sábado, 27 de abril de 2013

Amor do próximo - Quarta Parte

Nota do blogue: Acompanhar esse Especial AQUI.
Cônego Júlio Antônio dos Santos
O Crucifixo, meu livro de estudos - 1950

Pecados de ações contra o próximo

            Compreendem todas as ações que ofendem o próximo como: a agressão, o assassinato, o escândalo. «Não matar!» Não devemos danificar a vida natural do próximo, isto é, a vida do corpo, nem prejudicar a sua vida sobrenatural isto é, a vida da alma provocando o pecado pelo escândalo.

Ofensas à vida natural
            A vida natural ou do corpo fica prejudicada pelo suicídio, pelo homicídio e pela briga.

            I. — Suicídio
            Que é o suicídio?
            O suicídio é o crime de quem dá a morte a si próprio.

            Gravidade do suicídio.
            O suicídio é um pecado gravíssimo, pois constitui um atentado contra Deus; uma cruel­dade para consigo mesmo e grande covardia e injustiça, contra a sociedade.

1.  E um atentado contra Deus cujos direi­tos usurpamos. Somente Ele no-la pode tirar. Concedeu-nos o uso dela, e não a propriedade.
2.  E uma crueldade consigo mesmo; com efeito, dando a morte a si mesmo despenha-se na condenação eterna, porque, ordinariamente, perde-se a vida no próprio ato do crime, sem haver tempo para o arrependimento.
3.  E uma covardia. — Longe de ser ato de coragem, não passa o suicídio de covardia: dá cabo da vida quem não possui a devida energia para suportar uma dor física ou moral.
4.  E uma injustiça para com a sociedade que nos educou e instruiu, e, portanto, tem direito aos serviços que lhe podemos prestar. Quem se mata rouba à família um membro e à pátria um cidadão que lhes poderia ser útil.
            O suicídio é, geralmente, cometido por pes­soas sem fé, que vivem no pecado ou na misé­ria, e que desesperam do socorro e da miseri­córdia de Deus, e, às vezes, também por pessoas irresponsáveis. Nenhuma razão pode desculpar o suicídio voluntário. Para inspirar horror a este crime nega a Igreja o socorro das suas orações e sepultura cristã aos que se suicidam sem terem dado provas de arrependimento.
            É lícito, porém, e até muito meritório, sacri­ficar a saúde ou a vida quando isto é necessário para obter a vida eterna ou quando com isto se pode salvar a vida da alma ou do corpo dos nossos semelhantes.

            II. — Homicídio
            Que é homicídio?
            Homicídio é a morte dada voluntária e injus­tamente ao próximo.
            Gravidade do homicídio.
            Tanto o homicídio direto em que se dá a morte ao próximo injustamente, como o homi­cídio em que se coopera para isso, é condenado por três razões.
1.  É crime contra Deus, cujos direitos usur­pamos. Somente Ele é o Senhor da vida. Ele quem no-la deu e só Ele no-la pode tirar.
2. É crime contra o próximo. — Se não pode mos atentar contra a nossa própria existência, também não podemos tocar na vida dos outros. É princípio elementar de justiça. Depois é pre­ceito da caridade que não façamos aos outros o que não queremos que os outros nos façam. Ora, é vontade nossa que respeitem a nossa vida, logo não ofendamos a vida dos outros.
3.  É crime contra a sociedade. — A socie­dade deve contar legitimamente com os serviços de todos os seus membros. Quem deles a esbulha, sem causa lícita, comete uma injustiça.

            III. — Briga
            Que é a briga?
            Briga é a luta entre duas ou mais pessoas, às vezes, com perigo de se ferirem e perderem a vida.
            Gravidade da briga.
            A briga é proibida:

1.  Pelo direito natural. Nenhum homem tem direito à sua vida nem aos seus membros nem tampouco à vida e membros alheios.
2.  Pelo direito divino. — A lei que proíbe o homicídio, proíbe, pela mesma razão, expôr-se a perder a vida ou a pôr em perigo a vida do próximo.

Causas de atentado contra a vida natural

         O homem que não é anjo nem animal segundo a expressão de Pascal, tem, todavia, ao mesmo tempo, o orgulho do anjo e a crueldade dos animais ferozes. Anjo decaído renovará sempre esta luta empreendida pelo orgulho contra a obe­diência; animal racional sentirá sempre dentro de si instintos cruéis que o impelem a usar da força contra a força, e usará mesmo da sua razão para excogitar os meios de se tornar mais desumano.
            Os atentados contra a vida natural são, pois, ordinariamente provocados pelos falsos prazeres, falsa vergonha, falsa piedade, tudo prove­niente dos instintos da carne, e pela falsa honra, filha do orgulho do espírito.

1. Falsos prazeres. — A paixão mais desen­freada, mais agradável à natureza e repugnante a Deus, a paixão da carne ou dos prazeres sen­suais é a mais homicida. Fere a infância na sua flor, ataca a juventude no seu vigor. A juventude não morre, suicida-se com os prazeres. Esse jovem, que peca contra a castidade, con­sigo mesmo ou com outrem, lembre-se de que esse sangue derramado clama como o de Abel contra o seu crime de verdadeiro homicida. Vox sanguinis clamat de terra.
            A paixão dos prazeres sensuais vai até matar, sob o véu sagrado do matrimônio, o germe da vida. Impedir de conceber é matar antecipada­mente. E, por isso, é homicida não só aquele que tira a vida a quem a tem, mas também o que priva dela o germe que a poderia ter. Lembrem-se esses esposos criminosos de que esse sangue, derramado por deboche, clama como o de Abel contra o seu crime de verdadeiros homicidas. Vox sanguinis clamat de terra.
            Um dia, diz ao jovem Tobias o seu compa­nheiro celeste, o arcanjo São Rafael: Há aqui uma donzela muito honesta, chamada Sara e tu podes casar com ela. Oh! exclamou Tobias, eu já ouvi dizer que ela teve sete maridos e que todos lhe morreram, porque o demônio lhos matou e eu temo que me aconteça o mesmo. Efetivamente, confirma o arcanjo, aqueles que vão para o matrimônio só com o fim de satis­fazer as suas paixões, são aqueles mesmos que o demônio persegue e mata, mas contigo não há de acontecer o mesmo; tu receberás esta donzela no temor do Senhor, levado mais pelo desejo de ter filhos do que por sensualidade. (Tob. VI, 10-22). Os pecados desses maridos dissolutos bradam ao Céu. Vox sanguinis clamat de terra.

2.  Falsa vergonha. — A mulher para ocultar a sua falta, que a enche de vergonha, trata por arte infernal, de desmanchar, destruir o germe de vida ou o pequenino ser, no seio materno. Esse sangue que ela e seus cúmplices derrama­ram clama como o de Abel contra tão nefando crime — Vox sanguinis clamat de terra.

3.  Falsa piedade. — Sob a pressão de uma falsa piedade julga-se lícito matar o filho para salvar a mãe. Ora nunca é licito matar diretamente um inocente. O sangue deste inocente clamaria como o de Abel contra tão abominável crime. Vox sanguinis clamat de terra. — Uma medicina, que se diz humana, serve-se de estu­pefacientes para tornar o moribundo insensível à dor ou abreviar-lhe a vida. Piedade homicida! ciência odiosa! O nosso corpo sucumbe, mas a nossa alma subsiste a esses destroços e pode ainda sentir, pensar e querer. Devemos ter um grande desejo de exalar conscientemente o último suspiro no seio de Deus. Deixem que o nosso coração bata até ao último instante determinado por Deus ou, de contrário, o nosso sangue clamará como o de Abel contra aquele que deve­ria cumprir uma missão de caridade e não o ofício de um algoz. Vox sanguinis clamat de terra.

4.  Falsa honra. — Um homem desafia para uma briga o seu antagonista, a fim de se vingar ou de reparar a ofensa. Esse homem não passa de um assassino e de um louco. É dupla­mente homicida, porque, às vezes, tem intenção de matar o adversário, e expõe-se ao perigo de ser morto. É louco porque, sob o pretexto de salvar a própria honra, perde-a perante as pes­soas verdadeiramente honestas, que o conside­ram como um escravo do orgulho, do ódio e da crueldade. De mais, a honra não tem relação alguma com a força física, aliás os mais fortes seriam sempre os mais honrados. De resto, fica bem a um homem recorrer aos tribunais para procurar justiça e é próprio de um cristão sofrer a injúria com paciência. Assim dá provas de heroísmo sublime.