quinta-feira, 9 de maio de 2013

A prece do coração

Fonte: Mãe Cristã

A reza ou a oração é o amor em ato e em exercício; é o movimento vital da alma amorosa; de modo que, segundo vários teólogos, a alma que não reza deixa de viver: Cessam as suas pulsações e morre.
               O coração, como um lar, é preciso estar aceso. Jesus Cristo é quem lhe ateia a sagrada chama e quem a alimenta e a atrai ao céu.
               Nós chamamos prece do coração às efusões de amor que, sob qualquer forma que seja, emanam de Deus e do homem para se confundirem e unirem indissoluvelmente. A prece do coração é a via pela qual nós nos comunicamos com Deus e entramos no seu alto reino; não é pelas agitações, mas pelas afeições íntimas, que sobe ao céu para ir até Deus: “non pedibus, sed affectibus, non migrando, sed amando”. E Santa Teresa diz, com mais simplicidade ainda, que “orar não é mais que testemunhar, nas freqüentes relações que temos a sós com Deus, o quanto o amamos e o quanto nos sentimos felizes em sermos por ele amados”.
               Segundo Santa Teresa, a prece é uma elevação, porque o alvo desejado está acima de todas as coisas deste mundo, e para atingi-lo, é preciso que o espírito se eleve, quebrando os laços que lhe embaraçam o vôo.
               Vários métodos aprovados nos ensinam as formas da prece ou da oração mental; mas o grande mestre desta ciência é o Espírito Santo e a condição do aproveitamento em sua escola é uma prática perseverante. Todas as coisas se aprendem pelo exercício; pela paciência é que nos tornamos pacientes e pela mansidão é que nos tornamos mansos, como é pelo cultivo assíduo das ciências e das artes que nos tornamos sábios. Do mesmo modo aprende-se a rezar, rezando; como se aprende a amar, amando.
               A alma que ama a seu Deus quase não tem necessidade de métodos nem de regras, pois orar é amar e, quando se ama, o coração se expande naturalmente, sem o auxílio de nenhuma arte. Que há de mais doce e de mais fácil do que amar o Amor e conversar com o ente amado?!
               É por se limitarem às orações estudadas, que tantas almas se afastam da prece interior. Ide com simplicidade a vosso Deus e falai-lhe com um coração sincero e ingênuo, que uma só palavra, que assim balbuciardes, tocará mais vivamente o coração de Deus, do que todas as frases que tiverdes aprendido de cor.

               A prece deve ser sentida, singela e espontânea. Pouca ou nenhuma impressão causam as saudações que os vossos filhos vos recitam, quando o seu professor foi quem as compôs, e preferis certamente a sua linguagem ingênua e simples aos discursos antecipadamente preparados.

               É útil, contudo, recorrer às lições dos guias espirituais; mas, conforme os seus próprios conselhos, cumpre segui-los com um espírito de liberdade, sem se sujeitar maquinalmente a eles. As frias considerações que a nossa razão elabora com trabalho, são operações lógicas, mas não orações. Orar não é meditar os mistérios do amor – sem amor; o mistério das dores – sem dor; e a paixão de Jesus Cristo – sem compaixão. Se as meditações frias têm a sua utilidade para certos espíritos graves, a maior parte das pessoas as evitam por exigirem um esforço intelectual de que poucos são capazes. Trata-se de entrar em comunicação com o Deus que em nós habita; e para isto o melhor, o mais excelente livro de rezas é o nosso próprio coração.
               A alma humilde pode contar com a assistência do Espírito Santo; e tanto mais feliz será o seu êxito na via das ascensões interiores, quanto maior for a fidelidade, a confiança e a simplicidade com que ceder aos atrativos celestes. Tal é o resumo das lições de São Francisco de Sales, de Santo Ignácio, de Santa Teresa e dos mais experimentados doutores da Igreja.
               Assim, pois, sempre que vos aproximardes de Deus para expandir o coração na prece, invocai o Espírito de amor e atraí-o a vós por um desejo veemente e perseverante. A perseverança é que triunfa dos obstáculos, mas é preciso ajuntar-lhe a paciência. “É bom esperar em silencio a saudação do Senhor”.

               Não exijais que a lenha verde se inflame depressa; suportai o fumo das distrações sem impaciência e sem desânimo. Esforçai-vos por guardar a alma na cela estreita e fechada de vosso coração; e o Pai Celeste, que é o único a penetrar neste secreto recôndito, atenderá aos vossos ardentes votos. Se ele provoca em vós este grito de amor: “Abba, Pater”, abandonai-vos aos impulsos do amor filial e não perturbeis a ação Divina com os vossos próprios pensamentos, nem com as inúteis demonstrações de uma sensibilidade fugitiva. Lançai-vos com Madalena aos pés do Senhor, ou com São João sobre o seu peito. Aí é que se colhem palavras vivificantes, que se meditam sublimes verdades, que sesaboreia um divino maná e se bebem as águas vivas da graça.

               Podeis abrir também o livro dos Salmos ou dos Evangelhos, e quando houver oportunidade, qualquer capitulo dos livros inspirados; mas convém ler pouco e apreciar muito. Procurai sob a casca do texto Sagrado o celeste alimento; em seguida, fechai o livro, aplicai o pensamento e o coração inteiro às lições divinas que ai recolhestes e exalai depois para o céu o perfume de uma prece inflamada. “In meditatione mea exardescet ignis”. “O fogo do amor- exclama Davi –se acendeu na minha meditação”.

               Oh! Como seria para desejar que os fiéis pudessem ler os livros Santos na língua da Igreja! Mas, bem que as diversas traduções desses livros sejam geralmente defeituosas, o fiel achará nelas inesgotáveis inspirações; e a alma, quer gemendo ao peso do temor e do remorso, quer estremecendo de júbilo e de esperança, terá no divino salmista o admirável interprete de todos os seus sentimentos.

               Seria um erro acreditar que a oração mental convém somente aos religiosos e que é impossível ou inútil na vida do mundo. Desenganai-vos: esta prática salutar é recomendável a todos, e as pessoas envolvidas nos negócios do século têm necessidade dela ainda mais do que as almas consagradas a Deus. Estando estas subtraídas às influências enervantes do espírito do mundo, têm menos tentações, menos paixões, menos quedas a recear. Como os círios que ardem no santuário, elas se consomem docemente ao fogo da caridade e se unem a Deus pela direção habitual da sua vida. Mas no tumulto das sociedades mundanas encontra-se o contrário, tudo que arruína o espírito, enoja a alma, e interrompe a nossa conversação com o céu; e se no meio de tantos perigos não recorreres ao recolhimento da oração, a vossa fé esfriará pouco a pouco e a vossa piedade se cobrirá de gelo.
               As dificuldades que se opõem a estes salutares exercícios provêm sempre da inconstância e do desânimo. Abandonam-se as primeiras tentativas, porque não produzem imediatamente o fervor; e é por falta de fidelidade que se reza sem obter o consolo almejado; quaisquer que sejam, pois, as vossas ocupações e as condições que vos cerquem, reservai sempre algum tempo para a prece do coração.
               São Paulo aconselha a “resgatar o tempo”, o que quer dizer segundo a explicação de Santo Agostinho, que, para ganhar tempo, é preciso ganhá-lo no tempo que se perde. Tirai alguns minutos a um sono muito prolongado, outros minutos às conversações frívolas, às leituras ociosas e às visitas inúteis e outros mais cuidados excessivos da vaidade, e tereis, por fim de contas, somando estes diferentes bocados de tempo perdido, o lazer necessário à oração.

               O Apóstolo vai mais longe: ele quer que o cristão reze a todo o tempo e em todo o lugar, pois que o incenso não deve jamais cessar de arder no santuário da alma. O verdadeiro amor não admite pausa, nem parada, nem intermitência; e sempre ora, porque ama sempre.
               É preciso pelo menos atiçar todos os dias a celeste fagulha, afim de que, nos instantes consagrados ao recolhimento e ao silencio, possa a oração desatar-se e voar, como a brisa matinal, e responder docemente por ecos de amor aos altos favores da graça.
               Os frutos desses entretenimentos sagrados são ao mesmo tempo saborosos e saudáveis; pois se a conversação com os sábios e a ciência destes nos tornam sábios, se a sociedade e a convivência dos bons nos tornam bons e na companhia das pessoas virtuosas nos tornamos virtuosos, que efeitos não produzirão em nós estas freqüentes comunicações com o Deus da ciências, com a sabedoria eterna?
               Mães cristãs, se quereis atrais as bênçãos de Deus sobre vós e sobre as vossas famílias, sede fiéis à prece, perseverai na oração e não desanimeis jamais.