8. CRIAR UM CLIMA CRISTÃO
Uma das condições essenciais da educação cristã
consiste em que o âmbito familiar realize uma atmosfera espiritual em que
as almas desabrochem e se elevem espontaneamente. A influência exercida
nas crianças se apóia melhor no conjunto harmonioso de uma multidão de fatos
aparentemente insignificantes do que em manifestações excepcionais ou
em discursos solenes.
• À religião não é qualquer coisa que se pespegue
no indivíduo, muito menos uma roupa com a qual nos vistamos ou da qual nos
desembaracemos à vontade, segundo os dias e as circunstâncias. É preciso
que o clima da casa tenha por base uma fé que tudo informe para tudo
transfigurar, sem trazer sombras.
• O clima de um lar será cristão se a religião
exprimir-se menos por fórmulas, atitudes, tabus ou rotinas, do que
por um espírito que tudo penetre, fazendo com que se viva, naturalmente,
as realidades sobrenaturais, com simplicidade, sem respeito humano, porque
“é assim mesmo”.
• Há um verdadeiro fenômeno de osmose que se
produz numa família autenticamente cristã, em que o senso do sagrado se
manifeste pelo respeito das coisas santas, em que as verdades
sobrenaturais estejam próximas, inserindo-se na trama da vida
cotidiana.
•Quando os pais vivem simplesmente na lógica de
sua fé tudo se torna luminoso e benfazejo; Jesus Cristo é o grande Amigo
divino de quem se fala como de alguém misteriosamente presente e infinitamente
amorável; a Virgem Maria é considerada como a Mãe de Jesus e nossa Mãe,
mediadora de todas as regras; a Igreja é a grande Comunidade cujos chefes
são respeitados e os membros, mesmo longínquos, fraternalmente amados; os
acontecimentos de sua vida são prazerosamente comentados, sua história é
conhecida, sua liturgia contribui com o seu ritmo de alegria e de
esperança.
Lealdade, caridade em palavras e ações, entre
todos e com todos, pureza sem equivoco como sem falso pudor; tudo isto
acaba por se instalar nos costumes, no sentido profundo do termo, para a
felicidade de todos.
• Custa-se a imaginar hoje em dia a sólida piedade
dessas famílias camponesas que formam uma Bernadette, um cura d’Ars, um
João Bosco... Nada a perturba, nada a abala... Apodera-se da
criança no berço; impõe-lhe o seu automatismo antes de lhe dar suas
razões, suas alegrias, suas esperanças. Seria insensato pretender que o
garotinho tenha a capacidade de optar com reflexão e em toda liberdade por
tais deveres, tais crenças e tais práticas. A família tem um direito
imprescritível relativamente à criança: o de escolher em seu lugar. Na medida
do possível deve evitar que a sua escolha caía, um dia, no erro. E o erro
aqui é o esquecimento de Deus.[1]
• A lealdade a serviço do Senhor é uma das
condições capitais para o desabrochar da vida religiosa dos jovens.
O dano mais grave que se pode causar à criança é habituá-la a
considerar as virtudes do Cristianismo como coisas que se dizem mas não se
fazem. O Cristianismo, então, não é mais do que uma linguagem sublime,
deixa de ser uma vida.
• Sejamos realistas: nossos filhos não encontrarão
sempre exemplos de vida cristã integral e autêntica, É preciso
não ter medo de falar-lhes e preveni-los antecipadamente contra a
decepção ou o escândalo que disso poderia resultar para eles. De modo
algum se trata de lhes provocar o desprezo farisaico em face do pecador,
muito ao contrário. Trata-se de fazer aumentar intensamente neles próprios
o ardente desejo de que o Senhor dê Sua luz aos cegos e Sua força
aos enfermos. O ódio ao pecado pode muito bem aliar-se ao respeito e
ao amor ao pecador. Esta é a pedra de toque de uma verdadeira educação
evangélica.
• Em certas famílias cristãs, no momento mais
favorável, quando todos se reúnem à noite, em serão, lêem-se
algumas linhas de um livro cristão: o Evangelho, a História
Sagrada, a vida dos Santos, um comentário Litúrgico sobre uma
festa próxima. Não há nada melhor para instilar nos espíritos e nos
corações as idéias que elevam para solidificar e unir as almas num
pensamento comum.
• Nada atrai mais eficazmente a bênção de Deus
para um lar do que a oração da noite em família, sob a condição,
entretanto, de que evite dois excessos igualmente prejudiciais: o da
rotina aborrecida e morna, e o de uma fantasia demasiado solta.
Há vários métodos e maneiras de fazer essa oração
da noite de modo a torná-la viva, adaptada às circunstâncias, aos tempos
litúrgicos, às datas aniversárias, às datas especiais e às preocupações da
vida familiar. Podem caber orações usuais ditas em comum. O que importa é
que cada um tenha, senão Todas as noites, pelo menos regularmente, uma
parte ativa, e que a oração seja realmente a expressão de sentimentos
sinceros.
• Em muitas famílias cristãs as crianças não
se deitam à noite sem receber a bênção de seus pais sob a forma
de uma cruz traçada na testa. Poder-se-á ver nisso a expressão da
autoridade espiritual do pai e da mãe de família, primeiros mandatários de
Deus junto às almas dos filhos.
[1] Henri Ghéon, Saint Jean Bosco, pág. 25
(Flammarion).