sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Respeito humano

Cônego Júlio Antônio dos Santos
O Crucifixo, meu livro de estudos - 1950

8. - Respeito humano

Que é o respeito humano?

É a vergonha daquele que não se atreve a manifestar os seus sentimentos religiosos e piedosos, porque com isso é escarnecido, insultado, perseguido.

I - Natureza do respeito humano
           
O respeito humano é o respeito pelas coisas humanas colocado acima do respeito pelas coisas de Deus; é a estima pelo homem preferida à estima por Deus.
O respeito divino coloca-nos na presença de Deus a quem devemos conhecer, amar e servir porque é nosso Criador, Senhor, Juiz e Remunerador.-  O respeito humano é a negação de tudo isto. Transfere sacrilegamente para o homem os direitos e a honra que são reservados a Deus. O homem é considerado como senhor e juiz, e, por isso, toda a vida exterior é para lhe agradar.

II - Aspectos diversos do respeito humano

O respeito humano reveste tantas formas quantos são os nossos deveres.

1.º Omissão do bem. - O respeito humano impede a prática sincera e fiel da nossa fé, fechamos a boca quando é preciso falar, e paralisa os nossos esforços quando é preciso agir.
Sabemos que a santa Missa é uma fonte de graças desde que assistamos a ela com edificação; todavia, na assistência à missa não estamos com a devida atenção e fervor, porque não queremos dar nas vistas com a nossa devoção.
Encontramos na comunhão uma grande força contra os inimigos da nossa salvação, um ódio ao pecado, um zelo ardente para o bem, uma garante de perseverança; todavia, não nos aproximamos muitas vezes deste banquete divino, porque tememos que nos censurem.
Queremos fazer progressos na piedade e na virtude; mas para isso é preciso frequentar a confissão a fim de alcançarmos o perdão das nossas faltas, recebermos conselhos úteis e uma direção salutar; todavia, não nos confessamos com frequência porque tememos que escarneçam de nós.

2.º Corrupção do bem. - O respeito humano infecciona tudo, mesmo o bem. Para que as nossas ações boas sejam meritórias devem ser feitas com intenção de agradar a Deus. Ora o respeito humano inclina-nos e decide-nos a praticar o bem para agradar às criaturas. Portanto, o respeito humano tira o caráter sobrenatural às nossas ações. Dá preferência do homem a Deus.

3.º Prática do mal. - O homem levado pelo respeito humano chega mesmo a praticar o mal para agradar os maus. Um companheiro aproxima-se de nós, convida-nos para os bailes, para reuniões profanas, para lugares perigosos e deixamo-nos arrastar pelo maldito companheiro até à boca do inferno e não temos coragem de lhe dizer secamente: não quero vai tu só.

4.º Jactância do mal. - O respeito humano faz mesmo com que o homem se glorie com o mel que fez e até mesmo se glorie com faltas que não cometeu.

5.º O respeito humano é um mal universal. - Um outro caráter do respeito humano é a sua universalidade. Por exemplo, o mentiroso, o voluptuoso, o colérico, têm estas paixões próprias: inimigos da verdade, da castidade, da mansidão; mas, no campo do respeito humano são inacessíveis a qualquer virtude. O respeito humano não apresenta o aspecto de um defeito particular, torna-se o foco de todos os vícios. Escravo do respeito humano, o homem é capaz de transgredir todos os mandamentos de Deus e da Igreja, faltar a todos os deveres e praticar todo o mal.

III - Motivos do respeito humano

1.º O mundo tem horror à verdade e ao bem - O mundo tem horror à verdade e ao bem e aos que representem estas coisas.
O ideal do mundo é o mal. Ora o mal é a negação do bem.
Moisés, que suportou tantas fadigas no governo de seiscentos mil homens a ouvir as suas queixas e a apaziguar as suas discórdias, quando esperava do seu povo louvores e agradecimentos, ouve da boca de um pastor estas amargas palavras: és néscio e doido em tomares sobre ti tantos negócios!
Vati, esposa de Assuero, a qual devendo ser louvada pela compostura e modéstia, porque recusou fazer, alarde da sua formosura perante a multidão dos convidados, tiveram-na unicamente por cabeçuda e teimosa.
Como queremos que os maus nos não tenham aversão se as nossas ações são uma repreensão contínua ao seu mau viver? Com a nossa piedade confundimos a sua falta de religião, com a nossa honestidade a sua dissolução, com a nossa caridade a sua avareza. Miram-se em nós como em espelhos e vêem esses infelizes todas as suas fealdades. Que admira, pois, que nos desprezem, que nos escarneçam e maltratem, semelhantes ao camelo que, em vendo água clara e nela a sua enorme fealdade, revolve-a com os pés até turvá-la completamente.
“Os ímpios abominam os que andam pelo caminho reto.” (Prov, XXIX, 27).
Assim como somos naturalmente levados a desculpar nos outros aquelas faltas que reconhecemos em nós mesmos, assim também, infelizmente, nos sentimos inclinados a desaprovar, ou, pelo menos, a desprezar nos outros as virtudes que não temos força de praticar.
Eis aqui a verdadeira razão pela qual os maus murmuram das pessoas virtuosas.

2.º O mundo quer perder as almas- O mundo sorri sarcasticamente e escarnece dos que têm religião e piedade porque ele quer prender e matar como outrora. Ele diz e faz como os irmãos de José: “Que quer este sonhador? E concluíram? Lancemo-lo numa cisterna.”
O cristão não deve temer o opróbrio dos homens. Nolite timere opprobriun hominum. Um cristão deve manifestar que há nas suas convicções uma força maior do que todas as paixões dos adversários.

IV - Gravidade do respeito humano

Consideremos a gravidade do respeito humana em si mesmo e nas suas consequências.

1 - O respeito humano é a preferência do homem a Deus

O respeito humano é a ruína da ordem e da perfeição, porque desvia o nosso pensamento, a nossa atenção de Deus para as criaturas. A razão e a fé dizem: Deus é o fim e o motivo de todos os nossos atos. O respeito humano diz: só devemos ter consideração pelo homem, pelos seus gostos, pelas suas opiniões, pelos seus caprichos.

2 - O respeito humano é uma fraqueza

O padre Ventura afirmava energicamente: “Ocultar os sentimentos da verdadeira fé, envergonhar-se de cumprir publicamente os preceitos, não é senão uma fraqueza, a maior de todas as fraquezas. É por isso que se encontra comumente nas almas pequenas.”

3- O respeito humano é uma fraqueza vergonhosa

Deus deu-nos um guia seguro, um juiz infalível das nossas ações, é a consciência que nos ilumina e dirige em todos os nossos passos, nos louva ou censura conforme praticamos bem ou o mal.
O escravo do respeito humano segue uma luz, obedece a uma outra regra. A sua luz e a sua regra é a opinião e o capricho de alguns homens.

4 - O respeito humano é uma fraqueza muito prejudicial à salvação

O respeito humano inutiliza os meios tão poderosos e eficazes de que Deus se serve para nos atrair a Si. Convida-nos pela sua graça a uma vida mais regular e mais santa e nós mesmos temos bons desejos de abraçar esta vida. Porque resistimos às solicitações da graça? É o respeito humano que impede a ação da graça e asfixia a nossa boa vontade.

5 - O respeito humano é uma traição

Devemos edificar uns aos outros. O que tem mais luz, mais virtude, deve irradiar estes bens em volta de si. Nosso Senhor Jesus Cristo diz: “Vós sois a luz e o sal da terra: luz que deve combater as trevas; sal que deve impedir a corrupção.” Ora o respeito humano contraria, destrói esta disposição de Deus, impede que a luz irradie, apaga-a, corrompe o sal; ajuda as trevas e o mal a espalharem-se por toda a parte.

6 - O respeito humano é a abdicação da personalidade humana

Deus determinou que o homem se conduzisse pela sua consciência esclarecida pela lei divina, é nisto que está toda a sua dignidade de homem. Ora o homem que se deixa arrastar pelo respeito humano não pensa, não fala, não opera por si mesmo, segundo a sua consciência, torna-se escravo dos outros, pensa, fala e faz como eles. Pode conceber-se alguma coisa mais destruidor da dignidade ou personalidade humana? Não.

7 - O respeito humano é a abdicação da dignidade de cristão

Um cristão pode dizer com São Paulo: “Eu vivo, mas verdadeiramente não sou eu já que vivo, é Jesus Cristo que vive em mim, é Jesus Cristo que pensa, fala e opera em mim.” Ora o cristão possuído do respeito humano é um discípulo indigno, tem o nome de cristão e não se deixa conduzir por Jesus Cristo: Poderá dizer: eu vivo, mas não sou eu que vivo, é o tal companheiro insensato, todo ele é que vive em mim. Eu abdiquei da minha alma para substituí-la por uma alma desvairada, estúpida.

8 - O respeito humano é uma escravidão vergonhosa

Se alguém quisesse fazer-nos uma observação sobre qualquer dos nossos defeitos dir-lhe-íamos: Não se meta onde não é chamado. Porém atacam as nossas virtudes e boas qualidades e temos a baixeza de nos envergonhar de as defender.

9 - O respeito humano é uma apostasia infame.

“Foi o respeito humano que fez morrer o Filho de Deus. Pilatos teria sido inabalável às instâncias e gritos dos Judeus que pediam a morte de Jesus por estar convencido da inocência do Salvador, e da injustiça deles, mas apenas o ameaçaram com César, toda a sua firmeza não pôde vencer o temor de desagradar a César. Ó respeito humano, exclama alguém, em quantos corações tens dado a morte a Cristo, e em quantos não O tens deixado nascer! Deixamos de ser de Deus ou receamos ser d'Ele, pelo temor do juízo dos homens”. Quem quiser ser amigo deste mundo perverso declara-se por isso mesmo inimigo de Deus.

10 - O respeito humano é causa de condenação eterna

1.º Condenação dos homens. - Ozanam, quem aconselhavam um dia uma prudência muito tímida nas manifestações da sua fé, respondia: “Não, eu não ganharei nada em dissimular as minhas convicções; não adquiro a confiança daqueles que me conhecem e perderei a da juventude que me considera; isto é, não obterei a estima dos maus e perderei a dos bons”.
O cristão fraco, tímido, engane-se nos seus cálculos, e acaba inevitavelmente por ver recusar o que tem sido objeto de todos os seus sacrifícios, o respeito dos outros. Aquele que falta aos juramentos de fidelidade a Deus não pode oferecer nenhuma garantia na confiança dos homens.

2.º Condenação de Deus. - No dia de juízo a sentença pronunciada sobre nós dependerá da maneira como tivermos compreendido o respeito humano e o respeito divino. “Eu confessarei, diante de meu Pai, aquele que me confessar diante dos homens, diz Jesus, e envergonhar-me-ei diante de meu Pai, daquele que se tiver envergonhado de mim diante dos homens”.
Jesus abomina, condena o mau cristão que recusou reconhecer a Sua soberania. 

Continuará...

Preservação da fé

Cônego Júlio Antônio dos Santos
O Crucifixo, meu livro de estudos - 1950


6 - Preservação da fé

Devemos preservar a nossa fé

Devemos, pois evitar os perigos das conversas e leituras contra a religião e contra a moral.
O seu efeito pernicioso não se manifesta, muitas vezes, senão mais tarde. Há bombas que demoram a explodir.
Os alimentos pouco sadios com o uso prolongado vêm a destruir a mais robusta saúde corporal: é impossível que as más conversas e leituras, não produzam o mesmo efeito na alma.
“Metei-vos no fogo, diz santo Isidoro, e, de ferro que sejais, acabareis por vos fundir.”
Ninguém diga: Não tenho receio das tentações contra a fé; Jesus Cristo orou a fim de que a fé de Pedro não desfalecesse. Ora se era possível a Pedro vacilar na sua fé, a nós poderia acontecer-nos o mesmo.

7. - Profissão da Fé

1 - Devemos professar a nossa fé

1.º Deus exige que professemos a nossa fé.

1.º “Fazei brilhar a vossa luz diante dos homens, diz Jesus Cristo, a fim de que eles vejam as vossas boas obras, e dêem glória a vosso Pai que está nos Céus.”
2.º A nossa salvação exige que professemos a nossa fé.  - Àquele que me confessa diante dos homens, diz ainda Jesus Cristo eu o confessarei também diante de meu Pai que está nos Céus. Todo aquele que me renegar diante dos homens, eu renegarei também diante de meu Pai que está nos Céus.” (Mat. X, 32 e 33). “Se alguém se envergonhar de mim e das minhas palavras, o Filho do Homem se envergonhará dele também, quando vier na sua glória.” (Luc. IX, 26).

2.º Modo de professar a fé

Vejamos a maneira de professar a fé.

1.º Assistindo aos atos de culto, sobretudo na igreja paroquial aos domingos e dias festivos; obedecendo a todas as leis da Igreja; praticando publicamente obras de caridade.
2.º Não nos envergonhando de praticar um ato de religião quando é necessário afirmar a nossa fé; não o fazendo perante os tribunais seria uma apostasia ou renúncia à fé; e não o fazendo também diante das pessoas ímpias ou indiferentes com receio de ser escarnecido, seria respeito humano.
3.º Não renegando a fé, nem diretamente por atos ou por palavras; nem indiretamente pelo silêncio, quando era preciso falar, nem pela abstenção quando era preciso operar.
4.º Não alterando a fé com superstições.
5.º Não abandonando a fé para se filiar em associações condenadas pela Igreja.


Conservação da fé


Cônego Júlio Antônio dos Santos
O Crucifixo, meu livro de estudos - 1950


5 - Conservação da fé

1 - Devemos manter a nossa fé

A fé é uma luz que Deus pôs na nossa inteligência para nos mostrar de uma maneira clara e segura, o que devemos crer e praticar.

2 - Porque devemos manter a nossa fé

Esta luz é inalterável em si mesma, mas o demônio e as nossas paixões tendem a obscurecê-la, apresentando-nos razões com aparências de verdade para assim rejeitarmos a nossa fé.
Assim o nosso orgulho diz-nos que as verdades de fé são contra a razão e, por isso, não devemos acreditar nelas; a nossa sensualidade diz-nos que os ensinamentos da fé são impraticáveis por causa da nossa fraqueza.

3 - Como devemos manter a nossa fé
Devemos manter a fé:

1.º fazendo atos interiores e exteriores de fé;
2.º lendo e meditando a Sagrada Escritura;
3.º ouvindo a pregação da palavra de Deus e fazendo reflexões sobre ela;
4.º finalmente, fazendo boas obras. A fé é uma árvore que produz frutos e que se alimenta desses mesmos frutos, que são as boas obras.

Santos Inocentes, Mártires século I.

Fonte: Escravas de Maria

28/12 Sexta-feira

Festa de Primeira Classe
Paramentos Vermelhos


A Santa Igreja honra como mártires este coro de crianças, vítimas do terrível e sanguinário rei Herodes, arrancadas dos braços das suas mães para escrever com o seu próprio sangue a primeira página do álbum de ouro dos mártires cristãos e merecer a glória eterna, segundo a promessa de Nosso Senhor Jesus Cristo: “Quem perder a vida por amor a mim há-de encontrará-la.” Para eles a liturgia repete hoje as palavras do poeta Prudêncio: “Salve, ó flores dos mártires, que na alvorada do cristianismo fostes massacrados pelo perseguidor de Jesus, como um violento furacão arranca as rosas apenas desabrochadas! Vós fostes as primeiras vítimas, a tenra grei imolada, num mesmo altar recebestes a palma e a coroa.” O episódio é narrado somente pelo evangelista São Mateus, que se dirigia principalmente aos leitores hebreus e, portanto, tencionava demonstrar a messianidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, no qual se realizaram as antigas profecias: “Quando Herodes descobriu que os sábios o tinham enganado ficou furioso. Mandou matar em Belém e nos arredores todos os meninos de dois anos para baixo, conforme o tempo que ele tinha apurado pelas palavras dos sábios. Foi assim que se cumpriu o que o profeta São Jeremias tinha profetizado: Em Ramá se ouviu um grito: coro amargo, imensa dor. É Raquel a chorar seus filhos; e não quer ser consolada, porque eles já não existem” (Jer. 31, 15).Costumes medievais, que celebravam nestas circunstâncias a festa dos meninos do coro e do serviço do altar. Entre as curiosas manifestações temos aquela de fazer descer os cônegos dos seus lugares ao canto do versículo: “Depôs os poderosos do trono e exaltou os humildes.” Deste momento em diante, os meninos, revestidos das insígnias dos cônegos  dirigiam todo o ofício do dia. A Liturgia, embora não querendo ressaltar o dia teve no curso da história, e quis manter esta celebração, elevada ao grau de festa por São Pio V, muito próxima da festa do Natal. Assim colocou as vítimas inocentes entre os companheiros de Cristo, para circundar o berço de Jesus Menino de um coro gracioso de crianças, vestidas com as cândidas vestes da inocência, pequena vanguarda do exército de mártires que testemunharão, com o sangue, a sua pertença a Cristo.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Doutrina Cristã - Parte 1 (ESPECIAL)

Nota do blogue: Iniciarei hoje a transcrição de um ótimo catecismo escrito por Monsenhor Francisco Pascucci, 1935, Doutrina Cristã, tradução por Padre Armando Guerrazzi, 2.ª Edição, biblioteca Anchieta.

Que a leitura desse Catecismo nos ajude na busca por santidade, ao conhecermos mais e assim, amarmos mais a Deus e a Sua santa doutrina! 

Indigna escrava do Crucificado e da SS. Virgem,
Letícia de Paula


Prefácio do Autor

A publicação presente quer vir ao encontro de um desejo, várias vezes manifestado, mesmo por pessoas autorizadas, acerca de um texto que, breve e claro, desenvolvesse o programa proposto pela Comunhão catequística diocesana de Roma para o curso médio-inferior. 
É fruto de longa e madura experiência.
Há muitos anos que o ensino da doutrina cristã vem sendo o assunto preferido de nossa atividade sacerdotal, no vivo desejo de que as almas juvenis encontrem o caminho, a verdade; a vida no conhecimento de Jesus Cristo, Filho de Deus, Salvador.
Ousamos, pois, esperar não seja vã esta humilde fadiga.
Para colimar o seu escopo, não podia o texto ser mais breve.
Quanto à ordem e clareza, di-lo-ão aqueles a quem é destinado o livro. Pelo que nos toca, pusemos-lhe amorosamente o máximo cuidado, no intuito de sermos úteis aos que seguem o programa do curso médio inferior nas escolas secundárias, mas particularmente aos alunos desejosos de participarem das disputações diocesanas, assim como aos que se preparam para conseguir o diploma do ensino de religião no curso elementar.
Encontrarão aqui os professores a ordem a seguir nas lições e em gérmen as questões que lograrão desenvolver conforme a capacidade dos ouvintes; os discípulos terão um processo para mais facilmente fixarem os pontos fundamentais do programa desenvolvido no decurso do ano.
Não nos resta senão solicitar de Jesus, divino Mestre, que tem por sobremodo caros os meninos, uma grande bênção para ser fecunda a nossa boa vontade, afim de que, pelo assíduo estudo do catecismo, inúmeras almas de adolescentes saibam conhecer, amar e fielmente servir ao Senhor.

Mons. Francisco Pascucci

PARTE I
I. - RELIGIAO

1. - O cristão, isto é, aquele que, batizado, deseja seguir verdadeiramente a Jesus Cristo, professar-Lhe a fé e praticar-Lhe a santa lei, deve conhecer o necessário para conseguir o seu fim, isto é a vida eterna. Tudo isso, ele o aprende pelo estudo da Religião.
______

A palavra Religião, segundo alguns, deriva de relégere, isto é, tratar com cuidado, porque o homem religioso cuidadosamente trata das coisas de Deus; segundo outros, vem de religare, ligar, porque tem por fundamento o vínculo que liga o homem a Deus.
Esse termo, que pode oferecer vários sentidos, define-se em geral: "O complexo das relações que, ligam o homem a Deus".
Tais relações podem referir-se à vontade e à inteligência: - pela inteligência, temos as verdades a crer: pela vontade - a moral - isto é, as leis a observar.
De dois modos é possível adquirir-se o conhecimento dessas verdades e dessas leis: - simplesmente, como faz qualquer bom cristão, pelo estudo elementar do catecismo; cientificamente, apresentando as provas do que se deve crer e do que se deve praticar.
O estudo científico da Religião diz-se Apologética. É necessário ao cristão para dar a razão da sua fé e das suas práticas religiosas, assim como para saber responder aos contraditores da Religião.
A Apologética apresenta-nos a demonstração dos fundamentos da nossa fé e, especialmente, da existência de Deus.

II. EXISTENCIA DE DEUS

2. Muitos argumentos poderiam ser aduzidos para demonstrar a existência de Deus: - nós, pelo caráter do nosso tratado, nos limitaremos apenas a dois argumentos, dos mais fáceis, deduzidos da ordem do universo e dá existência da lei moral, reforçados pelo argumento do consenso universal do gênero humano.

1. - A ordem do universo

Todo efeito exige uma causa proporcionada a si mesma. Conseguintemente, onde houver ordem, há de ter havido um ordenador, isto é, uma inteligência que tenha ideado essa ordem e uma vontade que a haja querido assim.
Ora, há, no universo, uma admirável ordem, seja na estrutura íntima de cada ser, seja no conjunto das várias coisas harmonizadas entre si.
Logo, o universo é obra de um supremo ordenador, a quem chamamos - Deus.
Assim raciocina a própria criança, ao ver ordenados ao fim de marcar horas os maquinismos de um relógio: - não pode supôr que o relógio se haja formado por si ou como um efeito do acaso, mas o atribui a um relojoeiro.

2. - A existência da: lei moral

Todo homem sente em sua consciência uma lei que lhe impõe fazer o bem e fugir ao mal.
Toda lei supõe um legislador.
Ora, esse legislador não podemos ser nós mesmos, porque observamos que, pelo contrário, a nossa natureza mal suporta essa lei e quisera, antes, que tal lei não existisse; - não a sociedade, porque todos os homens, superiores ou súbditos, sentem em si tal lei.
Por ser, pois, lei universal, deve provir de um legislador acima e fora de toda a humanidade: - esse legislador é Deus.

3. - Consenso universal dos povos

Atesta-nos claramente a História que a existência de Deus foi admitida em todos os países e em todos os tempos. Os homens terão podido talvez errar quanto ao modo como formarem um conceito da divindade! mas foram sempre acordes em admitirei a existência.
Essa crença não pôde derivar do temor, porque se não teme um ser, cujo atributo principal é a bondade; - não da ignorância, porque a professam e comumente a admitem doutos e ignorantes; - não das paixões, porque a existência de Deus é, para elas, antes um incômodo.
Logo, urge concluir que foi imposta pela evidência objetiva, percebida pela razão.
O consenso universal dos povos vem, assim, dar uma conformação aos dois argumentos precedentes e constitui uma demonstração indireta da existência de Deus.
Aos argumentos da razão ajunta-se o argumento da fé por quanto o próprio Deus Se revelou ao homem de modo sobrenatural, Ele que Se revelara já ao homem por meio de Suas obras naturais.

III- A REVELAÇÃO

Definição. - Possibilidade. - Necessidade

3. - A Revelação é a manifestação de algumas verdades, feita por Deus à criatura inteligente.
A revelação é possível,
quer por parte de Deus, por que Ele é a Bondade infinita, sequiosa de comunicar-Se a criatura;
quer por parte do homem, por ser o homem inteligente, e, por isso mesmo, capaz de recebê-la.
Era necessária a revelação? Convém distinguir duas espécies de necessidades e duas espécies de verdades.
A necessidade pode ser absoluta ou física, ou pode ser necessidade moral.
Uma coisa é necessária de necessidade absoluta ou física, quando, sem ela, absolutamente se não pode conseguir o fim; por exemplo, a luz nos é absolutamente necessária para vermos os objetos.         
Uma coisa é necessária de necessidade moral, quando, sem ela, poderia conseguir-se o fim, mas imperfeita e dificilmente; por exemplo, a instrução, dada pelo professor, é necessária para eu aprender, embora por mim mesmo eu pudesse estudar.
Além disso, cumpre distinguir entre verdades de ordem natural, que formam a Religião natural, e verdades de ordem sobrenatural, que formam a Religião revelada.
No que respeita às verdades de ordem natural, que o homem, com suas forças naturais, lograria conhecer (existência de Deus, alma, eternidade, modo de honrar a Deus, etc.), a revelação só era necessária moralmente, enquanto a razão humana teria, sim, podido, sem ela, conhecer essas verdades, mas com dificuldade, muito imperfeitamente e exposta a muitos erros. Porque não possuem todos engenho suficiente, nem terão todos vontade e tempo de se aplicarem a estudá-las; e todos nós somos sujeitos a errar.
No que, porém, se refere às verdades de ordem sobrenatural, a revelação foi necessária absolutamente, porque o homem, munido apenas das forças naturais, não poderia conhecê-las, e, por outro lado, tal conhecimento lhe era necessário para obter o fim sobrenatural a que Deus, por bondade, o elevara.

4. - Períodos da Revelação

4. - Deus não revelou de uma só vez ao homem todas as verdades religiosas; mas fê-lo gradativamente.
Daí, três períodos na divina revelação: - primitivo ou patriarcal, mosaico e cristão.
O período primitivo ou patriarcal vai da criação a Moisés: - nele, falou Deus aos patriarcas revelando-lhes algumas verdades e vários preceitos, entre os quais os da lei natural.
A revelação, deviam conservá-la na consciência e passá-la de geração a geração, para o que sobremaneira contribuía a longevidade dos Patriarcas.
O período mosaico vai de Moisés à vinda do Redentor, - e, neste, falou Deus ao povo eleito por meio de Moisés e dos profetas, revelando-lhes novas verdades, sobre dar-lhes, em duas tábuas de pedra, a lei escrita.
O período cristão abrange a revelação feita pelo nosso Redentor divino, que aperfeiçoou a revelação primitiva e a revelação mosaica no tocante às verdades ensinadas e aos preceitos da lei natural, e cumpriu as promessas contidas nas revelações precedentes.
Com a morte do último apóstolo, São João Evangelista, encerrou-se a revelação. Depois desta, não há mais verdades novas a revelar.
Quando, pois, a Igreja docente nos define uma verdade de fé, não acrescenta verdade nova ao depósito da revelação, mas apenas define, isto é, declara, de modo a ninguém poder duvidar, que aquela verdade estava já implícita na revelação, e desta lhe deduz as provas.

5. Fontes: Sagrada Escritura e Tradição

5. - São fontes da revelação divina – A Sagrada Escritura e a Tradição.
A Sagrada Escritura ou Bíblia é o complexo dos livros escritos por inspiração de Deus e declarados tais pela Igreja.
A Sagrada Escritura tem por autor primário a Deus, e, como simples instrumento, o escritor.
Deus não ditou uma por uma todas as palavras ao escritor, mas inspirou-o, isto é, iluminou-lhe a mente nas coisas que Ele queria fossem escritas, moveu-lhe a vontade para escrever e assistiu-lhe de tal modo que não errasse em nos comunicar o divino ensinamento.
Além do que os livros da Sagrada Escritura também gozam de autoridade humana: - considerados ótimos documentos históricos, porque são genuínos, isto é, do autor da época a que se atribuem, ou, pelo menos, não publicados como obras de outros autores ou de outras épocas: são verazes, isto é, não enganam e não querem enganar; são íntegros, isto é, chegaram até nos tais quais saíram das mãos de seus autores.
Os livros da Sagrada Escritura dividem-se em Velho e Novo Testamento.
A palavra Testamento significa pacto ou aliança:
o Antigo Testamento é a aliança de Deus com o povo hebreu;
o Novo é a aliança de Deus com a humanidade inteira, aliança selada com o sangue de Jesus Cristo.
Em cada Testamento, dividem-se os livros em históricos, proféticos e sapienciais.
Os principais livros históricos do Novo Testamento são os quatro Evangelhos escritos por São Mateus, São Marcos, São Lucas e São João.
A Igreja, mestra infalível, dá-nos o Canon, a saber - a lista autêntica dos livros divinamente inspirados. Segundo esse Canon, sancionado pelo Concilio Tridentino, compreende a Bíblia 71 livros - 44 pertencentes ao Velho Testamento e 27 ao Novo.      
A Tradição é o ensino de Jesus Cristo e dos Apóstolos, feito de viva voz, e transmitido, sem alteração, até nós, pela Igreja. A Tradição é uma fonte de revelação, anterior e mais vasta que as Escritura, e merece a mesma fé.
Encontra-se a tradição nos símbolos e nas profissões de fé, nos atos dos Concílios, nos escritos dos Padres da Igreja, na prática geral e constante da própria Igreja, na liturgia, etc, Assim como a Sagrada Escritura, a Tradição foi também confiada ao magistério infalível da Igreja.

6. - Caracteres internos e externos

6. - Os caracteres, para se reconhecer se uma verdade ou um complexo de verdades, e, portanto, da religião, são revelados, uns são internos, externos outros.
A. - Os caracteres internos são negativos ou positivos.
Os caracteres negativos consistem em que não pode ser revelada uma doutrina que encerre contradições ou coisas contrárias à reta razão ou aos bons costumes; e, pelo contrário, pode ser revelada, desde que esteja plenamente em harmonia consigo mesma, com a razão e com a regra dos bons costumes.
Os caracteres positivos consistem em santidade, sublimidade e pertinácia de doutrina tais como não as poderia sequer imaginar a mente humana.
B. - Os caracteres externos são os milagres e as profecias, enquanto aqueles e estas somente poderiam provir de Deus; sendo revelada a doutrina à qual Deus apôs tal selo.

Santo Estevão, Mártir.

Fonte: Escravas de Maria

26/12 Quarta-feira
Festa de Primeira Classe Oitava de Natal
Paramentos Vermelhos


Santo Estevão, seu nome vem do grego Στέφανος (Stephanós), o qual se traduz para aramaico como Kelil, significando coroa - e Santo Estêvão é, de resto, representado com a coroa de martírio da cristandade, recordando assim o fato de se tratar do primeiro cristão a morrer pela sua fé - o protomártir. Alguns da sinagoga se levantaram a disputar com Estevão, mas não podiam resistir à sabedoria e ao Espírito que nele falava. Então subornaram alguns homens, que agitaram o povo. Levaram-no ao conselho e apresentaram falsas testemunhas, que disseram: “Este homem não cessa de proferir palavras contra o lugar santo e contra a lei”. (Atos 6,8-13). Ele, porém, disse: “Irmãos e pais, escutai. O Altíssimo não habita em edifícios construídos por mãos de homens, como diz o profeta: “O Céu é o meu trono e a terra o escabelo dos meus pés. Que casa me edificareis?” diz o Senhor, “ou qual é o lugar do meu repouso? Não fez porventura a minha mão todas estas coisas?” Homens de dura cerviz e de corações e ouvidos incircuncisos, vós sempre resistis ao Espírito Santo; assim como agiram vossos pais, assim o fazeis também! A qual dos profetas não perseguiram vossos pais? E mataram até os que anunciavam a vinda do Justo, do qual agora fostes traidores e homicidas, vós que recebestes a lei por ministério dos Anjos e não a guardastes”. Ao ouvir, porém, tais palavras, enraiveceu-se-lhes o coração e rangiam os dentes contra Estevão. Mas como estava cheio de Espírito Santo, olhando para o céu, viu a glória de Deus e Jesus à destra de Deus. E disse: “Eis que estou vendo os céus abertos e o Filho do Homem à direita de Deus”. Então, levantando uma grande gritaria, taparam os ouvidos e, todos juntos, arremeteram com fúria contra o santo diácono e, tendo-o lançado para fora da cidade, apedrejaram-no; e as testemunhas depuseram os mantos aos pés de um moço, que se chamava Saulo.

terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Da virtude mais necessária aos capitalistas

Nota do blogue: Acompanhe esse Especial AQUI.

Padre Júlio Maria, C.SS.R.
As virtudes, 1936.

Começo pela mesma observação preliminar que fiz na conferência anterior. É livre a quem quer que seja, não obstante a tríplice e magnífica certeza, histórica, experimental e psicológica, da divindade de Jesus Cristo, recusá-la. O que, porém, ninguém pôde fazer, porque isso não permite o senso comum, é aceitar a divindade e recusar o ensino de Jesus Cristo, que, em síntese, quanto ao seu resultado, se resume nesta alternativa oferecida a todos os homens: a vida eterna ou a morte eterna.
A vida eterna reduz-se, como bem demonstrado ficou, a esta tríplice felicidade; plenitude de espírito, plenitude da verdade no espírito, plenitude do amor no coração, plenitude do gozo no corpo.
Todos os homens, porém, conseguem essa felicidade, que será a consumação, para cada homem, do seu destino?           
O ensino de Jesus Cristo, transmitido à humanidade pela Igreja, responde negativamente, isto é, que conseguem a vida eterna os que observam a lei religiosa e perdem-na os que a infringem.
Nada de sensato se pode opôr ao ensino da Igreja, porquanto trata-se de lei religiosa e sua sanção. Ora todas as leis - a lei natural, a lei moral, a lei civil, as próprias leis da matéria têm a sua sanção, que o homem não pode evitar, desde que as infringe. Assim, um homem pode tomar, se lhe apraz, uma porção de veneno, mas não pode deixar de envenenar-se. Pode disparar um tiro sobre o seu semelhante, mas não pode evitar as consequências do ato criminoso. Pode faltar à sua obrigação de cidadão, eximindo-se ao pagamento de imposto, mas não pode evitar a respectiva pena. Como, pois, poderia infringir a lei religiosa, sem ficar sujeito à sanção da mesma lei? Absurdo! A sanção da lei religiosa é proporcional à felicidade perdida. A felicidade perdida é uma vida eterna. A pena, portanto, não pode deixar de ser uma morte eterna. Esta morte Jesus Cristo a proclamou e ensinou.
Nem a leviandade dos homens pode infirmar a palavra de Deus; nem o interesse das paixões pode mudar a natureza das coisas.
O inferno é uma verdade, não só porque Jesus Cristo afirmou, como porque tudo o exige, sob pena de tudo ser uma mentira, uma ilusão. Ele o afirmou, descrevendo-o no Seu Evangelho, como - dores, lágrimas eternas, gemidos eternos; sendo que esta pena, que é dos sentidos, não é a maior, porque a maior é a perda de Deus, a privação da vida beatífica.
Antes de prosseguir, devo observar que, muito de indústria, usa da palavra inferno, não preferindo expressões equivalentes muito usadas; como por exemplo, a eternidade, dores, etc...
A razão é que a palavra inferno vai se tornando, entre nós, uma palavra ridícula, como que significando apenas um espantalho para crianças ou um terror para néscios. Até da pregação - oh que tristeza! - com a palavra, que se teme, desagrade aos ouvintes, vai desaparecendo o ensino que se teme incorra nas zombarias dos incrédulos. É assim que sermões e sermões, homilias e homilias, conferências e conferências se fazem; e o inferno fica escondido para se não ofenderem os melindres da época.
Não admira, pois, que o traço da fisionomia brasileira que devo apontar-vos hoje, seja este – o nenhum temor do inferno.
Uma multidão, de homens vive, ou não, acreditando teoricamente no inferno, ou crendo, mas procedendo de tal maneira que, praticamente é como se o inferno não existisse.
Os capitalistas, por exemplo, expressão genética em que podem ser compreendidos todos os ricos, os proprietários, todos os homens opulentos pelo dinheiro ou por bens equivalentes, esses entendem que a filantropia basta para salvar o homem e que, se ela reveste a forma de esmola aos pobres, então o réu está garantido.
Nem a filantropia, simples madrasta, incapaz de substituir a mãe verdadeira que é a caridade; nem esmola, grande meio de obter graças e favores de Deus basta ao homem para evitar o inferno. A filantropia tem belas obras, e muito para admirar, sem dúvida, são os seus hospitais, os seus asilos, as suas escolas. Mas ela, sem dúvida, não dá ao homem a perdão dos seus pecados graves. A esmola é um sinal de predestinação naquele que tem verdadeiramente o amor dos pobres, dos órfãos, dos desvalidos, dos abandonados; mas a esmola não é um sacramente não tem a virtude de operar a justificação do pecador. Entender-se o contrário é uma ilusão perigosa, que bem se verifica neste fenômeno de atualidade brasileira - a vida sem oração.
Há um verso de Vitor Hugo, em relação à perturbação que causaria no equilíbrio do mundo físico a supressão de um só ninho da floresta; e diz que maior seria a perturbação que traria ao mundo moral a supressão de uma só oração, feita por lábios, humildes, mas que tantas vezes é a causa determinante das maiores misericórdias, para o homem e para os povos. Não; não me objeteis contra a oração o que vós, incrédulos, chamais as leis inflexíveis da natureza. Não há leis inflexíveis ou invariáveis; todas obedecem a Ele, que, aliás ab eterno, antes mesmo da criação do mundo, ouviu a nossa súplica e pode ter disposto, se assim lhe aprouve, todas as coisas de modo a ser satisfeita a nossa oração.
A oração, fiquem sabendo tantos, entre nós, que a desprezam, não é só essa lei de equilíbrio a que acabo de referir-me; é também uma lei universal; a criança pede a sua mãe, o fraco pede ao forte, o pobre pede ao rico, o homem pede a Deus.
Bela, porque é o reconhecimento da nossa indigência, a oração, além disso, é onipotente para obter certos favores de Deus, sucedendo que, mesmo entre os homens, quanto mais fraco é um ser, mais poderosa é a sua súplica, não se podendo supôr que haja um só homem capaz dê não ouvir a súplica de uma criança.
A vida sem oração explica em parte o nenhum temor do inferno, como, por seu turno, este nenhum temor tem uma causa fácil de averiguar-se - a ignorância do catolicismo, do que ele ensina, do que se deve crer, em relação ao inferno.
Trata-se de uma verdade que pode ser provada com todos os gêneros de provas; e, numa vasta exposição, darei o testemunho da história, da filosofia da história, da critica histórica, da psicologia, da metafísica, da moral, do direito natural, do direito criminal, dos atributos de Deus e da economia da redenção.
Da história deduzo que a crença no inferno é universal, não só dos povos cristãos, mas de todos os povos antigos e modernos, judeus ou gentios, bárbaros ou civilizados; sendo certo que o inferno de que nos fala S. Paulo era também afirmado por Cícero, Platão; que a morte eterna de que nos fala Cristianismo era também reconhecida pelo paganismo.
Da filosofia da história deduzo que um fenômeno universal supõe uma causa universal, isto é, o inverno universalmente acreditado, não pode deixar de ser uma revelação de Deus.         
Da critica histórica deduzo que não podia a própria humanidade ser quem inventasse o inferno, porque o homem, cheio de vícios e paixões, não seria capaz de inventar semelhante castigo para si próprio.
Da psicologia, isto é, da analise da alma humana deduz o que o sentimento do inferno está profundamente gravado na nossa natureza, e tanto, que dele diz o celebre teólogo: "é um diamante negro engastado nas profundezas do coração humano”.
Da metafísica deduzo a necessidade de uma conclusão eterna para o destino do homem, porque todas as coisas estão compreendidas entre dois termos: o principio e a conclusão, ambos eternos, porque se o principio não fosse eterno não seria princípio; e conclusão eterna, porque se não fosse eterna não seria conclusão.
Da moral deduzo que, da mesma sorte que duas linhas paralelas, por mais que se prolonguem, não se podem encontrar, assim também o bem e o mal não podem chegar a mesma conclusão: deve chegar à vida eterna, o outro deve chegar à morte eterna.
Do direito natural deduzo que, sendo o homem livre; o próprio Deus, respeitando essa liberdade, não pode conduzir ao céu o homem que recusa a vida.
Do direito criminal deduzo que muito especiosa lê a objeção que opõe, contra o inferno, a suposta crueldade de punir eternamente aos passageiros como os pecados, porquanto a própria criminologia humana nos ensina que a pena se mede, não pelo tempo gasto na perpetração do delito, mas pela intenção do delinquente. É certo que o adultério, o roubo, o homicídio e, em geral, todos os crimes cometem-se em poucos instantes; entretanto a sociedade os pune com muitos anos de prisão, havendo mesmo casos de galés perpétuas, de exílio e de morte civil. Ora, que é que isto mostra? Mostra que, se a própria sociedade existisse eternamente, ela puniria eternamente certos homens. O que a sociedade não pode fazer, fá-lo Deus, que conhece toda a malícia da intenção e dá-lhe, quando é justo, a pena do inferno, infinita na duração, porque na eternidade não há tempo, mas finita na intensidade, porque será proporcionada à malicia da intenção do homem impenitente; e só deste é que se trata, isto é, do homem que no uso de sua liberdade, recusa, pela reparação de seu pecado, a salvação que a todos Deus oferece.
Dos atributos de Deus deduzo que a veracidade, a onipotência, a justiça e a providência de Deus exigem o inferno; a veracidade, porque Deus o revelou em todos os tempos; a justiça, porque sem o inferno o bem e o mal teriam a mesma conclusão; a onipotência, porque sem o inferno Deus não poderia punir eternamente, podendo recompensar eternamente a providência divina, porque, sem ela, sem reparação ficariam todas as desigualdades e dotes e iniquidades humanas.
Eis todos os atributos de Deus exigindo o inferno; e ainda há, não poucos, que aleguem contra o inferno o amor de Deus, como se o amor de Deus pudesse anular todos os outros atributos de Deus e como se o inferno não fosse a recusa do próprio amor.
Chego ao que chamo prova decisiva, definitiva, irrecusável, da existência do inferno. Esta prova é a economia da redenção.         
Que é a redenção? É o mistério de um Deus que se fez homem para salvar o homem. Salvá-la de que? - dos meios temporais, das enfermidades, das dores, da pobreza, da morte física? Não, porque todas estas causas continuam.
Logo Jesus Cristo nos veio salvar do Inferno, como Ele próprio declarou; é certo que Jesus Cristo, sendo Deus, Sua morte é um sacrifício infinito. Ora, um sacrifício infinito, dado como um remédio ao homem para salvar-se, supõe um mal infinito, o inferno. Só o inferno explica a Paixão e a Morte de Jesus Cristo, que supre o que nos falta, mas não nos dispensa de um ato imprescindível aos seres livres: a reparação de seus pecados.
Eis o ensino que a Igreja dá a todos os homens, mas para o qual eu chamo hoje principalmente a atenção dos capitalistas, observando-lhes: não é a riqueza uma coisa má em si, mas ela é das que, mal aplicadas, mais afastam do céu. Não basta a esmola para que coisa tão perigosa se transforme em meio de salvação.
Há só um meio de tirar à riqueza todo o mal. Porque esse meio não só diviniza a esmola, mas leva o homem à pratica de todas as virtudes, inclusive a necessária confissão dos seus pecados.
O meio a que me refiro é a Caridade, que, amor de Deus, não se deve confundir nem com a filantropia, nem com a compaixão natural pelos pobres.
Ouvi o apóstolo S. Paulo: "A mais excelente das virtudes é a caridade. Ela é o resumo de toda a lei. Ela é o laço da perfeição. Ela é tal, que se eu falasse a língua dos homens e dos anjos, mas não tivesse a caridade, eu não seria mais do que um bronze soando.” Se eu possuísse o dom de profecia e se eu penetrasse todos os mistérios, e se eu possuísse toda a ciência, e se eu tivesse uma fé capaz de transportar montanhas, se não tivesse caridade - eu nada seria. E se (ouvi capitalistas)... se eu distribuísse pelos pobres todos os meus bens... sem a caridade isso não me aproveitaria! Para que, pergunto, dizer muitas coisas da caridade, depois de citar esta sublima explosão do apóstolo?
A caridade, direi apenas, é mais que filantrópica; é mais do que a compaixão natural: é o amor de Deus.
É a ultima, a mais alta, a mais divina das virtudes.
Não só a caridade é a consumação de todas as obras de Deus: a criação, a encarnação, a redenção; ela é também a rainha do tempo e da eternidade. Do tempo, porque ela cumpre toda a lei cristã, encerra todos preceitos em um preceito universal, prevalece sobre os dons mais sublimes e as virtudes mais excelentes. Da eternidade – porque ela sobrevive às coisas do tempo, e, quando já a fé tiver desaparecido na visão, quando a esperança tiver já desaparecido na posse, ela – a Caridade – terá no céu todas as suas delícias e todos os seus esplendores.