domingo, 25 de setembro de 2016

19. A EDUCAÇÃO DO SENSO RELIGIOSO - 1.ª Parte

Nota do blogue: Acompanhe esse especial AQUI.


19. A EDUCAÇÃO DO SENSO RELIGIOSO

Uma mãe cristã se preocupa com a alma do seu filho muito antes que ele nasça. Durante esse período único em que é uma só pessoa com o serzinho que traz nas entranhas, a mãe pode, por seu espírito de oração e de oblação, exercer uma influência invisível sobre a alma do ser querido e capitalizar para ele as bênçãos divinas.

• No instante do nascimento, as mães e pais cristãos não deixam de consagrar ao Senhor o serzinho querido que Deus lhes deu, ou melhor, lhes confiou. O que será esse filho mais tarde? De qualquer modo, não se destina a se tornar um eleito? E a missão mais importante dos pais não é a de ajudá-lo a realizar a sua vocação sobrenatural de filho ou filha de Deus?
• Tão cedo quanto possível, batizai vosso filho. Que o cuidado com as legítimas alegrias familiares não diminua em vosso pensamento a grandeza do primeiro sacramento que o recém-nascido vai receber. Pensai que no momento em que a água se derrama na sua fronte enquanto são pronunciadas as palavras sacramentais, vosso filho se torna o tabernáculo vivo da Santíssima Trindade, e que forças ocultas — germes das virtudes teologais — nele se depositam misteriosamente. 
  • É aos pais que cabem a honra e a alegria da primeira educação religiosa dos filhos. Mas é preciso tudo prever. O padrinho e a madrinha recebem da Igreja a missão de “suplemento” e “complemento”. É nesse espírito que cumpre escolhê-los, e não tendo unicamente em conta convenções mundanas ou suscetibilidades familiares.

• É nos primeiros meses que a criança — que registra muito mais do que se pensa — pode receber a feliz influência da mamãe orando ao pé do seu berço. A criança, olhando apenas, imitará por si mesma os gestos da mãe e aprenderá assim, pouco a pouco, a juntar as mãos e a enviar um beijo à imagem de Jesus e de Maria, cujos nomes, juntamente com os do pai e da mãe, serão os primeiros que balbuciará.

• Logo que a criança começa a falar, a mamãe pode fazê-la repetir algumas curtas invocações na sua linguagem de recém-nascido. Muito depressa, aliás, ela se mostrará capaz de falar espontaneamente ao Bom Deus, por menor que seja o estímulo materno.
• Do modo pelo qual os pais fazem os filhos rezar depende em grande parte a concepção de oração que hão de guardar Toda a vida. Se a oração é feita sem gosto, sem entusiasmo, de tal maneira que se entediam ao fazê-la, ao crescerem correm o risco de associar a idéia de remédio a todo ato religioso.
• O ideal é que a oração se torne para a criança como que uma necessidade e, ao mesmo tempo, uma alegria. Em certos momentos, ela poderá exigir-lhe um esforço, como por exemplo à noite, se for grande o sono; contudo, é um esforço que deve ser generosamente aceito.
• A partir do momento em que a criança houver compreendido e saboreado a oração pessoal, torna-se capaz de uma verdadeira vida de união com Deus, de conversação com Ele. 
• Desenvolver o espírito de fé na criança é habituá-la a ver Deus e a levá-lo em conta na vida cotidiana. Compete à mãe impregnar da Divina Presença os dias do filho. Cumpre evitar que as relações com Deus sejam relegadas unicamente ao começo e ao fim do dia, mas aproveitar as circunstâncias, bem como as disposições do filho, para elevar-lhe a alma naturalmente a Deus, para provar-lhe e fazê-lo sentir o amor de seu coraçãozinho por Aquele que o vê sem cessar e o ama com tanta ternura.

• É bom não abusar da expressão “Menino Jesus”. Decerto, o Senhor o foi; lembra-Se de tê-lo sido; mas não o é mais. Se Ele gosta de ser terno com as crianças, não é o açucarado personagem de cachos louros e camisa cor de rosa que uma imagística do tipo “bondon” tem vulgarizado. Ele é e continua a ser o Senhor.
• De uma parte, não se deve tratar o Bom Deus como um camaradinha, o que levaria muito depressa à falta de respeito e à abolição do senso do sagrado. De outra parte, nunca se deve apresentar Deus como um ser remoto, inacessível, espião das fraquezas humanas, sempre pronto a surpreender as delinquências, pequenas ou grandes. Isto seria uma caricatura, uma verdadeira traição. Quanto mal pode ser feito por meio de frases como a que assimila Deus a um “Papão” ou a um “Papai-de-chicote”: “Desobedeceste e por isso te machucaste; é bem feito, o Bom Deus te castigou!”
• Não apresentar igualmente Deus como um rico comerciante com o qual se negocia. Não é aqui necessário refutar longamente a assertiva criminosa de certos pais inconscientes que esperam até que os filhos atinjam a idade de 21 anos para deixar que escolham “livremente” a sua religião. Como se fosse preciso esperar 21 anos para lhes dar um nome de família, uma pátria! Como se (o que é mais grave) aos 21 anos um homem já não estivesse moralmente orientado! Por que privar essa criança de Todas as riquezas que uma fé esclarecida lhe trará durante a existência? Por que privar Deus do amor dessa criança? O que importa não é ajudá-la a adquirir, com a graça do Senhor, convicções e uma piedade pessoal de acordo com o plano divino a seu respeito? 
•   Alguns, argumentando com o chamado direito “de liberdade de consciência”, gostariam que os pais ficassem mudos diante das apalpadelas do instinto religioso: “Quando crescer mais, escolherá por si mesmo”. Mas, sem contar que a criança não precisa atingir essa idade para escolher, e escolher arbitrariamente, em função de seu egoísmo latente ou de seu mimetismo voluntário, tal raciocínio não se mantêm de pé. Pois, tratar-se-á, com efeito, — mesmo na idade adulta de escolher? Não se escolhe se nos devemos alimentar de peixes ou carnes sadias; a natureza já escolheu por nós. Trata-se antes de “compromisso racional”. Liberdade de consciência ou liberdade religiosa no adulto significa realmente; possibilidade que se deixa à razão, senhora do si mesma de voltar às fontes de sua fé, sem que dela entretanto duvide. Com a idade, realmente, a fé da criança tornar-se-á independente da dos pais, de onde terá extraído a substância, para encontrar, na reflexão pessoal, na experiência e no estudo, razões convincentes para crer, tal qual o fruto que progressivamente se descasca para oferecer, por fim, sua polpa saborosa. Como estaria atrasada a humanidade se, em cada geração, devesse novamente começar de zero... E, sobretudo, se em princípio, cada geração devesse recolocar tudo em problema. Seria então preciso negar a unidade, a continuidade e a universalidade da consciência humana[1].

• Assim que a criança puder, ensinar-lhe as principais orações da Igreja: o Padre-Nosso, a Ave-Maria. Explicar-lhe o sentido dessas orações, mas cuidar de que sejam recitadas corretamente, sem atropelos. Ainda aí, prestemos atenção ao senso do sagrado e façamos orar “em beleza": belo sinal da cruz, genuflexão bem feita, oração bem dita, com todo o coração.
• Jamais considerar as orações como exercícios declamatórios. Que erro, por exemplo, aproveitar a visita de uma pessoa amiga para fazer com que a criança recite as suas orações à maneira de uma fábula: “Mostra a esta moça como sabes rezar tuas orações.” Tais fórmulas só têm valor se exprimirem um sentimento interior, e para ajudar essa expressão nada é indiferente ou secundário.
• Não limitar a oração às fórmulas oficiais. À medida que a criança crescer, estimulá-la também à oração silenciosa, no segredo da alma para com Deus.
• Convém orientar a criança no sentido de uma grande confiança para com a Santa Virgem, por quem nos foi dado Jesus, e em quem sempre encontramos o caminho que a Ele conduz.
• Excelente é inculcar na criança uma devoção prática para com o seu anjo da guarda, cuja força protetora é tanto mais eficaz (e Deus conhece as necessidades dos nossos queridos filhinhos!) quão mais frequentemente for invocada.
• A criança é gulosa de histórias. Não convirá que, o mais cedo possível, mamãe lhe conte a mais bela de todas: a de Jesus? Não é também a mais emocionante? Mas, se quisermos tirar dessa história todo o proveito para a educação do senso religioso, é preciso, sem insistência, ajudar a criança a exprimir sua emoção numa reza — uma atitude, uma resolução.
• Com as crianças as precauções nunca são bastantes. Porque não lhes souberam contar Toda a história de Jesus, inclusive Sua ressurreição, há crianças que permanecem quer no estágio do presépio, quer na fase da cruz. Para as primeiras, Jesus é uma criança como elas, que nunca cresceu; para as segundas, é um Deus morto.
• Meu irmão de 4 anos — conta uma educadora — sempre se interessava pela significação dos crucifixos. Mas, um dia em que se mostrava insuportável, a governante lhe disse: “João Paulo, se não ficares bonzinho, o Menino Jesus vai chorar!” Meu irmãozinho olhou-a espantado e ergueu os ombros: “Ele não pode chorar porque está morto!”
• Um ponto em que é fácil formar o espírito religioso da criança é o do mistério da morte: em vez de apresentar-lhe a morte como um poço negro e fatal em que toda a humanidade vem cair, por que não lhe fazer compreender que a morte não é um fim, mas um começo e, como diz a Igreja, o nascimento para uma vida nova incomparavelmente bela, boa, feliz e eterna; que o “não sei quê” do túmulo nada tem que deva perturbar, uma vez que é apenas um invólucro material que a alma, sempre viva, repele como a borboleta repele a crisálida de que se serve para se lançar no azul primaveril; que somente os maus devem temer o Além, que os bons só podem desejá-lo?



[1] Entrettens familiers de morale civique – RENOUVEAUX (15-3-42)