e o fim de todo o ser; é a finalidade do próprio Deus; e o Anjo revela-nos que é o primeiro efeito da Encarnação.

Terei compreendido suficientemente esta verdade?  Exercerá ela a sua alta influência sobre os meus pensamentos e sobre a minha vida?  Viver a gente para procurar a glória de Deus é unir-se a Ele com todo o seu ser; é, pois, divinizar-se.

Meditação

Primeiro ponto - A Glória de Deus, fim de Jesus

Uma glória como Deus nunca recebeu igual, uma glória absoluta e perfeita: é essa a obra que vem realizar o Menino do Natal. Procuro com os olhos o templo donde se devem elevar essas homenagens; não vejo aqui vastas naves de colunatas imponentes, não ouço vibrar em instrumentos sonoros as grandes harmonias dos mestres, e o incenso não se eleva para o céu em espirais triunfantes... Mas que vejo? Um pardieiro abandonado, que Se oculta entre rochedos sombrios, e, na manjedoura desse estábulo, um menino dum dia, que parece estranho a tudo que se passa em torno... E eis tudo, sim, tudo na aparência... Nesse pequeno corpo humano, agita-se uma alma maior que o mundo, mais bela que o próprio céu: a alma dum Deus. Poderá encontrar-se templo mais admirável? Dali eleva-se constantemente um concerto magnífico de adoração, de ação de graças, de expiação poderosa, de apelos ardentes à misericórdia. E tudo isto no meio do incenso perfumado do amor divino.

Este contraste entre a aparência e a realidade é uma assombrosa revelação. Deus parece querer mostrar-nos, com esse desdém por tudo o que vem da terra, o valor único da Encarnação; com efeito, embora em toda a criação nenhum ser houvesse louvado a Deus, embora Ele não tivesse de encontrar, na seqüência dos tempos, um único adorador, Deus recebeu já a Sua adoração completa: um Deus feito homem louvou, adorou, amou um Deus infinito, e isso com uma dignidade igual à Sua... Desde o primeiro instante, um leve sopro saído do peito dum menino dá a Deus uma glória suprema! E esse leve sopro, que mal se percebe no ar calmo da estreita gruta, faz-se sentir até as extremidades do vasto universo que ele enche. E é por isso que os louvores, as adorações, as oferendas de todos os homens em conjunto, e os seus amores, mesmo os mais ardentes, só terão valor unindo-se a esse pequeno desconhecido...

Será essa a única voz que Deus ouvirá, e o Seu coração há-de ser tão grande que todas as almas se Lhe reunirão para formar com Ele apenas um grande corpo místico, último termo da obra divina! Não devo esquecê-la nunca, foi principalmente por causa de Deus que Jesus Se fez homem. A glória de Seu Pai é o Seu primeiro fim; não poderia subordiná-lo a qualquer outro. O motivo é bem claro; devendo todo o ser inteligente dirigir cada um dos seus atos para o fim mais elevado, o Ser perfeito tem por dever reconduzir a Si mesmo todas as coisas.

Se me assombra esta conclusão, e se a palavra - egoísmo de alguma forma roça pelo meu espírito, é porque eu confundo os direitos do Ser que é tudo com os direitos do ser que é nada.

Para este último, para cada homem, para mim, fazer convergir tudo para si mesmo não é somente uma injustiça, é também a causa dos maiores males. Pelo contrário, esse movimento de Deus para Si mesmo é não só duma justiça absoluta e duma suprema beleza, mas é também duma bondade admirável, porque, reconduzindo-nos para Ele, une-nos à Sua própria ação e eleva-nos ao Seu destino... Proceder divinamente, que nobreza! E já neste mundo, que segurança! ...

Segundo ponto. - A Glória de Deus nosso fim

Gozar de Deus no Céu, que admirável perspectiva! ... E maravilhava-me quando esse pensamento se punha claramente diante de mim! ... E, no decorrer da minha vida, só por acaso de tempos a tempos eu repetia essa fórmula sabida: ó meu Deus, tudo para Vossa maior glória! ... Hoje compreendo melhor o seu sentido, e é com novo e vivo júbilo que junto a minha voz à dos Anjos, ou melhor, à voz do divinal Menino para cantar: «Glória a Deus no mais alto dos céus! ... »

Esquecendo as vulgaridades da vida e as preocupações contínuas, elevando-me acima de mim mesmo, quero neste momento viver dum só desejo:

«Oh meu Deus, sede glorificado... Sede glorificado pelos Vossos sacerdotes e pelas almas piedosas, pelas suas virtudes e pelos seus sofrimentos! ... Sede glorificado pelo conjunto dos cristãos, pelo seu espírito de fé e pela edificação dos seus exemplos! ... Sede glorificado pelas criancinhas e pelas suas Comunhões cada vez mais freqüentes!.. ».

Ó Jesus, dirigindo a Deus estas preces, colaboro nos Vossos desígnios; ainda mais, entro na Vossa própria Pessoa; aproprio-me dos Vossos sentimentos e da Vossa voz; é o que Vós sentis; é o que intimamente exprimis sob a aparente inércia do Vosso pequenino ser dum dia. Que importam a minha miséria e a minha indignidade? Graças à nossa união, ó Jesus, a minha oração eleva-se muito acima de mim; toma os Vossos assentos divinos; e, tornando-se digna de Deus, é também criadora de graças.

Resoluções

São Paulo diz a todos os fiéis, mesmo aos imperfeitos: «Fazei tudo pela glória de Deus». Esse motivo eminentemente sobrenatural, não tem necessidade de ser sensível, basta que seja sincero; lá está a graça para fazê-lo brotar e para lhe servir de sustentáculo.

Quero familiarizar-me com este pensamento e empregar com freqüência este motivo: «Sim, faço isto pela glória de Deus!» Deus não se esquece daqueles que se esquecem de si mesmos por causa dEle.

(Meditações Afetivas e Práticas pelo Cônego Beaudenom, Tomo I, 1936)

PS.: Grifos meus.