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22. EDUCAÇÃO DA LEALDADE
Nada irrita tanto os pais como as mentiras dos filhos, e têm razão, porque a partir do momento em que a duplicidade se insinuar no coração de um filho ou de uma filha, nenhum clima de confiança será mais possível, a atmosfera tornar-se-á logo irrespirável. Com demasiada frequência, entretanto, os pais esquecem que lhes cabe primeiro dar aos filhos o exemplo da mais escrupulosa lealdade.
• Torna-se tanto mais preciso formar as crianças relativamente à franqueza, quanto à mentira. Sendo um meio fácil de defesa para o ser fraco, logo se transforma em tentação permanente para a criança, cujo julgamento, não estando ainda formado, pode levá-la pouco a pouco a se deixar emaranhar nas próprias mentiras. Ora, quem não sabe mais distinguir o verdadeiro do falso, está perto de não poder mais discernir o bem do mal.
Convém que os pais sejam particularmente exigentes em relação a estes fundamentos da educação moral: não suportar a mentira, repeli-la impiedosamente; perdoar a criança que confessa a falta em vez de negá-la; desmascarar-lhe as velhacariazinhas instintivas é o meio de habituá-la à limpeza em sua própria consciência e nas suas relações com Deus e os homens.
• A menor deslealdade por parte dos pais é a ruína de sua autoridade moral. Mesmo que a criança não o note de imediato, haverá no fundo de seu coração uma surpresa dolorosa, uma fissura na confiança. A criança nunca perdoa a mentira. Lembremo-nos de que as suas reações não são como as do adulto. Não possuindo espírito crítico nem senso de matizes, ela toma ao pé da letra o que os pais lhe dizem, sejam promessas, ameaças ou mesmo “profecias”. Eis a tal respeito uma historiazinha autêntica:
Uma “mocinha” de 5 anos prepara-se para sair com a tia. Acabam de fazê-la vestir uma “toilette” nova que os hábeis dedos da mamãe executaram especialmente para ela, com todo amor. Ora, mamãe, muito vaidosa, contempla a filhinha que sai, dizendo-lhe: “Todo o mundo que encontrares vai cair de costas admirado, vendo-te tão bonita!”
O passeio termina... A tia e a garotinha voltam para casa. Com o rostinho crispado e gestos ferozes, a “mocinha” arranca o chapéu e joga-o sobre um móvel... “Que tens?” — pergunta a mãe surpreendida. “Ninguém caiu de costas, admirado, vendo-me...”
Decepção amarga!
Dir-me-eis que essa garotinha era uma boba por ter tomado ao pé da letra a predição materna... Mas as crianças sempre tomam ao pé da letra o que lhes dizem...
• Caso não se possa responder à pergunta inoportuna ou indiscreta de uma criança, é melhor dizer-lhe com simplicidade que não se pode responder, no momento, por tal ou qual razão; enganar, por pouco que seja, é que nunca!
• Nunca se dirá bastante do mal que têm feito às crianças as tais histórias de Papai Noel, do Menino Jesus na chaminé, ou ainda as fábulas ridículas de repolhos ou cegonhas para explicar o nascimento dos bebês. As crianças pequenas acreditam nos pais como se fossem o Evangelho. Algumas mesmo chegam às vias de fato para defender as informações recebidas. E quando percebem (isto vem fatalmente, mais dia, menos dia) que foram enganadas, sentem-se, mesmo que não o dêem a entender desde logo, terrivelmente decepcionadas, dolorosamente ulceradas. Em certos temperamentos generosos, um único abuso de confiança de que tenham sido vítimas pode criar um verdadeiro traumatismo psicológico e moral.
Quando contamos uma história, tenhamos o cuidado de dizer: “Isto é um conto, uma história inventada, irreal”. Quando, pelo contrário, contamos uma narrativa do Antigo ou do Novo Testamento, digamos: “Esta é uma história verdadeira”. Mesmo assim, é muito importante não perturbar uma inteligência ingênua, dando-lhe o falso como verdadeiro. A tal propósito, até quando contaremos às crianças que o Menino Jesus desce pela chaminé na noite de Natal? Como pretender depois, quando os preparamos aos seis ou sete anos para a primeira comunhão, que elas acreditem que o Jesus presente na Hóstia não é o mesmo que traz brinquedos para os sapatinhos? Que contradição para essas cabecinhas! Que confusões absurdas e perigosas! Ninguém se espante que depois de tudo isso os garotos fiquem furiosos, decepcionados, irritados por terem sido enganados; ou que continuem, durante a vida inteira, a colocar no, mesmo plano o sagrado e o profano e que para eles a religião permaneça simplesmente um mito maravilhoso, dado como alimento aos pobres para lhes embelezar a vida.
Não se trata de suprimir a árvore de Natal, cheia de luzes e brinquedos, menos ainda de não colocar os sapatinhos junto à chaminé para festejar a mais maravilhosa das noites; trata-se simplesmente de dizer a verdade que é bela. As crianças ficarão do mesmo modo felizes se souberem que é a própria mamãe que deposita os lindos brinquedos junto ao presépio em nome de Jesus e para festejar alegremente a Sua vinda à terra.
Não enganemos as crianças pelo prazer de nos divertirmos com a sua credulidade; a confiança é uma coisa muito bela para que nos arrisquemos a perdê-la para sempre. Sejamos os semeadores da verdade.[1]
Prepara-se uma menina para a comunhão. Essa menina está decepcionada porque acaba de saber que o Menino Jesus da chaminé é, na realidade, sua mamãe. “Então, Simoninha, estás contente por que vais receber no teu coração o Menino Jesus da Hóstia?” Simone enrubesce e responde com os olhos a brilhar: “Ora, mamãe, não sou assim tão tola como julgas. O Menino Jesus desce tanto na Hóstia como nos sapatinhos de Natal; quer dizer que não vale a pena que eu faça a minha primeira comunhão”.[2]
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[1] VÉRINE, Les Dix Commandements des Parents, pág. 95.
[2] Fato autêntico citado por uma professora.