quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Breve Tratado do Matrimônio (Padre Jean Viollet)

Nota do blogue: Tratado retirado do site do Mosteiro da Santa Cruz.


O Padre Viollet, bem conhecido pelos seus livros sobre a família e a educação, expõe em algumas páginas os princípios e regras do matrimônio cristão.

Numa época em que a instituição familiar está sendo muito ultrajada, em que se perdem as referências, esta obra ajudará os jovens que se preparam para o matrimônio, e também os esposos, em conhecerem melhor a grandeza deste estado de vida.

O autor não se contenta com relembrar os princípios, mas dá também valiosos conselhos para formar uma família capaz de atravessar todas as dificuldades da vida, uma família fundada sobre um amor verdadeiro, e não sobre o egoísmo.



I – MATRIMÔNIO

1- A chamamento para o matrimônio

Entre as vocações às quais os homens estão chamados pela Providência, o matrimônio é umas das mais elevadas. Pelo matrimônio o homem e a mulher, colaboradores de Deus na procriação dos filhos, são chamados a se santificar mutuamente e recebem, ao mesmo tempo, a missão de formar, pela educação, o coração, a inteligência e a vontade dos filhos que lhe são confiados, até chegar o dia em que os mesmos são finalmente capazes de se conduzir por si próprios.

2- Baseia-se no amor

Porque Deus é amor e porque Ele criou o mundo por amor, quis que seus filhos nascessem do mesmo modo, isto é, pelo amor que une um homem e uma mulher para a vida inteira. Por esta razão, o casamento deve ser considerado com um respeito religioso. Aliás, é consagrado por um sacramento, o sacramento do Matrimônio.

3- Pede longa preparação

Por conseguinte, o homem e a mulher têm de preparar-se antecipadamente e por longo tempo, durante os seus anos de adolescência, para a sublime vocação que fará deles os colaboradores da obra divina. Para preparar-se para isto, o jovem deverá conservar o seu corpo na castidade, aprender a respeitar a mulher, adquirir as qualidades sobre as quais poderá, com toda confiança, repousar o coração da esposa. A jovem deverá ser reservada, cuidar da guarda do seu coração, não procurar as emoções sentimentais sem futuro, mas acostumar-se a missões de devotamento e generosidade, começando no seio da própria família.

4- O que deve ser o amor

O amor não é uma satisfação dos sentidos; também não é um sonho novelesco. É um sentimento forte e profundo, o dom generoso e durável de um só homem para uma só mulher.

Exige que cada um dê ao outro o melhor de si mesmo, aplique-se a lutar contra os defeitos que constituem um obstáculo para a harmonia conjugal, conquiste as qualidades e virtudes que enriquecem o amor e lhe dão todo seu valor moral e espiritual. O verdadeiro amor não se confunde, como amiúde acreditam os jovens, com uma beatitude sem mistura.

É feito de alegrias e penas, de desenvolvimentos e sacrifícios. Os que pretendem não ter do amor senão suas alegrias, o matam antecipadamente; ao passo que aqueles que aceitam seu fardo e seus cuidados, o garantem contra os egoísmos da paixão e as dificuldades da vida. 

5- Origem do amor

O amor conjugal não é uma invenção humana. É querido por Deus. É desvio de seu fim natural não procurar nele mais do que a satisfação dos desejos da paixão, sem fazer por onde gerar filhos e se consagrarem os esposos à sua educação, dando-lhes o melhor de si mesmos.

II - A PREPARAÇÃO PARA O MATRIMÔNIO

1- O valor do amor depende do valor das almas

Se há tantos matrimônios que não perseveram, é porque não foram preparados e porque os que se uniram não tinham compreendido as suas exigências morais e espirituais. É preconceito corrente que o amor aparece e desaparece sem se saber como e sem que seja erro de ninguém. A verdade é inteiramente outra. Se o aparecimento do amor é sempre resultado de um encontro fortuito ou preparado, a sua duração e profundidade dependem do valor das almas e da maneira de como elas se preparam para amar.

2- Os erros dos jovens

Para um jovem, não é preparação para amar multiplicar os prazeres sensuais nos dias da sua adolescência. Tais falsos prazeres, que se pretendem justificar pelo odioso provérbio: “é preciso gozar a juventude”, desenvolvem hábitos de prazer egoísta e sem responsabilidade, que terão por resultado diminuir o respeito devido à esposa e a si próprio. Dando livre curso aos instintos inferiores, os adolescentes diminuem as delicadezas de coração e o controle da vontade. Preparar-se para amar é aprender a respeitar-se a si mesmos e fazer-se respeitar pelo outro sexo; é forjar sua vontade com vista às obrigações futuras; é amar antecipadamente aquela que é ainda desconhecida, por fidelidade antecipada; é conquistar as qualidades de coragem, de lealdade, de domínio de si e de abnegação sobre as quais se apoiará, um dia, o coração da esposa.

3- Os erros das jovens

Para a jovem, preparar-se para amar é habituar seu coração para todas as delicadezas da fidelidade. Provocar e perturbar o sexo forte com jogos de sedução não é aprender a amar; nem multiplicar, pelo namorico, as falsas emoções da sensibilidade; nem sonhar com paixões amorosas irrealizáveis. O coração não vive senão pelo dom de si. Ora, para aprender a devotar-se, a jovem deverá exercitar-se no devotamento sob todas as suas formas. A moça que não souber esquecer-se de si mesma no decorrer de sua adolescência, não o saberá fazer na sua vida familiar.

4- O amor é enriquecimento mútuo

O amor não vive se não for alimentado pelo enriquecimento mútuo do marido pela esposa e da esposa pelo marido. Muitos casamentos falham porque os noivos não possuem as qualidades que teriam enriquecido e feito desabrochar a alma do seu cônjuge.

5- Como se preparar

Por isso, os jovens e as jovens devem aplicar-se em desenvolver ao máximo, durante seus anos de adolescência, as qualidades próprias de cada sexo. O homem deve se forjar uma personalidade forte e corajosa, um julgamento reto, uma consciência leal; conquistar as qualidades que darão à esposa o sentimento de poder se abandonar com confiança à retidão e generosidade de seu marido. A esposa deve desenvolver em si todas as sensibilidades do coração; conquistar as qualidades de dona de casa e se mostrar apta a todos os atos que tornam amável e atraente o lar. Um e outra deveriam preparar-se para bem educar seus filhos, devotando-se durante a sua adolescência, às obras de formação da juventude.

III - A ESCOLHA

1- Da escolha depende o futuro

A escolha do esposo e da esposa é de importância primordial, porque não se pode esquecer que compromete definitivamente o futuro. Dessa escolha depende a felicidade ou infelicidade do futuro lar, a vida moral e espiritual da família.

2- Não confundir qualidades físicas e qualidades morais

A escolha pode ser deformada de várias maneiras. Primeiro, porque preocupam-se mais com as qualidades físicas do que com as qualidades morais. O gosto que se tem em presença de uma “bela pessoa” tira ao espírito a liberdade de exame e julgamento; impede ver a pessoa tal como é, com suas qualidades e defeitos; leva-nos a esquecer que as satisfações dos sentidos são variáveis e inconstantes e que a felicidade reside mais na união dos corações e das vontades, cuidadosas de um mesmo ideal moral.

3- A situação financeira não substituirá nunca o amor

As considerações de dinheiro, as vaidades sociais não são menos perigosas quando se trata de se unir para sempre. Ao ter em vista problemas de dinheiro e de situação financeira, quando se trata de fundar um lar, os esposos estão se preparando para as piores desilusões, se decidirem pelo matrimônio para satisfação de simples vaidades sociais ou amor ao dinheiro, sem preocupar-se de pôr em primeiro plano as considerações morais, fundamento do amor conjugal.

4- Pôr em primeiro plano o valor moral da pessoa

Se a atração física deve ter sua parte na escolha do cônjuge, o valor moral da pessoa deve ser colocado sempre em primeiro plano. Por isso, esclarecimentos sérios e seguros devem preceder a decisão final.

5- Necessidade de um estudo aprofundado

É necessário que os pais ou, na sua falta, pessoas de toda confiança, ajudem seus filhos a se esclarecer, sobre os antecedentes dos candidatos e de sua família, do ponto de vista moral e religioso. Não devem negligenciar a questão da saúde. Ninguém tem direito, numa questão de que dependem futuras exigências, de agir sem rodear-se de todas as garantias possíveis e sem assegurar-se das aptidões morais e físicas da pessoa para a criação de uma família sadia. Não é raro que pessoas sem escrúpulos, querendo casar, disfarcem mais ou menos seus verdadeiros sentimentos.

6- A família – O meio social

Ainda que não se case com a família e o meio social da pessoa escolhida, seria agir com grande imprudência decidir-se a casar sem estar previamente assegurado de que os hábitos de seu meio e sua educação não serão de natureza a provocar conflitos e incompreensões.

7- Harmonias secundárias

Mas, se para o bom entendimento se exige, antes de mais nada, a compreensão mútua, há contudo harmonias secundárias que seria perigoso desprezar. As diferenças de meio social, de educação recebida e a desproporção de fortunas são outros tantos elementos que podem provocar dificuldades e desentendimentos que perturbarão o desembaraço das relações quotidianas. Seria erro psicológico crer que o amor se basta a si mesmo, e que as dificuldades da vida não podem exercer sobre ele nenhuma influência para o bem ou para o mal.

8- A harmonia exige um ideal comum

Uma das condições essenciais para a boa harmonia conjugal é a comunhão de ideal moral e de convicções religiosas. Antes de comprometer-se pelos laços do matrimônio, os interessados deveriam sempre assegurar-se de que existe concordância na sua maneira de encarar os grandes problemas da vida. Nunca poderão estar de acordo os que encaram a vida comum como divertimento com os que a consideram como vocação; os que não partilham os mesmos princípios de moral conjugal; os que têm convicções religiosas com os que não as têm. Se os esposos não querem ver surgir-lhes desacordos trágicos e sofrimentos sem saída, precisam, antes mesmo do matrimônio, se colocar de acordo nas grandes diretivas de seu ideal conjugal e familiar. Uma mesma direção moral é o fundamento mais seguro para o bom entendimento conjugal. Amar é orientar-se juntamente no presente em direção a um ideal cuja realização se procura em comum.

9- Este ideal é especialmente necessário quando se tratar de educar os filhos

O problema de concordância das convicções morais e de crenças religiosas ganha toda sua importância quando se trata da educação dos filhos, e da influência a exercer sobre suas consciências. Quantas divisões dramáticas quando, cada um dos esposos, pretende passar para as almas dos filhos convicções contrárias às de seu cônjuge.

10- Os caracteres

Apesar dos preconceitos correntes, cremos que o matrimônio entre pessoas de caráter diferente, até mesmo opostos, nem sempre é de se desaconselhar. Não é raro que caracteres diferentes sejam complementares e se harmonizem na mesma medida em que necessitam um do outro.

11- Matrimônio de coração ou matrimônio de razão

É preciso opor os matrimônios de “coração” aos matrimônios de “razão”? Certamente que não, porque seria deixar entender que, de um lado, o coração tem o direito de ser insensato e que, por outro lado, a razão pode decidir-se independentemente dos sentimentos. Os matrimônios que apresentam as maiores probabilidades de sucesso são aquele em que coração e razão se compreenderam e se entenderam harmoniosamente. O matrimônio não é uma loteria, mas um ato livre, no qual, após ter rezado a Deus e examinado todas as circunstâncias, a vontade se decide com pleno conhecimento de causa.

IV - LEIS DO AMOR CONJUGAL

1- Há uma moral de vida conjugal

É preconceito corrente que, após receber o sacramento do matrimônio, os esposos tenham o direito de se comportar como bem lhes parece, e que não estejam submetidos a nenhuma obrigação moral especial.

2- Responsabilidades da união conjugal

De todos os atos humanos, o amor é um dos que implicam mais responsabilidades pessoais e sociais. Se todos os atos humanos dependem da lei moral, como poderia este ser exceção? Não é da maneira como nos comportamos em face do amor que depende a felicidade ou infelicidade do outro? E não é no seio da união conjugal que as potências geradoras assumem sua significação moral para o bem ou para o mal?

3- Leis do matrimônio – A fidelidade

Quais são, então, as leis do amor conjugal? A primeira é a fidelidade. Os que pretendem que existe o direito de se conciliar o amor e a infidelidade, dariam, por isso mesmo, prova de que não amam sinceramente. É para assegurar a sinceridade do dom que um faz ao outro fazem, marido e esposa, que o matrimônio está declarado indissolúvel. Esta indissolubilidade ajudará os cônjuges a triunfar das vicissitudes, dos sofrimentos e das tentações da vida. Fidelidade e indissolubilidade estão intimamente ligadas. A fidelidade é não só possível, mas relativamente fácil para cônjuges que, durante sua adolescência viveram castamente, para os que têm convicções religiosas e se aplicam, no decorrer de seu amor, em afastar ocasiões de fraqueza, em dominar os egoísmos da natureza, em destruir em si os defeitos susceptíveis de comprometer a boa harmonia conjugal.

4- A infidelidade não rompe a união conjugal

Isso não quer dizer que as paixões humanas não possam provocar, por vezes, a infidelidade de um ou outro dos esposos. A infidelidade, apesar do que dela pensam os partidários do divórcio, não dá nenhum direito ao esposo lesado romper suas promessas. A falta de um dos cônjuges não autoriza o outro a cometer uma falta semelhante, quebrando o laço que tinha consentido livremente ao se casar.

5- Condenação do divórcio

O divórcio está, assim, em oposição formal às leis da união conjugal. O fato de ser aceito pela lei civil em nada muda seu caráter de imoralidade. O legislador não pode mudar, à sua vontade, leis morais que devem, normalmente, presidir às promessas mútuas dos esposos no matrimônio.

6- Lei da unidade

À lei de fidelidade e de indissolubilidade vem se juntar a de unidade do laço conjugal, a saber, que o matrimônio não é concebível senão entre um único homem e uma única mulher. O casamento repetido entre divorciados não passa de poligamia disfarçada.

7- União conjugal e procriação dos filhos

Abordamos aqui o difícil problema da castidade conjugal, quer dizer, das regras morais que devem presidir à união dos esposos. Basta que consideremos o plano de Deus fora de qualquer idéia preconcebida, para concluir que a união dos sexos tem como fim principal e primeiro a continuação da espécie. Ainda que haja entre marido e esposa elementos de união espiritual aos quais teremos de voltar, não se pode perder de vista que a primeira conseqüência do dom que mutuamente se fazem um ao outro, não somente de seu coração mas também de seu corpo, deve incluir a aceitação leal das conseqüências que resultam naturalmente disto, a saber, a concepção eventual de filhos.

8- Os filhos devem nascer no seio da família

No pensamento de Deus, nunca os filhos devem nascer de uma aventura passageira. Os infelizes que nascem nestas condições são as vítimas do egoísmo humano. Deve presidir ao nascimento e educação dos filhos uma união sincera e duradoura. Por isso, a instituição do matrimônio se confunde com a da família. Mas, no seio da vida conjugal, levantam-se certos problemas que os esposos devem encarar com sinceridade, se querem que Deus abençoe seu lar e se estão decididos a evitar faltas que os afastariam da vida e da perfeição cristã.

9- A temperança

Não devem esquecer que os ameaça um perigo, o de praticar prazeres sexuais à custa do devotamento generoso e desinteressado. Por isso, desde o princípio do matrimônio, deverão se aplicar à prática da virtude de temperança. Grande número de esposos cessam de se amar depois de alguns anos de casamento, por que procuraram o máximo de prazeres e negligenciaram desenvolver entre si as qualidades desinteressadas que dão ao amor todo seu valor moral e espiritual. Para viver e se desenvolver, o amor tem necessidade de lutar contra os egoísmos da natureza e, muito especialmente, contra os egoísmos da carne.

10- O amor e dom de si

As alegrias da união conjugal são legítimas e podem contribuir poderosamente para a manutenção da boa harmonia dos esposos, mas sob condição de que sejam conformes ao plano divino, quer dizer, que possam servir, se Deus o quer, a dar vida a filhos. O amor se orienta naturalmente para o dom, primeiro o dom dos esposos um ao outro, depois, por esse dom, o dos dois esposos conjuntamente aos filhos que lhes são confiados.

11- O número de filhos

Por pouco que os esposos tenham compreendido a grandeza de sua vocação familiar, multiplicarão generosamente o número de seus filhos tanto quanto permitir a saúde da esposa e as condições materiais da existência. Se absterão de pretextos mais ou menos egoístas, demasiadas vezes invocados por aqueles que limitam, sem maior razão, o número de seus filhos. Mas, por mais desejosos que estejam de criar uma família numerosa, talvez um dia se encontrem perante dificuldades que irão levantar, inevitavelmente, a questão da limitação do número de seus filhos.

12- Perfeição conjugal e castidade

Esta limitação, se apoiada em razões válidas, significa, para os esposos, o difícil problema da continência. Sabem que a moral reprova os meios ilícitos de evitar filhos. Desde logo se aplicarão a evitá-los e, para se fortalecerem contra sua própria fraqueza, buscarão na oração e na prática dos sacramentos os socorros que lhes são necessários. Para evitar que a continência prejudique a boa harmonia conjugal e o seu equilíbrio moral, multiplicarão, um em relação ao outro, as atenções e delicadezas do coração e procurarão, juntos, um derivativo às exigências da carne, no maior devotamento para com seus filhos e sua educação. Reservado, além disso, o direito de dar um ao outro marcas de ternura e velando para que estas tendam mais à união dos corações do que dos corpos, não se perturbarão se essas ternuras vierem a provocar involuntariamente alguma excitação de ordem sexual, uma vez que essas excitações não tenham sido procuradas e queridas por si mesmas. Além disso, se confiarão lealmente a um diretor espiritual esclarecido e se ajudarão mutuamente a pôr em prática seus conselhos. Não sendo perfeitos, e exigindo a prática da abstinência conjugal longos e difíceis esforços, não se deixarão desencorajar por quedas sempre possíveis. Reconhecê-las-ão humildemente e continuarão seus esforços que os levarão, pouco a pouco, a um estado melhor e mais perfeito. A Igreja, que perpetua a misericórdia de Jesus Cristo, reserva para o pecador de boa vontade a maior indulgência, desde que este reconheça humildemente suas fraquezas e se esforce por delas triunfar. ¹
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1- Existem métodos naturais que permitem determinar, com maior ou menor exatidão, o período de fecundidade e infecundidade da mulher. Tais métodos permitiriam evitar, à vontade, concepções indesejadas. Até que ponto é legítimo o emprego destes métodos? Não o é, certamente, quando o método é usado pelos esposos com intenção egoísta, quando poderiam normalmente aumentar o número de seus filhos. Mas quando for utilizado legitimamente, quer dizer, por razão grave, tais como: saúde da mulher, dificuldades econômicas, perigo de desunião ou desvio de conduta, nunca os esposos devem perder de vista que o seu uso tende a multiplicar os egoísmos carnais, em prejuízo da generosidade do coração. Os esposos que desejam elevar seu amor mútuo para uma espiritualidade sempre mais elevada, não usarão tal método senão para evitar um mal maior, e se esforçarão em substituí-lo por esforços cada vez mais generosos no sentido da continência.

V - O MATRIMÔNIO ENTRE CRISTÃOS NÃO É UM
SIMPLES CONTRATO, MAS SIM UM SACRAMENTO

1- O matrimônio não é um contrato comum

Notemos, em primeiro lugar, que o casamento, considerado independentemente do sacramento, não é um contrato semelhante aos outros contratos. Enquanto que os contratos comuns podem ser renovados pelo consentimento das partes contratantes, o casamento implica um compromisso definitivo que nada poderá quebrar, senão a morte de um dos cônjuges. Com efeito, pelo matrimônio, marido e esposa se prometem e se consagram conjuntamente a uma instituição que os ultrapassa e que, ao mesmo tempo, os liga: a instituição familiar. A sociedade familiar se baseia no compromisso de um ao outro perante Deus, e por isso tal dom tem valor sagrado e definitivo.

2- É um sacramento

Para os cristãos, sacramento e contrato são uma e mesma coisa. Pelo fato de que marido e esposa tomam a Deus por testemunha ao se darem livremente um ao outro, conferem-se mutuamente o sacramento do matrimônio. O padre está ali para abençoar os esposos, assistir como testemunha, em nome da Igreja, as promessas que os esposos trocam, para verificar se são sinceras e livres e se estão nas condições requeridas para receberem as graças do sacramento.

3- A lei civil não tem nenhum poder sobre o matrimônio

É dever da lei civil proteger a família. Aquela, malgrado suas pretensões, não tem nenhum poder direto sobre a união conjugal, a qual depende unicamente da livre vontade dos contratantes. Assim, não é o funcionário civil que casa os cônjuges, mas estes mesmos, únicos responsáveis pela sua resolução. O funcionário civil, neste ato, satisfaz-se em verificar a existência e a validade do contrato, a fim de tirar as conseqüências dele resultantes, principalmente no que respeita aos bens dos esposos, sua situação jurídica e de seus filhos. Tendo verificado o matrimônio, a sociedade familiar que acaba de se formar e intervir no caso em que teria de suprir as falhas e abusos, sempre possíveis, dos pais. Portanto, é por excesso de poder que a sociedade civil se arrogou o direito de fazer e desfazer matrimônios. O divórcio e o casamento de divorciados estão em contradição flagrante com as exigências do contrato no qual se baseia a sociedade familiar.

4- Os casamentos nulos

Quer dizer que todos os matrimônios são válidos? Não. Há casos em que há, apenas, aparência de matrimônio. Neste caso o matrimônio é nulo e a Igreja, pronunciando anulações de matrimônio, não destrói um laço existente, apenas verifica que não existiam as condições necessárias para que a união fosse válida.

5- Algumas condições para a validade do matrimônio

Eis algumas das condições necessárias para a validade do matrimônio: liberdade moral dos contratantes no momento do compromisso; certeza de que não existe erro na identidade da pessoa com que vai se casar; poder para cumprir normalmente o ato conjugal; ausência de laços de parentesco em grau próximo; cumprimento das formalidades requeridas pelo Direito Canônico, como presença de testemunhas, etc...

6- A declaração de nulidade não é divórcio disfarçado

Vê-se que a declaração de nulidade de um matrimônio pela Igreja não tem qualquer relação com o divórcio pronunciado por um magistrado civil. Pelo divórcio, o Estado pretende romper uma união legítima e autorizar os interessados a se casarem de novo. A Igreja declara que um pretenso matrimônio nunca existiu. Os processos de nulidade devem ser instruídos pela hierarquia da diocese. Não é cobrado qualquer custo aos indigentes nos casos de nulidade.

7- Graças do sacramento do Matrimônio

Sendo um sacramento, instituído por Nosso Senhor Jesus Cristo, o Matrimônio confere aos esposos graças especiais que lhes permitirão, se forem fiéis, cumprir a sua vocação de maneira perfeita e santificante. Mas para que a graça do sacramento atue, para que produza todos seus frutos no decorrer da evolução da vocação familiar, é preciso que os cônjuges sejam sinceramente crentes e se apliquem em praticar, tão perfeitamente quanto possível, os compromissos e obrigações que contraíram ao se casar.

8- Quando serão dadas? Quando serão recusadas?

Se, por mentira implícita, os esposos recebessem o sacramento do matrimônio com más intenções, como, por exemplo, a de recorrer ao divórcio em caso de desentendimento, ou se recusar ao dever de procriação, não somente não receberiam graças, mas cometeriam um sacrilégio. Mas, se os esposos casarem-se em estado de graça, após confissão sincera e com boa vontade em preencher seus deveres tão perfeitamente quanto possível, conservando a união de corações, velando pela boa educação dos filhos e observado as leis da castidade conjugal, podem esperar das graças do sacramento todas as forças e todas as luzes necessárias à sua vida conjugal.

VI - DIREITOS E DEVERES RECÍPROCOS DOS ESPOSOS

1- Ajuda conjugal mútua

O matrimônio confere aos esposos, como vimos, direito recíproco sobre seus corpos; implica também obrigação de mutuamente se ajudarem moral e materialmente, ao longo de toda sua vida conjugal.

2- São, conjuntamente, responsáveis pela educação dos filhos

Ambos são responsáveis, de igual modo, pela educação dos filhos. Portanto, devem entender-se cada vez que tiverem de tomar decisões sobre essa educação.

3- Deveres e direitos da autoridade marital

Ainda que o pai seja constituído, por Deus, chefe supremo da família, a sua autoridade não é moralmente legítima se não for exercida segundo as leis da moral e para o bem comum dos membros da sociedade familiar. É responsável, perante Deus, pelos abusos que poderia cometer a este respeito.

4- A esposa possui o primado do amor

Se as qualidades masculinas conferem o primado do comando, as qualidades femininas conferem à esposa o primado do amor. O amor tempera o que o comando poderia ter de excessivo e o comando tempera as fraquezas possíveis do sentimento.

5- O amor reduz as dificuldades

Todas as dificuldades sobre o papel recíproco dos esposos tendem a desaparecer na mesma medida em que eles mantiverem o respeito e o amor mútuo. A vontade, a inteligência e o coração de ambos devem colaborar, sem atritos, para a boa harmonia do lar. Os problemas serão resolvidos de comum acordo, cada um se aplicando em reconhecer o bom fundamento dos conselhos e reflexões do outro. Tal harmonia exige grande desprendimento de si mesmo e o cuidado único de contribuir para o bem geral da família.

VII - BOM ENTENDIMENTO CONJUGAL

1- Na Terra, o amor é uma criação nunca terminada

Nesta Terra, o amor nunca é plenamente realizado: é uma criação, mistura de alegrias e sofrimentos, e não pode progredir senão graças à boa vontade recíproca dos esposos.

2- Obstáculos à harmonia

Se as primeiras alegrias do amor podem dar a ilusão de amor total e definitivo, as realidades da vida em comum fazem logo aparecer divergências de caráter e de educação, hábitos e defeitos que dificultam a harmonia conjugal, e provam serem necessários, no mais das vezes, longos e penosos esforços de adaptação para realizar a união das pessoas morais, e fazer passar o amor das regiões superficiais da sensibilidade para as profundezas da alma e da vontade.

3- O amor se mantém pela generosidade dos esforços

Aqueles que desejam somente as alegrias do amor sem dele aceitar as obrigações morais, verão, pouco a pouco, elas desaparecerem e deixarem no coração um gosto de amargura e insuficiência. O amor não cresce e não satisfaz as aspirações íntimas do coração se não for o apoio dos esforços que os esposos devem fazer quotidianamente para se corrigirem de seus defeitos, melhor se adaptarem um a outro, se devotarem em conjunto à sua vocação familiar.

4- Alternância de alegrias e sofrimentos

O amor implica como que uma alternância de alegrias e sofrimentos. Temos disso uma primeira prova no fato de que as alegrias da união conjugal se transformam, normalmente, num parto doloroso para a mãe e, para o pai, na obrigação de respeitar por um tempo, pela continência, aquela que acaba de dar um filho ao mundo. E será sempre assim: a alegria da paternidade será seguida pelas preocupações da educação; mas as preocupações da educação prepararão, por sua vez, toda a elevação moral de ver crescer as qualidades e virtudes dos filhos, aos quais terá consagrado o melhor de si. Enganam-se muito aqueles que crêem poder separar o amor das abnegações que o devem levar a constantemente se ultrapassar a si próprio. Por isso importa precisar as condições graças às quais os esposos conseguirão se amar todos os dias mais.
Para preparar as harmonias futuras, é preciso que o homem esteja habituado, desde a adolescência, a respeitar a mulher e a fugir daquelas cuja ligeireza ou má conduta arrisquem falsear seu ideal feminino; que a jovem se aplique em conservar, em casta reserva, os encantos de seu corpo e as delicadezas de seu coração. Quantos nunca se compreenderam no decorrer de sua vida conjugal, porque a verdadeira concepção das relações entre marido e esposa foi falseada durante seus anos de adolescência!...

5- Maridos, compreendam vossas esposas; esposas compreendam vossos maridos

A compreensão psicológica de um sexo pelo outro é elemento essencial do bom entendimento conjugal. O marido se deve esforçar por compreender o caráter, a natureza e as aspirações do coração feminino, e reciprocamente. Tal compreensão mútua, aliás, nunca está terminada, e deve se adaptar a todos os incidentes da vida em comum. Os esposos não se regozijam no seu relacionamento mútuo senão na medida em que se sentem compreendidos pelo seu cônjuge.

6- Confiança e confidências

O bom entendimento não subsiste sem a confiança, a qual implica que os esposos tenham, um para com outro, a mais inteira franqueza. A desconfiança mútua mata o regozijo dos sentimentos e, para a evitar, é necessário que a vida de cada um dos esposos possa ser exposta à luz do sol. Se dissimulam os seus procedimentos, as suas relações, o emprego do dinheiro e, em geral, aquilo que constitui a trama da existência quotidiana, preparam inconscientemente a separação de vida e, por conseqüência, de corações. Ainda é preciso que a vida conjugal não suprima as liberdades e as independências necessárias.

7- Atenções e cortesias

É grave erro terminar, desde que casado, com as atenções e cortesias que tanto encanto deram aos tempos de noivado. A harmonia conjugal exige que os esposos continuem, ao longo de toda sua vida comum, os esforços para se agradarem. As negligências, neste ponto, arriscam o aparecimento da indiferença.

8- Não existe defeito que não prejudique a harmonia conjugal

Não se pode esquecer nunca que não há defeito que não prejudique o bom entendimento conjugal. A mentira, a preguiça, a inveja, o amor próprio, e com maior razão o egoísmo sob todas as formas, são outros tantos obstáculos à harmonia de corações e de caracteres. Declarar ao seu cônjuge que ele deve aceitá-lo tal como você é, é não compreender absolutamente nada das exigências do amor. Amor sincero implica que se mude todos os dias por amor do outro, e que haja esforço para corrigir tudo o que no caráter arrisca prejudicar a harmonia.

9- Não existe virtude que não lhe seja necessária

Podemos ser tentados a dizer: “O amor não vive sem a virtude, sem todas as virtudes”. O que preserva da corrupção é a vontade sincera de perfeição. Para se ajudarem mutuamente a bem viver, os esposos devem partilhar suas alegrias, suas preocupações e suas penas, para se tornarem melhores, tanto para seu próprio bem espiritual como para o de seus filhos.

VIII - PATERNIDADE E MATERNIDADE

1- O amor vem de Deus. É para dar a vida

Porque Deus é amor e criou o mundo para o amor, colocou entre o homem e a mulher a faísca do amor, da qual deverão nascer os filhos. Tal como o amor divino, o amor conjugal deve ser criador, redentor e santificador.

2- Amor criador

É criador, pois por ele são concebidas as criaturas que Deus quer chamar à vida, e que é ele que vai prover às necessidades temporais e espirituais dos filhos.

3- Amor redentor

É redentor, pois os esposos, por amor de um para com o outro e por amor de seus filhos, devem oferecer suas alegrias, seus trabalhos e suas penas para salvação comum da família.

4- Amor santificador

É santificador, pois o esposo deve se santificar por amor da esposa, a esposa por amor do esposo, e ambos por amor das almas de seus filhos.

5- Os filhos

O dom que de seu corpo mutuamente se fazem, esposo e esposa, é princípio de vida e não deve nunca ser desviado de seu fim natural: os filhos. A chegada de um filho transforma os esposos em dois novos seres, animados de um sentimento comum que os eleva acima de si próprios, o sentimento de paternidade e de maternidade.

6- Novas responsabilidades

Pai e mãe se sentem juntamente ligados pela imensa responsabilidade, que é a proteção e educação do pequeno ser sem força e sem luz que lhes é confiado. Ambos se sentem chamados em proporcioná-las tão perfeitamente quanto possível. Sabem que o filho se alimentará dos exemplos que tiver sob seus olhos e tal perspectiva os obriga a se aperfeiçoarem a si mesmos. Devem formar um coração e uma inteligência de homem e de cristão e, para fazê-lo, não mais viverão para si mesmos, mas para levar a cabo aquela vida de que agora têm responsabilidade.

7- O bem dos filhos exige o bom entendimento entre os esposos

Velarão para que não haja entre eles a mínima desinteligência e a menor divisão, porque sabem que estas desvirtuam a formação do pequeno ser fraco e sem defesa que lhes é confiado. Compreendem que o filho tem necessidade da dupla afeição do pai e da mãe e que essa afeição só vale se se concilia num sentimento único: união para o bem moral e espiritual daquele ao qual irão, doravante, se consagrar. Para a paternidade e a maternidade o amor conjugal se eleva e se transfigura.

8- Tentação

Mas que os esposos não se deixem tentar por uma espécie de egoísmo a três, de regozijarem-se nas alegrias da paternidade, mas reduzidas ao mínimo. O amor, desde então, recusaria sobre si mesmo e se despojaria da vida espiritual para a qual tende.

9- O amor só vive pelo dom

O amor não se conserva e não se aprofunda senão se dando. Por isso os esposos cristãos multiplicam o dom de si mesmos, multiplicando o número de seus filhos. Aceitam, antecipadamente, trabalhos e penas que acompanham a educação de família numerosa. Mas sabem que as bênçãos de Deus estão reservadas para aqueles que as aceitam generosamente. Os esposos, que sabem com certeza que não podem ter filhos, podem, no entanto, usar legitimamente dos seus deveres conjugais, com vista à realização dos outros fins do matrimônio, e para favorecer o bom entendimento conjugal.

IX - FILHOS E SUA EDUCAÇÃO

1- A finalidade da educação

O fim primeiro do matrimônio são os filhos. Não simplesmente os filhos concebidos e vindos à luz, mas os filhos educados, quer dizer, conduzidos e guiados por seus pais em direção à perfeição humana e cristã. Os filhos são a glória e a consolação de seus pais quando foram formados no amor do bem e na fuga do mal.

2- Não se enganar sobre o fim a atingir

Que o pai e a mãe definam juntos o fim a atingir, pondo-se de acordo sobre o que convém chamar de felicidade do filho. Nem saúde, nem fortuna, nem ausência de sacrifícios constituem a verdadeira felicidade, mas o gosto do bem, a aceitação das penas da vida, vontade de amar a Deus e ao seu próximo. Fazer a felicidade do filho é ensinar-lhe a amar os bens que não perecem e a não se servir dos outros bens senão na medida em que são úteis à salvação da alma. Muitos pais fizeram a infelicidade de seus filhos porque se enganaram, desde o início, sobre a noção da verdadeira e da falsa felicidade.

3- Os métodos de educação variam com as diversas concepções de vida

É evidente que os métodos de educação variam até à contradição, segundo a concepção que os educadores fazem da vida e seus fins. Os métodos não são os mesmos, segundo se crê ou não se crê em Deus; que se represente a vida como conjunto de deveres recíprocos dos homens uns em relação aos outros, ou como campo de batalha em que todos os meios são bons para vencer. Importa, pois, que os pais definam a si próprios e diante de Deus o ideal que se esforçam por colocar no coração de seus filhos.

4- A educação exige a perfeição dos pais

A educação é, antes de tudo, uma respiração: a respiração pela alma do filho e pela alma dos adultos. Se a alma dos pais é rica de vida moral e espiritual, os filhos alimentam-se quotidianamente da riqueza espiritual de seus pais. Pelo contrário, os melhores métodos de educação não obterão nenhum resultado durável se não são acompanhados de exemplos que formam e arrastam as vontades.

5- Confiança

A educação não é, de modo algum, um sistema complicado de ordens, de permissões e de proibições. Se as ordens devem ter seu papel, sobretudo nos primeiros anos, jamais substituirão a confiança, única capaz de despertar no filho o amor do bem que se deseja lhe inculcar. A confiança não implica na abdicação da autoridade, muito pelo contrário. O filho mimado não é um filho que confia. A severidade, desde que temperada pela ternura, não constrange a confiança, na condição de que o filho tenha o sentimento de que nunca o enganaram, que se aplicaram em ajudá-lo em todas as circunstâncias, e que lhe deram os encorajamentos de que a sua fraqueza necessitava.

6- O filho deve colaborar na sua própria educação moral

O problema da educação consiste em fazer passar de fora, quer dizer, da alma dos pais, para dentro, quer dizer, para o coração e para a vontade dos filhos, o bem que se deve praticar. Enquanto o educador não conseguir fazer que a criança diga sinceramente “eu quero”, nada praticamente fez. É preciso que o filho colabore na sua própria educação.

X - CONCLUSÃO

O matrimônio é uma obra divina. A união dos esposos deve contribuir para o aumento de sua vida moral e espiritual e preparar a dos filhos. O amor foi dado aos esposos para que colaborem, amando-se na obra de Deus, Criador e Providência. Deus confia-lhes o poder para que provejam às necessidades materiais e espirituais do filho; autoridade, com poder de punir e recompensar, para estimular a fugir do mal e a praticar o bem. Porque os esposos são imperfeitos e muitas vezes tentados por faltas e fraqueza que contradizem sua vocação, têm necessidade de se apoiarem em Jesus Cristo, tanto para obterem perdão de suas faltas como para serem socorridos pela Sua graça, muito particularmente pela Sua presença na Eucaristia. Invocarão especialmente o Espírito Santo que lhes ensinará a se amarem e a amarem seus filhos, conforme a vontade divina.
Rev. Pe. Jean Viollet

O NAMORO


O namoro é o período em que o rapaz e a moça procuram conhecer-se em preparação para o matrimônio.

O namoro só se justifica no caso em que o rapaz e a moça têm condições para contrair matrimônio num prazo razoável de um a dois anos. Namoro de adolescentes, ou longo demais, não é preparação para o matrimônio, mas sim ocasião de pecado.

No matrimônio homem e mulher doam seus corpos, constituem uma só carne e tornam-se instrumentos de Deus na geração de novas vidas humanas.

Mas antes de doar os corpos é preciso doar as almas. No namoro os jovens procuram conhecer, não o corpo do outro, mas sua alma.

Os namorados não podem ter relações sexuais, pois o corpo do outro ainda não lhes pertence. Unir-se ao corpo alheio antes do casamento (fornicação) é um pecado contra a justiça, algo como um roubo.

E como nosso corpo é templo do Espírito Santo (I Cor 6,19) a profanação de nosso corpo é algo semelhante a um sacrilégio.

“Não sabeis que sois um templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós? Se alguém destrói o templo de Deus, Deus o destruirá. Pois o templo de Deus é santo e esse templo sois vós” (I Cor 3,16-17).

Porém não é apenas a fornicação que é pecado, mas também tudo o que provoca o desejo da fornicação, como abraços e beijos que, muito mais do que constituírem expressões de afeto, despertam, alimentam e exacerbam o desejo físico.

Aliás, é possível profanar o templo do nosso corpo até por um pensamento: “Todo aquele que olha para uma mulher com mau desejo já cometeu adultério com ela em seu coração” (Mt 5,28)

Durante o namoro deve evitar-se o contato físico desnecessário. O contato entre os corpos (beijos e abraços), além de causar o desejo de fornicação, obscurece a razão. O próprio beijo na boca já constitui uma entrega física, que, se acidentalmente pode não se consumar, no entanto a prepara ou apressa. Vale a pena lembrar a advertência de Cristo: “Vigiai e orai para não cairdes em tentação. O espírito está pronto, mas a carne é fraca” (Mt 26,41).

O prazer excita os sentidos, além disso, torna os jovens incapazes de perceber a beleza da alma do outro. O namoro assim deixa de ser uma ocasião de amar para ser uma ocasião de egoísmo a dois, cada um desejando sugar do outro o máximo de prazer.

COMO NAMORAR

Sendo o namoro o encontro de dois templos sagrados que desejam conhecer-se e amar-se interiormente, os namorados deveriam agir à semelhança de um rito litúrgico: 
- rezar antes e depois do namoro; 
- namorar apenas em lugares visíveis para evitar a ocasião de pecado. Nada há para esconder;
- durante o namoro, evitar ir além de conversar e dar as mãos;
- ter sempre em mente: “Eu estou diante de um templo sagrado. Ai de mim se eu profanar este templo até por um pensamento”.

E se o outro não aceitar um namoro cristão?

É preciso renunciar ao namorado (à namorada).
“Aquele que ama o pai ou a mãe mais do que a Mim não é digno de Mim. E aquele que ama o filho ou a filha mais do que a Mim não é digno de Mim” (Mt 10,37).

E Jesus poderia acrescentar: 

“Aquele que ama o namorado ou a namorada mais do que a Mim, não é digno de Mim”.

Para conservar a graça que Cristo nos conquistou com o preço de seu sangue, devemos renunciar até a própria vida.

Mas há um consolo. Se o outro não aceita namorar senão através de beijos e abraços escandalosos, na verdade ele não lhe ama, mas deseja gozar do prazer que você pode oferecer. O verdadeiro amor sabe esperar.

É preciso ser diferente de todo mundo?

Sim. O cristão deve ser o sal da terra (Mt 5,13), a luz do mundo (Mt 5,14), o fermento na massa (Mt 13,33).

“Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos, pela renovação do vosso espírito, a fim de poderdes discernir a qual é a vontade de Deus, o que é bom, o que lhe agrada e o que é perfeito.” (Rm 12,2)

A alegria da pureza

Aquele que procura o prazer, encontra o prazer. Mas depois vem o vazio, o remorso de consciência e a tristeza.

Aquele que se abstém do prazer por amor, encontra a alegria. Os puros de coração são capazes desde já de conhecer as coisas de Deus muito melhor do que os outros. A pureza se expressa no olhar. Ao olharmos para os olhos de uma pessoa pura vemos algo de Deus em sua alma. 

Se os que buscam o prazer na impureza conhecessem a alegria da pureza, desejariam ser puros mesmo que fosse por egoísmo. A alegria da pureza está acima do prazer da impureza assim como o Céu está acima da Terra. Experimente e diga-me se não é assim. 

Pe. Luis Carlos Lodi da Cruz.

Oração para antes do namoro

Senhor, 
Estou aqui diante de um templo santo, onde Vós habitais. 
Amo-Vos presente neste templo e prefiro morrer 
a profanar este santuário mesmo por um pensamento.
Fazei que com este namoro eu aprenda a amar-Vos presente
no outro e assim descubra se foi este (esta) quem escolhestes 
para estar ao meu lado por toda a minha vida.
São Rafael Arcanjo, que conduziste Tobias a Sara 
e lhes ensinastes a pureza do coração, 
fazei-nos namorar de tal modo que os anjos possam 
estar presentes e glorificar a Deus conosco.
Virgem puríssima, dai-nos a pureza do vosso Imaculado Coração.

Depois do namoro

Depois do namoro, convém fazer o exame de consciência: 
“Estou agora amando a Deus mais do que antes?”