domingo, 3 de fevereiro de 2013

Amor de Deus - 3.ª Parte (Motivos/prática/vantagens do amor de Deus)

Nota do blogue: Acompanhar esse Especial AQUI.

 Cônego Júlio Antônio dos Santos
O Crucifixo, meu livro de estudos - 1950
2- Motivos do amor de Deus

1 - Devemos amar a Deus porque o próprio Deus o ordena

“Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, e com todas as tuas forças.”
Este mandamento é o primeiro e o maior. É o primeiro na sua ordem, como o mais essencial. O único essencial. - É o maior pela majestade do seu objeto: Deus; pela sua extensão: compreende todos os nossos deveres “o amor é a plenitude da lei” pelo seu fim: a glória de Deus e a felicidade das criaturas as quais se alcançam sobretudo pelo amor; pelo rigor da sua obrigação: ninguém está dispensado dele.

2 - Devemos amar a Deus porque a nossa natureza o exige

Há em nós uma inclinação para tudo o que é belo e bom. Esta inclinação é tão violenta que nos apegamos algumas vezes, de maneira desordenada, às criaturas que nos manifestam alguma beleza ou bondade. Ora Deus e só Ele, possui todas as perfeições que a imaginação pode conceber. Por isso, somos irresistivelmente atraídos para Deus.
E logo que o amor dá entrada no coração faz guerra de extermínio a todos os vícios.
Basta dizer que o Espírito Santo compara-o à morte - fortis est ut mors dilectio, o amor é forte como a morte.
Não há força que resista à morte, diz São Leonardo, arranca o filho ao pai, o ambicioso às suas dignidades, o avarento aos seus tesouros, ataca mesmo os exércitos no campo da batalha.
Omnia separat amara mors. - A morte separa de tudo. Eis precisamente o que faz o amor; aquele que ama a Deus de todo o seu coração, está desapegado de todos os bens do mundo; está morto para o mundo, a sua divisa é a do Apóstolo: Mihi vivere Christus est. A minha vida é Jesus Cristo.
Há em nós uma inclinação para sermos reconhecidos e, por consequência, para amarmos aqueles que nos fazem bem. Ora quem nos terá feito mais bem do que Deus?
Deus é nosso Criador e foi por amor que nos criou.
Deus é nosso Conservador, é a Ele que recebemos a vida, o movimento.
Deus é nosso Redentor, deu-nos o Seu Filho que, por amor, quis morrer por nós.
Deus é nosso Santificador, pelas Suas graças contidas nos sacramentos, purifica-nos e edifica-nos, em certo modo.
Deus é nosso Remunerador, é por amor que dá o Céu aos Seus servos fiéis.

3- Prática do amor de Deus

Para termos uma caridade perfeita para com Deus, São Lourenço Justiniano propõe-nos três meios muito eficazes: libenter de Deo cogitare, libenter pro Deo dare, libenter pro Deo pati; isto é, pensar de boa vontade em Deus, dar de boa vontade por amor de Deus e sofrer de boa vontade por Deus.

1 - Pensar muito em Deus

O primeiro meio de inflamar o nosso coração no amor de Deus é: pensar muito em Deus. Na verdade quanto mais aprofundamos o conhecimento de Deus, mais aprendemos quanto é digno de ser amado. E, então, a nossa ocupação mais agradável é fazer atos de amor, de complacência para com Deus, regozijando-nos de Deus ser Deus; de amor de benevolência desejando que seja conhecido, amado e servido de amor de preferência, pondo Deus acima de todas as criaturas.
Para este fim devemos amar a oração, a meditação, o retiro. O retiro, segundo São Luiz de Gonzaga, é como a casca das árvores que as preserva do frio e do calor, despojada da casca, a árvore seca. Assim o recolhimento serve para conservar em nós a lembrança de Deus e com a lembrança de Deus o Seu santo amor.

2- Dar de boa vontade a Deus

O segundo meio de nos abrasarmos no amor de Deus é: dar de boa vontade a Deus. - De muitas coisas nos podemos privar para dar a Deus um testemunho do nosso amor: 1.° Devemos privar-nos de todos os excessos do amor próprio que é o único veneno da verdadeira caridade para com Deus. Por amor próprio entende-se aqui a inclinação perversa do coração humano para com a sua própria satisfação em todas as coisas.
Compenetremo-nos, pois desta verdade, que, para sermos amigos de Deus devemos ser inimigos de nós mesmos, praticando generosamente a mortificação e aplicando-a, sobretudo às partes mais sensíveis. Não agradamos a Deus se fizermos consistir a nossa virtude num exterior composto, numa atitude devota, numa aparência que é, muitas vezes, mais o resultado da educação do que da graça. Agradeçamos-Lhe sim, se fizermos consistir a nossa virtude em triunfar continuamente do amor próprio, aproveitando todas as ocasiões, que se nos apresentam no decurso do dia, para mortificá-lo.
- Santa Teresa, interrogada por uma enfermeira porque não comia de um alimento que parecia bem preparado, respondeu: É precisamente porque é bom que eu não como.
Eis como procede aquele que ama a Deus. Abstém-se de tal alimento porque é agradável ao paladar; retém uma palavra que lhe vem à língua porque é picante; serve gostosamente tal pessoa porque é ingrata; gosta de se entreter com tal outra porque é desagradável.
Se procedermos assim sentiremos que, em pouco tempo, o nosso coração arde na mais bela chama da caridade. 
Examinemo-nos bem e tomemos as nossas resoluções.
O amor de Deus obriga-nos a evitar tudo o que possa ofendê-lO por ser infinitamente santo e infinitamente justo.
Porque Deus é infinitamente santo, devemos temer ofendê-lO, de maneira a não Lhe desagradarmos em coisa alguma; porque é infinitamente, justo, devemos temer ofendê-lO, de maneira a não atrairmos justos castigos sobre nós.
O temor de Deus não nos leva a fugir de Deus, mas a fugir de tudo o que Lhe pode ser desagradável, isto é, do pecado e das ocasiões do pecado. Assim, se estamos na graça de Deus, devemos fugir da ocasião do pecado com medo de a perder; se caímos em pecado, devemos logo pedir sinceramente perdão com medo da justiça divina ofendida. 
- Estamos dispostos a não ofender a Deus gravemente pelo pecado mortal? Se a nossa generosidade se limita simplesmente a isto, diz São Leonardo, a nossa generosidade é como a dos facínoras, est beneficium latronum, que julgam que lhes deveríamos ficar muito obrigados porque, apesar de nos tirarem a bolsa, nos deixaram a vida.
Estamos dispostos a nem sequer ofender a Deus levemente por pecados veniais? É um grau mais elevado, mas é ainda muito pouco. - Estamos dispostos a fazer a vontade e gosto de Deus, tanto quanto é possível fazê-lo sobe a terra? Eis o amor verdadeiro, eis uma disposição digna para introduzir a caridade nos nossos corações.
Probatio amoris exhibitio est o peris - O amor manifesta-se por obras.

3 - Sofrer de boa vontade por Deus

O terceiro meio de acender em nossas almas fogo do amor divino é sofrer de boa vontade por Deus. Tudo o que não é mortificação não é senão devoção aparente. Os nossos exercícios de piedade, oração, meditação, senão produzem o espírito de mortificação e o desejo de sofrer de boa vontade por amor de Deus, são como belas árvores ornadas de folhas e flores sem fruto.
 “Desenganai-vos, diz São Francisco de Sales, a lenha mais própria para queimar e despertar as chamas da caridade é a lenha da cruz; uni o vosso coração com a santa mortificação e assim estareis dispostos para um grande amor.”
Gravemos, pois, profundamente no nosso coração esta máxima de santa Teresa: ou sofrer ou morrer, ou então a de santa Madalena de Pazzi; sofrer e não morrer; ou antes, depois destas preciosas máximas formulemos uma terceira, que nos será bem mais apropriada e mais proveitosa: sofrer e amar; sofrer e amar para tornarmos Deus propício durante a vida e na hora da morte; sofrer e amar para assegurarmos o gozo de Deus por toda a eternidade.
- O amor de Deus pode aumentar:
1.° Pela meditação das perfeições e benefícios de Deus. “Alimenta-se o fogo juntando-lhe lenha ou carvão; alimenta-se o amor de Deus, diz São Lourenço Justiniano, pela meditação das verdades divinas.” E pela meditação, sobretudo da Paixão e Morte de Jesus. “A montanha do Calvário, diz São Francisco de Sales, é a melhor escola do amor.” - 2.° Pelo desprendimento das coisas da terra. O desprendimento das coisas da terra contribui também para o aumento da caridade. A lenha arde tanto melhor quanto mais seca e menos úmida; assim a chama do amor divino abrasará tanto mais as nossas almas, quanto mais desprendidas elas estiverem das inclinações viciosas. - 3.° Por frequentes atos de caridade. Toda a faculdade se desenvolve pelo exercício, assim a faculdade de amar a Deus aperfeiçoar-se-á pela repetição de atos de caridade.
O amor de Deus perde-se pelo pecado mortal. Um jato de água apaga instantaneamente o fogo físico e o pecado mortal o fogo do amor divino.

4 - Vantagens do amor de Deus

O amor de Deus é proveitosíssimo para nós - tanto neste mundo como no outro.
Neste mundo. - 1.º O amor de Deus ilumina a nossa razão. - A nossa alma assemelha-se a um espelho que reflete os objetos que lhe apresentam. Se voltarmos, portanto, a nossa alma para o amor de Deus, nela resplandecerá a divindade, quer dizer, compreenderá melhor as coisas divinas, será iluminada.
O ferro em brasa deixa-se facilmente trabalhar, a alma abrasada no amor de Deus, é mais sensível às inspirações do Espírito Santo. Aquele que tem maior caridade, atinge um conhecimento mais perfeito de Deus. É o que sucede com o fogo; quanto mais ardente mais viva é a sua luz.
2.° O amor de Deus robustece a nossa vontade. - Não há nada que dê mais força e coragem que o amor. “O amor suporta tudo, diz o Apóstolo São Paulo, e tudo sofre.” (I Cor. XIII, 7).
3.° O amor de Deus obtém-nos o perdão dos pecados. - Jesus Cristo disse de Madalena pecadora; “Perdoados lhe são muitos pecados porque amou muito.” (Luc. VII, 47). “O amor, diz São Pedro, cobre a multidão das faltas.” (I Ped. IV, 8).
No outro mundo. 1.º Pelo amor de Deus obtemos os gozos do Céu. “Nunca os olhos viram, nem os ouvidos ouviram, nem jamais o entendimento do homem compreendeu o que Deus tem preparado para aqueles que o amam.” (I Cor. II, 9).
1.º O amor de Deus valoriza as nossas boas obras- Às nossas boas obras terão valor tanto maior, diz São Francisco de Sales, quanto maior for a caridade com que as praticarmos. “O amor é o tempero das boas obras, diz São Boaventura; quanto mais temperos desses possuímos, mais as nossas obras são agradáveis ao paladar de Deus.” A comida sem sal não tem sabor nenhum, assim as nossas obras se lhes falta o amor, não são ao gosto de Deus.
2.º O amor de Deus aumenta a nossa felicidade no Céu. - A nossa felicidade será tanto maior quanto maior for, ao morrermos, o grau do nosso amor.
Quanto mais tivermos amado, diz São Francisco de Sales mais seremos glorificados no Céu. Um pai também dá mais àquele dos seus filhos que lhe mostrou mais afeição. O amor é o peso do homem; quer dizer que quanto mais ele ama, maior é o valor que tem diante de Deus.