terça-feira, 15 de janeiro de 2013

6. - Desconfiança e desesperação

 Cônego Júlio Antônio dos Santos
O Crucifixo, meu livro de estudos - 1950 

A desconfiança é a perda parcial da esperança e a desesperação é a perda total da esperança.
Tenho a convicção de que devo ganhar o Céu e evitar o inferno, cuidar da salvação da minha alma, mas a virtude é muito difícil de alcançar porque as minhas paixões são muito fortes e os obstáculos são muitos e insuperáveis e Deus é multo severo. 

I - Origem da desconfiança e da desesperação

A nossa inclinação para a desconfiança, para o, desespero, vem de três causas:

1. º Do pecado original. - Da mesma maneira que depois da prevaricação de Adão, o animal receou aproximar-se do homem, assim também o homem receou aproximar-se de Deus. Adão vendo ao longe o Senhor escondeu-se.
2. ° Dos pecados atuais. - Depois da nossa degradação original vêm as nossas inumeráveis faltas atuais. Ora esta incessante culpabilidade, incessantemente nos perturba, desconcerta e nos faz duvidar das misericórdias do Senhor.
3. ° Do demônio. – Enfim, o demônio vem também inquietar-nos e não admira porque ele é o pai do desespero.
A história das almas é a de uma perpétua agitação causada pelas apreensões sobre Deus, sobre a nossa vida passada, presente e futura.

II- Estragos da desconfiança e da desesperação

A desconfiança e a desesperação privam-nos de dois estimulantes que nos fazem caminhar:

- A graça de Deus e o esforço da vontade. Uma alma desconfiada, abatida, desesperada, é uma alma que não ora ou ora mal, e que por consequência, se priva dos socorros divinos; é uma alma incapaz do mínimo esforço. Qual não seria o nosso ardor em empregar todos os meios para alcançar perdão dos nossos pecados se tivéssemos a esperança do perdão; qual não seria o nosso ardor contra as paixões, se tivéssemos a esperança de as vencer; qual não seria o nosso ardor pela prática da virtude, se tivéssemos a esperança de adquiri-la; qual não seria o nosso ardor para nos aproximarmos de Deus, se tivéssemos a esperança de ser bem acolhidos! Mas privados da confiança somos privados, da vida, somos homens feitos cadáveres.
O desespero referente às coisas da salvação é pecado grave, quando não deixa confiança nenhuma na bondade e na misericórdia de Deus. Este pecado é a causa da ruína de muitas almas. Os desesperados contando só com a justiça divina, julgam-se irremediavelmente perdidos e repetem como Caim: - O meu pecado é demasiado grande para que possa ser perdoado. (Genes. IV, 13).

           III- Meios de evitar a desconfiança e a desesperação

Merecemos esta amarga censura de Jesus Cristo: «O homens de pouca fé, porque duvidais!»
Temamos tudo do pecado e esperemos tudo de Deus. Esta regra é absolutamente prática: 1.º Manda-nos fugir de todo o pecado voluntário; 2. ° Dá tranquilidade ao nosso espírito e ao nosso coração. Ao nosso espírito: Que coisa mais razoável do que falar assim a Deus: Meu Deus, já que só quero esperar em Vós, eu quero também evitar tudo o que Vos desagradar.
- Ao nosso coração: «Esperemos tudo do Senhor, mas não Lhe desagrademos.» Há nestas palavras, uma mistura de respeito, de prudência, de delicadeza e de amor, diz Desurmont, que satisfaz a alma. Então a alma satisfeita e alegre pode exclamar: viva a minha esperança pois que tem por garantia a inocência! viva a minha inocência, porque tem por tesouro a esperança!
Antes do pecado devemos sempre temer a justiça de Deus, depois do pecado devemos confiar na Sua misericórdia. Deus nunca despreza um coração contrito e humilhado.

           VI- Formação da esperança nas almas

Devemos tornar, esta virtude bem sólida nos seus fundamentos e fecunda nos seus resultados. Para a tornar sólida nos seus fundamentos é necessário meditar, a miúdo, sobre os motivos em que se funda: no poder de Deus, na Sua bondade e nas magníficas promessas que nos faz.
- Para tornar a nossa esperança fecunda devemos trabalhar com Deus na obra da nossa santificação. «Pela graça de Deus, diz o Apóstolo São Paulo, é que sou o que sou, mas a sua graça não tem sido vã em mim, antes tenho trabalhado mais copiosamente que todos eles, não eu, contudo, mas a graça de Deus comigo».
Não há dúvida de que na obra da santificação, tudo depende de Deus; mas é preciso trabalhar como se tudo dependesse somente de nós. É que de fato diz Tanquerey, Deus não nos recusa jamais as Suas graças, e, por consequência, na prática, não temos que nos preocupar senão do nosso esforço pessoal.

Reflexões e resoluções. - Agora, com os olhos da minha alma fixos em Jesus Crucificado, faço reflexões sobre a virtude da esperança cristã e tomo as resoluções de esperar sempre em Deus, ainda mesmo que Ele me guie por vias que para mim sejam incompreensíveis e dolorosas, e de evitar a falsa confiança, a presunção, a desconfiança e desesperação. Maria Santíssima, minha boa Mãe, ajudai-me a ser fiel a estas resoluções. Assim seja.