12. TER MEDIDA E PONDERAÇÃO
Evitai na criança a tensão nervosa, a estafa
física e moral. Para assimilar tudo o que se lhe diz ou ensina, a criança
tem necessidade de períodos de tranquilidade. É preciso que possa viver um
pouco à vontade.
• Vigiai vossos filhos, mas não estejais sempre a
espioná-los.
• Estar todo tempo “atrás” de uma criança só serve
para fatigá-la sem resultado e impedi-la de ser ela própria.
• Seriai os esforços pedidos à criança. Seu ponto
de saturação é depressa alcançado. Não o ultrapasseis. É preciso deixá-la
respirar. Montaigne diz que a atenção da criança é de
pequena capacidade: é preciso não enchê-la com muita coisa ao mesmo tempo.
• Cumpre evitar todo exagero com as crianças,
porque elas tomam ao pé da letra o que lhes dizemos. Um excesso de
elogios pode ser tão funesto quanto um excesso de censuras.
• Não procureis amedrontar uma criança. Seu
organismo ainda é frágil e não se sabe nunca que repercussão
profunda pode produzir um temor irracional. Evitai as histórias
de bandidos, fantasmas, “lobisomens”. Evitai as ameaças ridículas: “Se não
ficares quietinho, o papão vem te comer!” Com maiores razões, não aceneis
com o inferno ou com o demônio por um pecadilho. Sobretudo, nunca adoteis
o lamentável meio que aquela pobre mulher usava, vendo passar um padre, a fim
de fazer cessar (!) o choro do filho: “Se não parares de chorar, aquele
homem de preto que ali vês, o senhor Padre, vai te levar...” Nada mais
indicado para fazer com que uma criança crie, talvez para sempre,
ojeriza ao padre e à religião.
• Grave erro psicológico é apresentar Deus como um
Pai de palmatória: “Estás vendo? Foi bem feito! Desobedeceste e Papai do
Céu te castigou...” A criança não tardará a perceber que Deus nem sempre
sanciona, de imediato, nossas faltas, e por outro lado, haverá algo de
mais falso e de mais perigoso para a sua fé do que apresentar o Deus de
amor com um déspota sempre pronto a vingar-se?
• Condicionemos sempre o esforço ao efeito que
desejamos obter. À força de encolerizar-se, de fazer “cenas” por
coisas insignificantes, de cumular uma criança de gritos,
censuras, lágrimas ou discursos, o educador perde a capacidade
de influenciar. Fica “queimado”... e paz às suas cinzas! A criança
disso logo se aproveita e acaba por opor a indiferença da força de inércia,
quando não a do desprezo interior.
• “A gritaria temerária e ordinária se transforma
em hábito e faz com que cada um a despreze” (Montaigne).
• É prejudicial submergir a atenção da criança com
discursos intermináveis.
Como uma mamãe terminasse uma “filípica” veemente
e longa contra o filho, Este lhe disse com impertinência, mas com uma
simpatia quase assustada: “Coitada da mamãezinha, como deve ter Sede!”
• Exigi somente coisas razoáveis, ao alcance
da criança; se pedirdes um esforço excepcional, deveis criar antes
um clima favorável. Mostrai-vos animador e tende cuidado em não
esticar demasiadamente a corda.
Por exemplo, não peçais habitualmente a uma
criança para ficar silenciosa e imóvel. Mas, eis que papai volta
do trabalho com uma forte enxaqueca. Mamãe afastará o filho e lhe
dirá afetuosamente: “Papai está com dor de cabeça. Vou te pedir esta noite
um esforço maior de que és capaz, porque já és um rapazinho: vais fazer o
menor barulho possível; senta-te neste canto e pega o teu livro de
gravuras. E que, de vez em quando, um beijo venha recompensar o rapazinho
ajuizado.
• Não abuseis de certas palavras como, por
exemplo, “mau”: “Oh Pedro, como és mau por estares sempre metendo o
dedo no nariz! — Joaninha, como és má por estares sempre mexendo nas
cortinas!” Em presença de Renatinho, diz mamãe a uma amiga: “Ah, se soubesse
como ele é mau: rasgou novamente a calça...”
O qualificativo “mau” serve para as ocasiões mais
fúteis e para as menores faltas. Como exigir que Pedro, Joana e Renato —
agraciados com o nome de “maus”, durante o dia inteiro, por futilidades
que não têm a menor relação com um desvio moral ou um vício de caráter —
possam ter uma noção razoavelmente equilibrada da verdadeira maldade?
• A criança atribui às coisas o valor e a
importância que lhes dão os pais. Assim, é necessário que os pais
tenham o senso das proporções e não atribuam ao acessório a importância do
principal.
• Certas aprovações demasiado vivas podem
falsear interiormente a perspectiva moral de Seres demasiado jovens para
que estabeleçam a própria escala de valores.
Por exemplo: não se deve dar importância maior a
um prato quebrado, uma calça rasgada, uma porta mal fechada, do que uma
desordem moral como a mentira, a teimosia, a crueldade.
• Ainda muito jovens, as
crianças têm o sentimento da própria dignidade. É preciso respeitá-la.
Certas humilhações públicas podem dar origem a complexos de inibição ou
de misantropia que perseguirão a criança a vida inteira. Há mães que
têm o hábito de dizer aos filhos: “Todo o mundo está te olhando, deveis
ter vergonha!” Disso pode resultar uma timidez exagerada, um temor de
enrubescer, um receio da opinião pública, que não
deixarão de repercutir funestamente mais tarde, quando a criança crescer.
• Dois complexos são igualmente perigosos: o
sentimento de superioridade e o sentimento de inferioridade ou
insuficiência. O grão gerado desses dois complexos, que desempenham papel
importante na germinação de perturbações psíquicas, é semeado desde a
primeira infância. Se a criança ouve sempre dizer que é superiormente
inteligente e divinamente bela, que tem disposições excepcionais, um
desenvolvimento superior ao de sua idade — tornar-se-á de uma suficiência
insuportável, acreditar-se-á algo de extraordinário e ferir-se-á,
dolorosamente, mais tarde, em face das duras realidades da vida.
Quando, pelo contrário, queixamo-nos continuamente
de que uma criança é desajeitada e estúpida, desenvolve-se nela um
sentimento de inferioridade que a torna, antecipadamente, vencida e
desesperada.
• Evitai tudo quanto prejudique o “natural” da
criança. A frescura, de sua alma é uma planta delicada demais
para que não se preserve das admirações errôneas que
ameaçam amolecê-la, senão falseá-la.
Que dizer de convites ao cabotinismo como este?
“Mostra aqui a este senhor como sabes fazer caretas!”
• Regra de ouro: não faleis nunca de vossos filhos
na presença deles. Se falais bem, correis o risco de
torná-los vaidosos; se falais mal, humilhá-los-eis perigosamente.