sexta-feira, 20 de maio de 2016

Domingos Sávio: o grande pequeno santo

Fonte: Blog do [cultor]

“Antes morrer que pecar”

Na Itália do século XIX, num tempo em que a Igreja atravessava terríveis provações, a breve e impressionante história de São Domingos Sávio, que aos quinze anos foi coroado por uma morte santa, desenrola-se ao lado da história de outro santo: Dom Bosco. Este grande fundador, que soube equilibrar a ousadia e a prudência sem nunca buscar o prestígio, era um construtor de obras sólidas. De família humilde, foi educado na fé por sua mãe viúva. Viu-se refletido nos pobres meninos de rua, que muitas vezes eram presos por pequenos roubos em busca de alimento. Sabia que fora preservado daquela vida apenas pelo cuidado de sua mãe, e, tomado de compaixão, iniciou a sua grande obra.

“É à volta de um problema quase único, o da infância infeliz e abandonada, que Dom Bosco concentra o essencial da sua atividade. Mas a importância desse problema, soube ele compreendê-la tão profundamente, e levar os seus contemporâneos a medi-la, que sobre essa base vai edificar uma obra grandiosa”.[1] O encontro e a influência de dois santos, Dom José Cottolengo e Dom José Cafasso, fizeram-no conhecer a fundo a miséria humana, e com eles aprendeu que “a caridade tem exigências sem limites e que, quando nos pomos ao seu serviço, temos de aceitar ser devorados por ela”.[2]

Dom Bosco pôs-se a serviço da caridade, procurando dar um abrigo fixo àquela mocidade abandonada nas ruas. Mesmo repelido por toda a parte, e mesmo quando os meninos que abrigava fugiam, levando os cobertores, ia achando meios de se instalar, e assim nasceu o primeiro Oratório de São Francisco de Sales, em memória de São Filipe Néri, que o alegre Dom Bosco admirava, e de São Francisco de Sales, “que ensinara os católicos a trazer a religião para a vida, a praticar diariamente as virtudes e a usar de suavidade na ação apostólica”.[3]

E eis que, “entre todos aqueles que as mãos potentes de Dom Bosco formaram, surge um santo com todas as letras, o pequeno Domingos Sávio (1842-57), modelo de fé, de devotamento, de graça, que a Igreja elevará aos altares”[4]. Magro e frágil, compensava a falta de força física com a sua fortaleza de coração. Devorado, já aos cinco anos, pelo amor de Deus, era humilde, e sabia ouvir e respeitar. Buscava e aceitava a vontade de Deus, fosse qual fosse.
Domingos Sávio, também de origem muito humilde, foi o primeiro fruto que se destacou da obra de Dom Bosco. Nasceu no dia 2 de abril de 1842, em um vilarejo chamado Riva, vila de Castelnuovo de Asti, próximo de Turim, ao norte da Itália. Seus pais, Carlos Sávio e Brígida Agagliate, de quem aprendeu o amor a Deus, eram humildes e devotos, e tinham a fé simples de um ferreiro e de uma costureira. Segundo Dom Bosco, Domingos era dotado “de uma índole doce e de um coração formado para a piedade, aprendeu com extraordinária facilidade as orações da manhã e da noite, que rezava já quando tinha apenas quatro anos de idade”.

Aos cinco anos, era já notado por sua devoção. Sabe-se que, por esta época, quando a família recebeu um visitante para um almoço, Domingos retirou-se com seu prato da mesa para comer sozinho em um canto. Depois, quando seu pai indagou a razão deste comportamento, respondeu: “Não me atrevo a pôr-me à mesa com uma pessoa que começa a comer como o fazem os bichos”.

Em 1847, quando a família mudou-se para Murialdo, perto de Castelnuovo, Domingos começou a assistir à catequese da paróquia. Chegava sempre adiantado para a santa missa, mesmo que por isso tivesse que esperar rezando, no frio e nas escadas, enquanto não abrissem a igreja. Logo aprendeu a ajudar na missa e tornou-se coroinha.

Domingos ardia no desejo de receber a Santa Eucaristia, e muito cedo, aos sete anos (1849), por sua maturidade e seu discernimento, obteve permissão para fazer a sua primeira comunhão, que naquela época era feita apenas aos doze anos. Considerava a confissão e a comunhão como os dois grandes remédios para os males de sua alma, para qualquer dúvida que surgisse, e tomou, nesta ocasião, propósitos que nos impressionam em um menino de sete anos:

“Propósitos que eu, Domingos Sávio, me propus no ano de 1849, quando fiz a Primeira Comunhão, aos 7 anos de idade:
1º. Confessar-me-ei com frequência e receberei a Sagrada Comunhão sempre que o confessor me permitir;
2º. Quero santificar os dias de festa;
3º. Meus amigos serão Jesus e Maria;
4º. Antes morrer que pecar”.

Desejava tornar-se sacerdote, e por isso, aos dez anos de idade, percorria quase vinte quilômetros todos os dias para a escola de Castelnuovo. Como impressiona, nesta época, ver o menino interpondo-se entre brigas, fazendo pequenos sacrifícios diários, e tomando para si a culpa de seus colegas na escola para livrá-los da punição. Certo dia, seus colegas puseram pedras na estufa da classe e acusaram Domingos, que aceitou a culpa em silêncio quando o mestre sacerdote mandou que se ajoelhasse na frente de todos para censurar-lhe a conduta. No dia seguinte, no entanto, o bom sacerdote descobriu a verdade, e quando perguntou a Domingos por que não havia se defendido, ele respondeu que queria imitar Cristo, que sofreu por nossos pecados e não se justificou quando foi acusado injustamente. Além disso, sabia que os verdadeiros culpados seriam expulsos se fossem acusados, mas ele seria perdoado por não ter ainda nenhuma outra falta.

O talento e a virtude do pequeno Domingos começaram a chamar a atenção de D. Cugliero, seu professor, que em 1854 procurou por Dom Bosco para contar-lhe que havia encontrado um “outro São Luís Gonzaga”. Ao conhecer o pequeno santo, quando este contava apenas doze anos, Dom Bosco o descreve dizendo que “era débil e delicado de compleição, de aspecto grave e ao mesmo tempo doce, com um não sei que de agradável seriedade”.

Como a situação da família de Domingos era precária, Dom Bosco decidiu levá-lo para o Oratório de Valdocco, em Turim, onde ele permaneceu cerca de três anos. Cumpria seriamente todos os deveres, e manifestava sempre uma boa conduta e um dom natural para acalmar as discussões entre seus companheiros. Cuidava acima de tudo para que todos servissem melhor a Deus, inspirando-se sempre em seu pai espiritual.

O grande ideal de Dom Bosco, “dai-me almas, Senhor, e ficai com tudo o mais”, refletiu-se no jovem santo. Certo dia, em um de seus sermões, Dom Bosco incentivou todos a alcançar a santidade, sem considerá-la como algo distante. Quando o pequeno Domingos, que desejava ardentemente tornar-se santo, perguntou-lhe o que deveria fazer, Dom Bosco ensinou-lhe que o caminho mais rápido seria ganhar almas para Deus, pois Jesus derramou por elas até a última gota de seu preciosíssimo sangue.

Quando, no dia 8 de dezembro de 1854, o Bem-aventurado Papa Pio IX proclamou o dogma da Imaculada Conceição, Domingos decidiu consagrar-se a Nossa Senhora, renovando seus votos de primeira comunhão: “Maria, eu vos dou meu coração; fazei com que seja vosso. Jesus e Maria, sede sempre meus amigos; mas, por vosso amor, fazei que eu morra mil vezes antes que tenha a desgraça de cometer um só pecado”. Fundou também a Companhia da Imaculada, destinada à ação apostólica, manifestando que “gostaria de fazer algo em honra de Maria, mas que fosse logo”, porque temia que não lhe restasse muito tempo. Nesta Companhia, seus membros comprometiam-se a ser obedientes e a vigiar os que se comportavam mal.

Domingos preocupava-se muito com a salvação das almas. Manifestava o desejo de ensinar o catecismo às crianças, por imaginar que muitas poderiam se condenar apenas por nunca receberem instrução. E suas aspirações iam ainda mais longe. Dom Bosco relata que ele desejava também ir à Inglaterra para converter as almas, afirmando que “sua oração predileta era a coroa ao Sagrado Coração de Jesus para reparar as injúrias que recebe dos hereges, infiéis e maus cristãos”.

Mas a vida deste pequeno santo, que prometia grandes obras, seria breve. Domingos tinha um pressentimento de que não conseguiria tornar-se sacerdote como gostaria. Quando ficou doente, com tuberculose, e foi mandado de volta do oratório para casa, despediu-se de seus amigos definitivamente. E no dia 9 de março de 1857, morreu com uma santidade sublime, contemplando uma linda visão, segundo suas próprias palavras.

Foi um exemplo comovedor da “força sobre-humana da humana fraqueza”.[5] O papa Pio XII, quando o canonizou em 1954, afirmou que era “pequeno, porém um grande gigante de alma”. Tornou-se padroeiro dos cantores infantis, e suas relíquias encontram-se hoje em Torino (Itália), na basílica de Nossa Senhora Auxiliadora. O próprio Dom Bosco escreveu a primeira biografia deste grande pequeno santo, incentivando os jovens a perguntar: “Se Domingos, com tão pouca idade, pôde santificar-se, porque não poderei também eu?”. Sua história suscitou muitas vocações, entre elas a do futuro Papa Bento XVI.[6]

Tabernáculo do Senhor, exemplo de amor a Deus e ao próximo, foi um verdadeiro apóstolo e missionário de Jesus. São João Paulo II, em sua Homilia do dia 7 de dezembro de 1997, exortou todos para que seguissem seu exemplo, dizendo:

“Como São Domingos Sávio, que todos sejam missionários do bom exemplo, da boa palavra, da boa ação em família, com os vizinhos e com os colegas de trabalho! Com efeito, em todas as idades pode-se e deve-se dar o testemunho de Cristo! O compromisso do testemunho cristão é permanente e quotidiano!”.



[1] Daniel-Rops, A Igreja das revoluções I: diante de novos destinos. Tradução de Henrique Ruas. São Paulo: Editora Quadrante, 2003, p766.
[2] Idem, página 768.
[3] Idem, página 769
[4] Idem, página 771.
[5] Idem, página 771 nota 76.