quinta-feira, 25 de março de 2010

AVE GRATIA PLENA!

ANUNCIAÇÃO DA SANTÍSSIMA VIRGEM


Maria, na Encarnação do Verbo,
não podia humilhar-Se mais do que Se humilhou;
Deus, pelo contrário,
não podia exaltá-La mais do que A exaltou.

Ó Virgem Imaculada e santa, ó criatura a mais humilde e a mais excelsa diante de Deus!

Fostes tão pequena aos Vossos olhos, porém tão grande aos olhos do Senhor, que Ele Vos exaltou a ponto de Vos escolher para Sua Mãe e fazer-Vos depois Rainha do céu e da terra. Dou, pois, graças Àquele Deus, que tanto Vos sublimou, e me alegro conVosco por ver-Vos tão unida a Deus, que mais não é possível a uma pura criatura.

Diante de Vós que Sois tão humilde, com tantos dotes, me envergonho de comparecer, eu, miserável, tão soberbo e tão carregado de pecados. Entretanto, mesmo assim, quero saudar-Vos:

Ave, Maria, cheia de graça. Sois cheia de graça, impetrai também a graça para mim. O Senhor é conVosco. Aquele Senhor que esteve sempre conVosco desde o primeiro instante de Vossa criação, uniu-Se agora a Vós mais estreitamente, fazendo-Se Vosso Filho.

Bendita sois Vós, entre as mulheres: ó Mulher bendita entre todas as mulheres, alcançai-me também a divina benção. E bendito é o fruto de Vosso ventre: ó planta bem-aventurada, que destes ao mundo um fruto tão nobre e tão santo (JESUS)! Santa Maria, Mãe de Deus: ó Maria, confesso que sois verdadeiramente a Mãe de Deus, e por esta verdade estou pronto a dar mil vezes a vida.

Rogai por nós, pecadores. Mas se Vós sois a Mãe de Deus, sois também a Mãe de nossa salvação, e de nós pobres pecadores. Pois para salvar-nos foi que Deus se fez homem, e Vos fez Sua Mãe para que Vossos rogos tenham a virtude de salvar qualquer pecador.

Eia, pois, ó Maria, rogai por nós: agora e na hora de nossa morte. Rogai sempre, rogai agora, que estamos em vida no meio de tantas tentações e perigos de perder a Deus. Mas sobretudo rogai por nós na hora da nossa morte, quando estivermos a ponto de deixar este mundo, e sermos apresentados ao divino tribunal a fim de que, salvando-nos pelos merecimentos de Jesus Cristo, e pela Vossa intercessão, possamos um dia, sem perigo de jamais nos perder, saudar-Vos e louvar-Vos com o Vosso Filho no céu, por toda a eternidade. Amém.

(Santo Afonso Maria de Ligório - Glórias de Maria)

quarta-feira, 24 de março de 2010

24 de março - São Gabriel Arcanjo

24 de março
São Gabriel Arcanjo


"O Espírito Santo virá sobre Ti e o Santo que de Ti há de nascer, será chamado Filho de Deus."

Nos primeiros séculos do Cristianismo o Arcanjo Gabriel não era honrado com um culto especial. No século IX aparece seu nome na lista dos santos, unido à festa da Anunciação, mais precisamente, na véspera desta, 24 de março.

Sua festa, por particular concessão da Santa Sé, era celebrada nos Reinos da Espanha antes que esta celebração fosse estendida a toda a Igreja, por Bento XV, em princípios deste século.

São Gabriel pode ser considerado como o Anjo da Redenção, pois ele aparece a cada instante para preparar o caminho da vinda do Redentor. Assim foi ele que anunciou a Daniel o tempo que faltava para a vinda do Messias e Sua morte na Cruz (Dan. 9, 24-26).

Depois, anunciou a São Zacarias o nascimento daquele que seria o Precursor do Salvador, como foi dito. Recebeu a insigne missão de participar a Maria Santíssima ter Ela sido escolhida para Mãe do Verbo de Deus encarnado, anunciando-Lhe o mistério da Encarnação.

Segundo muitos, foi ele que apareceu aos pastores comunicando-lhes o nascimento do Salvador, e em sonhos a São José recomendando-lhe que fugisse para proteger o Menino do ódio de Herodes. Segundo outros, foi ele também que confortou a humanidade santíssima de Cristo em Sua agonia.

Anjo da Encarnação e da Consolação, na tradição cristã, Gabriel é sempre o Anjo da clemência enquanto Miguel é antes o Anjo do julgamento. Ao mesmo tempo, na Bíblia, Gabriel é, de acordo com o seu nome, o Anjo do Poder de Deus, e é de se notar a freqüência com que palavras como grande, poderoso, e forte, aparecem nas passagens a ele referidas...

(Extraído do livro: O Livro dos Três Arcanjos)

terça-feira, 23 de março de 2010

Infância de São Paulo da Cruz

Infância de São Paulo da Cruz


E' no berço que o homem se forma para a virtude ou para o vício. Cumpre à mãe amoldar a alma e as inclinações do filhinho para o bem, dando-lhe sólida educação religiosa, que permanecerá para toda vida.

Ana Maria, penetrando a extensão da imensa responsabilidade, pôs todas as suas virtudes a serviço desse altíssimo dever: elevação de inteligência, delicadeza de sentimento; bondade e energia, unção e piedade, mas, sobretudo, grande fé em Deus.

Com que solicitude zelou pelo tesouro que o Pai celeste lhe confiara! Com que cuidado não lhe depositou no coração pequenino a semente de todas as virtudes! Tinha-o sempre ante os olhos se esmerava por afastar dele tudo o que pudesse empanar-lhe a candura. E Paulo levará ao túmulo a inocência batismal!

Ensinava-o a conhecer, amar e servir o Pai celeste, narrando-lhe a vida dos santos anacoretas. E como estava intimamente unida a Deus, sabia dar às palavras tais acentos e tal expressão, que o menino a ouvia com o maior interesse. Foi assim que nasceu nele esse amor à solidão, que se tornou a característica de sua vida.

Falava-lhe da Paixão e Morte de Nosso Senhor, e nos olhos puros do pequeno borbulhavam lágrimas. Se, ao penteá-lo, Paulo se punha a chorar, como fazem geralmente as crianças, narrava-lhe algum fato da vida dos santos, e era de ver o pequeno passar do pranto à mais viva atenção, ainda conservando nos olhos as últimas lágrimas.

Colocava-lhe outras vezes nas mãos o crucifixo, dizendo:

Vê, meu filho, quanto Jesus sofreu por nosso amor! ”.

E ele, fitando a devota imagem, como por encanto deixava de chorar. A santa mãe consagrara-o à Rainha das Virgens. Dizia lhe também repetidas vezes da obediência e docilidade do Menino Jesus e da ternura de Maria Santíssima, o que lhe despertava singularíssima devoção para com Eles.

E Paulo, de joelhos, mãozinhas postas ante suas imagens, comprazia-se em dirigir-lhes breves orações.

Essa esmerada educação materna foi corroborada pelos exemplos do virtuoso pai. A lembrança de mãe tão santa permanecerá indelével na alma agradecida de Paulo Francisco, até o final de sua longa existência.

Dela discorria freqüentemente em público, comovido, propondo-a como exemplo. Mais tarde dirá:

“Se me salvar, como espero, devo-o a educação que recebi de minha mãe ” .

Felizes os pais que assim educam para Deus os seus filhos!

Crescendo Paulo em idade crescia outrossim na virtude. Desenvolvia-se-lhe natural tendência à solidão, à prece e à penitência, enquanto começava a revelar caráter brando e afável, talhado para a conquista dos corações. Fugia dos divertimentos infantis e, com seu irmãozinho João Batista que, como veremos lhe foi companheiro fiel nos labores apostólicos entretinha-se em construir altarezinhos adornando-os com flores e imagens do Menino Jesus e da ss. Virgem. Ali passava horas e horas recitar o terço, devoção que conservou até a morte.

Certa vez, enquanto oferecia esta prova de amor à Rainha do Céu, apareceu-lhe uma criança de encantadora formosura Era Jesus, que se dignava recompensar assim a ternura que Paulo lhe votava.

Maria Santíssima também lhe patenteou de modo extraordinário, bem como a João Batista, sua materna proteção. Enquanto colhiam flores às margens do rio para ornamentar o altar da Virgem, ambos escorregaram e caíram no Olha.

As águas eram profundam, rápida a corrente. Paulo e João Batista estavam prestes a perecer... quando de improviso vêm uma senhora de sobre-humana formosura e majestade que, caminhando sobre as águas, lhes estende a mão e os livra da morte. Graça tão assinalada inflamou mais e mais o coração de Paulo no amor e no reconhecimento para com a sua libertadora e para com aquele deifico Menino, cuja beleza o encantara.

(Excertos do livro: Vida de São Paulo da Cruz - Pe. Luís Teresa de Jesus Agonizante)

PS: Grifos meus

Várias orações a São José

Várias orações a São José


ORACIÓN DE UNA RELIGIOSA
A SAN JOSÉ

SAN JOSÉ, vos me conocéis bien, puesto que soy la prometida de vuestro Jesús. Pero, como lo conozco aún tan poco, lo amo también muy poco. Hay aún en mí muchas cosas que no son enteramente suyas. Vos habéis conocido a Jesús muy bien, nadie como vos, salvo María, haced que yo lo conozca. Vos lo habéis amado mucho, comunicadme vuestro amor.

Vos, que gozabais de un trato íntimo con Él, dadme un poco de vuestra intimidad respetuosa respecto a Él. Vos, que erais el casto esposo de la Inmaculada, haced de mí una esposa toda casta de vuestro Jesús. Vos, que vivíais la pobreza con Jesús, hacedme toda pobre con Él. Vos, que erais tan obediente a la Providencia divina, hacedme perfectamente obediente con respecto a mis Superiores como el mismo Jesús lo era para con vos.
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ORACIÓN DE UN JOVEN PARA ELEGIR A SAN JOSÉ
COMO GUÍA Y PROTECTOR DE SU VIDA

SAN JOSÉ, el mismo Hijo de Dios os eligió para ser su padre, su guía y protector en su infancia, su adolescencia y su juventud. Él quiso ser guiado por vos en todos los caminos de su joven existencia terrena. Vos cumplisteis vuestra misión con total fidelidad.

Yo también quiero confiaros mi juventud. En nombre de Jesús, os ruego encarecidamente que seáis mi guía y mi protector, me atrevo a decir mi padre, en la peregrinación de mi vida. No permitáis que me aleje del camino de la vida que está en los Mandamientos de Dios. Sed mi refugio en las adversidades, mi consuelo en las penas, mi consejero en las dudas, hasta que llegue finalmente a la tierra de los vivientes, al cielo, donde gozaré en Jesús mi Salvador con vos, vuestra santísima esposa María y todos los Santos. Amén. 
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ORACIÓN DE UNA JOVEN
A SAN JOSÉ

SAN JOSÉ, Dios os confió la joven más santa y más bella, la Virgen María. Ella pudo abandonarse a vos con total confianza, con su alma y su cuerpo, sabiendo que respetaríais fielmente todos los designios de Dios en Ella. En nombre de María, vuestra esposa virginal e inmaculada, os ruego que seáis mi protector, que guardéis mi alma y mi cuerpo para los designios de Dios.

Si Dios me ha destinado a la misión admirable de la maternidad según la carne, elegid para mí un novio que se os parezca, que sepa respetarme, que sepa amarme con amor auténtico en Dios, que me guarde íntegra para el feliz día de nuestra boda, que camine conmigo en los senderos de un amor conyugal verdaderamente cristiano y santificador, que ame en Dios a nuestros hijos, frutos de nuestro amor, y los eduque conmigo para Dios, que proteja en ellos a vuestro Jesús y que me ame un poco como vos habéis amado a María.

Pero, si Dios me ha destinado a la vida religiosa, a ese matrimonio con el Verbo hecho carne en la pobreza, la obediencia y la continencia perfecta, guardadme totalmente para Jesús como habéis guardado a María.

Proteged mi alma, proteged mi cuerpo para Jesús, conducidme muy cerca del que quiso ser como vuestro hijo y retenedme siempre muy cerca de Él. Amén.
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ORACIÓN DE SAN FRANCISCO DE SALES
A SAN JOSÉ

GLORIOSO SAN JOSÉ; esposo de María, otorgadnos vuestra protección paternal; os lo suplicamos por el Sagrado Corazón de Jesucristo. Vos, cuyo poder infinito abarca todas nuestras necesidades y puede hacernos posibles las cosas más imposibles, abrid vuestros ojos de Padre a las necesidades de vuestros hijos. En los trastornos y las penas que nos agobian., recurrimos a vos con confianza; dignaos tomar bajo vuestra caritativa protección este asunto importante y difícil, causa de nuestras inquietudes. Haced que su resolución feliz redunde en gloria de Dios y en el bien de sus amantes siervos. Amén.

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ORACIÓN DE SAN PÍO X A SAN JOSÉ,
MODELO DE OBREROS

GLORIOSO SAN JOSÉ, modelo de todos los que se consagran al trabajo, otorgadme la gracia de trabajar con espíritu de penitencia por la expiación de mis numerosos pecados; de trabajar en conciencia, anteponiendo el culto del deber a mis inclinaciones; de trabajar con reconocimiento y con alegría, considerando como un honor poder emplear y desarrollar mediante el trabajo los dones recibidos de Dios; de trabajar con orden, paz, moderación y paciencia, sin retroceder jamás ante el agotamiento y las dificultades; de trabajar sobre todo con pureza de intenciones y con desapego de mí mismo, teniendo siempre presente la muerte y que tendré que dar cuenta del tiempo perdido, de los talentos inutilizados, del bien omitido y de las vanas complacencias en el éxito, tan funestas para la obra de Dios. ¡Todo sea por Jesús, todo por María, todo por imitaros, patriarca José! Este será mi lema en la vida y en la muerte. Amén.
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ORACIÓN DE LA MAÑANA
A SAN JOSÉ

GLORIOSO SAN JOSÉ, todopoderoso cerca de los Corazones de Jesús y María, concedednos vuestra protección al comenzar este día, a fin de que, cuando venga la noche, dirijamos con un corazón puro nuestras acciones de gracias a la Divina Majestad. Recordad que fuisteis en la tierra el jefe de la Sagrada Familia; alcanzad el pan para los que tienen hambre, un techo para los que carecen de él, la paz y la prosperidad para los que os invocan. Acordaos también de que sois el Patrono de la Iglesia Católica. Que por vuestra intercesión de nuestro Papa, nuestros cardenales, nuestros obispos, que todos aquellos que sirven a la causa de Pedro, se beneficien con las gracias que necesitan en el cumplimiento de su misión.

(Orações retiradas do blogue: Signum Magnum)

A dor purifica a alma de suas faltas

A dor purifica a alma de suas faltas


"O amor de Cristo nos contrange"
(II Cor 5,14)

Há nesta triste terra outro perigo em nos encerrarmos nela, na exclusiva contemplação das coisas visíveis; e esse é o perigo de nos corrompermos, aviltando-nos, degradando-nos; é, enfim, o perigo de perdermos, ao contato do mal, a beleza da nossa alma.

Ora, sendo Deus a justiça infinita, o mal, mesmo o mais leve, não poderá tocar uma alma sem provocar imediatamente uma punição. O castigo, como já dizia o velho Homero, sempre acompanha o crime com um passo lento e certo. Cometendo um ato culpado, concedeis a Deus uma razão para que vos castigue. Com o cometimento de dez atos culpados, suscitais dez razões para a vossa punição. Imaginai o caso de cem ou mil ações repreensíveis! E se fizesseis de vossa vida uma trama em que mil culpabilidades de toda a espécie se encadeiassem num tecido sem fim?

Algumas vezes, quando um navio está em pleno mar, uma fenda diminuta se abre em seus flancos. A água por ali penetra, lentamente, gota a gota; se o comandante não remediar o mal, poucos dias após, o navio estará no fundo do oceano.

Grande e triste imagem do perigo das almas! Elas desceriam quase todas, lentamente, infalivelmente, aos abismos da justiça infinita, se não houvesse uma força expiatória, uma virtude purificante que servisse de contrapeso á multidão das suas faltas.

E por isso foi sempre considerado como o mais terrível de todos os castigos, para uma alma pecadora e impenitente, ignorar a dor, ser abandonada a uma felicidade sem nuvens. Há venturas que apavoram. Só podemos contemplá-la trêmulos e apreensivos.

Entrevedes desse modo o segundo papel da dor, a sua segunda e sublime missão. Quando o homem pecou, quando perdeu, ao contato do mal, a pureza de sua alma e o amor do bem, ao mesmo tempo que o generoso impulso que o arrebatava da terra, Deus o confia á dor.

Ela foi colocada junto ao mal, para o arrancar do coração do homem por meio da expiação. A dor purifica em suas chamas o homem culpado, como, ao contato do fogo, o ouro repele toda a escória da sua substância abrasada.

Não creio que nenhum homem, tendo a nítida sensação do bem e do mal, tente acusar a justiça de Deus. Quanto a mim, essa justiça não me parece somente um elemento necessário de Sua bondade; ela me atrai mais do que me repele. Um Deus que não soubesse punir, tratar-nos-ia com indiferença.

Eu não sentiria o peso da Sua mão, mas também não poderia beijar-Lhe os joelhos...

Não pretendo afirmar a suavidade desses golpes; diremos como podem ser amenizados; queremos unicamente agora mostrar a sua explicação e o seu fim útil, importante e sagrado aos olhos de Deus; notai, a arte profunda com que Deus criou a dor.

É quase inexato dizer que Deus criou a dor, pelo menos como hoje ela se manifesta. Deus não fez a dor, como não fez a morte; nasceram ambas no mesmo dia, essas desventuradas filhas do pecado, horrendas como ele, destinadas a ensinar ao homem que impunemente não se revoltaria contra a ordem eterna e, principalmente, encarregadas de submetê-lo a essa ordem por meios imprevistos, porém sublimes.

Semelhantes aos grandes mestres da arte que, dispondo apenas de ruínas e destroços, constróem soberbos templos, o amor infinito se apoderou da dor, no momento em que tristemente ela aparecia no mundo, e dela procurou fazer o grande meio de reabilitação das almas.

Querendo punir, pois que assim era necessário, mas querendo ainda mais perdoar. Tirando o bem do mal, empregando o mal na vitória do bem, Ele formou com a Sua justiça e o Seu amor um suplício que se pudesse tornar uma reabilitação. E no meio do mundo foi erguido um cadafalso que poderia ser um altar. Desse modo fez a dor...

E a fim de que fosse quase impossível ao homem não transformar sofrimento em expiação, eis como Deus procedeu. Disse: "O homem caminha para a sua perda por um triplice declive. Corrompe-se pelos atos que são compostos, a um tempo, de orgulho, concupiscência e revolta; pois bem, eu o lançarei, a despeito de sua vontade, com determinados intervalos, na humildade, na obediência e no sacrifício."

E desses três elementos, misteriosamente fundidos, Ele compôs a dor.

Aproximai-vos de um doente, de um moribundo. Em que estado se acha? Primeiramente, na humildade. Esse espírito tão vivo, tão brilhante, essa boca tão eloqüente, essa proclamada ciência dos negócios, onde tudo isso está? Essa mulher tão bela causa agora pavor. Todos os seus dons naturais despareceram.

A humildade se manifesta em tudo; eis o primeiro estado. Ele corresponde ao primeiro elemento de todo o mal, que é o orgulho. Examinai ainda a sua obediência passiva.

Ontem, não obedecia a ninguém, nem mesmo a Deus; hoje, cumpre-lhe obedecer a toda a gente, até mesmo aos seus servidores. E que sofrimento é o seu! Onde se oculta o sangue que lhe fervia nas veias, nos momentos de prazer? Circula agora mui lentamente ou com demasiada agitação. Ela se acha na obediência, na humilhação e na dor...

É isso, como vêdes, o inverso do pecado. Obtende desse doente um ato de adesão interior, um ato de amor e de resignação, e vereis como rapidamente será recuperada a sua saúde moral.

É assim que as almas não perecem. De tempos em tempos, Deus as lança na dor, forçando-as á expiação de suas faltas; e basta que elas consintam um pouco nisso, para que esse sofrimento voluntariamente aceito as regenere e as resgate, compensando-lhes as iniquidades.

E se é fácil ver, por uma composição metafísica, que a dor é um fruto da sabedoria, com mais facilidade ainda vemos que ela é um efeito do amor. Como a dor se proporciona a cada alma! Dir-se-ia que uma terna e invisível mão a dirige para os pontos em que é necessário despertar a vida. Com que inteligente teimosia volta sempre á região dos nossos corações! E que maravilhosos resultados determina!

Ela quase opera como um sacramento, ex opere operato, por sua própria virtude. Esse homem violento, imperioso, pessoal se torna acessível desde que a dor o feriu; estende-vos espontaneamente a mão, agradece-vos as menores atenções. Quanta humildade nasce da dor!

Aquele coração insensível agora vos quer, e vos suplica um pouco de afeto. O amor renasce nele com as lágrimas. Aquele mancebo, tão ousado contra Deus, inacessível a toda a luz do céu, e que vivia aturdido pelo surdo murmúrio de suas próprias paixões, sente que elas se tranquilizam, - como sucede a calmaria após a borrasca - desde que a dor o atinge.

Extingue-se o foco do mal; dissipam-se os seus impuros sonhos. Tudo o que constituia a vergonha de sua alma, o seu desespero de cristão, diminue, desaparece, ao contato da dor.

Assim, o homem orgulhoso se submeteu, enterneceu-se o insensível, acalmou-se aquele que se deixava arrebatar por suas paixões. A alma, enfim, deformada pelo mal, foi de novo forjada pela dor como numa bigorna divina.

Que sucederia, pois, ó meu Deus, se a alma aderisse á dor, se compreendesse a sua eficácia, se, a cada golpe de martelo, ela murmurasse um agradecimento; se, enfim, não permanecesse muda, inerte, cega, prostrada, porém inteligente, viva, ardente, aplaudindo o trabalho do celeste Operário!

Ó minha alma, conhece a fealdade de tuas faltas, as tuas perpétuas fraquezas, as tuas obscuridades de cada dia, as tuas vaidade e as tuas revoltas: lava-te nas tuas lágrimas. Não ouso aconselhar-te a que busques a dor; mas, quando ela vier, não a repilas. É uma amiga. Compreende o valor desse segundo batismo, do qual tão bela podes sair!

E tu, mãe, batiza os teus filhos nas tuas pobres dores. Quando eles nascem no meio de tuas grandes angústias, quando passas as noites a acalentar nos teus braços esses pobres e pequeninos entes que choram sem saber porque (oh! muito depressa o saberão!), não deixes inativa a soma desses sofrimentos. Coloca-os a render, sobre a cabeça de teus filhos, para que cheguem á idade dos perigos ricos do tesouro das lágrimas de sua mãe, de seus sofrimentos voluntariamente aceitos e corajosamente oferecidos em favor deles.

Deus fez, de fato, outra maravilha, tornando inestimável a dor submissamente recebida. É pouco para ela purificar uma alma; a sua virtude superabundante se aplica a todas as que nos são caras. É como o perfume de Aarão, que, depois de ter ungido e sagrado a sua cabeça, descia ao longo da barba e embalsamava até as últimas franjas de suas roupas. Lêde, no Gênesis, o admirável diálogo de Deus e Abraão; dez justos, vereis aí, podiam servir de contrapeso a milhares de culpados. Compreendereis a onipotência expiatória da dor.

Esse homem que jamais envia aos céus uma prece, que nenhuma homenagem dirige a Deus, que O contrista e, talvez, O insulte, sabeis porque vive e não é ferido pela dor? É que em torno dele há filhos que oram, uma esposa que chora, entes queridos que, colocando dores, méritos, virtudes, inocências num dos pratos da balança, fazem contrapeso ás iniquidades que ele coloca no outro.

E se os povos subsistem, se essas imensas oficinas do mal não rebentam sob o peso das graves desobediências á lei de Deus, é porque no meio deles há expiações voluntárias, homens que sofrem e se imolam por amor. E se, algumas vezes, acumulam-se as vergonhas, os crimes nas veias das nações, as desgraças também ali se acumulam; se um país desce ao abismo e dele remonta, procurai a razão.

Achareis grandes almas que livremente se sacrificaram; algumas dores imerecidas nobremente, santamente, sublimente suportadas; algumas gotas de sangue puro correndo por amor, para lavar imensas iniquidades.

Mas não insistamos mais nestas considerações de ordem geral. Outros pontos de vista nos atrai a atenção.
A dor vivifica e engrandece a alma.

(Excertos do livro: A Dor - Monsenhor Bougaud)

PS: Grifos meus.

segunda-feira, 22 de março de 2010

A educação da caridade

A educação da caridade


Não se trata de tornar nossos filhos "santinhos como imagens". Uma criança não foi feita para ser uma "imagem". Foi feita para ser agir, para arcar um dia com pesadas responsabilidade, e devemos prepará-la para isso.

A criança foi criada pelo amor. Foi pelo amor concebida. É para amar a Deus e aos homens que está na terra. É amando que preencherá mais perfeitamente sua missão. É a delicadeza de seu coração e a intensidade de sua caridade que determinarão o valor de sua alma e a fecundidade profunda de sua vida.

Os pais cristãos devem cuidar da educação da caridade dos filhos como um dos elementos essenciais de sua missão. Infelizmente há poucos pais que disso cogitam. O primeiro mandamento é ou não o do amor? A caridade é a virtude cristã por excelência, a que resume toda a lei e sem a qual as outras virtudes nada são...

É o amor ao próximo, com tudo quanto comporta de espírito de sacrifício, que constitui a melhor prova de amor a Deus. Por força da graça do batismo e da confirmação, nosso filhos são chamados a se tornar apóstolos no meio em que tiverem de viver. Mas não poderão agir se, na idade em que se formam os traços do pensamento, não se desenvolverem neles reflexos de caridade e, em particular, o cuidado pelos outros.

A educação da caridade é tanto mais necessária quanto a criança é em si mesma egocêntrica. Tende a ser o centro do mundo e gostaria de ver todos a seus pés. O "primeiro eu", quando não seja o "eu e mais ninguém", é o grito instintivo desse frágil ser que sempre receia fracassar.

Mas, ao mesmo tempo, há nele possibilidades surpreendentes de generosidade, quando sabemos despertar-lhe o "bom coração"...

Para desenvolver na criança a caridade e a bondade, nada melhor, ainda aí, do que o exemplo dos pais e mestres. Mostrai-vos bons, benevolentes, generosos para os pobres, todos os que sofrem e, de uma maneira geral, o que se convencionou chamar de "próximo". Sempre que possível, prestai serviço, mostrando-vos felizes em fazê-lo. Que nisso colaborem mesmo os vossos filhos na medida de suas forças.

Mostrai que considerais uma pena não poder ajudar tanto quanto queríeis os que sofrem. Que nunca na hora das refeições sejam criticados os ausentes. Que em vossa casa a principal preocupação seja a de semear a felicidade; esse clima autêntico de caridade realizará coisas maiores do que os mais belos sermões.

Na vida de todos os santos verifica-se que eles pertenceram a uma família que honrava a caridade: vide, por exemplo, a influência do Cura d'Arc ... de Santa Teresa do Menino Jesus.

Dar a conhecer, desde cedo, às crianças a realidade da miséria. Aproveitar-se disso para lhes ensinar a evitar todo o desperdício, porém, mais ainda a praticar a arte da partilha. Sempre que possível, fazei dos vosso filhos os intermediários da vossa caridade, e pouco a pouco encorajai-os a dar parte das suas próprias pequenas economias.

... Honrar no espírito das crianças os heróis da caridade cristã; mostrar-lhes, além disso, que a caridade não é uma virtude menor para pessoas fracas, mas que pelo contrário exige valor, pois com freqüência se trata de sacrificar-se quando alguém se dedica a outrem. A caridade é mais forte do que a violência porque obtêm êxito quando a força fracassa.

Habituar as crianças a descobrir o que há de bom nos que os cercam; a substituir imediatamente, por um ato positivo de caridade, qualquer sentimento de má vontade que pudesse nascer em seus corações. Habituá-las a dirigir mentalmente, todas as manhãs, no momento das orações, um pensamento de boa vontade a todas as pessoas que encontraram durante o dia.

(Excertos do livro: A arte de educar as crianças de hoje - Pe. G. Courtois)

PS: Grifos meus.

Que nobre representação!

Que nobre representação!

Para cuidar da criança, toma a Providência de Deus os olhos e ouvidos da mãe. A esta cabe vigiar, porque o pai tem sua lida fora de casa. Passa grande parte do dia longe dos filhos.

Só com muito amor aos filhos é, porém, que uma mãe saberá vigiá-los. Pois a vigilância é a atenção perseverante às dores, aos cuidados, aos perigos e às precições de outros. Para bem ver tudo isso é preciso esquecer a si próprio. É por isso o egoísmo o principal obstáculo à vigilância.

Pensamos nos outros somente na medida em que os amamos.

Ora, os olhos da Providência caem amorosamente sobre os nossos passos. Seus ouvidos escutam e medem o ritmo de nosso coração. A ave que canta sobre o telhado, a flor escondida no campo são vistas e guardadas por Deus. Dos homens está escrito que o Senhor lhes traz os nomes gravados na palma de Suas mãos. E quanto mais vê e conhece o Altíssimo as crianças, suas prediletas!

Que nobre procuração recebe, portanto, toda mãe, guarda vigilante de seus filhinhos!

Há mães, entretanto, que confiam os seus filhos a pessoas, a quem não confiariam um cachorrinho de estimação ou as suas jóias! Que responderão a Deus no dia das contas e das recompensas e das punições?

(Excertos do livro: As três chamas do lar - Pe. Geraldo Pires de Souza)

PS: Grifos meus.

domingo, 21 de março de 2010

São Bento, Abade

21 de março
São Bento, Abade


Deus sucita sempre nas grandes emergências da história nobres figuras de Santos que assegurem à Igreja o bom êxito da empresa sobrenatural que deve exercer nas almas. O império perdia o último reduto no Ocidente e os bárbaros atravessavam a Europa em terríveis correrias de selvagens, quando nasceu o Patriarca dos Monges do Ocidente.

Vindo á luz do mundo na Umbria á volta de 480, foi mandado pelos pais a Roma para se iniciar no estudo das letras, mas, diz São Gregório, possuindo já a prudência dum ancião, deixou a cidade e o mundo e reitou-se para a solidão do Subiaco.

Depois de levar ali dois anos de vida eremita escondido na gruta do monte, foi tal a fama que aureolou o seu nome, que se viu em breve rodeado de discípulos, e as famílias de Roma confiavam-lhe os filhos para educar.

Organizou assim a vida monástica fundando doze pequenos mosteiros em que, sob a direção do Abade, os monges votados "a procurar Deus" se davam à oração e ao trabalho. Alguns anos mais tarde, São Bento deixou Subiaco para fundar nas alturas da Campânia a grande Abadia do Monte Cassino. Foi lá que escreveu a "Regra dos monges", firme e discreta, profundamente religiosa, em que andam de par o gênio romano e a ascese monástica do Oriente cristão.

São Bento morreu à volta de 547. É o Patriarca dos monges do Ocidente, não porque inaugurasse propriamente a vida monástica nos nossos países, (existia já antes dele na Itália e nas Gálias), mas porque a penetrou do seu espírito e foi como que o fermento novo que contrinuiu poderosamente para a formação da cristiandade da Idade Média.

A organização econômica e social do mosteiro, hierarquicamente constituída, o seu caráter de estabilidade que fixa os monges ao solo como centro irradiador de trabalho e de pensamento cristão, exerceram profunda influência na civilização de que somos herdeiros.

Nos nossos dias ainda a influência de São Bento é considerável e não deixa de transbordar para fora dos limites do mosteiro. A Regra Beneditina e a espiritualidade que dela derivam aproximam-se muito da piedade da Igreja, correm ambas espontaneamente da mesma fonte do Evangelho, demasiado puras para se não adaptarem às necessidades espirituais de todos os tempos.

Devemos pois render a Deus muitas graças por haver concedido à Igreja o Santo Patriarca de Cassino, cujo espírito e doutrina iluminam e vivificam ainda as almas "para que em tudo Deus seja louvado".

(Retirado do Missal Quotidiano e Vesperal - Dom Gaspar Lefebvre)

A dor eleva a alma a Deus

Capítulo primeiro
 

Eis, pois ó minha alma, o verdadeiro segredo das coisas. A terra é por demais estreita para um ser imortal. Ela me fere e me magoa. Qual um prisioneiro, eu arrasto aqui a minha corrente. Cada dia, os meus passos mais pesados, os meus movimentos mais penosos, a minha cabeça mais inclinada ou mais trêmula, me dizem, sem que Deus tenha necessidade de intervir, que eu não sou feito para a terra.

Do homem, meu companheiro de viagem, recebo ainda melhor ensinamento. A cada instante sou por ele abandonado ou traído. Quando ao seu ombro me apoio, ele se quebra como um junco e me fere. E os melhores, aqueles aos quais chamo amigos, não são mais fiéis. A morte os arrebata, eu os fatigo com os meus defeitos, ou meus pesares os afugentam.

Quantos, cuja alma se aliava á minha, me foram violentamente arrancados pela morte! Quantos, que tinham depositado em mim a sua confiança, e que de mim se haviam aproximado, felizes, partiram desiludidos, diante de minha frieza.

Quantos outros que eu busquei, quando queria repousar em um peito amigo a minha cabeça dolorosa, e que não mais foram encontrados!

Oh! Como é o homem pouco apto aos mistérios profundos da amizade; e como verdadeiras são estas tristes palavras do sábio: “Nada é mais raro do que um verdadeiro amigo!”

E não é só a amizade que falha! Traído por ela, já torturado pelas amarguras da vida, tenta o homem achar uma consolação. “Procuremos outra coisa, diz ele, uma afeição mais terna, mais profunda, mais desinteressada, uma única, e esqueçamos tudo mais”.

Divisa, então, uma criatura que Deus expressamente destinou ao nobre encargo de amar e de consolar; muito diferente do homem, não possuindo a sua força nem a sua ambição, muito diferente, porém, por isso mesmo mais cara; não tendo ao mesmo grau nada do que o homem possui, e tendo, em compensação, tudo quanto lhe falta; uma criatura, cujo coração Deus formou com delicada arte, a quem a dor atrai, que se obstina heroicamente na dedicação, e em cuja alma Deus colocou, como um último dom que coroa todos os outros, uma espécie de intuição que lhe permite tudo compreender, a fim de que ela possa tudo consolar.

O homem vê esse ente que Deus lhe consagrou. Estremece de júbilo, e desce do altar onde lhe deu a sua mão, rejuvenescido, renovado.

Mas, infelizmente, não assiste á realização do seu sonho de felicidade. É ele o culpado? É a mulher? São ambos? Ou quis Deus que esse sonho nunca se materializasse na terra, a fim de que se ergam os olhos para o céu, onde Ele será a plena e deslumbrante realidade?

Assim, a desejada ventura a que o homem aspirava, durou pouco e mal. As promessas de felicidade não são cumpridas nos casais mais ternamente unidos. Que diríamos dos lares em que só há cinzas extintas e daqueles em que a chama jamais ardeu?

Que diríamos de outros, menos infelizes, contudo, em que brilhava a flama ardente e pura, mas onde a morte veio inexoravelmente apagá-la? Vós vos afastais da família devastada, como da amizade destruída. Lançais-vos no torvelinho dos negócios dos negócios, em uma vida ativa, ruidosa, que vos atordoa.

Mas apenas começais nesse terreno a vossa lida, a calúnia vos persegue; e, depois de conhecerdes as paixões dos homens, voltais magoado, e desiludido dessa nova tentativa em busca de aventura.

Qual um viajante que galga uma montanha, cujo cimo atinge depois de ter deixado nas veredas da encosta, dispersos, todos os seus companheiros, e que, ao olhar em torno, vê, no fundo do vale as árvores derrubadas pela tempestade; nós, chegados ao vértice da vida, olhamos em volta e nos vemos sós.

Ao longe, vislumbramos os sonhos destruídos, as amizades devastadas, os amores extintos, as generosidades amáveis que pereceram no caminho, e não mais se encontram; e, com o olhar triste e o coração angustioso, transpomos lentamente esses últimos e nevados cimos da existência, que seriam miseráveis, se Deus não se achasse no fim da nossa jornada.

E, cansados de tudo, mesmo da esperança, pois nada mais esperamos, nem mesmo os consolos da amizade, certos de que todas as taças estão vazias ou contêm uma bebida amarga, lançamos um derradeiro grito: “Meu Deus! Meu Deus!”

Pergunta-se: “Qual a razão da dor?”.
Eis a primeira: a terra se vela para deixar resplandecer o céu!

Sim, no grave e sublime ensinamento da Religião, é essa a primeira razão da dor. Feitos para Deus, nós nos prendemos demasiado á terra. Aí construímos um ninho, longe dos ventos e ao abrigo das neves, onde quereríamos adormecer na felicidade, onde desejáramos não envelhecer, onde a perfeição seria a exclusão da morte.

É precisamente nesse ninho em que olvidamos a eternidade, que Deus, de vez em quando, sacode a dor, como se agitasse um facho luminoso.

Quem definiria Deus, quando se visse forçado a isso?
Com que delicadeza proporciona Ele a dor á necessidade dela!

As mais das vezes, toca apenas em um ponto doloroso. É um sonho que se esvai, uma ilusão que se dissipa, um amigo que esquece ou um coração que se esfria. Involuntariamente, levantamos os olhos para o céu. E dizemos: “Ó meu Deus, unicamente Vós sois constante e fiel!”

Outras vezes, o golpe vibrado por Deus é mais forte. Uma fortuna se desfaz, um trono vacila. O mundo não vê mais do que a poeira que se eleva dessas ruínas; a alma golpeada vê outra coisa. Uma luz desconhecida começa a aparecer-lhe; o céu se descobre diante de seus olhos consolados e ela acha aí uma compensação aos bens terrestres que perdeu.

Ó meu Deus, dizia a rainha da Inglaterra, eu Vos agradeço a perda de três reinos, se com isso me posso tornar melhor”. Bossuet, referindo-se a essa soberana, dizia: “Ela agradece a Deus não o fato de a ter feito rainha, mas o de tê-la feito rainha infeliz”.

Se a dor é ainda maior (porquanto cair de um trono não é a mais cruel das desventuras), então a luz é, por assim dizer, infinita como a própria catástrofe.

Tal é por vezes o seu brilho que ela desperta nos lábios dos que sofrem, palavras tão belas e expansões tão puras quanto as da santidade.

“Oh! Como há luz atrás desse véu negro!”, dizia uma jovem viúva, vendo destruída, aos vinte anos, a mais pura felicidade que a alma possa sonhar. “A imaginação, acrescenta ela, não pode supor o que eu sofro: o tédio, o vácuo imenso, a obscuridade que envolve para mim a terra, outrora radiante aos meus olhos. Eu que amei a vida, só amo hoje a morte...”

Notai estas últimas expressões. São as mesmas que tão freqüentemente acodem os lábios dos sábios nos seus derradeiros dias de existência.

Rapidamente, a dor transportara essa jovem viúva, na virente juventude de seus vinte anos, aos altos píncaros de onde todas as coisas do mundo são julgadas com o desprendimento que merecem, e para galgar os quais foram, no entanto, necessários quarenta anos de esforços a santa Teresa e a santa Chantal.

Algumas vezes, os golpes se multiplicam. Ouvimos sobre a nossa cabeça o ronco da tormenta. Quem, nestes casos, descreveria as ternuras de Deus? A mãe, que apresentando o filho ao bisturi do cirurgião, o cobre de beijos, ternamente o acaricia antes, durante e depois da operação. Isso é uma fraca imagem do que se passa nas almas.

Quando a espada se crava até a guarda, há, muitas vezes, tal desprendimento de luz, e, no fundo da dor extrema, um tão delicado, inexprimível e desconhecido júbilo, que a alma, mesmo a mais afastada de Deus, reconhece a Sua mão e submissamente a beija. Quero citar um exemplo, de que pessoalmente fui testemunha.

Conheci, há alguns anos, um magistrado que, no meio de sua carreira, conseguira alcançar honras, consideração e influência. Era rico e feliz; nada lhe faltava, exceto a fé. Casado com uma senhora tão distinta quanto piedosa, pai de suas raparigas, ele as educara cristãmente, posto que não fosse cristão; aos dezoito e dezesseis anos, elas tinham, com a graça e o encanto de sua idade, o que a piedade, a modéstia e a inocência do coração juntam á beleza.

Muitas vezes eu as encontrava acompanhadas pelo magistrado. Ele revelava fisionomia nobre orgulho de um pai que se sente reviver em filhos dignos dele.

Um dia, a mais velha sentiu uma súbita e violenta dor de cabeça; uma febre tifóide se declarou, e em poucos dias ela morria, como um verdadeiro anjo. Sua irmã, que fora muito tarde afastada da cabeceira da enferma, apresentou, logo depois, os sintomas da mesma moléstia, e, pouco após, igualmente morria.

O desventurado pai encerrou-se oito dias na sua vivenda campestre, mudo, vencido pela dor, com os olhos fixos no leito em que vira desaparecer o seu último tesouro. Esses golpes foram para ele uma inefável revelação.

Que era este mundo, e que valia? Que valiam as honras, os cargos, as grandezas, a influência? Tudo isso lhe era odioso agora. Que valiam mesmo as criaturas, pois que tinha visto sucumbir suas duas filhas, tão amadas e tão puras, protegidas em vão por sua inocência?

Ele disse, então, consigo que o tremendo desgosto não podia ser o resultado do acaso, porquanto se pelo acaso o mundo fosse governado, não haveria outra solução além do desespero. Disse ainda que esses fatos não podiam provir da vontade insensível e indiferente de Deus; a um Deus semelhante Ele nunca teria ódio demasiado.

Teve a intuição de que Deus não poderia proceder assim senão por amor, de um modo que ele não compreenderia, mas que talvez compreendesse mais tarde. E a dor teve uma significação aos seus olhos...

Viveu ainda longos anos, servindo nobremente o seu país na magistratura, em que ocupou os cargos mais elevados e mais honrosos. Mas, ao mesmo tempo, bom cristão, surpreendendo a todos pela firmeza das suas esperanças e pela beleza de sua fé, e auxiliando os pobres com a distribuição do dote de suas duas filhas.

Esse magistrado morreu; e quando deixou este mundo, quando as suas jovens filhas vieram ao seu encontro, transfiguradas e radiantes, todos três compreenderam, em um enleio que não terá mais fim, porque Deus os havia separado durante um momento; e como, coroando e preservando as filhas, Ele concedia ao pai, á custa da separação de um dia, a imensa felicidade de viver durante a eternidade inteira na mesma luz e no mesmo amor.

Eis o primeiro serviço que a dor presta aos homens. Sim, minha alma, compreende-o, e tira disso o teu proveito; a primeira coisa que o Deus de bondade colocou nas garras sanguinolentas da dor, foi um feixe de luz.

(Excertos do livro: A Dor – Monsenhor Bougaud)

PS: Grifos meus

“Escolhe bem”

“Escolhe bem”


Estuda o caráter daquela que há de ser tua companheira. O casamento é um contrato entre dois e por toda a vida. M. de la Palisse teria dito, ser verdade mui clara á todos nós. Todavia é sempre oportuno aqui, recordá-lo.

Os esposos, diz com graça. A. Daudet, são muita vez uma “baixela desemparelhada”. A tua “metade” não será de fato uma “fúria”? Esta mulher mundana, ricamente trajada, é uma fúria vestida a última moda.

Outros se vêem finalmente a convencer, com espanto, de que se casaram com uma tempestade; e Pailleron tinha razão em dizer: “muito palavreado antes, poucas palavrinhas ao depois, e grandes palavrões por fim”.

Com um mau casamento o homem faz entrar em sua vida uma mulher, perversa, importuna como um pesadelo, movendo-se sobre dois pés. Bela é a observação e Taine em Th. Graindorge: “Observam-se por três semanas, amam-se por três meses, discutem por três anos, toleram-se por trinta anos...e os filhos recomeçam a comédia”.

Se fores prudente, atentamente medita, porque feita a promessa e dado o passo, “já não há meio de se voltar atrás, com arrependimentos. O casamento é a ordem em que se faz a profissão antes do noviciado, e, caso houvesse um ano de provação, como para a profissão nos mosteiros, poucos seriam os professos”. (São Francisco de Sales)

Não deves procurar tua companheira entre as jovens levianas. O juízo delas é ainda mais curto do que a saia que usam! E há nelas tão poucas idéias como a miséria do estofo que cobre-lhe os braços e ombros. Os seus sentimentos são um tecido tão pouco sólido e resistente qual o das suas meias, como teias de aranha.

Estas pequenas, apenas são grandes, pela altura dos seus tacões, e preciosas só pela quantidade dos seus adereços.

O seu cérebro não é um sino capaz de dar o belo som grave da reflexão, é uma campainha em que só tilinta o baladar das vaidades e do prazer.

Bagatelas, leviandades = 100.
Pensamentos sérios = 0.

Esses seres levianos são tudo o que quiserem: borboletas, colibris... mas mulheres, não, oh não!

Não cases nunca com uma jovem sem religião. Dos casamentos desiguais, o pior é o das almas. Se queres que teu amor pendure, dosa-o com sentimentos divinos. Imita os esposos de Caná: convida Cristo ás tuas núpcias.

Outros para presidi-lo, convidariam a Baccho. Hão de um dia penitenciarem-se.
Em lares sem religião, que de vidas se apresentam unidas, e que são apenas paralelas!...

Paralelas: lembra-te de tuas aulas de geometria?... São duas linhas que nem ao infinito se encontram!

Naquele belo par, que em público continua a dar-se o braço, de muito tempo houve o divórcio das almas. Uma abertura profunda se fez entre aquelas duas existências assim como, nos Alpes, uma fenda de cem metros, separa duas geleiras cujas bordas parecem, á primeira vista, estar em contato.

O cavalheiro e a senhora são estas duas geleiras.
Estão um do outro tão perto e tão longe!

Oh céus! Que de suspiros, que de soluços, por vezes, se ocultam por traz de elegantes frontarias e em dourados salões? A mesa, em presença dos convivas, sorriem-se. Em particular, engalfinham-se!...

... Em verdade, cada um dos sexos busca no outro aquilo de que carece: procuram por assim dizer o seu ângulo complementar. A jovem procura, sobretudo, no homem o que ela não tem: a força. O homem procura, sobretudo, na mulher aquilo de que se acha desprovido: o encanto, a graça.

É legítimo, é normal encantar-se na beleza daquela com quem queres casar-te. (Sobretudo, não, porém, exclusivamente e nem sempre.)

Todavia não deves olhar unicamente ao encanto das linhas... Por volta dos quarenta anos e ás vezes mais cedo, perde-se o ar de gentileza e de frescor, e só ficam as qualidades sérias.

A eterna primavera cantam-na sempre, e não se realiza jamais.
Um dia o espelho lhe dirá que está velha.
E saberá ela o que é o espelho?

Até os trinta anos: um “conselheiro de encantos”. De trinta a cinqüenta: um “juiz severo”. A partir dos cinqüenta: uma “testemunha penalizada”.

... Foi ela boneca ou foi mulher? Soube ser mãe? Quis ser mãe?...

Quando um jovem pensa no casamento, a quem deverá ele escolher para esposa? Uma mulher. Uma mulher, repito. E não é inútil relembrá-lo, porquanto hoje em dia menospreza-se isto, para esposar brasões ou um cofre cheio de ouro.

O casamento não deve ser uma acumulação de dotes, mas uma união de corações.

(Excertos do livro: A Grande Guerra – Pe. Hoornaert)

PS: Grifos meus

sexta-feira, 19 de março de 2010

São José na vida de Santa Teresa de Jesus

VIVA SÃO JOSÉ!


São José na vida de Santa Teresa de Jesus


...Tomei por advogado e senhor o glorioso São José, encomendando-me muito a ele. Vi com clareza que esse pai e senhor meu me salvou, fazendo mais do que eu podia pedir, tanto dessa necessidade como de outras maiores, referentes à honra e à perda da alma.

Não me lembro até hoje de ter-lhe suplicado algo que ele não tenha feito.

Espantam-me muito os grandes favores que Deus me concedeu através desse bem-aventurado Santo, e os perigos, tanto do corpo como da alma, de que me livrou. Se os outros santos o Senhor parece ter concedido a graça de socorrer numa dada necessidade, a esse Santo Glorioso, a minha experiência mostra que Deus permite socorrer em todas, querendo dar a entender, que São José, por ter-Lhe sido submisso na terra, na qualidade de pai adotivo, tem no céu todos os pedidos atendidos...

Eu procurava festejá-lo com toda solenidade, movida mais pela vaidade do que pelo espírito, querendo que tudo fosse perfeito e primoroso, embora com boa intenção. Mas havia algo de mau: se o Senhor me dava a graça de fazer um bem, eu o fazia com imperfeições e muitas faltas. Para o mal, para os exageros e para a vaidade, era grande a minha esperteza e diligência. Que o Senhor me perdoe!

Eu queria persuadir todos a serem devotos desse glorioso Santo, pela minha grande experiência de quantos bens ele alcança de Deus. Não conheço nenhuma pessoa que realmente lhe seja devota e a ele se dedique particularmente, que não progrida na virtude; porque ele ajuda muito as almas que a ele se encomendam.

Há alguns anos, sempre lhe peço, em seu dia, alguma coisa, nunca deixando de ser atendida. Se a petição vai algo de torcido, ele a endireita para maior bem meu.

... Só peço, pelo amor de Deus, que quem não me crê o experimente, vendo por experiência o grande bem que é encomendar-se a esse glorioso patriarca e ter-lhe devoção. As pessoas de oração, em especial, deveriam ser-lhe afeiçoadas; não sei como se pode pensar na Rainha dos Anjos, no tempo em que tanta angústia passou com o Menino Jesus, sem se dar graças a São José pela ajuda que lhes prestou.

Quem não encontrar mestre que ensine a rezar tome por mestre esse glorioso Santo, e não errará no caminho. Queira o Senhor que eu não tenha cometido erro por me atrever a falar dele; pois, embora apregoando que lhe sou devota, em servi-lo e imitá-lo sempre falhei.

(Excertos do livro: Livro da Vida - Santa Teresa de Jesus - Capítulo VI - 6 ao 8)

Porque a dor?

As razões divinas da dor


Porque a dor?

Porque a dor? Eis o primeiro grito da alma. Ferido pela moléstia, acabrunhado pela morte do pai, da mãe ou de um filho, o homem só tem um grito: “Porque?”

A esta angustiosa interrogação sucede o silêncio; o olhar se torna fixo. Dir-se-ia que ele procura sondar o abismo em que a felicidade se sepultou. Depois, o homem ergue a cabeça, fita suplicantemente os amigos que o rodeiam, e repete a mesma palavra, única que a dor sabe proferir: “Porque? Porque?”

Porque? Quem o sabe? Ninguém responde a essa pergunta, nem a ciência, nem a filosofia. E a própria amizade se cala, na impossibilidade de satisfazer a essa pungente interrogação. Quando os amigos de Job o viram prostrado sob o peso de tão grandes dores, permaneceram silenciosos sete dias, pois não sabiam consolá-lo. E, na ruína de Tróia, Virgílio nos descreve as mulheres sentadas junto ao mar, tristes e mudas, com os olhos banhados de lágrimas e um longo olhar fixo nas ondas murmurantes. É assim o homem sob os golpes da dor.

Quando pela primeira vez essas imagens amarguradas passaram ante meus olhos, eu me achava ainda na primavera da vida; lembro-me de não as ter compreendido. E achei-as exageradas. Esses prolongados silêncios me pareciam inexplicáveis. Mais tarde, em presença de grandes infortúnios, conheci, por meu turno, a dor amarga de nem mesmo ousar abrir os lábios, pois sentia que as minhas expressões de alento seriam inúteis: eu não conseguiria consolar.

E eis porque, se existe uma força misteriosa capaz de suavizar as mágoas, ela deve ser invocada. Acaricie ela ternamente a cabeça daquele que sofre e murmure aos seus ouvidos algumas dessas palavras que a própria amizade desconhece.

Se pode responder ao “porque?” doloroso dos que padecem – e aos quais a terra não oferece uma resposta – seja ela bendita.

Porque a dor? Porque, se Deus é bom? Um dia dirigi esta pergunta a um ancião que me disse: “Precisamente, meu filho, porque Ele é bom.” Quase me revoltei, ao ouvi-lo; hoje já não me revolto; murmuro apenas: “Talvez!”

De outro modo serieis cruel, ó meu Deus! Vós criastes o homem, que é Vosso filho, e ao qual dedicais Vosso amor, pois não o teríeis, certamente, criado se não o amasseis. Sois grande, imenso, infinito, ao passo que o homem é pequeno e débil.

Não seria possível admitir que gostosamente o magoásseis. Eu não molestaria uma criança, junto á qual me considero demasiadamente forte; envergonhar-me-ia de abusar assim de minha superioridade. Que blasfêmia é, pois, imaginar que abusais de Vossa força, ó meu Deus, castigando-nos sem um objetivo e sem razão, abandonando-nos friamente às leis fatais que nos esmagam!

Ó meu Deus criastes jamais uma alma para outro fim além da felicidade? E se a Vossa mão pousa dolorosamente sobre ela, não é justo confessar, com submissão, que só por bondade assim procedeis, em virtude de misteriosos desígnios que um dia compreenderemos?

Há homens que protestam. Para eles tem o valor de um insuportável paradoxo a afirmação de que as dores e as aflições deste mundo decorrem da bondade divina. Contudo, reflitamos.

Não podemos voluntariamente, com deliberado intento, provocar o sofrimento de uma pessoa que estimamos? Em certas circunstâncias, não é possível que a façamos sofrer tanto mais quanto maior é o afeto que lhe consagramos? A questão se resume na resposta a essas interrogações.

Eis uma criança que brinca á borda de um abismo. Quer colher uma flor ou perseguir uma borboleta; vai cair. De repente, dois braços vigorosos a arrebatam, e com uma violência tanto maior quanto mais ternos forem. A criança grita, sofre. De onde resulta esse sofrimento? Evidentemente do coração e do amor de sua mãe.

Observai agora outra criança. Tem á mão uma faca, com a qual se vai, fatalmente, ferir. Sobrevêm o pai, que a repreende e lhe arranca a faca, talvez com violência, talvez punindo o filho para que não recomece. A criança grita e intimamente acusa o pai. Só mais tarde, reconhece o mal de que o libertara a solicitude paterna.

Outro exemplo. Está doente uma criança. Sua mãe, tomando-a nos braços, apresenta-a ao cirurgião, que com o bisturi vai operá-la. A criança, a gritar, repele o médico. Quem ousará dizer que essa mãe é cruel? Talvez o filho o diga, em um acesso de dor. Mas quem contempla a cena, mais se compadece da mãe do que da criança. O amor materno é naquele instante cruciantemente torturado.

O que tão belo, tão luminoso e tão comovente nos parece, quando vemos em ação a solicita dedicação paterna, mais grandioso é em Deus. Sem dúvida, se não sabeis que somos feitos para Ele, e que para Ele tendemos irresistivelmente; se considerais este vasto universo como um campo fechado em que lutam forças fatais, a dor não tem sentido.

Se sucumbis ao peso da amargura, que quereis que eu vos diga? Porque adquiristes essa moléstia? Porque deixastes que vosso filho fosse esmagado sob as rodas de um carro?

Devorareis silenciosamente a vossa amargura, sem importunar com os vosso gritos em céu vazio e os homens que nada podem fazer em vosso favor. A punição daqueles que vivem sem Deus, é sofrer sem consolação.

Sai, porém, desse sombrio corredor; retirai-vos desse antro; colocai-vos na grande luz da Religião e da razão. Acreditai em Deus, em um Deus sábio, poderoso e bom, que criou os homens para si, que, em um rápido instante, os faz viver no mundo, a fim de que eles aí se tornem dignos da eternidade; a fim de que o espírito, o coração, a personalidade e o amor sejam verdadeiramente criados por seus esforços.

Acreditai em um Deus que, enquanto os homens, Seus filhos, trabalham nesse grande intento, vela por eles e os auxilia, desviando-lhes os perigos, estimulando-os na luta, para que atravessem o mundo sem aviltamento e sem corrupção.

Crede firmemente nisso; começareis, então, a entrever, em uma luz divina que já será um começo de consolação, de onde vem a dor e porque Deus a permite.

Deus, criando o mundo, fê-lo, deliberadamente, muito estreito para nós; de sorte que aí não nos podemos mover sem sofrimento, sem que a cada instante encontremos, dolorosamente, os seus limites. Deus quis, assim, que diante de tão restritas fronteiras nós aspirássemos a mais; ignoro, porém, que Ele pudesse proceder de outro modo.

Quando um dia nos acharmos no infinito, aí dilataremos amplamente a nossa visão, sem que se nos anteponham limites nem fronteiras.

Oh! Seremos, então, venturosos! Mas de qualquer forma que Deus dispusesses as condições deste pobre mundo, ele seria necessariamente muito pequeno para nós. Uma alma não poderia aí viver sem sofrimento, não se estenderia neste leito de procusta sem o achar demasiadamente curto, não desdobraria as asas sem encontrar obstáculos.

Eis a terra como feita para as nossas provações, a fim de que, sempre constrangidos, nos aspirássemos a mais vastos espaços e ambicionássemos infinitos horizontes.

Suponde, entretanto, uma criatura que, em vez de abrir as asas, as encolha; que, sem se elevar nos ares, voluntariamente se prenda á terra; que não ache muito estreito esse leito de procusta, onde, ao contrário, se deita folgadamente; suponde uma grande águia das montanhas, a qual, sem gemer na apertada gaiola em que a encerraram, admire a sua prisão de ouro ou de prata, pintada de azul ou de verde; imaginai, enfim, um ser imortal que já não expanda suas forças infinitas, que se deleite na terra, onde se enclausura e se degrada; que esteja prestes a se desonrar e a perder-se: porque Deus não interviria?

Porque Deus não lhe tornaria dolorosos esse limites ás suas aspirações, que essa alma esqueceu? Porque não tornaria cruciante a situação dessa criatura sem ideal, a fim de que ela erguesse os olhos?

Porque não arrancaria a faca das mãos dessa criança? E se essa alma imprudentemente costeasse o abismo, porque Deus a não afastaria violentamente, com a sua mão paterna, desse precipício a que ela se ia arrojar? Porque, finalmente, se esse ser humano estivesse enfermo, Deus, que é pai e mãe, não o confiaria á ciência do cirurgião? E se assim fizesse, porque o homem, primeiramente aturdido, ofuscado pelas lágrimas, não diria em seguida: “Meu pai, eu vos agradeço o bem que me fizestes?”

Eis o sentido da dor, o princípio essencial, fundamental, do seu tratamento divino. Ao “porque” da alma que sofre, a Religião só oferece uma resposta terna e consoladora. Ela diz:

“Homem, tu nasceste para Deus. Se, pois, tivesses tido a coragem de atravessar este triste mundo sem te maculares, com um fervoroso amor a Deus, com um vivo e ardente impulso do teu coração, a dor não teria jamais existido. Ela só foi criada para suprir a tibieza do teu amor”.

Com efeito, no começo da vida, sob as árvores do Éden, só havia o amor, e ele bastava. O papel que a dor hoje representa, era, então, exercido pelo amor, e muito melhor.

A dor ilumina, purifica, desprende o homem das coisas transitórias; a dor eleva os corações. Mas tudo isso é alcançado pelo amor, com mais rapidez e mais grandeza. Se, pois, ele não houvesse sido olvidado no paraíso; se, em vez dessa leve centelha que dele nos resta, nós tivéssemos conservado a chama viva do amor primitivo, a dor não teria jamais existido.

Ela é uma asa divina que nos foi concedida, quando nos abismávamos na matéria; Deus no-la ofereceu, bondosamente, como um auxílio.

Eis o que cumpre admitir. Além dessa crença, só há a desesperação. Escolhamos essa fé ou a odiosa fatalidade que nos esmaga.

Sim, nas nossas dores, é necessário, de fato, escolher a fria mão da fatalidade que nos acha sob a roda de um carro e que, sem piedade, nos aniquila, ou a mão terna e paternal de Deus que em nós se pousa com respeito e compaixão, para nos tornar melhores. Deus bom ou Deus tirano; não há um termo médio.

Para mim, a escolha está feita. Nunca acreditarei, meu Deus, na Vossa indiferença, na Vossa injustiça ou na Vossa crueldade. Beijo-vos a mão; e com os olhos obscurecidos pelas lágrimas, não compreendendo, embora, o motivo da dor que me tortura, só estas palavras quero ter nos lábios: “Piedade, Vós sóis bom! Piedade, Vós sois grande e sábio!”.

Mas não vos devemos limitar a esse princípio geral; convém examinar as suas minudências e seguir, com a vista e o coração, a mão de Deus quando se apóia dolorosamente no homem e, por meio da dor, o arranca a todos os perigos e o eleva pouco a pouco á beleza moral e á virtude.

(Excertos do livro: A Dor – Monsenhor Bougaud)

PS: Grifos meus